RESUMO
Os objetivos deste estudo foram: relacionar o jogo deliberado com o conhecimento tático declarativo em praticantes de basquetebol; comparar o nível de conhecimento tático declarativo em praticantes de basquetebol com diferentes tempos de jogo deliberado durante a iniciação à modalidade. Participaram do estudo 271 praticantes da categoria sub-12. Utilizou-se o IMCTD-Bb, que consiste em 17 cenas editadas. Aplicou-se o teste de Spearman e Mann-Whitney. Estabeleceu-se os pontos de cortes em percentis. Verificou-se uma relação positiva entre as variáveis (r= 0,275; p< 0,001). Os atletas com maior tempo de jogo deliberado apresentaram maiores pontuações no IMCTD-Bb (p<0,001; tamanho do efeito= 0,356). A priorização do jogo deliberado na iniciação esportiva é crucial para melhorar a conhecimento tático e a leitura de jogo.
Palavras-chave:
Basquetebol; Conhecimento; Esporte; Tomada de decisão
ABSTRACT
The objectives of this study were: to relate deliberate play with declarative tactical knowledge in basketball players; to compare the level of declarative tactical knowledge in basketball players with different deliberate play times during their initiation to the sport. A total of 271 under-12 players participated in the study. The IMCTD-Bb, which consists of 17 edited scenes, was used. The Spearman and Mann-Whitney tests were applied. The cutoff points were established in percentiles. A positive relationship was found between the variables (r= 0,275; p< 0,001). Athletes with more deliberate play time had higher scores on the IMCTD-Bb (p<0,001; effect size = 0,356). Prioritizing deliberate play in sports initiation is crucial to improving tactical knowledge and game reading.
Keywords:
Basketball; Knowledge; Sport; Decision making
RESUMEN
Los objetivos de este estudio fueron: relacionar el juego deliberado con el conocimiento táctico declarativo en jugadores de baloncesto; comparar el nivel de conocimiento táctico declarativo en jugadores de baloncesto con diferentes tiempos de juego deliberado durante su iniciación en el deporte. Participaron del estudio 271 practicantes de la categoría sub-12. Se utilizó el IMCTD-Bb, que consta de 17 escenas editadas. Se aplicó la prueba de Spearman y Mann-Whitney. Los puntos de corte se establecieron en percentiles. Hubo una relación positiva entre las variables (r= 0,275; p< 0,001). Los atletas con más tiempo de juego deliberado tuvieron puntuaciones más altas en IMCTD-Bb (p<0,001; tamaño del efecto= 0,356). Priorizar el juego deliberado en la iniciación deportiva es crucial para mejorar el conocimiento táctico y la lectura del juego.
Palabras-clave:
Baloncesto; Conocimiento; Deporte; Toma de decisiones
INTRODUÇÃO
No basquetebol, os atletas são desafiados a tomar decisões em um contexto de grande variabilidade e imprevisibilidade, enfrentando uma constante pressão de tempo para executar suas escolhas de forma eficaz (Wissel, 2019). As ações no jogo são moldadas por diversas pressões e restrições, tanto externas, como a dinâmica dos colegas e oponentes, o espaço de jogo, as táticas defensivas e a trajetória da bola, quanto internas, como a motivação e o cansaço. Nesse contexto, tanto a percepção quanto a tomada de decisão desempenham papéis cruciais na aprendizagem das nuances táticas do jogo. Isso permite a assimilação do conhecimento tático (Greco et al., 2014; Voigt et al., 2023).
O conhecimento tático necessário para executar uma ação está ligado à habilidade de planejar e antecipar situações que podem influenciar uma decisão (Reis et al., 2022). Esse conhecimento é desenvolvido através da acumulação de experiências passadas, que guiam quando e como uma decisão deve ser tomada e qual movimento executar em resposta a uma situação específica (Gréhaigne e Godbout, 1995; Reis et al., 2022). Assim, o indivíduo é capaz de tomar decisões durante o jogo com base no conhecimento tático adquirido (Alarcón López et al., 2011; Qizi, 2023; Sánchez-López et al., 2024). Portanto, o conhecimento tático representa a base informacional para que o indivíduo tome uma decisão frente a demandas ambientais (Kump et al., 2015).
O conhecimento tático pode manifestar-se de duas formas: processual ou declarativa (Kump et al., 2015; Racsmány e Szőllős, 2022). O conhecimento tático processual (CTP) está ligado à memória implícita, na qual o jogador é capaz de executar seu plano de ação, mas não consegue explicar verbalmente os motivos por trás de sua decisão ou descrever os padrões motores utilizados (Anderson et al., 2004; Kump et al., 2015). Por outro lado, o conhecimento tático declarativo (CTD) está associado à capacidade do jogador de verbalizar sua tomada de decisão e de perceber os sinais relevantes envolvidos na ação, justificando assim sua resposta (Kump et al., 2015; Sánchez-López et al., 2024). Logo, a proceduralização é o processo da transferência do CTD, que, mediante a prática, se torna CTP. Ou seja, o aluno/atleta é capaz de perceber os sinais relevantes no ambiente e verbalizar (Kump et al., 2015; Sánchez-López et al., 2024).
Sabe-se que o conhecimento tático é desenvolvido perante a prática (Kump et al., 2015; Racsmány e Szőllős, 2022). Porém, no contexto da iniciação esportiva, além do praticante ser submetido a um sistema de treinamento, sob a responsabilidade de um professor, se faz necessário que as crianças brinquem a partir das modalidades esportivas preferidas, de forma lúdica e prazerosa (Côté et al., 2009; Racsmány e Szőllős, 2022). Nesse contexto, nos primeiros anos de prática esportiva se destaca o jogo deliberado. Tal termo se refere à natureza intencional e voluntária dos jogos esportivos informais, em contraposição a outras três formas de atividade: atividades livres na pré-infância e na infância; as práticas estruturadas típicas do ambiente esportivo formal e a prática deliberada (Côté et al., 2009, 2020). Portanto, considera-se como jogo deliberado quando as crianças encontram com seus amigos para brincar de basquetebol em uma praça pública, ou na escola durante o recreio, entre outros, momentos esses que acontecem fora do treinamento da modalidade (Côté et al., 2009, 2020).
Côté et al. (2020) abordaram a importância da prática informal, sem a presença de um professor, de jogos esportivos durante a infância, enfatizando a priorização da diversão. Além disso, evidencia-se que praticar o esporte de forma divertida, fora do ambiente de treinamento, desempenha um papel significativo no fortalecimento da sociabilidade infantil (Kay et al., 2024). Estudos mostram que o jogo deliberado é um aspecto básico para o desenvolvimento esportivo. Folle et al. (2020), ao investigarem atletas de basquetebol, e Collet et al. (2018), atletas de voleibol, revelaram que o jogo deliberado na iniciação ajudou no processo de desenvolvimento de habilidades motoras e cognitivas básicas dos atletas, facilitando o ingresso e a permanência desses indivíduos na prática esportiva.
Variáveis intervenientes ao treinamento esportivo podem afetar os níveis de CTD de praticantes de basquetebol. Por exemplo, o estudo de Rosso et al. (2020) mostrou que os atletas de basquetebol submetidos a um processo de treinamento analítico não apresentam melhorias no CTD. Em contrapartida, estudos mostram que atletas de basquetebol submetidos a processos de treinamento voltados às capacidades cognitivas, baseados em jogos, apresentaram um acréscimo significativo no CTD (Tallir et al., 2005; Alarcón López et al., 2011; Gray e Sproule, 2011). O tempo de prática e os estágios de desenvolvimento podem afetar o nível de CTD dos atletas. Reis et al. (2022) revelaram que atletas mais experientes na categoria de base do basquetebol apresentam um maior desempenho em um teste de CTD que os atletas menos experientes. Resultados semelhantes foram encontrados em um estudo com atletas de futebol de categoria de base de um clube profissional espanhol (Sánchez-López et al., 2024) e no voleibol (Castro et al., 2017).
Na iniciação esportiva, ainda não se sabe se o jogo deliberado afeta o nível e CTD de praticantes de basquetebol. Entende-se que o jogo deliberado desempenha um papel fundamental no desenvolvimento dos atletas (Nybakken e Falco, 2022). A tomada de decisão no contexto esportivo envolve selecionar a resposta mais adequada em diversas situações de jogo, visando alcançar objetivos específicos (Côté et al., 2020). Jogadores com habilidades mais avançadas nesse aspecto tendem a apresentar um melhor desempenho e alcançar níveis competitivos mais altos. Para desenvolver essa capacidade, é crucial proporcionar às crianças atividades que estimulem habilidades perceptivo-cognitivas. A sistematização do treino deve levar em consideração as necessidades individuais dos jogadores, visando otimizar seu desenvolvimento (Güllich et al., 2023). Somando-se a isso, o jogo deliberado, ou seja, a prática das modalidades esportivas de maneira informal, emerge, em tese, como uma ferramenta eficaz para aprimorar o conhecimento tático dos atletas, preparando-os para enfrentar os desafios do esporte (Collet et al., 2018; Côté et al., 2020).
Portanto, os objetivos deste estudo são: relacionar o jogo deliberado com o CTD em praticantes de basquetebol durante a iniciação à modalidade; comparar o nível de CTD em praticantes de basquetebol com diferentes tempos de jogo deliberado durante a iniciação à modalidade. Destaca-se como hipótese, considerando a relação do CTD e a prática esportiva, que atletas que possuem maior tempo de jogo deliberado apresentarão maior CTD em comparação aos seus pares com menos tempo de prática. Além disso, espera-se que existe uma correlação positiva entre jogo deliberado e CTD nos atletas estudados.
MÉTODO
Esta investigação foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (CAAE: 16946719.2.0000.5149). Todos os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e os pais ou responsáveis, um Termo de Assentimento Livre Esclarecido.
Participantes
Participaram do estudo 271 praticantes de basquetebol da categoria sub-12 de 28 equipes dos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Tais estados são os principais centros formadores de atletas para o basquetebol masculino brasileiro. Identificou-se nos sites das federações dos respectivos estados as equipes que participavam dos campeonatos federados. A seguir, selecionaram-se também as equipes localizadas no oeste paulista, sul mineiro e no interior fluminense que participavam de ligas independentes e de campeonatos organizados pelas respectivas federações do estado de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.
Estabeleceram-se os seguintes critérios de inclusão para conformação da amostra:
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Atletas de basquetebol do sexo masculino;
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treinar sistematicamente pelo menos 2 vezes por semana, com duração mínima, de cada sessão de treinamento, de 1 hora;
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os atletas deveriam pertencer a equipes que disputam campeonatos organizados pela Federação Mineira de Basketball (FMB), Federação Paulista de Basketball (FPB), pela Federação de Basquetebol do Estado do Rio de Janeiro (FBERJ) ou ligas independentes (Liga de Ribeirão Preto, Liga Serrana, Liga Super Basketball, Liga de Basquete de Bauru). Tais entidades organizam pelo menos um campeonato de basquetebol por ano.
Instrumento
Questionário de prática esportiva
Durante a fase de coleta de dados, os participantes do estudo foram solicitados a preencher o questionário demográfico para caracterizar a amostra. Foi aplicado um questionário no sentido de verificar o tempo despendido com o jogo deliberado em horas na fase de iniciação esportiva pelos participantes do estudo, no período que compreende os 6 aos 12 anos. Para isso, se perguntou quantas horas por semana eles gastavam, em horas, com o jogo deliberado. A elaboração desse questionário contou com a colaboração de três especialistas em psicologia do esporte e desenvolvimento de atletas.
Instrumento para mensurar o conhecimento tático declarativo no basquetebol
Aplicou-se para verificar o CTD o IMCTD-Bb (Instrumento para Mensurar o Conhecimento Tático Declarativo no Basquetebol), validado por Reis e Morales (2020) e Reis et al. (2021). Dezessete cenas editadas de dez jogos oficiais de basquetebol, organizados pela Federação Internacional de Basquetebol (FIBA), compõe o instrumento, na qual são dez cenas de passe, três cenas de arremesso e cinco de infiltração, que correspondem à treze cenas de ataque posicionado e quatro de contra-ataque. Para cada cena, é possível ter a pontuação de 0 a 4 pontos, totalizando 68 pontos considerando todos os itens do instrumento.
Delineamento
Por meio dos diretores das FMB, FPB e FBERJ, das ligas independentes, e dos próprios treinadores, entrou-se em contato com os dirigentes das instituições esportivas, para realização do convite da participação do estudo, e obtenção da anuência institucional e para o agendamento da coleta de dados.
Durante a coleta de dados, inicialmente, os participantes foram familiarizados com duas cenas. Após a conclusão dessa etapa de familiarização, deu-se início à aplicação efetiva do instrumento. Durante o teste, cada cena foi pausada no momento anterior à definição da ação, por um período de 3 segundos.
Após a tela ficar preta (oclusão), os participantes tiveram inicialmente um período de 5 segundos para responder por escrito em um caderno de respostas ao seguinte questionamento: qual decisão o atleta, com a posse de bola, deve tomar nesta situação? Em seguida, foi concedido mais 35 segundos para que o participante pudesse listar outras possíveis decisões que o atleta com a bola poderia tomar, permitindo que o participante gerasse mais opções sobre as possíveis tomadas de decisão.
Ao término desse período, foi solicitado que o aluno hierarquizasse as tomadas de decisão, atribuindo o número 1 à melhor tomada de decisão, o número 2 à segunda melhor, e assim por diante.
Análise de dados
Pretendeu-se comparar o nível de CTD dos atletas a partir da separação da amostra conforme a análise de percentil para a variável tempo de jogo deliberado. Analisaram-se primeiramente os pressupostos de normalidade dos dados por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov. Constatou-se que os dados não apresentaram distribuição normal (p< .001). Para verificar o nível de correlação entre as variáveis tempo de jogo deliberado e nível de CTD se aplicou o teste de Spearman, considera-se uma correlação fraca o r ≤ 0,3; moderada o r entre 0,30 e 0,69 e forte o r acima e igual a 0,70 (Dancey e Reidy, 2006).
A fim de um melhor entendimento a respeito das variáveis jogo deliberado em horas e CTD em atletas da categoria sub-12, adotou-se o procedimento de separar a amostra em percentis quanto ao tempo de jogo deliberado. Assim, foi possível comparar os basquetebolistas quanto ao nível de CTD, considerando o tempo de jogo deliberado. Logo, se estabeleceu os pontos de corte para o grupo com menor tempo de jogo deliberado em horas, considerando o percentil 25, e para o grupo com maior tempo de jogo deliberado em horas, o percentil 75. Considerou-se, no grupo como um todo, os atletas com valores extremos de jogo deliberado. Vale ressaltar que os atletas que se encontram no percentil 75 para a variável tempo de jogo deliberado apresentam maior tempo de jogo deliberado que 75% da amostra que participou do estudo. Outros estudos na área de ciências do esporte também comparam grupos a partir da separação conforme a análise de percentil, isto é, compararam os indivíduos que pertenciam ao percentil 25 com os indivíduos que pertenciam ao percentil 75 quanto ao nível de desempenho em uma variável específica (Gonzaga et al., 2014; Souza et al., 2018). A separação em percentil considera um nível de significância de 95%.
Portanto, para se comparar o nível de CTD em praticantes de basquetebol com diferentes tempos de jogo deliberado durante a iniciação à modalidade, se aplicou o teste de Mann-Whitney. Calculou-se o tamanho do efeito por meio da utilização do r de Pearson. Para isso, se utilizou a fórmula de Roshental (Field, 2009): , no qual z é o escore-z e o n é o tamanho dos valores do estudo, isto é, o total de observações realizadas na qual o escore-z foi baseado. Os valores se interpretaram da seguinte forma: r = 0,10 efeito pequeno, r >0,10 até 0,30 efeito médio e r ≥ 0,50 efeito grande.
RESULTADOS
A correlação entre o tempo de jogo deliberado em horas e a pontuação no IMCTD-BB foi de 0,275, para um p<0,001, sendo considerada fraca. A seguir encontra-se a comparação do nível de CTD entre os atletas de percentis 25 x 75 (igual ou abaixo do percentil 25, acima do percentil 75) para a categoria sub-12, conforme o cálculo dos quartis para a variável tempo de jogo deliberado em horas.
Reportaram-se diferenças entre os grupos de atletas que ocuparam o percentil 75 e 25 para as variáveis investigadas (Tabela 1). Os atletas com maior jogo deliberado apresentaram maiores pontuações no IMCTD-Bb. Considera-se que o tamanho do efeito foi pequeno.
Comparação do nível de conhecimento tático declarativo entre os percentis relacionados jogo deliberado em horas.
DISCUSSÃO
Os objetivos deste estudo foram: relacionar o jogo deliberado com o CTD em praticantes de basquetebol durante a iniciação à modalidade; comparar o nível de CTD em praticantes de basquetebol com diferentes tempos de jogo deliberado durante a iniciação à modalidade.
Verificou-se que existe uma relação positiva entre a quantidade de tempo de jogo deliberado na iniciação e o nível de conhecimento tático declarativo. Além disso, os alunos que apresentaram maior quantidade de jogo deliberado apresentam também maior escore no teste IMCTD-Bb em relação aos seus pares com menos tempo de jogo deliberado. O estudo corrobora com modelos teóricos sobre desenvolvimento esportivo preconizam, que praticar o esporte de forma informal, sem a presença de um professor, por meio do jogo deliberado na iniciação esportiva afeta positivamente aspectos intervenientes ao desenvolvimento esportivo, no caso o CTD (Côté et al., 2009, 2020; Côté e Vierimaa, 2014). Os atletas de alto nível relevam a importância da vivência de jogo deliberado, variabilidade de prática, nas etapas iniciais, no desenvolvimento da capacidade de tomada de decisão e permanecia na prática (Côté et al., 2009; Côté e Vierimaa, 2014; Santos et al., 2021).
Investigações revelaram a importância do jogo deliberado na formação de esportistas (Haugaasen et al., 2014; Folle et al., 2020; Machado et al., 2022; Güllich et al., 2023). O estudo de Folle et al. (2020) mostrou que, em atletas profissionais do basquetebol feminino brasileiro, o jogo deliberado na iniciação à modalidade serviu como uma base motora e motivacional para a atleta ingressar no esporte. Nesse estudo inferências sobre o jogo deliberado foram coletadas por meio da percepção das atletas. No futebol, uma investigação mostrou que atletas ingleses de futebol que chegaram no alto nível de rendimento, a Premiere League, passaram mais tempo destinado ao jogo deliberado entre os 6 aos 12 anos em comparação a atletas que alcançaram níveis de desempenho apenas recreacional (Ford et al., 2009). Já o estudo de Machado et al. (2022) mostrou que atletas de futsal que apresentavam um maior tempo de jogo deliberado nas etapas de desenvolvimento esportivo apresentavam uma melhor tomada de decisão em jogos da modalidade na idade adulta em relação aos pares com menos tempo de jogo deliberado. O tempo em horas destinado a tal variável nos trabalhos supracitados nesse parágrafo também foram estimados por meio de um questionário, procedimento semelhante realizado no atual estudo.
Côté e Hay (2002) destacam o papel fundamental das atividades diversificadas durante a fase dos seis aos doze anos, de maneira informal, nas ruas e parques, denominada de jogo deliberado, para o comprometimento a longo prazo dos atletas. Segundo Santos et al. (2021), especificamente no contexto dos jogos coletivos, enfatizam a importância da participação em uma variedade de experiências durante as fases iniciais do desenvolvimento, contribuindo para o aprimoramento da capacidade de tomada de decisão. O jogo deliberado surge como uma base motora e motivacional que suportará os treinos mais estruturados futuramente, minimizando a desistência no esporte e ampliando a participação a longo prazo (Côté et al., 2020). Assim, a prática do esporte por meio de jogo deliberado na iniciação esportiva afeta positivamente aspectos intervenientes ao desenvolvimento esportivo, como no caso em específico desse estudo, o CTD (Côté e Vierimaa, 2014).
O atual estudo foi pioneiro em relacionar o jogo deliberado e uma habilidade cognitiva na iniciação ao basquetebol. Ressalta-se a importância de praticantes de basquetebol serem expostos ao jogo deliberado, como forma de fortalecer e desenvolver aspectos motores e cognitivos que serão base para a prática da modalidade posteriormente, nos anos finais da categoria de base. Delimitou-se na investigação apenas relacionar o jogo deliberado e o CTD de alunos de três estados brasileiros (MG, RJ e SP). Os resultados devem ser relacionados com cautela para alunos de outras localidades, com realidades culturais e de prática esportiva diferentes. Indica-se realizar estudos longitudinais, verificando a progressão da prática esportiva e do jogo deliberado ao longo do tempo. E também relacionar o CTD com outras variáveis na iniciação esportiva, como coordenação motora e CTP. Pode-se considerar como limitação do estudo que o jogo deliberado em horas foi estimado a partir da percepção e da recordação dos atletas. Medidas mais precisas podem contribuir para melhorar a compreensão das variáveis estudadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados apontam que atletas com maior jogo deliberado apresentaram maiores níveis de CTD. Logo, podemos considerar que o jogo deliberado é uma variável que interfere diretamente no conhecimento tático na iniciação do basquetebol. Assim, a priorização do jogo deliberado na iniciação esportiva é crucial para o desenvolvimento holístico dos jovens praticantes de basquetebol, tanto em termos motores, sociais, quanto cognitivos. Nessa perspectiva, se faz necessário o incentivo à prática do jogo deliberado associado ao treinamento da modalidade. É necessário que a criança, além de treinar, brinque de basquetebol com seus pares. Por fim, as políticas públicas desempenham um papel crucial na promoção do jogo deliberado na iniciação esportiva, principalmente em promover espaços públicos para a prática de jovens entusiastas da modalidade basquetebol.
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FINANCIAMENTO
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
30 Jun 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
03 Out 2024 -
Aceito
26 Maio 2025
