Tendências e impacto: um estudo de caso sobre as interações entre influenciadores digitais do Instagram e estudantes universitários de Educação Física

Trends and impact: a case study on the interactions between Instagram digital influencers and Physical Education university students

Tendencias e impacto: un estudio de caso sobre las interacciones entre los influencers digitales de Instagram y los estudiantes universitarios de Educación Física

RESUMO

Neste trabalho visamos discutir os principais aspectos das interações entre influenciadores digitais do Instagram e um grupo de acadêmicos de Educação Física do Nordeste brasileiro. Essa pesquisa é um estudo de caso cujos dados foram obtidos por meio de entrevistas semiestruturadas a 20 estudantes de uma universidade do Nordeste brasileiro. Utilizamos a análise de conteúdo para codificação e categorização das falas e o software webQDA. Os principais tipos de interação encontrados perpassam diferentes níveis dos comportamentos nocivos, da influência profissional, da Educação para a saúde e do consumo. Enquanto área da saúde, a Educação Física tem um importante papel na consideração dessas novas formas de interagir com os meios digitais de informação e seus atores, considerando os variados contextos formativos e profissionais.

Palavras-chave:
Educação Física; Rede social; Influenciador digital; Interação

ABSTRACT

In this work, we aim to discuss the main aspects of the interactions between Instagram digital influencers and a group of Physical Education academics from the Brazilian Northeast. This research is a case study whose data were obtained through semi-structured interviews with 20 students. We used content analysis for coding and categorization of speeches and webQDA software. The main types of interaction found permeate different levels of harmful behaviors, professional influence, health education and consumption. As a health area, Physical Education has an important role in considering these new ways of interacting with digital information media and their actors, considering the various training and professional contexts.

Keywords:
Physical Education; Social network; Digital influencer; Interaction

RESUMEN

En este trabajo pretendemos discutir los principales aspectos de las interacciones entre los influenciadores digitales de Instagram y un grupo de académicos de Educación Física del Nordeste brasileño. Esta investigación es un estudio de caso cuyos datos se obtuvieron a través de entrevistas semiestructuradas a 20 estudiantes. Se utilizó el análisis de contenido para la codificación y categorización de los enunciados y el software webQDA. Los principales tipos de interacción encontrados permean diferentes niveles de conductas nocivas, influencia profesional, educación para la salud y consumo. Como área de la salud, la Educación Física tiene un papel importante en la consideración de estas nuevas formas de interacción con los medios digitales de información y sus actores, teniendo en cuenta los diversos contextos formativos y profesionales.

Palabras-clave:
Educación Física; Red social; Influenciador digital; Interacción

INTRODUÇÃO

As redes sociais (RS) são espaços digitais utilizados como ambientes de socialização e diferentes interações, contando com a presença de promotores de conteúdo diversos conhecidos como influenciadores digitais (ID), atores que se destacam nesses espaços, principalmente em redes sociais como o Instagram, cuja arquitetura voltada para a produção, edição e divulgação de imagens favorece a criação de determinados tipos de conteúdo, como os da saúde e bem-estar (Djafarova e Rushworth, 2017; Hines, 2019; Hruska e Maresova 2020; Boyd e Ellison, 2007; Recuero, 2012; Aleksandrova e Parusheva 2019; García et al., 2020; Webster et al., 2021; Aichner et al., 2021; Wielki, 2020; Sette e Brito, 2020).

Como foco nesses aspectos, neste trabalho visamos dar destaque a universitários do curso de Educação Física em um contexto de ensino do Nordeste brasileiro, e às principais formas de interação surgidas entre estes e influenciadores digitais de conteúdo de saúde e bem-estar na rede social Instagram.

Algumas investigações na área trazem dados sobre o uso de tecnologias, incluindo as redes sociais como Instagram, por universitários de várias áreas do conhecimento (Azofeifa-Mora e García-Martínez, 2023; Tarullo, 2021; Dzib Moo, 2022; Castillejos López, 2022; Montero Corrales, 2020; Santos et al., 2022), abordando suas variadas formas de uso. Entretanto, mais estudos voltados aos contextos brasileiros e dos universitários da Educação Física são necessários para compreender como universitários de áreas de conhecimento distintas interagem com as RS.

Por ser uma pesquisa realizada no interior do Nordeste brasileiro, essa investigação visa contribuir com lacunas de pesquisas sobre os diversos contextos de uso de redes sociais por públicos distintos (Stolarski, 2017; Pilgrim e Bohnet-Joschko, 2019), trazendo, igualmente, destaques para a área da Educação Física e as possibilidades para seus futuros profissionais com relação à inclusão de tecnologias de informação e comunicação no contexto formativo e profissional (Alves e Silva, 2020; Pereira e Cadima, 2020). Para tanto, o objetivo principal deste trabalho é discutir os principais aspectos das interações entre influenciadores digitais do Instagram e um grupo de acadêmicos de Educação Física do Nordeste brasileiro.

MÉTODO

Esta pesquisa caracteriza-se como um estudo de caso e visou entrevistar 20 estudantes de um curso de graduação em Educação Física, durante o primeiro semestre do ano 2020. Utilizamos a entrevista semiestruturada, elaborada com base em autores relacionados às áreas do trabalho e validadas por um painel de especialistas (Gil, 2002; Amado e Ferreira, 2017; Amado e Freire, 2017; Sampieri et al., 2013; Lakatos e Marconi, 1992; Severiano, 2000). Para fins de organização das falas, os alunos foram nomeados com a letra E (entrevistado) e seguindo a ordem de realização da entrevista (exemplo: E1, E2...).

Na apreciação das falas, aplicamos a análise do conteúdo, observando os aspectos apontados no referencial teórico de onde os códigos foram extraídos e aplicados ao contexto das falas dos alunos. Durante o processo de categorização, optamos pelo recorte temático das unidades de registro e, como regra de quantificação, a opção foi a frequência e presença/ausência dos códigos (Bardin, 1977).

Com o fim de ajudar nesse rigoroso processo de análise de conteúdo, utilizamos o software de análise de dados qualitativos webQDA, que permitiu a organização e classificação do material, síntese e elaboração de perguntas aos códigos para a construção de categorias e reflexão sobre o conteúdo. A Tabela 1 (ver Documento Suplementar) aponta a frequência de codificação e a Figura 1 (ver Documento Suplementar) apresenta a árvore da categoria descrita a partir dos dados do software webQDA:

Tabela 1
Frequência dos códigos.

Códigos de Árvore – Interação com Influenciadores
Nome	Fontes	Referências
Comportamentos Nocivos
Auto comparação	10	15
Pressão	7	16
Modelo de Corpo	11	24
Influência Profissional
Parâmetro Profissional	13	24
Ator Influenciador	20	60
Espaço de Atuação	13	30
Educação para a Saúde
Saúde Mental	5	15
Mudança de Comportamento	14	29
Comportamento Alimentar	12	21
Atividade Física	15	36
Conhecimentos sobre Saúde	13	29
Interação com o Consumo	12	21

• Representação numérica das frequências dos códigos com base no software WebQDA (2022).
• Fonte: própria da autora.

Figura 1
Representação da árvore de códigos. Representação da categoria e subcategorias a partir dos dados do software webQDA (2022). Fonte: própria da autora.

Este trabalho é parte de uma tese de doutorado, cuja pesquisa foi submetida aos respectivos comitês de ética de Portugal e do Brasil, sendo aplicada apenas após a sua aprovação, sob os pareceres: Doc89-CE-UTAD-2020 (Comissão de Ética da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro – CE-UTAD) e Parecer Consubstanciado do CEP, sob o número CAAE 42856720.0.0000.5294, pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Brasil.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os resultados indicam o surgimento de quatro tipos principais de interação entre influenciadores e entrevistados: Comportamentos Nocivos, voltando-se aos modelos de corpo, pressão e auto comparação; Influência Profissional a respeito do ator influenciador, do espaço de atuação e do parâmetro profissional; a Educação para a Saúde, voltada para os conhecimentos sobre atividade física, saúde mental, alimentação e a mudança de comportamentos; e, por fim, a Interação com o Consumo, que seguidamente analisaremos com detalhe.

Comportamentos nocivos

As principais características desses comportamentos estão relacionadas ao modelo de corpo, à pressão e à auto comparação. Destacamos algumas falas:

E13: [...] eu vou no Instagram e olho a foto de uma menina com a barriga ‘chapada’, aí eu fico ‘Meu Deus, o tanto que eu comi… eu nunca vou conseguir ter essa barriga. Eu nunca vou conseguir ficar assim’.

E2: [...] às vezes a gente se pega pensando e se comparando a outras pessoas. A pressão social às vezes ajuda.

E16: [...] acho que é normal a mulher, mais ainda, ter esse comparativo. ‘Ah isso aqui, ah, minha barriga, minhas pernas, ah, esse perfil aqui’. Eu quase sempre devo estar olhando [...] na minha cabeça, eu tenho de melhorar para mim. Se eu puder chegar a um padrão parecido, tudo bem.

Compreendemos por modelo de corpo a noção de um padrão de corpo socialmente imposto, representado por postagens de imagens de corpos magros. Acrescentamos os exercícios, consumo de determinados alimentos, esse corpo se associa à saúde, beleza, juventude e um determinado status social visado por muitos (Chung et al., 2021; Pilgrim e Bohnet-Joschko, 2019; Jacob, 2014; Tiggemann e Zaccardo, 2015).

Os corpos dos ID são expostos retratando rotinas alimentares e de exercícios, roupas e situações voltadas ao mundo fitness, enquadrando padrões curvilíneos e tonificados e escondendo a estrutura social e disponibilidade desses atores digitais para alcançar esses padrões de consumo e de corpo. Esses fatores contribuem para provocar frustrações e obsessão pelo autoaprimoramento por parte dos outros usuários com menos condições, além de contribuir para desconsiderar outros estilos de corpos (Jacob, 2014; Jiang e Ngien, 2020; Camacho-Miñano et al., 2019).

É possível observar nas falas dos entrevistados a tendência em assimilar e desejar um modelo de corpo dos ID com indicações para insatisfação corporal e baixa autoestima, por exemplo, podendo impactar na saúde e bem-estar dos alunos. Esse aspecto do comportamento nocivo está de acordo com o observado em outros estudos (Webster et al., 2021; Vall-Roqué et al., 2021; Dunlop et al., 2016; Tiggemann e Zaccardo, 2015; DiBisceglie e Arigo, 2021; Jiang & Ngien, 2020; Goodyear et al., 2018).

A pressão está relacionada com a busca por alcançar um estilo de corpo e de vida, caracterizando-se como um dos modos de influência sobre os jovens encontrado nas publicações relacionadas à saúde (Goodyear et al., 2018), juntamente ao apelo visual gerado pelos ID e fácil disseminação do conteúdo promovido pela rede social (Chung et al., 2021).

Por último, a auto comparação é observada como aspecto do comportamento nocivo e trata sobre o modo como os alunos se autocomparam ao mencionarem a rotina, a motivação, os projetos ou mesmo os corpos do ID que eles seguem, e está intrinsecamente relacionado aos outros dois, uma vez que há formas de auto comparação em todos os momentos. Esse aspecto está relacionado ao uso frequente do Instagram e à exposição de imagens de inspiração fitness, gerando insatisfação, baixa autoestima e mediando a ansiedade (Tiggemann e Zaccardo, 2015; DiBisceglie e Arigo, 2021; Torres et al., 2019; Silva et al., 2019; Jiménez-Castillo e Sánchez-Fernández, 2019; Djafarova e Rushworth, 2017; Casaló et al., 2020; Almeida et al., 2018; Pilgrim e Bohnet-Joschko, 2019).

Influência profissional

A influência profissional pressupõe que o contato dos universitários com os influenciadores e os conteúdos por eles divulgados abre espaço para novas formas de se relacionar com o mundo profissional. Esse fator está intimamente relacionado com o tipo de ID que os alunos seguem e com o modo como eles divulgam seus conteúdos. As principais características dessa interação são: a noção sobre o ator influenciador e a compreensão deste como parâmetro de profissional, além da compreensão do Instagram como uma nova possibilidade de atuação profissional. As falas a seguir ressaltam esses aspectos:

E7: [...] eu comecei a seguir profissionais da saúde que influenciam digitalmente desde que eu entrei na faculdade [...] a maioria deles são profissionais formados. Eu gosto muito de seguir psicólogos e profissionais de Educação Física, no geral.

E12: [...] hoje, principalmente aqui (no curso), nossos colegas, eu vejo que a maioria deles está fazendo (um perfil de) Instagram para divulgar seu trabalho. Hoje, nessa era digital, a maioria tem dois perfis: um para promover sua profissão, que está lá dando as dicas, mostrando seu resultado; e o seu perfil pessoal. Então sim, influencia bastante e agrega também.

E19: [...] eu acho que a questão de lidar com o público muito facilmente, entendeu? Eles lidam muito fácil com o público, é muito treinamento, muito costume [...] (têm) uma linguagem acadêmica bem elaborada, mas eles conseguem minimizar e passar informação de uma forma tão completa para uma pessoa leiga no assunto, que isso é uma característica que eu queria ter, entendeu?

De maneira geral, os alunos investigados tendem a separar a compreensão entre ID e profissionais, ao não considerar que podem ser a mesma pessoa e que buscam igualmente por engajamento, seguidores e divulgam produtos. A diferença está na classificação do ator influenciador, que pode ser desde profissionais especialistas em um assunto, até celebridades, artistas, ativistas etc. (Wielki, 2020). Apesar disso, esse aspecto pode justificar o motivo pelo qual os alunos os vejam como parâmetros de profissional a seguir.

Assim, os ID chamam a atenção dos alunos investigados pela facilidade do trato com o público, interagindo de modo dinâmico e simplificando a linguagem acadêmica; a capacidade em desenvolver conteúdo ou materiais de divulgação com a utilização de diferentes recursos e em um tempo curto; a paciência e o amor pelo que fazem; pelo esforço que empregam em seus estudos e que conseguem inserir na realidade; a persistência e determinação que se aplicam tanto às rotinas e à criação de projetos.

Também observamos que o Instagram é considerado como potencial ferramenta de atuação profissional, e seu uso já é realidade para alguns alunos. A profissionalização nas redes sociais pelo público docente (ou futuros docentes, no caso dessa pesquisa) também é ressaltada em outras pesquisas, observando a utilização desse meio como forma de compartilhar interesses em comum e empreender, além de se conectar com outros profissionais (Carpenter et al., 2020; Davis e Yi, 2022).

Entretanto, essas pesquisas associam a profissionalização nas redes fora da sala de aula à desvalorização da categoria e trabalho extra não remunerado, embora essas práticas tendam a contribuir com a troca de experiências docentes e para dirimir o sentimento de solidão (Carpenter et al., 2020). No caso dos resultados do presente trabalho, observamos essa profissionalização como um aspecto positivo e que pode agregar à área da Educação Física, contribuindo para expandir os horizontes profissionais da área.

Outro aspecto que devemos ter em conta é o nível de confiança e identificação estabelecido entre seguidores e ID, resultante da constante busca dos ID em cultivar um ambiente confiável e uma relação de proximidade com os usuários comuns (Cotter, 2019). Além disso, é importante destacar que o ID tem sua atuação validada pelos próprios usuários, tornando-o quem é (Mariano et al., 2017). No caso da nossa pesquisa, a noção distorcida de influência digital pode ser prejudicial aos alunos quando se trata de reconhecer as intenções por trás da influência, embora se apresente como uma possibilidade de contato com profissionais que, de outro modo, as barreiras geográficas e socioeconômicas imporiam dificuldades de acontecer.

A interação com esse aspecto profissional também deixa claro que a inserção de tecnologias na vida acadêmica e no futuro profissional dos alunos universitários já acontece por iniciativa deles, embora ocorra de forma lenta pelos meios oficiais de educação (Araújo e Padilha, 2023). O uso de recursos tecnológicos variados como parte da formação acadêmica na área das ciências do movimento vem sendo explorado em outros contextos e tem seu sucesso atestado, alertando para a necessidade de preparo dos futuros profissionais e dos professores formadores para a geração de competências digitais, bem como ao permitir a flexibilização do ensino e aprendizagem e ampliação do acesso às informações em fontes diversas (Azofeifa-Mora e García-Martínez, 2023).

Educação para a saúde

Os alunos também apontam para aspectos da Educação para a Saúde (EpS) surgidos das interações. Dentre os entendimentos sobre EpS, compreendemos que a ideia central está na capacitação e empoderamento dos indivíduos (Naidoo e Wills, 2009).

Dentre os aspectos relativos à EpS, observamos a interação com informações que sugerem conhecimentos de saúde no geral e saúde mental, influência positiva para a mudança de comportamentos, incluindo a atividade física e o comportamento alimentar. Destacamos as falas a seguir como exemplos:

E4: [...] eu percebo que eles influenciam, principalmente no meu caso, que eu gosto bastante de acompanhar os psicólogos. Nesse momento de pandemia, eles estão auxiliando bastante nesse processo [...] até porque nós estamos em isolamento;

E14: [...] buscar fazer escolhas mais saudáveis, sim, eu me inspiro um pouco neles para isso [...];

E6: [...] essa nutricionista (ID), a ideia dela era legal, porque ela passava coisas básicas que você poderia ter em casa e era uma coisa que tornava mais acessível.

E15: [...] a maioria dos que eu sigo praticam atividade física regularmente, o que para mim é bem-estar, né? Você está bem se exercitando [...]. Eles sabem que é bom se exercitar e postam sobre isso também.

E16: [...] alguns nutricionistas, médicos, que eu vejo algum tipo de postagem mais científica e informativa também. Eu acredito sim que tem como contribuir nesta questão (de educar para a saúde).

De maneira geral, os alunos aparentam se beneficiar do conteúdo de saúde e bem-estar divulgado pelos ID, aproveitando da melhor maneira as postagens de inspiração e as informações científicas, de modo que os influenciadores podem estar também contribuindo nesse aspecto. Além disso, ressaltamos o papel que a rede social desempenha ao permitir o acesso com baixo custo às informações de saúde, expandindo o alcance para pessoas com baixa renda, aspecto esse que também foi enfatizado pelos entrevistados.

Outros dados também comprovam o papel positivo que esse tipo de mídia pode desempenhar em relação ao aprendizado de conteúdos relacionados à saúde, levando em consideração o pertencimento dos jovens e os modos de aprender nesses espaços e desenvolvidos por eles (Goodyear e Quennerstedt, 2019).

Como foi possível perceber nos resultados desta pesquisa, as falas dos entrevistados ressaltaram aspectos que representam fatores relacionados aos conhecimentos em saúde e à mudança benéfica de comportamentos, denotando que os usuários da plataforma Instagram e seguidores de perfis de ID podem sim fazer um bom e proveitoso uso das informações produzidas e divulgadas, a despeito dos apontamentos sobre os fatores negativos existentes sobre a produção em massa dessas informações.

Um fator que justifica o bom aproveitamento dessas informações por parte dos participantes dessa pesquisa é o fato de fazerem parte de uma formação que engloba a área da saúde. Essa outra investigação atesta uma maior literacia em saúde por parte dos universitários de cursos ligados às áreas biológicas. Os conteúdos sobre nutrição, emagrecimento e hipertrofia são os mais buscados, para tanto o discernimento crítico possibilitado pela literacia digital em saúde é indispensável no tratamento dessas informações (Santos et al., 2022).

Compreendemos, entretanto, que a mudança de comportamento se associa a outros fatores entrelaçados com o fornecimento de informações, tais como a autopercepção para a mudança, literacia em saúde, ambiente propício etc. Ou seja, ainda há a necessidade de integralidade de vários outros setores para que a educação para a saúde aconteça eficientemente (Loureiro e Miranda, 2016).

Interação com o consumo

Esse último aspecto foi abordado com menos intensidade pelos alunos, mas ainda de modo marcante. O engajamento para o consumo é uma das finalidades da atuação do ID, e a literatura aponta amplamente os impactos nos comportamentos de compra dos outros usuários e a confiança criada entre esses dois atores (Sette e Brito, 2020; Djafarova e Rushworth, 2017; Lin et al., 2018; Hu et al., 2020; Jiménez-Castillo e Sánchez-Fernández, 2019; Wielki, 2020).

Os alunos da nossa pesquisa se veem desejando cursos e materiais para o desenvolvimento e autoformação. Esse fato faz sentido quando percebemos o tipo de ator influenciador que eles costumam seguir, no caso aqui, profissionais voltados para as áreas de interesse em suas formações. Também, apontam a vontade de consumir suplementos e roupas indicadas e/ou usadas pelos ID. As falas a seguir apontam esses aspectos:

E7:Geralmente eles (os ID) indicam livros, que são caríssimos, e que eu gostaria sim de consumir, mas infelizmente não tem como. Eu acho também que cursos que eles oferecem, só que são exageradamente caros.

E19: Com relação ao meu consumo, é mais cursos [...] geralmente é mais cursos ou algo do tipo.

E5: (Consome) Suplementação, por exemplo. Eu consumo de vários atletas que recomendam [...] alguns protocolos (de treino) eu tenho muita vontade de comprar [...].

Percebemos que ainda há uma carência de compreensão dos alunos sobre como atuam nas RS e sobre a noção de influência digital, pois é possível observar que mesmo os influenciadores profissionais apontados por eles tendem a divulgar e engajar para o consumo, mesmo que seja o consumo voltado ao conhecimento e formação, embora também estejam presentes outros tipos de produtos e serviços relacionados ao mundo fitness.

O uso de produtos e serviços voltados para a vida fitness, tais como roupas, suplementos, alimentos, treinamento, entre outros, está associado a uma ideia de saúde e bem-estar e às características de beleza e juventude (Pilgrim e Bohnet-Joschko, 2019; Silva et al., 2019; Tiggemann e Zaccardo, 2015; Stolarski et al., 2018; Alexandrino, 2019; Chung et al., 2021) e podem explicar, em partes, esse o tom de frustração dos entrevistados ao não possuírem condições financeiras de adquirir determinado bem ou produto.

A maior identificação com o ID pode interferir no comportamento de acessar propagandas e no comportamento de compra (Croes e Bartels, 2021). A identificação social com um influenciador digital é a motivação que melhor explicita o comportamento dos usuários em torno dos ID, no caso do nosso estudo. Os usuários são potencialmente conectados emocionalmente com os ID.

CONCLUSÕES

Observamos os principais aspectos da interação surgida entre estudantes da educação física e influenciadores digitais no Instagram, e pudemos verificar que as relações observadas suscitam interações em vários níveis. Dentre elas, os comportamentos nocivos sobre o corpo, pressão e auto comparação; o contato com novos parâmetros de profissionais e espaços de atuação que já são realidade para o grupo investigado; interação com conhecimentos e comportamentos que evidenciam e favorecem os cuidados e a educação para a saúde e, por fim, o engajamento para o consumo, tanto voltados a autoformação quanto ao consumo de produtos fitness.

Dentre alguns limites e possibilidades dos resultados, ressaltamos a necessidade de um novo olhar para a atuação profissinal e a ampliação das formas de comunicação sobre saúde e bem-estar podem ser identificadas como benefícios dessas interações, assim como os comportamentos negativos relativos ao consumo e os demais mencionados podem ser vistos como limitação. Nessa perspectiva, a educação, a literacia digital e o investimento na formação de competências digitais podem ser fatores mediadores para a melhoria dessas práticas de usos de recursos digitais.

A Educação Física, enquanto área da saúde, dos conhecimentos sobre o corpo e dos diferentes estilos de vida, tem um papel fundamental no reconhecimento das tendências de uso de redes sociais por parte de seus futuros profissionais e dos já atuantes, bem como a necessidade de implementar esses aspectos em suas possibilidades formativas, ampliando a capacidade de reflexão dos sujeitos para o trato dessas informações e também da sua produção.

Mais pesquisas são necessárias, e envolvendo um público maior e de outras áreas do conhecimento, com vista a buscar compreender cada vez mais sobre as relações surgidas entre os atores que permeiam os meios de comunicação digital das redes sociais e os diversos contextos em que se encontram.

Material Suplementar

Este artigo acompanha material suplementar.

Documento suplementar

Este material está disponível como parte da versão online do artigo na página: https://doi.org/10.1590/rbce.45.e20230046

• FINANCIAMENTO

  O apoio parcial para este trabalho foi fornecido pelo Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Ceará, campus de Limoeiro do Norte. Este trabalho foi parcialmente apoiado pelo Governo Português, através da Fundação para a Ciência e Tecnologia, IP (FCT), no âmbito do financiamento plurianual atribuído ao CIIE (subsídios n.º UIDB/00167/2020 e UIDP/00167/2020).

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  04 Dez 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  01 Ago 2023
• Aceito
  09 Nov 2023