Acessibilidade / Reportar erro

Influência de diferentes posições corporais na capacidade vital em pacientes no pós-operatório abdominal superior

Resumos

JUSTIFICATIVA:

As alterações no posicionamento corporal podem ocasionar mudanças na função respiratória e é necessário compreendê-las, principalmente no pós-operatório abdominal superior, já que os pacientes estão suscetíveis a complicações pulmonares pós-operatórias.

OBJETIVO:

Verificar a capacidade vital nas posições de decúbito dorsal (cabeceira a 0° e 45°), sentado e em ortostase em pacientes no pós-operatório de cirurgia abdominal superior.

MÉTODOS:

Estudo transversal, feito entre agosto de 2008 e janeiro de 2009, em um hospital na cidade de Salvador (BA). O instrumento usado para mensuração da capacidade vital (CV) foi o ventilômetro analógico e a escolha da sequência das posições seguiu uma ordem aleatória obtida a partir de sorteio das quatro posições. Os dados secundários foram colhidos nos prontuários de cada paciente.

RESULTADOS:

A amostra foi composta por 30 indivíduos com idade média de 45,2 ± 11,2 anos e IMC 20,2 ± 1,0 kg/m2. A posição em ortostase apresentou valores maiores da CV em relação à sedestração (média das diferenças: 0,15 ± 0,03 litros; p = 0,001), ao decúbito dorsal a 45° (média das diferenças: 0,32 ± 0,04 litros; p = 0,001) e 0° (0,50 ± 0,05 litros; p = 0,001). Houve um aumento positivo entre os valores de CVF do decúbito dorsal para a postura ortostática (1,68 ± 0,47; 1,86 ± 0,48; 2,02 ± 0,48 e 2,18 ± 0,52 litros; respectivamente).

CONCLUSÃO:

A posição do corpo afeta os valores da CV em pacientes no pós-operatório de cirurgia abdominal superior, com aumento nas posturas em que o tórax encontra-se verticalizado.

Posicionamento do paciente; Capacidade vital forçada; Complicações pós-operatórias; Cirurgia abdominal


RATIONALE:

The changes in body position can cause changes in lung function, and it is necessary to understand them, especially in the postoperative upper abdominal surgery, since these patients are susceptible to postoperative pulmonary complications.

OBJECTIVE:

To assess the vital capacity in the supine position (head at 0° and 45°), sitting and standing positions in patients in the postoperative upper abdominal surgery.

METHODS:

A cross-sectional study conducted between August 2008 and January 2009 in a hospital in Salvador/BA. The instrument used to measure vital capacity was analogic spirometer, the choice of the sequence of positions followed a random order obtained from the draw of the four positions. Secondary data were collected from the medical records of each patient.

RESULTS:

The sample consisted of 30 subjects with a mean age of 45.2 ± 11.2 years, BMI 20.2 ± 1.0 kg/m2. The position on orthostasis showed higher values of vital capacity regarding standing (mean change: 0.15 ± 0.03 L; p = 0.001), the supine to 45 (average difference: 0.32 ± 0.04 L; p = 0.001) and 0° (0.50 ± 0.05 L; p = 0.001). There was a positive trend between the values of forced vital capacity supine to upright posture (1.68 ± 0.47; 1.86 ± 0.48; 2.02 ± 0.48 and 2.18 ± 0.52 L; respectively).

CONCLUSION:

Body position affects the values of vital capacity in patients in the postoperative upper abdominal surgery, increasing in postures where the chest is vertical.

Positioning the patient; Forced vital capacity; Postoperative complications; Abdominal surgery


JUSTIFICACIÓN:

Las alteraciones en el posicionamiento corporal pueden ocasionar cambios en la función respiratoria y es necesario comprenderlas, principalmente en el postoperatorio abdominal superior, ya que los pacientes son susceptibles a complicaciones pulmonares postoperatorias.

OBJETIVO:

Verificar la capacidad vital en las posiciones de decúbito dorsal (cabeza a 0° y 45°), sentado y en ortostasis en pacientes en el postoperatorio de cirugía abdominal superior.

MÉTODOS:

Estudio transversal realizado entre agosto de 2008 y enero de 2009, en un hospital en la ciudad de Salvador (BA). El instrumento usado para la medición de la capacidad vital (CV) fue el espirómetro analógico y la elección de la secuencia de las posiciones siguió un orden aleatorio que se obtuvo a partir de un sorteo de las 4 posiciones. Los datos secundarios fueron extraídos de las historias clínicas de cada paciente.

RESULTADOS:

La muestra se compuso de 30 individuos con edades medias de 45,2 ± 11,2 años e IMC de 20,2 ± 1 kg/m2. La posición en ortostasis presentó valores mayores de CV con relación a la posición sedente (media de las diferencias: 0,15 ± 0,03 L; p = 0,001), al decúbito dorsal a 45° (media de las diferencias: 0,32 ± 0,04 L; p = 0,001) y a 0° (0,50 ± 0,05 L; p = 0,001). Hubo un aumento positivo entre los valores de CV forzada del decúbito dorsal para la postura ortostática (1,68 ± 0,47; 1,86 ± 0,48; 2,02 ± 0,48 y 2,18 ± 0,52 L, respectivamente).

CONCLUSIÓN:

La posición del cuerpo afecta los valores de la CV en pacientes durante el postoperatorio de cirugía abdominal superior, con aumento en las posturas en las que el tórax está verticalizado.

Posicionamiento del paciente; Capacidad vital forzada; Complicaciones postoperatorias; Cirugía abdominal


Introdução

Os procedimentos cirúrgicos abdominais superiores são responsáveis por um grande número de complicações pulmonares pós-operatórias (CPP). Isso ocorre porque o procedimento interfere diretamente na mecânica pulmonar e tende a induzir distúrbios ventilatórios restritivos, bem como a inibição reflexa do nervo frênico e a consequente disfunção diafragmática.1Erice F, Fox GS, Salib YM, et al. Diaphragmatic function before and after laparoscopic cholecystectomy. Anesthesiology. 1993;79:966-75. , 2Simonneau G, Vivien A, Sartene R, et al. Diaphragm dysfunction induced by upper abdominal surgery. Role of postoperative pain. Am Rev Respir Dis. 1983;128:899-903. and 3Ford GT, Whitelaw WA, Rosenal TW, et al. Diaphragm function after upper abdominal surgery in humans. Am Rev Respir Dis. 1983;127:431-6. Durante o período pós-operatório imediato o paciente poderá apresentar hipoventilação, relacionada ao processo anestésico, assim como alterações ventilatórias limitantes por causa da dor na incisão cirúrgica.4Arozullah AM, Conde MV, Lawrence VA. Preoperative evalua- tion for postoperative pulmonary complications. Med Clin N Am. 2003;87:153-73.

A taxa de prevalência das CPP nas cirurgias de abdômen superior varia entre 17% e 88%.5Overend TJ, Anderson CM, Lucy SD, et al. The effect of incentive spirometry on postoperative pulmonary complications. Chest. 2001;120:971-8. Essas alterações são mais acentuadas nos procedimentos de laparotomia, mas também são observadas nas cirurgias laparoscópicas.1Erice F, Fox GS, Salib YM, et al. Diaphragmatic function before and after laparoscopic cholecystectomy. Anesthesiology. 1993;79:966-75.

Os testes de função pulmonar têm importante papel na avaliação e no diagnóstico, na quantificação da intensidade do acometimento dos distúrbios ventilatórios e no direcionamento do tratamento.6Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisologia. Diretrizes para testes de função pulmonar. J Pneumol. 2002;28 Suppl. 3:S1-238. A capacidade vital forçada (CVF) é uma das medidas de função pulmonar frequentemente usada para este fim e é definida como o máximo volume de ar expirado a partir do ponto de inspiração máxima.6Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisologia. Diretrizes para testes de função pulmonar. J Pneumol. 2002;28 Suppl. 3:S1-238. and 7Gibson J, Whitelaw W, Siafakas N. Tests of overall respiratory function. Am J Respir Crit Care Med. 2002;166:521-6. A redução da CVF é uma anormalidade bastante evidente em pacientes com fraqueza de músculos respiratórios ou alterações de mecânica pulmonar que levam à sobrecarga deles.7Gibson J, Whitelaw W, Siafakas N. Tests of overall respiratory function. Am J Respir Crit Care Med. 2002;166:521-6. and 8Chevrolet JC, Deleamond P. Repeated vital capacity measure- ments as predictive parameters for mechanical ventilation need and weaning success in Guillain-Barré syndrome. Am Rev Respir Dis. 1991;144:814-8. Essas reduções no pós-operatório de abdome superior variam de 20% a 30% do valor pré-operatório e podem atingir valores mais significativos de até 50%.7Gibson J, Whitelaw W, Siafakas N. Tests of overall respiratory function. Am J Respir Crit Care Med. 2002;166:521-6. , 9Frazee RC, Roberts JW, Okeson GC, et al. Open versus laparoscopic cholecystectomy. A comparison of postoperative pulmonary function. Ann Surg. 1991;213:651-3. , 1010 Hasuki´c S, Mesi´c D. Postoperative pulmonary changes after laparoscopic cholecystectomy. Med Arh. 2001;55:91-3. and 1111 Ravimohan SM, Kaman L, Jindal R, et al. Postoperative pulmonary function in laparoscopic versus open cholecystec- tomy: prospective, comparative study. Indian J Gastroenterol. 2005;24:6-8.

Alterações no posicionamento corporal e a consequente mudança de atuação das forças da gravidade, entre outros fatores, ocasionam mudanças na função respiratória em diferentes intensidades.1212 Gea J. La especie humana: un largo camino para el sistema respiratorio. Arch Bronconeumol. 2008;44:263-70. Logo, o conhecimento dos efeitos fisiológicos das diferentes posições corporais sobre a função pulmonar é fundamental para o direcionamento das condutas fisioterapêuticas, incluindo a avaliação espirométrica na prática clínica, de forma que seus valores possam ser comparáveis entre diferentes períodos e pacientes.1313 Wallace JL, George CM, Tolley EA, et al. Peak expiratory flow in bed? A comparison of 3 positions. Respir Care. 2013;58:494-7. Sendo assim, o objetivo do presente estudo foi verificar a capacidade vital funcional nas posições de decúbito dorsal (cabeceira a 0° e 45°), sentado no leito com membros inferiores pendentes e em ortostase em pacientes no período pós-operatório de cirurgia abdominal superior.

Método

Este foi um estudo transversal feito nas enfermarias do Hospital Santo Antônio - Obras Sociais Irmã Dulce, Salvador (BA), referência em cirurgias abdominais na cidade.

Foram incluídos pacientes com idade superior a 18 anos, no segundo dia de pós-operatório de cirurgia abdominal superior, com relato de independência funcional prévia e liberação médica para ortostase. Os critérios de exclusão foram quadro álgico não reversível com analgésicos, comprometimento neurológico e/ou cognitivo que impossibilitasse a mensuração da CVF e queda da pressão arterial maior do que 20% do basal durante a mudança das posições.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do hospital, parecer n° 40/06. Todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).

A coleta de dados foi feita de agosto de 2008 a janeiro de 2009. A mensuração da capacidade vital forçada (CVF) seguiu as normas das diretrizes para testes de função pulmonar de 2002.6Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisologia. Diretrizes para testes de função pulmonar. J Pneumol. 2002;28 Suppl. 3:S1-238. O instrumento usado para essa medida foi o ventilômetro analógico (Ferraris - Mark 8 Wright Respirometer, Louisville, CO, EUA), acoplado a uma máscara facial siliconada. A sequência das posições foi randomizada por meio de blocos de envelopes. Posteriormente, os indivíduos foram colocados nas posições propostas e foi solicitado que fizessem uma inspiração máxima até a capacidade pulmonar total (CPT), seguida de uma expiração máxima até o volume residual (VR). O valor da capacidade vital adotado em cada posição foi a medida de maior valor, dentre três aferições, com diferença menor do que 10% entre elas. As quatro posições adotadas no presente estudo foram decúbito dorsal a 0°, decúbito dorsal a 45°, sentado com membros inferiores pendentes e ortostase. Todas as medidas foram tomadas pelo mesmo avaliador. Os dados clínicos foram obtidos por meio de consulta no prontuário de cada paciente.

Médias e desvios padrão foram usados para representar os valores da CVF obtidos nas posições corporais analisadas. Para comparação das médias da CVF entre cada posição corporal foi usada a Análise de Variância (Anova) com post hoc de Bonferroni. Todas as análises foram feitas com o programa SPSS versão 14.0

Resultados

A população foi composta por 30 indivíduos com idade média de 45,2 ± 11,2 anos, IMC 20,2 ± 1,0 kg/m2 e com predomínio do sexo feminino (76,7%). As características demográficas, assim como as cirurgias feitas, encontram-se na tabela 1. Os valores obtidos para CVF nas diferentes posições estão apresentados na tabela 2. O maior valor obtido ocorreu na postura ortostática (CVF 2,18 ± 0,52; 95%IC 1,99-2,37).

Tabela 1 -
Dados demográficos dos pacientes inclusos no estudo
Tabela 2 -
Avaliação da capacidade vital forçada (CVF) em litros (L) nas diferentes posições corporais, com intervalo de confiança (95% IC)

Ao compararmos com as outras três posições foi observado que a ortostase apresentou valores significativamente maiores em relação à sedestração (média das diferenças: 0,15 ± 0,03; p = 0,001), ao decúbito dorsal a 45° (média das diferenças: 0,32 ± 0,04; p = 0,001) e 0° (0,50 ± 0,05; p = 0,001). Também se identificaram diferenças significativas entre a postura sentada com membros inferiores pendentes e o decúbito dorsal a 45o (média das diferenças: 0,17 ± 0,04; p = 0,001) e a 0° (média das diferenças: 0,34 ± 0,04; p = 0,001), bem como entre o decúbito dorsal a 45° e 0° (média das diferenças: 0,17 ± 0,04; p = 0,001) (fig. 1). Houve uma tendência positiva entre os valores de CVF do decúbito dorsal para a postura ortostática (tabela 3).

Figura 1 -
Média da CV (L) nas diferentes posições. 1 - Decúbito dorsal a 0 grau; 2 - Decúbito dorsal a 45°; 3 - Sedestração com membros inferiores pendentes e 4 - Ortostase.

Tabela 3 -
Comparação da capacidade vital forçada (CVF) em litros com as médias das diferenças entre as diferentes posições corporais (n = 30)

Discussão

O presente estudo identificou que a CVF aumenta progressivamente entre as posições de decúbito dorsal a 0° e ortostase em pacientes no pós-operatório de cirurgia abdominal superior. Este foi o primeiro estudo a avaliar a mecânica respiratória por meio da CV nesse perfil de pacientes cirúrgicos, o que é algo relevante, já que as cirurgias de andar superior predispõem a complicações e o posicionamento pode minimizar algumas alterações ventilatórias.

Uma maior redução da CVF na posição de decúbito dorsal a 0° em comparação com as demais posições foi observada no atual estudo, achado esse que se encontra de acordo com o evidenciado por demais estudos.1414 Meysman M, Vincken W. Effect of body posture on spiro- metric values and upper airway obstruction indices derived from the flow-volume loop in young nonobese subjects. Chest. 1998;114:1042-7. and 1515 Behrakis PK, Baydur A, Jaeger MJ, et al. Lung mechan- ics in sitting and horizontal body positions. Chest. 1998;83: 643-6. Essa redução pode ser atribuída à diminuição da complacência pulmonar dinâmica e ao aumento da resistência ao fluxo pulmonar, decorrente da redução da CRF nessa postura.1515 Behrakis PK, Baydur A, Jaeger MJ, et al. Lung mechan- ics in sitting and horizontal body positions. Chest. 1998;83: 643-6. and 1616 Valenza F, Vagginelli F, Tiby A, et al. Effects of the beach chair position, positive end-expiratory pressure, and pneumoperitoneum on respiratory function in morbidly obese patients during anesthesia and paralysis. Anesthesiology. 2010;107:725-32. Na posição supina há alterações anatômicas da faringe, nas quais o diâmetro é reduzido, o que aumenta, assim, a resistência das vias aéreas superiores. O deslocamento cefálico do diafragma decorrente do aumento da pressão abdominal, bem como o aumento do volume sanguíneo intratorácico, também são fatores que resultam em redução do volume pulmonar de repouso e justificam um aumento da resistência pulmonar nessa postura.1515 Behrakis PK, Baydur A, Jaeger MJ, et al. Lung mechan- ics in sitting and horizontal body positions. Chest. 1998;83: 643-6.

Comparada à posição supina, a sedestração apresentou uma elevação de 20,2% na CVF no presente estudo. Esse achado corrobora outros estudos, os quais demonstraram aumento da CVF nessa posição com variação de 4,6% a 20% em pacientes submetidos ao procedimento abdominal.1414 Meysman M, Vincken W. Effect of body posture on spiro- metric values and upper airway obstruction indices derived from the flow-volume loop in young nonobese subjects. Chest. 1998;114:1042-7. , 1515 Behrakis PK, Baydur A, Jaeger MJ, et al. Lung mechan- ics in sitting and horizontal body positions. Chest. 1998;83: 643-6. , 1616 Valenza F, Vagginelli F, Tiby A, et al. Effects of the beach chair position, positive end-expiratory pressure, and pneumoperitoneum on respiratory function in morbidly obese patients during anesthesia and paralysis. Anesthesiology. 2010;107:725-32. and 1717 Domingos-Benício NC, Gastaldi AC, Perecin JC, et al. Medi- das espirométricas em pessoas eutróficas e obesas nas posições ortostática, sentada. Rev Assoc Med Bras. 2004;50:142-7. Esse achado pode estar relacionado ao favorecimento de inspirações mais profundas nessa postura e supera a tendência ao fechamento das vias aéreas relacionadas às alterações da complacência pulmonar e à menor pressão dos órgãos abdominais em relação ao diafragma.1818 Tsubaki A, Deguchi S, Yoneda Y. Influence of posture on respi- ratory function and respiratory muscle strength in normal subjects. J Phys Ther Sci. 2009;21:71-4.

Os maiores aumentos da CVF foram observados na posição ortostática. Achado semelhante foi observado por outros autores, os quais sugerem que a posição ortostática oferece uma maior vantagem mecânica à musculatura respiratória, uma vez que o conteúdo abdominal não interfere no deslocamento diafragmático e gera, assim, maiores pressões transpulmonares.1919 Townsend MC. Spirometric forced expiratory volume measured in the standing versus the sitting posture. Am Rev Respir Dis. 1984;130:123-4. and 2020 Gudmundsson G, Cerveny M, Shasby DM. Spirometric values in obese individuals. Effects of body position. Am J Respir Crit Care Med. 1997;155:998-9. Em contrapartida, Costa et al. e Domingos-Benício et al. não observaram diferença estatisticamente significativa na CVF entre as posturas de sentado e ortostase, porém esses estudos foram desenvolvidos em uma população não cirúrgica, saudável e jovem. 1717 Domingos-Benício NC, Gastaldi AC, Perecin JC, et al. Medi- das espirométricas em pessoas eutróficas e obesas nas posições ortostática, sentada. Rev Assoc Med Bras. 2004;50:142-7. and 2121 Costa GM, Lima JGM, Lopes AJ. Espirometria: a influência da postura e do clipe nasal durante a realização da manobra. Pul- mão. 2006;15:143-7. De acordo com Pereira et al., em adultos e idosos a CVF é maior em ortostase (1% a 2%) e menor (7% a 8%) na posição supina em relação à postura sentada, o que não ocorre em pessoas mais jovens. 6Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisologia. Diretrizes para testes de função pulmonar. J Pneumol. 2002;28 Suppl. 3:S1-238.

A principal justificativa que explica o aumento da CVF nas posturas com o tórax mais verticalizado é a possível redução da pressão transtorácica, já que mesmo na posição a 45° existe um menor efeito compressivo da parede abdominal, o qual é maior na postura horizontalizada a 0°. Valenza et al. demonstraram o impacto do aumento da pressão pleural sob o diafragma, já que a força exercida na posição de Trendeleburg foi maior quando comparada com a posição sentada, 1616 Valenza F, Vagginelli F, Tiby A, et al. Effects of the beach chair position, positive end-expiratory pressure, and pneumoperitoneum on respiratory function in morbidly obese patients during anesthesia and paralysis. Anesthesiology. 2010;107:725-32. o que também foi demonstrado no estudo feito por Behrakis et al. em relação à complacência. 1515 Behrakis PK, Baydur A, Jaeger MJ, et al. Lung mechan- ics in sitting and horizontal body positions. Chest. 1998;83: 643-6.

Outra explicação para redução da CVF na posição em supino a 0° pode ser decorrente da redução da área alveolar, e não somente pelo aumento da frequência de atelectasias, como relatado por Pankow et al.2222 Pankow W, Podszus T, Gutheil T, et al. Expiratory flow limitation and intrinsic positive end-expiratory pressure in obesity. J Appl Physiol. 1998;85:1236-43. Entretanto, no presente estudo esse achado não foi evidenciado, já que a redução da CVF pode ser devida à inibição reflexa do nervo frênico, e não necessariamente ao aumento da elastância do sistema respiratório pelo trauma cirúrgico abdominal.

A cirurgia abdominal superior induz a uma disfunção diafragmática com duração de aproximadamente uma semana e pode ser uma das principais causas do padrão restritivo pulmonar no pós-operatório.2Simonneau G, Vivien A, Sartene R, et al. Diaphragm dysfunction induced by upper abdominal surgery. Role of postoperative pain. Am Rev Respir Dis. 1983;128:899-903. A redução da função diafragmática pode ser responsável por atelectasias, redução da capacidade vital e hipoxemia.3Ford GT, Whitelaw WA, Rosenal TW, et al. Diaphragm function after upper abdominal surgery in humans. Am Rev Respir Dis. 1983;127:431-6. Embora a anestesia e a dor possam ser responsáveis pela disfunção dos músculos respiratórios, estudos apoiam a hipótese de que um reflexo inibitório decorrente da manipulação da cavidade abdominal é o mecanismo principal.1Erice F, Fox GS, Salib YM, et al. Diaphragmatic function before and after laparoscopic cholecystectomy. Anesthesiology. 1993;79:966-75. , 2Simonneau G, Vivien A, Sartene R, et al. Diaphragm dysfunction induced by upper abdominal surgery. Role of postoperative pain. Am Rev Respir Dis. 1983;128:899-903. , 3Ford GT, Whitelaw WA, Rosenal TW, et al. Diaphragm function after upper abdominal surgery in humans. Am Rev Respir Dis. 1983;127:431-6. , 2323 Vassilakopoulos T, Mastora Z, Katsaounou P, et al. Contribution of pain to inspiratory muscle dysfunction after upper abdominal surgery. A randomized controlled trial. Am J Respir Crit Care Med. 2000;161:1372-5. , 2424 Sprung J, Cheng EY, Nimphius N, et al. Diaphragm dysfunction and respiratory insufficiency after upper abdominal surgery. Plucne Bolesti. 1991;43:5-12. and 2525 Dureuil B, Viires N, Cantineau JP, et al. Diaphragmatic con- tractility after upper abdominal surgery. J Appl Physiol. 1986;61:1775-80. Logo, os baixos valores da CVF evidenciados nos pacientes do presente estudo nas diferentes posições podem ser decorrentes de disfunção diafragmática mediada por mecanismo reflexo aferente de inibição do nervo frênico.

Dessa forma, o conhecimento a respeito das posições que favorecem a função pulmonar pode ser usado como uma medida terapêutica, com o objetivo de melhorar o volume pulmonar, a oxigenação e a mecânica respiratória e minimizar os principais distúrbios produzidos por procedimentos cirúrgicos com redução da incidência de atelectasias e prevenção de complicações pulmonares.1616 Valenza F, Vagginelli F, Tiby A, et al. Effects of the beach chair position, positive end-expiratory pressure, and pneumoperitoneum on respiratory function in morbidly obese patients during anesthesia and paralysis. Anesthesiology. 2010;107:725-32. , 2626 Dean E. Effect of body position on pulmonary function. Phys Ther. 1985;65:613-8. , 2727 Tucker B, Jenkins S. The effect of breathing exercises with body positioning on regional lung ventilation. Aust J Phys. 1996;42:219-27. , 2828 Lunardi AC, Resende JM, Cerri OM, et al. Efeito da continuidade da fisioterapia respiratória até a alta hospitalar na incidência de complicações pulmonares após esofagectomia por câncer. Fisioter Pesqui. 2008;15:72-7. and 2929 França EET, Ferrari F, Fernandes P, et al. Fisioterapia em pacientes críticos adultos: recomendações do Departamento de Fisioterapia da Associação de Medicina Intensiva Brasileira. Rev Bras Ter Intensiv. 2012;24:6-22.

Este estudo apresenta algumas limitações, tais como a ausência de mensuração da pressão intra-abdominal (PIA), uma vez que sua elevação pode estar presente no pós-operatório de cirurgias abdominais e gerar variações nos dados espirométricos. No entanto, a mensuração da PIA trata-se de um procedimento invasivo com necessidade de profissional especializado, o que dificultaria a feitura do estudo. Outra possível limitação refere-se ao uso da máscara facial como instrumento de medida, em vez do bocal. De acordo com Fiore et al., 3030 Fiore JF Jr, Paisani DM, Franceschini J, et al. Pressões res- piratórias máximas e capacidade vital: comparação entre avaliação através de bocal e de máscara facial. J Bras Pneumol. 2004;30:515-20. as avaliações da CV podem ser feitas com uso de máscara facial sem que haja interferência nos resultados obtidos e tornam-se acessíveis a pacientes que apresentam dificuldades para sua feitura, uma vez que a preensão labial torna-se desnecessária.

Conclusão

A posição corporal afeta os valores da CV em pacientes no pós-operatório de cirurgia abdominal superior, com aumento nas posturas com o tórax mais verticalizado. A função respiratória mais favorecida é na posição de ortostase, seguida pela postura sentada, quando comparada com as posições de decúbito dorsal a 0 e 45°.

References

  • 1
    Erice F, Fox GS, Salib YM, et al. Diaphragmatic function before and after laparoscopic cholecystectomy. Anesthesiology. 1993;79:966-75.
  • 2
    Simonneau G, Vivien A, Sartene R, et al. Diaphragm dysfunction induced by upper abdominal surgery. Role of postoperative pain. Am Rev Respir Dis. 1983;128:899-903.
  • 3
    Ford GT, Whitelaw WA, Rosenal TW, et al. Diaphragm function after upper abdominal surgery in humans. Am Rev Respir Dis. 1983;127:431-6.
  • 4
    Arozullah AM, Conde MV, Lawrence VA. Preoperative evalua- tion for postoperative pulmonary complications. Med Clin N Am. 2003;87:153-73.
  • 5
    Overend TJ, Anderson CM, Lucy SD, et al. The effect of incentive spirometry on postoperative pulmonary complications. Chest. 2001;120:971-8.
  • 6
    Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisologia. Diretrizes para testes de função pulmonar. J Pneumol. 2002;28 Suppl. 3:S1-238.
  • 7
    Gibson J, Whitelaw W, Siafakas N. Tests of overall respiratory function. Am J Respir Crit Care Med. 2002;166:521-6.
  • 8
    Chevrolet JC, Deleamond P. Repeated vital capacity measure- ments as predictive parameters for mechanical ventilation need and weaning success in Guillain-Barré syndrome. Am Rev Respir Dis. 1991;144:814-8.
  • 9
    Frazee RC, Roberts JW, Okeson GC, et al. Open versus laparoscopic cholecystectomy. A comparison of postoperative pulmonary function. Ann Surg. 1991;213:651-3.
  • 10
    Hasuki´c S, Mesi´c D. Postoperative pulmonary changes after laparoscopic cholecystectomy. Med Arh. 2001;55:91-3.
  • 11
    Ravimohan SM, Kaman L, Jindal R, et al. Postoperative pulmonary function in laparoscopic versus open cholecystec- tomy: prospective, comparative study. Indian J Gastroenterol. 2005;24:6-8.
  • 12
    Gea J. La especie humana: un largo camino para el sistema respiratorio. Arch Bronconeumol. 2008;44:263-70.
  • 13
    Wallace JL, George CM, Tolley EA, et al. Peak expiratory flow in bed? A comparison of 3 positions. Respir Care. 2013;58:494-7.
  • 14
    Meysman M, Vincken W. Effect of body posture on spiro- metric values and upper airway obstruction indices derived from the flow-volume loop in young nonobese subjects. Chest. 1998;114:1042-7.
  • 15
    Behrakis PK, Baydur A, Jaeger MJ, et al. Lung mechan- ics in sitting and horizontal body positions. Chest. 1998;83: 643-6.
  • 16
    Valenza F, Vagginelli F, Tiby A, et al. Effects of the beach chair position, positive end-expiratory pressure, and pneumoperitoneum on respiratory function in morbidly obese patients during anesthesia and paralysis. Anesthesiology. 2010;107:725-32.
  • 17
    Domingos-Benício NC, Gastaldi AC, Perecin JC, et al. Medi- das espirométricas em pessoas eutróficas e obesas nas posições ortostática, sentada. Rev Assoc Med Bras. 2004;50:142-7.
  • 18
    Tsubaki A, Deguchi S, Yoneda Y. Influence of posture on respi- ratory function and respiratory muscle strength in normal subjects. J Phys Ther Sci. 2009;21:71-4.
  • 19
    Townsend MC. Spirometric forced expiratory volume measured in the standing versus the sitting posture. Am Rev Respir Dis. 1984;130:123-4.
  • 20
    Gudmundsson G, Cerveny M, Shasby DM. Spirometric values in obese individuals. Effects of body position. Am J Respir Crit Care Med. 1997;155:998-9.
  • 21
    Costa GM, Lima JGM, Lopes AJ. Espirometria: a influência da postura e do clipe nasal durante a realização da manobra. Pul- mão. 2006;15:143-7.
  • 22
    Pankow W, Podszus T, Gutheil T, et al. Expiratory flow limitation and intrinsic positive end-expiratory pressure in obesity. J Appl Physiol. 1998;85:1236-43.
  • 23
    Vassilakopoulos T, Mastora Z, Katsaounou P, et al. Contribution of pain to inspiratory muscle dysfunction after upper abdominal surgery. A randomized controlled trial. Am J Respir Crit Care Med. 2000;161:1372-5.
  • 24
    Sprung J, Cheng EY, Nimphius N, et al. Diaphragm dysfunction and respiratory insufficiency after upper abdominal surgery. Plucne Bolesti. 1991;43:5-12.
  • 25
    Dureuil B, Viires N, Cantineau JP, et al. Diaphragmatic con- tractility after upper abdominal surgery. J Appl Physiol. 1986;61:1775-80.
  • 26
    Dean E. Effect of body position on pulmonary function. Phys Ther. 1985;65:613-8.
  • 27
    Tucker B, Jenkins S. The effect of breathing exercises with body positioning on regional lung ventilation. Aust J Phys. 1996;42:219-27.
  • 28
    Lunardi AC, Resende JM, Cerri OM, et al. Efeito da continuidade da fisioterapia respiratória até a alta hospitalar na incidência de complicações pulmonares após esofagectomia por câncer. Fisioter Pesqui. 2008;15:72-7.
  • 29
    França EET, Ferrari F, Fernandes P, et al. Fisioterapia em pacientes críticos adultos: recomendações do Departamento de Fisioterapia da Associação de Medicina Intensiva Brasileira. Rev Bras Ter Intensiv. 2012;24:6-22.
  • 30
    Fiore JF Jr, Paisani DM, Franceschini J, et al. Pressões res- piratórias máximas e capacidade vital: comparação entre avaliação através de bocal e de máscara facial. J Bras Pneumol. 2004;30:515-20.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    26 Mar 2014
  • Aceito
    02 Jun 2014
Sociedade Brasileira de Anestesiologia R. Professor Alfredo Gomes, 36, 22251-080 Botafogo RJ Brasil, Tel: +55 21 2537-8100, Fax: +55 21 2537-8188 - Campinas - SP - Brazil
E-mail: bjan@sbahq.org