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Análise temporal da heterogeneidade florística e estrutural em uma floresta ribeirinha

Temporal analysis of floristic and structural heterogeneity of a riverine tropical forest

Resumos

Neste trabalho, foram estudadas a composição florística e a estrutura fitossociológica da vegetação em um fragmento de floresta ribeirinha, ao longo do rio Passa Cinco, Ipeúna, SP. Foram amostradas 157 parcelas contínuas de 5 x 10 m, em uma área de 0,785 ha. Foram feitas medidas de diâmetro e mapeados todos os indivíduos com DAP maior ou igual a 5 cm, em 1989 e 1998. Constatou-se a presença de um mosaico vegetacional e discutiram-se os possíveis fatores definidores deste mosaico. Foram, também, verificadas as alterações florísticas e fitossociológicas na área após nove anos. As análises multivariadas da vegetação mostraram a presença de três grupos vegetacionais com grande sobreposição aos três tipos de solo identificados na área. As análises quantitativas da estrutura da comunidade mostraram diferenças em cada um destes grupos, que se mantiveram ao longo do tempo, indicando associações florísticas próprias com grande correlação à cada tipo de solo. O grupo vegetacional sobre solo aluvial, na faixa imediatamente paralela ao curso d’água, apresentou diferenças florísticas mais pronunciadas, e maior diversidade de espécies, área basal e densidade de indivíduos. Em nove anos, poucas alterações na estrutura fitossociológica foram observadas para as espécies de maior valor de importância na área, com um aumento de 2,01% do número total de indivíduos e 2,80% na área basal total.


Floristic composition and phytosociological structure were studied in a fragment of riverine semideciduous forest, along Passa Cinco River, Ipeúna, São Paulo State, southeastern Brazil. A total of 157 continuous plots (5 x 10 m) totalising 0.785 ha were sampled. All trees > or = 5 cm DBH were measured and mapped in 1989 and 1998. The presence of a vegetacional mosaic was observed and possible factors determining this heterogeneity are discussed. Multivariate analysis of vegetation revealed the presence of three vegetacional groups, indicating a strong relationship with edaphic features in the area. Quantitative analysis of community structure showed differences among these groups, which have not changed over time, reinforcing the correlation with soil cover. Vegetational type above alluvial soil, at river banks, showed strong floristic differences, greater diversity, basal area and density. After nine years, few changes occurred in the phytosociological structure for the most important species in the area, with an increase of 2.01% in the total density and 2.80% in total basal area.

Tropical riverine forest; tree communities; dynamics; soil; topography


Análise temporal da heterogeneidade florística e estrutural em uma floresta ribeirinha

DANIELA FESSEL BERTANI1 1 . Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo, Av. Pádua Dias, 11, Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba, SP, Brasil. ,3 1 . Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo, Av. Pádua Dias, 11, Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba, SP, Brasil. , RICARDO RIBEIRO RODRIGUES1 1 . Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo, Av. Pádua Dias, 11, Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba, SP, Brasil. , JOÃO LUIZ FERREIRA BATISTA1 1 . Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo, Av. Pádua Dias, 11, Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba, SP, Brasil. e GEORGE JOHN SHEPHERD2 1 . Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo, Av. Pádua Dias, 11, Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba, SP, Brasil.

(recebido: 31 de janeiro de 2000; aceito: 26 de setembro de 2000)

ABSTRACT - (Temporal analysis of floristic and structural heterogeneity of a riverine tropical forest). Floristic composition and phytosociological structure were studied in a fragment of riverine semideciduous forest, along Passa Cinco River, Ipeúna, São Paulo State, southeastern Brazil. A total of 157 continuous plots (5 x 10 m) totalising 0.785 ha were sampled. All trees ³ 5 cm DBH were measured and mapped in 1989 and 1998. The presence of a vegetacional mosaic was observed and possible factors determining this heterogeneity are discussed. Multivariate analysis of vegetation revealed the presence of three vegetacional groups, indicating a strong relationship with edaphic features in the area. Quantitative analysis of community structure showed differences among these groups, which have not changed over time, reinforcing the correlation with soil cover. Vegetational type above alluvial soil, at river banks, showed strong floristic differences, greater diversity, basal area and density. After nine years, few changes occurred in the phytosociological structure for the most important species in the area, with an increase of 2.01% in the total density and 2.80% in total basal area.

RESUMO - (Análise temporal da heterogeneidade florística e estrutural em uma floresta ribeirinha). Neste trabalho, foram estudadas a composição florística e a estrutura fitossociológica da vegetação em um fragmento de floresta ribeirinha, ao longo do rio Passa Cinco, Ipeúna, SP. Foram amostradas 157 parcelas contínuas de 5 x 10 m, em uma área de 0,785 ha. Foram feitas medidas de diâmetro e mapeados todos os indivíduos com DAP maior ou igual a 5 cm, em 1989 e 1998. Constatou-se a presença de um mosaico vegetacional e discutiram-se os possíveis fatores definidores deste mosaico. Foram, também, verificadas as alterações florísticas e fitossociológicas na área após nove anos. As análises multivariadas da vegetação mostraram a presença de três grupos vegetacionais com grande sobreposição aos três tipos de solo identificados na área. As análises quantitativas da estrutura da comunidade mostraram diferenças em cada um destes grupos, que se mantiveram ao longo do tempo, indicando associações florísticas próprias com grande correlação à cada tipo de solo. O grupo vegetacional sobre solo aluvial, na faixa imediatamente paralela ao curso d’água, apresentou diferenças florísticas mais pronunciadas, e maior diversidade de espécies, área basal e densidade de indivíduos. Em nove anos, poucas alterações na estrutura fitossociológica foram observadas para as espécies de maior valor de importância na área, com um aumento de 2,01% do número total de indivíduos e 2,80% na área basal total.

Key words - Tropical riverine forest, tree communities, dynamics, soil, topography

Introdução

As florestas ribeirinhas são caracterizadas pela grande heterogeneidade ambiental, gerada por fatores físicos e bióticos. Como fatores físicos podem-se citar as variações topográficas, edáficas e a influência do regime de cheias do rio, resultando na deposição e retirada de sedimentos e a retirada da camada de serapilheira (Rodrigues 1992, Mazer 1996, Oliveira Filho et al. 1997). Os fatores bióticos seriam a influência das áreas vegetadas adjacentes e a função de corredor de vegetação destas áreas, o que leva a um trânsito maior de polinizadores e dispersores, além de maior possibilidade de trocas gênicas com áreas mais remotas.

Esta complexidade de fatores resulta em um mosaico vegetacional, com grande heterogeneidade florística e alta diversidade (Rodrigues & Leitão-Filho 2000). Alguns estudos vêm mostrando que o mosaico vegetacional de fragmentos florestais tem grande relação com as características físico-químicas do solo e com o gradiente topográfico (Lescure & Boulet 1985, Rodrigues 1992, Oliveira Filho et al. 1994, Mazer 1996, Sabatier et al. 1997). Porém, poucos estudos identificam as características vegetacionais nestes diferentes sítios ou unidades do mosaico e abordam as possíveis alterações temporais (Mazer 1996).

A proposta deste estudo foi identificar o mosaico vegetacional encontrado num trecho de floresta ribeirinha do rio Passa Cinco, discutindo as possíveis características do ambiente definidoras desta heterogeneidade espacial da vegetação, e verificar as alterações temporais (florísticas e fitossociológicas) da composição deste mosaico vegetacional.

Material e métodos

Área de estudo - Este estudo foi realizado em um fragmento de floresta estacional semidecidual aluvial (FIBGE 1993) do rio Passa Cinco, definida neste artigo como floresta estacional semidecidual ribeirinha, localizado no município de Ipeúna (22°26’08" S e 47°43’05" O), estado de São Paulo, que faz parte da APA de Corumbataí. Apresentando uma área de aproximadamente 60 ha, tem como atividade principal do entorno a cultura de cana de açúcar. Apesar da bacia do rio Passa Cinco se caracterizar como altamente perturbada, tendo como principal causa práticas agrícolas inadequadas, restaram alguns fragmentos florestais, entre os quais a área de estudo, que foi mantida em bom estado de conservação por estar confinada em um fundo de vale. Ainda assim, podem ser observados alguns sinais de degradação neste trecho de floresta ribeirinha, principalmente nas bordas, pela extração seletiva de madeira e pelo fogo originado da cultura de cana do entorno. Os limites deste fragmento florestal estão definidos por encostas íngremes, com declividade superior a 30°. Nesta região, o rio tem cerca de 12 m de largura média, o fundo é irregular, com grandes depósitos de material oriundo de assoreamento à montante. Alcança profundidade média de 1,5 m em época de chuva, quando o rio apresenta grande volume d’água e forte correnteza, com inundações mais duradouras apenas em alguns trechos. O clima da região de Ipeúna caracteriza-se como quente úmido, com inverno seco (maio a setembro) e verão chuvoso (outubro a fevereiro) (Rodrigues 1992).

Levantamento florístico e fitossociológico - Este estudo foi feito em uma área de floresta ribeirinha do rio Passa Cinco de 7850 m2. Foi demarcada uma parcela de formato irregular, de 200 m ao longo do rio e 40 m perpendicular à este, subdividida em 157 sub-parcelas de 5 x 10 m (figura 1a). O levantamento de solos realizado por Rodrigues (1992) indicou a existência de três tipos principais de solos neste trecho de floresta amostrado, de aproximadamente 0,8 ha: solo Aluvial (AL), solo Podzólico Vermelho Amarelo (PV) e solo Areia Quartzosa Intermediário para Cambissolo, de textura fina/franco arenosa (AQ/Cb), conforme figura 1b. A descrição destes solos e as características físico-químicas estão apresentadas em Rodrigues (1992).



Em 1989, foram amostrados e mapeados todos os indivíduos arbustivo-arbóreos com diâmetro à altura do peito (DAP) maior ou igual a 5 cm, em cada sub-parcela. Em 1998, foram repetidas as medições de diâmetro, e os indivíduos ingressantes, que atingiram DAP maior ou igual à 5 cm, foram mapeados e tomadas suas medidas de diâmetro.

Todos os indivíduos amostrados foram numerados com plaquetas de alumínio galvanizado e coletados para posterior identificação.

O material coletado foi identificado através de observações de campo, com auxílio de especialistas, e, quando possível, por comparações com material do Herbário ESA (ESALQ/USP).

Os parâmetros fitossociológicos calculados para a vegetação da área de estudo foram os normalmente utilizados em trabalhos desta natureza (Martins 1993).

Para verificar a existência de um mosaico vegetacional na floresta ribeirinha, em função das características fisiográficas do ambiente, foram feitas análises multivariadas tendo como unidade as parcelas amostrais. A análise de classificação foi feita usando o método de Ward (Gauch 1982), através do programa FITOPAC (Shepherd 1995), e a ordenação foi feita usando o método de média recíproca (RA) ou análise de correspondência (CA), através do programa Canoco (Hill 1973, 1974, Ter Braak 1985, 1988). Para estas análises, foram consideradas as espécies que apresentaram mais de cinco indivíduos, para os dados do levantamento de 1989, segundo recomendação de Gauch (1982).

Para serem feitas comparações florísticas entre os três grupos vegetacionais identificados na análise multivariada, foi usado o coeficiente de similaridade de Jaccard. Foram usados os índices de Shannon-Wiener (H’) e equidade (J’) como medida de diversidade de espécies (Krebs 1989).

Resultados

Na tabela 1 listam-se os parâmetros fitossociológicos calculados para as espécies encontradas na floresta ribeirinha do rio Passa Cinco, nos levantamentos feitos em 1989 e 1998, em ordem crescente de IVI para 1998. Em 1989, foram amostrados 1395 indivíduos vivos com DAP maior ou igual a 5 cm, distribuídos em 35 famílias, 73 gêneros e 105 espécies. A densidade total foi de 1788,93 indivíduos.ha-1.

A figura 2 apresenta um dendograma da classificação dos dados de vegetação obtidos em 1989 pelo método de Ward. Este método separou dois grandes grupos de parcelas, que apresentaram entre si valor alto de dissimilaridade (745,40). O grupo de direita (Grupo A) foi constituído por parcelas da faixa sobre interferência direta do curso d’água, às margens do rio. O grupo da esquerda (Grupo B) foi constituído por vários sub-grupos com diferentes graus de dissimilaridade.


Na figura 3, apresenta-se o resultado da análise de ordenação dos dados de vegetação de 1989 pela análise de correspondência (CA). O eixo 1 separou dois grupos principais de parcelas. No lado direito do diagrama, com maiores valores do eixo 1, estão alocadas as parcelas imediatamente paralelas ao curso d’água. No lado esquerdo do diagrama, com menores valores no eixo 1, foi agrupado o restante das parcelas. Estas parcelas não ribeirinhas foram reagrupadas no eixo 2, ficando na porção inferior principalmente as parcelas do canto sudeste do trecho de estudo, e algumas do canto sudoeste da área de amostragem. Ainda em relação ao eixo 2, na parte superior, com valores mais altos, foram agrupadas as parcelas da porção central e as restantes do canto sudoeste da área de estudo, que estão sobre solo AQ/Cb. Comparando estes dados com o mapa de solos da área (figura 1b), as parcelas imediatamente paralelas ao curso d’água estavam sobre solo Aluvial (AL), enquanto as parcelas do canto sudeste estavam sobre solo Podzólico Vermelho Amarelo (PV). As parcelas da porção central e canto sudoeste da área estavam sobre solo transicional entre areia Quartzosa (AQ) e Cambissolo (Cb).


Os agrupamentos obtidos pelo método de ordenação foram muito parecidos com aqueles obtidos pelo método de classificação, reforçando a presença de três grupos vegetacionais: vegetação do canto sudeste; vegetação da beira do rio (0-5 m) e vegetação da porção central e do canto sudoeste da área de estudo.

A tabela 2 contém uma lista das espécies que ocorreram em cada um desses grupos vegetacionais, nos levantamentos de 1989 e 1998. A similaridade entre as áreas foi baixa quando se comparou a vegetação sobre solo Aluvial com os outros dois ambientes (47% e 46%, respectivamente para a vegetação sobre AQ/Cb e PV). Entre os grupos vegetacionais sobre os solos AQ/Cb e PV, a similaridade foi mais alta (61%). Porém, estes valores são relativamente altos, e o que provavelmente irá diferenciar as três sub-áreas será a análise quantitativa dos dados estruturais da comunidade.

No levantamento feito em 1998, foram encontrados 1423 indivíduos vivos, distribuídos em 34 famílias, 74 gêneros e 107 espécies (tabela 1). A densidade total foi de 1812,82 indivíduos.ha-1.

Em relação aos dados obtidos em 1989, no levantamento de 1998 houve um aumento de 5% na densidade relativa de Actinostemon klotzschii (tabela 1), promovendo o aumento total de indivíduos na comunidade, sendo que as demais espécies não apresentaram grandes variações para este parâmetro. Em alguns casos, houve até uma diminuição da densidade relativa, como ocorreu em Callisthene minor (0,78%) e Matayba elaeagnoides (1,02%), entre outras.

Considerando-se as espécies com maiores valores de dominância relativa, nota-se um aumento neste parâmetro para Callisthene minor, Cariniana estrellensis, Diatenopteryx sorbifolia, Copaifera langsdorffii, Actinostemon klotzschii e Syagrus romanzoffiana (tabela 1). Neste período, A. klotzschii passou de 10a para 6a posição na ordenação da dominância, em função do aumento do número de indivíduos nesta população. Para Matayba elaeagnoides, Luehea divaricata e Acacia polyphylla, ocorreu uma redução dos valores de dominância, sendo que Acacia polyphylla passou de 6a para 10a na ordenação, em função da redução do número de indivíduos amostrados.

Neste intervalo de tempo, houve um aumento nos valores de importância para Actinostemon klotzchii, que passou de 2° lugar, em 1989, para 1o lugar, em 1998 (figura 4), em função do aumento de densidade e freqüência relativas. O pequeno acréscimo nos valores de importância para Callisthene minor, Cariniana estrellensis, Diatenopteryx sorbifolia e Metrodorea nigra ocorreu em função do crescimento de área basal destas espécies neste período. Matayba elaeagnoides e Eugenia blastantha apresentaram diminuição nos seus valores de importância, devido principalmente à redução do número de indivíduos destas populações.


Algumas espécies representadas por apenas um indivíduo, definidas por alguns autores como raras (Martins 1993), que foram amostradas no levantamento de 1989, desapareceram neste levantamento. Foi o caso de Erythrina crista-galli (Fabaceae), Patagonula americana (Boraginaceae), Ocotea sp. (Lauraceae) e Eugenia aff. pluriflora (Myrtaceae). No entanto, foram amostradas em 1998 algumas espécies que não foram registradas em 1989, como: Albizia polycephala (Mimosaceae), Myrciaria floribunda (Myrtaceae), Ixora venulosa (Rubiaceae) e Prockia crucis (Flacourtiaceae).

A figura 5 mostra uma diminuição do número de indivíduos na maioria das famílias botânicas entre 1989 e 1998. Porém, para Euphorbiaceae, Rutaceae e Meliaceae houve um aumento do número de indivíduos, reflexo da contribuição de algumas espécies como Actinostemon klotzschii e Sebastiania serrata, entre outras.


Ocorreu, também, uma oscilação do número de espécies por família, observando-se um aumento para Myrtaceae, Rubiaceae, Flacourtiaceae e Mimosaceae, e uma diminuição para as outras famílias como Fabaceae, Rutaceae, Euphorbiaceae, Meliaceae, Lauraceae e Sapindaceae (figura 6).


A tabela 3 mostra uma comparação dos dados fitossociológicos observados em 1989 e 1998, para a comunidade como um todo, e considerando os três grupos vegetacionais.

Em relação à comunidade, houve um aumento da densidade, área basal e riqueza (tabela 3). A diversidade diminuiu em função da diminuição da equidade.

Entre os três grupos vegetacionais, o grupo que ocorreu imediatamente paralelo ao curso d’água, sobre solo Aluvial, apresentou os maiores valores para todos os parâmetros incluídos na tabela 3. Em nove anos, houve uma diminuição da densidade e diversidade, em função da diminuição da riqueza. A área basal apresentou aumento considerável.

O grupo vegetacional localizado no canto sudoeste e porção central da área de estudo, sobre solo AQ/Cb, apresentou os menores valores de diversidade, quando comparado aos outros grupos vegetacionais. Ocorreu aumento considerável na densidade e área basal. A diversidade diminuiu em função da diminuição da equidade, relacionada com o aumento da dominância de A. klotzschii nesta área.

O grupo vegetacional do canto sudeste da área de estudo, sobre solo PV, apresentou os menores valores de densidade e área basal. No período estudado, houve diminuições nos valores da maioria dos parâmetros analisados.

Discussão

Poucas mudanças florísticas e estruturais ocorreram em nove anos na floresta ripária do rio Passa Cinco. Em estudo de quatro anos em uma mata de galeria no Distrito Federal, Felfili (1994) encontrou mudanças na densidade de algumas espécies mais abundantes da área, sugerindo que a estrutura fitossociológica é dinâmica, e que as espécies dominantes podem mudar com o tempo. Alguns estudos em florestas tropicais indicaram que, em áreas não atingidas por distúrbios severos, ocorreram poucas mudanças na densidade e composição de espécies, sugerindo uma aparente estabilidade (Swaine et al. 1987). Porém estes trabalhos foram desenvolvidos em curta escala de tempo, sendo ainda pouco consistentes estas conclusões.

Santos et al. (1996), em um fragmento de floresta mesófila semidecídua, encontraram mudanças na riqueza de espécies em 23%, após 11 anos, e redução na densidade das duas espécies mais abundantes na área, relacionando isto ao isolamento e ao pequeno tamanho do fragmento. A floresta ribeirinha do presente estudo está dentro de um fragmento de aproximadamente 60 ha, bem menor do que o fragmento estudado por Santos et al. (1996), e poucas alterações ocorreram na área. Isto pode indicar que a presença do rio é um grande fator da manutenção da vegetação, em relação à riqueza de espécies e densidade de indivíduos, reforçando a idéia da função de corredor de vegetação de áreas ribeirinhas. A presença do curso d’água contribui para maior seletividade e conseqüente presença de espécies típicas de formações ribeirinhas, como as espécies do gênero Inga (Gibbs & Leitão-Filho 1978), Tapirira guianensis (Torres et al. 1994, Salis et al. 1994, Toniato et al. 1998), Lafoensia pacari (Durigan 1994), Terminalia triflora (Torres et al. 1994, Toniato et al. 1998), entre outras. As inundações periódicas, apesar de restritivas em termos de diversidade, tem atuação diferenciada no espaço, provocando grande heterogeneidade ambiental. Este seria o fator principal da elevada diversidade encontrada na área. Os maiores valores de densidade e área basal poderiam estar relacionados com a maior luminosidade, como efeito da presença do rio, pois no período de estudo houve um grande aumento da área basal total. A diminuição, após nove anos, da densidade e diversidade pode estar ocorrendo em função da perturbação gerada pelas cheias do rio e da seletividade de algumas espécies. As inundações nesta faixa são rápidas, causando a retirada da camada de serapilheira e a eliminação de alguns indivíduos mais jovens de espécies menos agressivas, que não apresentaram crescimento rápido da parte radicular desde as cheias anteriores. As inundações mais duradouras estão restritas a apenas alguns trechos.

Outro fator que provavelmente contribui para a diversidade da área é a heterogeneidade ambiental, não apenas gerada pelo rio, mas pelos tipos de solo e topografia encontrados na área. Apesar da elevada similaridade florística entre os três grupos vegetacionais identificados pelas análises multivariadas, as análises quantitativas permitiram diferenciar claramente que são associações bem definidas e distintas. Assim, nesta condição ribeirinha existe um mosaico vegetacional relacionado com as características fisiográficas, principalmente com a presença do rio e dinâmica de suas cheias, topografia, solo, etc.

Os dados da tabela 2 permitem a identificação de uma matriz vegetacional dependente do tipo de solo e distanciamento do rio. As espécies exclusivas de cada grupo vegetacional, indicadas nesta tabela, sugerem uma base de dados para programas de recuperação da vegetação em áreas que margeiam cursos d’água e áreas adjacentes, que representam componentes importantes na conservação de recursos hídricos.

Agradecimentos - Aos técnicos José Anibal Zandoval, Adolfo Tulio Cruz e à Sandra Tamborim, pela ajuda nos trabalhos de campo; ao Professor Jorge Yoshiro Tamashiro (Departamento de Botânica-UNICAMP), pela ajuda na identificação do material botânico e ao Professor Lindolfpho Capellari pela ajuda nos desenhos. À CAPES, pela concessão da bolsa de mestrado à primeira autora e à FAPESP, pelo apoio financeiro ao desenvolvimento de parte deste trabalho.

2. Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Biologia, Caixa Postal 6109, 13083- 970 Campinas, SP, Brasil.

3. Autor para correspondência: dbertani@unicamp.br

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    . Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo, Av. Pádua Dias, 11, Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba, SP, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Maio 2001
    • Data do Fascículo
      Mar 2001

    Histórico

    • Recebido
      31 Jan 2000
    • Aceito
      26 Set 2000
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