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Balanço do desenvolvimento epistemológico da Educação Física brasileira

Epistemological development overview of Brazilian Physical Education

Balance del desarrollo epistemológico de la Educación Física en Brasil

RESUMO

Este artigo apresenta um balanço do desenvolvimento epistemológico da Educação Física brasileira. A análise histórica revela a constituição de um campo plural, caracterizado por propostas, abordagens, vertentes e metodologias diversas. No entanto, o debate epistemológico tem sido permeado por dualidades, o que dificulta a busca por uma abordagem integrada e relacional. Essa situação demanda formas de abordar a Educação Física de maneira integrativa, considerando a complexidade da área e buscando superar as premissas dualistas.

Palavras-chave:
Educação Física; Epistemologia; Dualidades; Pluralidade

ABSTRACT

This article presents an overview of the epistemological development of Brazilian Physical Education. Through a historical analysis, the article reveals the constitution of a diverse field characterized by various proposals, approaches, perspectives, and methodologies. However, the epistemological debate has been marked by dualities, which hinders the quest for an integrated and relational approach. This situation calls for innovative ways to address Physical Education in an integrative manner, considering the complexity of field and striving to overcome dualistic assumptions.

Keywords:
Physical Education; Epistemology; Dualities; Plurality

RESUMEN

Este artículo presenta un balance del desarrollo epistemológico de la Educación Física brasileña, destacando su consolidación como un espacio autónomo de producción del conocimiento. El análisis histórico revela un campo plural, caracterizado por propuestas, enfoques, corrientes y metodologías diversas. Sin embargo, el debate epistemológico ha estado impregnado de dualidades, lo que dificulta la búsqueda de un enfoque integrado y relacional. Esta situación demanda formas de abordar la Educación Física de manera integradora, considerando la complejidad de la área y buscando superar las premisas dualistas.

Palabras-clave:
Educación Física; Epistemología; Dualidades; Pluralidad

INTRODUÇÃO

O campo acadêmico-científico da Educação Física (EF) brasileira tem se consolidado como espaço autônomo de produção do conhecimento. Esse processo, iniciado nos idos dos anos de 1980 e 1990 do século XX, contou com reflexões sobre os pressupostos epistemológicos que balizariam o campo, como também com o surgimento de periódicos científicos específicos da EF, fato que estimulou diversas pesquisas e auxiliou na constituição de uma prática científica. Uma grande influência para o debate é o conhecido Movimento Renovador da EF. Esse movimento enxergou nas teorias das Ciências Sociais (principalmente a partir das chamadas teorias críticas) possibilidades de crítica epistemológica e política.

Foi a partir desse contexto que uma efervescente disputa teórico-política se alastrou no campo e, conforme Lima (2000), oLima HLA. Pensamento epistemológico da Educação Física brasileira: das controvérsias acerca do estatuto científico. Rev Bras Ciênc Esporte. 2000;21(2):95-102. que era crise se transformou em crises. Isso porque, num primeiro cenário, as discussões estavam centradas especialmente na tentativa de delinear uma nova identidade para a Educação Física, porém, no início da década de 1990, os debates se transladaram para a esfera epistemológica.

Essa conjuntura de embates político-ideológicos e epistêmicos transformou a Educação Física brasileira em um campo plural (Almeida et al., 2012Almeida FQ, Bracht V, Vaz AF. Classificações epistemológicas na Educação Física: redescrições… Movimento. 2012;18(4):241-63. http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.27727.
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). O campo foi imbuído de propostas, abordagens, vertentes, metodologias, posições político-ideológicas etc., se tornando uma área que pode ser figurada como um mosaico (Fensterseifer, 2006Fensterseifer PE. Atividade epistemológica e Educação Física. In: Nóbrega TP, organizador. Epistemologia, saberes e práticas da Educação Física. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB; 2006, p. 29-37.).

O objetivo deste artigo consiste em apresentar um balanço do desenvolvimento epistemológico da Educação Física brasileira. Para tal, recorreu-se a uma análise histórica, uma vez que “a história, de modo geral [...], é sempre mais rica em conteúdo, mais variada, mais multiforme, mais viva e sutil do que mesmo o melhor historiador e metodólogo podem imaginar” (Feyerabend, 2011, pFeyerabend PK. Contra o método. 2. ed. São Paulo: Editora UNESP; 2011.. 31). Como o foco não é especificamente realizar uma investigação historiográfica, cabe, portanto, inspirado em Melo (2007)Melo VA. Reflexão sobre a história da Educação Física no Brasil: uma abordagem historiográfica. Movimento. 2007;3(4):41-8. http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.2206.
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e Quitzau e Silva (2020)Quitzau EA, Silva MM. Educación Física y ciencia: una mirada historiográfica. Rev ALESDE. 2020;12(1):23-42., recorrer à literatura para efetuar apenas uma reflexão historiográfica1 1 Entende-se por historiografia a “[...] análise epistemológica e ideológica que vai permitir o retomar e o redimensionar dos caminhos dos estudos históricos, apontando possíveis problemas e possibilitando o ‘arriscar’ de sugestões” (Melo, 2007, p. 42). Uma pesquisa historiográfica demanda um rigor metodológico e analítico muito diligente para com os estudos históricos. Algo que seria inviável neste trabalho. O que se pretende é “apenas” provocar reflexões a partir dos estudos históricos para se pensar o processo de desenvolvimento epistemológico do campo da Educação Física brasileira. .

A EMERGÊNCIA DA EPISTEMOLOGIA NA EDUCAÇÃO FÍSICA BRASILEIRA: UM CAMINHO EM BUSCA DE IDENTIDADE E LEGITIMIDADE

Um dos elementos fulcrais para o estabelecimento do debate epistemológico foi a constituição do campo acadêmico da Educação Física brasileira a partir da década de 1960 (Bracht, 2014Bracht V. Traçados analíticos e esforços de autointerpretação: uma entrevista com Valter Bracht. In: Almeida FQ, Gomes IM, organizadores. Valter Bracht e a Educação Física: um pensamento em movimento. Vitória: EDUFES/Editora Unijuí; 2014.), uma vez que após esse marco a produção do conhecimento começa a ser desenvolvida, pensada e analisada, mormente, por intelectuais próprios da Educação Física. É nesse contexto que o debate da Educação Física começa a ser mais bem desenvolvido.

Se a Educação Física seria um campo acadêmico, fazia-se necessário fundamentá-la com mais rigor. Em um primeiro momento, os intelectuais da área, influenciados pelo movimento disciplinar dos Estados Unidos, perceberam que a Educação Física carecia de um estatuto científico (Manoel, 2020Manoel EJ. As ciências do esporte/cinesiologia: entre a arte, a ciência disciplinar e a ciência interdisciplinar ou como Alice (não) encontrou seu “caminho” no mundo das maravilhas. In: Galak E, Athayde P, Lara L, organizadores. Por uma epistemologia da educação dos corpos e da educação física. Natal: EDUFRN; 2020. Vol. 3; p. 127-45.). Portanto, houve uma mobilização coletiva para que a Educação Física brasileira lograsse o seu estatuto científico.

Manoel (2020)Manoel EJ. As ciências do esporte/cinesiologia: entre a arte, a ciência disciplinar e a ciência interdisciplinar ou como Alice (não) encontrou seu “caminho” no mundo das maravilhas. In: Galak E, Athayde P, Lara L, organizadores. Por uma epistemologia da educação dos corpos e da educação física. Natal: EDUFRN; 2020. Vol. 3; p. 127-45. assevera que esse contexto pode ser metaforicamente comparado com o momento em que Alice (analogia com a história do livro Alice no País das Maravilhas), ao perseguir o coelho branco, sem saber para onde ele iria, entra no país das maravilhas. No caso da Educação Física, ela começa a seguir a ciência e entra no maravilhoso universo científico, mas sem ter uma preocupação aonde chegaria. Assim como Alice, a Educação Física se perdeu no maravilhoso mundo estranho. E para se reencontrar, foi necessário percorrer novos caminhos, enfrentar diferentes desafios, mas sem nenhum destino definido, só se tinha a certeza de que, se continuasse caminhando, chegaria a outro lugar.

Tal analogia é pertinente no sentido de evidenciar que naquele contexto das décadas de 1960 a 1980 a Educação Física brasileira iniciava a busca pela constituição do seu teorizar científico, almejando se transformar em uma ciência nos cânones tradicionais. Nesse caso, é mister salientar que a ascensão do sistema esportivo no cenário mundial teve papel significativo para essa nova fase da Educação Física brasileira. Os esforços foram direcionados para atender as demandas do fenômeno esportivo e, para tanto, o objetivo dos intelectuais da Educação Física era, sobretudo, explorar as bases científicas para garantir a máxima performance esportiva. Sendo assim, surge a designada Ciências do Esporte, que ordenou o campo da Educação Física brasileira naquele período (Bracht, 2003Bracht V. Educação Física & ciência: cenas de um casamento (in)feliz. 2. ed. Ijuí: Editora Unijuí; 2003.).

Todavia, segundo Fensterseifer (1999), aFensterseifer PE. A Educação Física na crise da modernidade [tese]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação; 1999. Educação Física brasileira entrou nesse caminho de maneira deslumbrada, uma vez que os intelectuais do campo, fascinados pelas possiblidades da ciência, presumiram que todos os problemas seriam resolvidos através das normativas da cientificidade. Desse modo, teve-se nessa conjuntura uma certa postura de alienação e de complacência frente às bases científicas.

Postura essa que só começou a ser tensionada especialmente a partir da década de 1980, com a intensificação do debate epistemológico e com a crise epistemológica da Educação Física brasileira, no qual alguns intelectuais do campo passaram a interpelar (embasados principalmente nos constructos das Ciências Humanas e Sociais) essa lógica de cientificidade.

Entretanto, essas discussões epistemológicas não surgem de forma arbitrária, sem estarem associadas a um contexto. Elas se originaram a partir da influência do movimento de redemocratização da sociedade brasileira. Como pontuou Medina (1990Medina JPS. A Educação Física cuida do corpo… e “mente”. 9. ed. Campinas: Papirus; 1990.)2 2 O clássico livro de Medina Educação Física cuida do corpo... e ‘mente’ teve sua primeira edição publicada em 1983, período no qual a Educação Física brasileira buscava reestruturar os seus componentes políticos, teóricos e pedagógicos, visando garantir à disciplina uma identidade mais coerente com seus princípios e finalidades sociais, além de buscar assegurar a sua legitimidade como uma disciplina escolar (deixando de ser uma mera atividade). , após o fim do período ditatorial e com a retomada da democracia brasileira, diversos campos vinculados à educação começaram o seu processo de autoavaliação para se fundamentarem a partir de teorias críticas que se contrapunham aos preceitos do paradigma educacional e social que vigorava naquele período. Em vista disso, mesmo que de forma bem mais tardia do que os outros, teve-se o processo de autoavaliação do campo da Educação Física brasileira.

Nesse processo de autoavaliação, constatou-se que a Educação Física tinha que entrar em crise, dado que a maneira como ela vinha sendo desenvolvida precisava ser superada. A Educação Física encontrava-se em um limbo, isto é, não se tinha clareza sobre sua identidade e sua especificidade, sobre o que ela era, o que deveria ser, sobre a sua relevância social, sobre o que a legitimava no seio social etc. É nesse bojo que Medina (1990)Medina JPS. A Educação Física cuida do corpo… e “mente”. 9. ed. Campinas: Papirus; 1990. ventilou a essencialidade de o campo passar por uma crise.

Desse contexto pode-se sintetizar alguns elementos medulares que fizeram parte do processo de desenvolvimento do debate epistemológico da Educação Física brasileira. Primeiramente, havia genuínas preocupações naquele período, tais como: a) como o campo da Educação Física se justificaria no universo acadêmico-científico? b) de que forma se daria o processo de produção científica da área? e, principalmente, c) qual era a especificidade da Educação Física?

Em consonância com Lima (2000)Lima HLA. Pensamento epistemológico da Educação Física brasileira: das controvérsias acerca do estatuto científico. Rev Bras Ciênc Esporte. 2000;21(2):95-102. e Vaz (2019)Vaz AF. Certa herança marxista no recente debate da Educação Física no Brasil. Movimento. 2019;25:e25069. http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.96236.
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, na conjuntura da década de 1980, as bases teóricas do materialismo histórico-dialético, sobretudo por intermédio das concepções sustentadas pela teoria histórico-crítica, tiveram um significativo impacto no que tange à constituição e ao desenvolvimento do Movimento Renovador da Educação Física brasileira. O grande exemplo disso foi a construção do livro Metodologia do Ensino da Educação Física (que deu origem à abordagem crítico-superadora), que foi cunhado por um coletivo de autores (Carmem Lúcia Soares, Celi Taffarel, Lino Castellani Filho, Maria Elizabeth Varjal, Micheli Escobar, Valter Bracht) que tinham divergências de pensamento, mas que naquele contexto fizeram um enorme esforço para se unirem em prol de uma nova fundamentação teórica, pedagógica e prática que justificasse a legitimidade e legalidade da Educação Física como um componente curricular escolar.

Destarte, vivia-se naquele período uma circunstância de ascensão das Ciências Sociais e Humanas. Novas formas de se pensar a educação, a sociedade, a política e a ciência começaram a ser introduzidas no Brasil. Assim, a teoria histórico-crítica, o Movimento Renovador e, por conseguinte, a abordagem crítico-superadora são frutos desse movimento e do processo de redemocratização da sociedade brasileira.

Ainda nessa esteira, entre as principais reivindicações de mudanças para a Educação Física brasileira, tanto da abordagem crítico-superadora quanto da maioria dos demais intelectuais e das abordagens do Movimento Renovador, tinham-se as seguintes objeções: I) ao ensino centrado totalmente na técnica; II) à lógica de reprodução do esporte na escola; III) à hegemonia dos conteúdos esportivos; IV) ao enaltecimento do esporte de alto rendimento; IV) à exclusão dos alunos menos habilidosos; VI) ao paradigma da aptidão física; VII) ao ensino acrítico, reprodutivo e transmissivo.

Portanto, pode-se argumentar que a Educação Física entrou em dois cenários de crise: no primeiro cenário (década de 1980), em que o debate epistemológico se engendrava no campo da Educação Física brasileira, o caráter da crise girava especialmente em torno de um esforço político-ideológico para construir uma nova identidade que assegurasse a sua legitimidade, a sua função e o seu papel no bojo da sociedade brasileira. Enquanto no segundo cenário (década de 1990), a crise se desdobrou para a esfera epistemológica.

No cenário da década de 1990, o debate epistemológico da Educação Física brasileira se intensificou. Os intelectuais do campo direcionaram seus esforços para tratar questões de ordem epistêmicas, dado que, além de uma crise de identidade, a Educação Física brasileira enfrentava a indefinição epistemológica (Lima, 2000Lima HLA. Pensamento epistemológico da Educação Física brasileira: das controvérsias acerca do estatuto científico. Rev Bras Ciênc Esporte. 2000;21(2):95-102.).

É especialmente a partir desse momento que a análise da produção do conhecimento passa a ser compreendida com um elemento essencial para o desenvolvimento da Educação Física brasileira. Apesar disso, o mote dominante do debate epistemológico naquele contexto foi a questão da problemática do estatuto epistemológico e científico.

Remontando à metáfora de Alice, se naquele primeiro momento, de 1960 até mais ou menos o início de 1980 (período que pode ser denominado de disciplinar, por conta do incessante desejo de se adentrar na esfera acadêmico-científica), a Educação Física brasileira esteve extasiada com o maravilhoso mundo científico, após a década de 1990 os obstáculos epistemológicos da cientificidade começaram a ser evidenciados por determinados intelectuais. Em vista disso, o maravilhoso mundo científico passou a ser analisado de modo mais sistemático, rigoroso e diligente pelos intelectuais da Educação Física brasileira.

O DEBATE EPISTEMOLÓGICO NA EDUCAÇÃO FÍSICA BRASILEIRA: TENSIONAMENTOS E DESDOBRAMENTOS ENTRE AS VERTENTES CIENTÍFICA E PEDAGÓGICA

De acordo com Lima (2000)Lima HLA. Pensamento epistemológico da Educação Física brasileira: das controvérsias acerca do estatuto científico. Rev Bras Ciênc Esporte. 2000;21(2):95-102. e Betti (1996)Betti M. Por uma teoria da prática. Motus Corporis. 1996;3(2):73-127., surgiram duas correntes epistemológicas antagônicas que foram denominadas de vertente científica e vertente pedagógica. Grosso modo, essas duas vertentes debateram particularmente sobre a questão do estatuto epistemológico da Educação Física brasileira. A vertente científica era composta por intelectuais (salvaguardando suas diferenças) que defendiam a essencialidade de um estatuto científico para a área que a legitimasse como uma disciplina científica, ao passo que a vertente pedagógica sustentava a prática pedagógica como o reduto fulcral da área.

Os principais intelectuais3 3 Outros intelectuais de ambas as vertentes contribuíram nesse contexto do debate epistemológico da Educação Física, porém aqueles que tiveram maior impacto foram esses constatados por Lima (2000). da vertente científica e suas respectivas propostas eram: Manuel Sérgio (Motricidade Humana), Canfield (Ciência do Movimento Humano), Go Tani (Cinesiologia) e Adroaldo Gaya (Ciências do Esporte). Enquanto da vertente pedagógica foram: Valter Bracht (a prática pedagógica como eixo integrador), Silvio Gamboa (a Educação Física como ciência da prática), Hugo Lovisolo (a Educação Física como arte da mediação) e Mauro Betti (a Educação Física como um campo dinâmico de pesquisa e reflexão) (Lima, 2000Lima HLA. Pensamento epistemológico da Educação Física brasileira: das controvérsias acerca do estatuto científico. Rev Bras Ciênc Esporte. 2000;21(2):95-102.).

Ademais, destaca-se que esse debate foi marcado também pela disputa do campo entre as subáreas que hoje denominamos de biodinâmica do movimento e saúde e sociocultural e pedagógica. De um lado, tinha a vertente científica que buscava a sua fundamentação, sobretudo, nos constructos das Ciências Biológicas4 4 Salienta-se que nem todas as propostas da vertente científica se ancoravam exclusivamente nas bases das Ciências Biológicas. Manuel Sérgio, por exemplo, fundamentou sua concepção de Ciências da Motricidade Humana respaldado no método integrativo que se pauta, também, pelas Ciências Humanas e Sociais. e representava a subárea da biodinâmica do movimento, defendendo a edificação de um estatuto científico para Educação Física brasileira, partindo da hipótese de que isso daria mais prestígio ao campo e, consequentemente, resolveria a crise de identidade. Do outro polo, a vertente pedagógica, que representava as subáreas sociocultural e pedagógica e tinha seu embasamento nos princípios das ciências sociais e humanas que, em resumo, sustentava que o campo não precisava de um selo de área científica para se consolidar, mas sim garantir a qualidade (com respaldo das bases científicas) da sua prática pedagógica em seus espaços de intervenção.

Em síntese, alguns elementos que podem ser extraídos do saldo obtido desse contexto de polarização entre as vertentes são:

  • Ganho de mais fundamentação científica e epistemológica na produção do conhecimento do campo;

  • Contestação da lógica de cientificidade e a abertura para a valorização de novos saberes;

  • Especialização do campo, dos pesquisadores e da produção de conhecimento com a abertura de novos programas de pós-graduação com áreas de concentração das diferentes subáreas da Educação Física brasileira;

  • Fortalecimento da dicotomia entre as subáreas e o estreitamento do diálogo entre elas;

  • Corroboração da fragmentação entre o biológico e o cultural;

  • Dualidade entre os conhecimentos das Ciências Humanas e Sociais e os conhecimentos das Ciências Biológicas;

  • Constituição (o que não significa a completa aceitação) de um campo plural teoricamente, tematicamente, metodologicamente e epistemologicamente;

  • Continuação da crise de identidade e da indefinição epistemológica do campo.

Todos esses elementos elencados são, em maior ou menor grau, sintomáticos em nosso campo até hoje. Primeiramente, em que pese toda a atmosfera de embate, é indubitável que o debate travado foi imprescindível para iniciar o processo de amadurecimento e desenvolvimento epistemológico e científico da Educação Física brasileira. Por ela ser um campo tão jovem, tem muito caminho a percorrer epistemologicamente e cientificamente para amadurecer, porém, cumpre reconhecer que o primeiro grande salto qualitativo dado na direção do amadurecimento foi nesse cenário.

Os debates travados entre as vertentes científica e pedagógica enriqueceram a produção do conhecimento do campo na medida em que os intelectuais, para fundamentarem suas proposições, introduziram novos autores, teorias e metodologias. Além disso, o cenário de conflito epistemológico foi crucial (mas não o único fator que contribuiu) para o campo começar a questionar com mais veemência o que estava produzindo, o que deveria produzir, qual(ais) era(m) o(s) objeto(s) de estudo da área, para onde a produção do conhecimento se direcionava, quais as limitações teóricas e metodológicas do que vinham sendo produzido etc.

Teve-se também como resultante a superação da lógica da cientificidade que pairou no campo por um período. Os intelectuais da vertente pedagógica interpelaram a postura de subordinação que o campo vinha tendo em relação às chamadas ciências mães. Na ânsia de consumar um estatuto científico para área, esqueceu-se de sua especificidade e autonomia. Nesse viés, Bracht alertou (2003) que o que vinha sendo produzido tinha muito mais vinculação com as chamadas ciências mães do que com a Educação Física.

Nessa senda, Lovisolo (1995)Lovisolo H. Educação Física: arte da mediação. Rio de Janeiro: Sprint; 1995. defendeu que se deve conceber a área da Educação Física em sua totalidade e dimensão como uma área plural de pesquisa, formação e intervenção sobre a sociedade. Então, para o autor, o campo dos fenômenos em que a Educação Física se insere é o das práticas corporais num sentido global, no qual temos que aumentá-lo em vez de restringi-lo. A Educação Física, portanto, precisa alcançar sua legitimidade profissional pelo seu valor social, não pela ambição de sistematizar seu objeto ou de seu reconhecimento enquanto uma disciplina científica

Portanto, as críticas proferidas à lógica da cientificidade foram profícuas para a mudança da maneira pela qual o campo passou a se relacionar e a operacionalizar com a ciência. Colocou-se em evidência que a especificidade da Educação Física precisava ser levada em consideração e que a relação com a ciência deve se dar no sentindo de se edificar a produção do conhecimento do campo com o respaldo (e rigor) das bases científicas. Nesse sentido, ficou manifesto que a ideação de enquadrar a Educação Física nos moldes da ciência não deveria ser levada adiante, posto que isso poderia ocasionar a descaracterização da área.

Outra consequência derivada do debate entre as vertentes pedagógica e científica foi a intensificação do processo de especialização do campo. Como apresentado por Manoel e Carvalho (2011Manoel EJ, Carvalho YM. Pós-graduação na educação física brasileira: a atração (fatal) para a biodinâmica. Educ Pesqui. 2011;37(2):389-406. http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022011000200012.
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, pp. 391-392), um dos fatores que contribuíram para a discussão sobre a identidade e a especificidade da Educação Física foi quando a “[...] CAPES começou a valorizar o grau de caracterização acadêmica dos programas, considerando a clareza e a consistência na definição da área básica, das linhas de pesquisa, dos projetos de pesquisa e das atividades discentes [...]”. Esse processo levou a um novo modelo de ordenamento da pós-graduação. A modificação que mais impactou o campo foi a criação de áreas de concentração que representava três diferentes subáreas da Educação Física.

O resultado desse novo ordenamento da pós-graduação da Educação Física brasileira pode ser resumido no que Gaya (2017)Gaya ACA. O pós-graduação e a formação de professores de educação física no Brasil. Rev Bras Educ Fís Esporte. 2017;31(Spe):71-5. http://dx.doi.org/10.11606/1807-55092017000nesp071.
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chamou de paradigma da especialização disciplinar. Nessa perspectiva a pós-graduação configura-se de maneira multidisciplinar, porém sem o diálogo entre as disciplinas, os pesquisadores e as subáreas. Sendo assim, a partir disso, a pós-graduação da Educação Física brasileira passou a formar pesquisadores com uma disposição demasiadamente especializada e fragmentada e, consequentemente, incapazes de terem uma compreensão integral e relacional do campo.

Paralelamente a esse processo de especialização do campo se desdobram outros três saldos do debate epistemológico, a saber: I) o fortalecimento da dicotomia entre as subáreas e o estreitamento do diálogo entre elas; II) a corroboração da fragmentação entre o biológico e o cultural; III) a dualidade entre os conhecimentos das Ciências Humanas e Sociais e os conhecimentos das Ciências Biológicas.

Em anuência com Bungenstab (2020)Bungenstab GC. Os movimentos dualistas e as “jaulas de aço” da Educação Física brasileira. Rev ALESDE. 2020;12(1):74-89., pode-se denominar esses três saldos de movimentos dualistas da Educação Física brasileira. No cenário do surgimento do Movimento Renovador, a partir dos embates teóricos-epistemológicos travados, tentou-se dar algumas respostas a determinadas perspectivas duais que vinham perdurando no campo, como as dualidades corpo/mente, prática/teoria e cultural/biológico. No entanto, fazendo uma leitura mais analítica percebe-se que as respostas ventiladas naquele contexto tiveram mais um caráter de disputa e de demarcação do campo do que uma busca de solução conjunta, o que acabou reforçando ou, até mesmo, criando perspectivas dicotômicas.

Com a divisão da pós-graduação em subáreas e, por conseguinte, com o surgimento do paradigma de especialização disciplinar, o campo da Educação Física brasileira, em referência à metáfora de Gaya (2017)Gaya ACA. O pós-graduação e a formação de professores de educação física no Brasil. Rev Bras Educ Fís Esporte. 2017;31(Spe):71-5. http://dx.doi.org/10.11606/1807-55092017000nesp071.
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, passa a ser operacionalizado em uma lógica de concha de retalhos, isto é, as disciplinas são inseridas no currículo de modo desintegrado, pensa-se apenas na especialização de uma determinada subárea e se esquece que há uma formação geral em Educação Física que necessita ser contemplada. Destarte, os pesquisadores formados nessa lógica se tornam mais especializados em conhecimentos de outras áreas, como fisiologia, sociologia, biologia, pedagogia, psicologia, filosofia etc., e dominam cada vez menos os conhecimentos específicos da Educação Física.

Então, como colocado por Hallal e Melo (2017), oHallal PC, Melo VA. Crescendo e enfraquecendo: um olhar sobre os rumos da Educação Física no Brasil. Rev Bras Ciênc Esporte. 2017;39(3):322-7. http://dx.doi.org/10.1016/j.rbce.2016.07.002.
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campo passou a se desenvolver por meio de um engavetamento epistemológico. Por esse horizonte, a organização da Educação Física pode ser vista metaforicamente como um armário de arquivo, no qual cada subárea representa uma gaveta. O problema ocorre quando o arquivista (o currículo da Educação Física) quer que cada uma delas se desenvolva de maneira isolada, sem qualquer relação com as demais gavetas, como se representasse uma área diferente. Entretanto, se esquece que cada gaveta desse armário representa apenas uma parte do dossiê completo da Educação Física, o que significa que sem a relação de todas as gavetas não se chega à totalidade da área.

Mas os dualismos não param por aí. Uma das demandas pleiteadas pelos diversos intelectuais do Movimento Renovador da Educação Física brasileira foi a superação da perspectiva de biologização que imperava no campo. Essa tendência foi contestada em razão de ocasionar a dicotomia corpo/mente. Pensava-se o corpo e o movimento humano apenas pelas dimensões biológicas e psicológicas. À visto disso, surgiram abordagens que propuseram, em oposição à tendência de biologização, a essencialidade da dimensão cultural para a Educação Física (Bungenstab, 2020Bungenstab GC. Os movimentos dualistas e as “jaulas de aço” da Educação Física brasileira. Rev ALESDE. 2020;12(1):74-89.).

Embora essa inserção da dimensão cultural tenha sido fundamental para o enriquecimento e redimensionamento do universo da Educação Física brasileira, vale ressaltar que, no limite, ela acabou gerando um novo viés de dualidade. Corrobora-se com a análise de Bungenstab (2020)Bungenstab GC. Os movimentos dualistas e as “jaulas de aço” da Educação Física brasileira. Rev ALESDE. 2020;12(1):74-89., quando o autor recorre à metáfora de “jaula de aço” de Weber5 5 “Jaula de aço” é um termo cunhado metaforicamente por Weber para explicar o modo de organização da sociedade capitalista. Para Bungenstab (2020, p. 75): “O aço, em sua dureza, representa o cotidiano dos indivíduos e o consequente desaparecimento da liberdade. Desse modo, o indivíduo torna-se prisioneiro – em sua jaula – de um sistema de abstração impessoal. Ou seja, a regra do sistema acaba por determinar a vida dos indivíduos. A liberdade, portanto, não passa nunca dos limites da jaula”. para argumentar que a subárea sociocultural e pedagógica não teve uma postura integrativa, uma vez que relegou a dimensão biológica e deu primazia à dimensão cultural. Nesse sentido, fazendo jus à metáfora de Weber, o autor assim coloca:

Se tomarmos emprestada a metáfora de Weber (2004) sobre a “jaula de aço” e associarmos a mesma ao campo da EF brasileira veremos que quando as subáreas sociocultural e pedagógica criticaram a subárea biodinâmica reivindicando sua importância diante do movimento humano não houve, como muitos acreditaram, a quebra do aço da jaula rumo à liberdade. O que aconteceu, na verdade, foi uma mudança de uma jaula para outra. Outra forma de racionalização entrou em vigor e começou a controlar o comportamento da maioria dos pesquisadores e profissionais da EF no Brasil. (Bungenstab, 2020, pBungenstab GC. Os movimentos dualistas e as “jaulas de aço” da Educação Física brasileira. Rev ALESDE. 2020;12(1):74-89.. 78).

Portanto, a proposição para resolver uma dicotomia acabou acarretando outra. Se antes o campo tinha uma inequação que privilegiava a dimensão biológica, agora há, em certos setores, a preponderância da dimensão cultural. Tal fato mostra o quanto o campo da Educação Física brasileira tem dificuldades epistemológicas em operacionalizar com as problemáticas das suas equações, tendendo sempre para um dos lados e desconsiderando o princípio da equivalência (grosso modo, esse princípio matemático busca garantir a igualdade das operações da equação).

Um outro exemplo que evidencia a fragilidade do nosso campo para equacionar suas problemáticas é o da dualidade entre os conhecimentos das Ciências Biológicas e os conhecimentos das Ciências Humanas e Sociais. De modo geral, os pesquisadores da subárea da biodinâmica do movimento e saúde valem-se dos conhecimentos das Ciências Biológicas, enquanto os pesquisadores das subáreas sociocultural e pedagógica operam com os conhecimentos das Ciências Humanas e Sociais. Evidentemente, não há nenhum problema cada pesquisador escolher os conhecimentos de uma determinada área que lhe dará melhores possibilidades para o desenvolvimento da sua pesquisa, dado que “[...] em cada nível de análise, existem epistemologias e metodologias adequadas” (Tani, 1996, pTani GO. Cinesiologia, educação física e esporte: ordem emanente do caos na estrutura acadêmica. Motus Corporis. 1996;3(2):9-50.. 29). Com efeito, o problema ocorre com o início do processo de hierarquização dos tipos de conhecimento.

Conforme explanaram Feron e Silva (2007), oFeron AV, Silva MME. A igreja do “diabo” e a produção do conhecimento na educação física. Rev Bras Ciênc Esporte. 2007;29(1):107-22. conhecimento das Ciências Biológicas foi o que hegemonicamente dominou a lógica discursiva da verdade do campo da Educação Física brasileira até meados de 1980, quando acontece o advento do Movimento Renovador. Doravante a esse marco, inicia-se a entrada dos conhecimentos advindos das Ciências Humanas e Sociais. O que para alguns foi visto como uma mudança paradigmática, pois novos saberes e formas de pensar e analisar o objeto da área foram introduzidos no campo. Todavia, não houve alteração na imposição de uma lógica discursiva da verdade. Alguns pesquisadores das Ciências Humanas e Sociais passaram a reivindicar o seu saber (assim como fizeram/fazem certos pesquisadores das Ciências Biológicas) como o “verdadeiro” (em nome, sobretudo, da criticidade), na medida em que relegavam os conhecimentos das Ciências Biológicas.

Dessa forma, criou-se uma atmosfera de rivalidade entre as áreas do conhecimento, em que cada área, à sua maneira, se articula para vencer o jogo do discurso verdadeiro (Feron e Silva, 2007Feron AV, Silva MME. A igreja do “diabo” e a produção do conhecimento na educação física. Rev Bras Ciênc Esporte. 2007;29(1):107-22.). Tani (1996)Tani GO. Cinesiologia, educação física e esporte: ordem emanente do caos na estrutura acadêmica. Motus Corporis. 1996;3(2):9-50. já alertava sobre a “miopia acadêmica” que essa lógica de ambivalência epistemológica dos conhecimentos poderia ocasionar, porquanto se enxergariam só os benefícios do que está perto (a área de conhecimento adotada), ao passo que se veria só as limitações do que está longe (a área de conhecimento “rival”). Portanto, torna-se escusado dizer que a miopia acadêmica é sintomática no campo da Educação Física brasileira!

Então, a culminância da falta de um equacionamento equivalente das questões epistemológicas elementares do campo da Educação Física brasileira é a constante criação de dualidades e de fragmentações. Enquanto a área não tiver maturidade epistemológica para buscar solucionar conjuntamente as problemáticas principais de suas equações (o que não significa unificar o pensamento) (Hallal e Melo, 2017Hallal PC, Melo VA. Crescendo e enfraquecendo: um olhar sobre os rumos da Educação Física no Brasil. Rev Bras Ciênc Esporte. 2017;39(3):322-7. http://dx.doi.org/10.1016/j.rbce.2016.07.002.
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), haverá sempre discrepâncias na maneira de proceder com a operacionalização das equações elementares e no fim não se chegará a um resultado de consenso mínimo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo objetivou apresentar um balanço do desenvolvimento epistemológico da Educação Física brasileira. Constatou-se que o panorama do debate epistemológico do campo da Educação Física brasileira tem sido marcado por herméticas dualidades. Embora sejam observados esforços significativos no campo para superar as perspectivas fragmentárias, tem-se verificado que algumas proposições feitas têm gerado ainda mais dualidades, criando uma tensão epistemológica que pode prejudicar a busca por uma abordagem mais integrada e relacional. Isso se deve, em parte, à maneira como algumas abordagens teóricas e metodológicas têm sido propostas, muitas vezes apoiadas em premissas dualistas que não conseguem captar a complexidade da realidade que envolve a área.

Essa situação, por sua vez, pode ser sentida no campo através das dicotomias entre as subáreas da Educação Física (levando a uma lógica de engavetamento epistemológico), à corroboração da fragmentação entre as abordagens biológicas e culturais e à segregação entre os conhecimentos das Ciências Humanas e Sociais e os conhecimentos das Ciências Biológicas, dificultando a construção de um campo mais plural e integrado. Nesse viés, a condição plural do campo, caracterizada pela diversidade de teorias, conceitos e práticas, representa um desafio para a busca de uma unidade ou consenso mínimo no âmbito da área. Sendo demandadas, portanto, formas de abordar a Educação Física de maneira integrativa e relacional, de modo a contemplar a complexidade e a abundância da composição do campo.

  • 1
    Entende-se por historiografia a “[...] análise epistemológica e ideológica que vai permitir o retomar e o redimensionar dos caminhos dos estudos históricos, apontando possíveis problemas e possibilitando o ‘arriscar’ de sugestões” (Melo, 2007, pMelo VA. Reflexão sobre a história da Educação Física no Brasil: uma abordagem historiográfica. Movimento. 2007;3(4):41-8. http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.2206.
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    . 42). Uma pesquisa historiográfica demanda um rigor metodológico e analítico muito diligente para com os estudos históricos. Algo que seria inviável neste trabalho. O que se pretende é “apenas” provocar reflexões a partir dos estudos históricos para se pensar o processo de desenvolvimento epistemológico do campo da Educação Física brasileira.
  • 2
    O clássico livro de Medina Educação Física cuida do corpo... e ‘mente’ teve sua primeira edição publicada em 1983, período no qual a Educação Física brasileira buscava reestruturar os seus componentes políticos, teóricos e pedagógicos, visando garantir à disciplina uma identidade mais coerente com seus princípios e finalidades sociais, além de buscar assegurar a sua legitimidade como uma disciplina escolar (deixando de ser uma mera atividade).
  • 3
    Outros intelectuais de ambas as vertentes contribuíram nesse contexto do debate epistemológico da Educação Física, porém aqueles que tiveram maior impacto foram esses constatados por Lima (2000)Lima HLA. Pensamento epistemológico da Educação Física brasileira: das controvérsias acerca do estatuto científico. Rev Bras Ciênc Esporte. 2000;21(2):95-102..
  • 4
    Salienta-se que nem todas as propostas da vertente científica se ancoravam exclusivamente nas bases das Ciências Biológicas. Manuel Sérgio, por exemplo, fundamentou sua concepção de Ciências da Motricidade Humana respaldado no método integrativo que se pauta, também, pelas Ciências Humanas e Sociais.
  • 5
    “Jaula de aço” é um termo cunhado metaforicamente por Weber para explicar o modo de organização da sociedade capitalista. Para Bungenstab (2020, pBungenstab GC. Os movimentos dualistas e as “jaulas de aço” da Educação Física brasileira. Rev ALESDE. 2020;12(1):74-89.. 75): “O aço, em sua dureza, representa o cotidiano dos indivíduos e o consequente desaparecimento da liberdade. Desse modo, o indivíduo torna-se prisioneiro – em sua jaula – de um sistema de abstração impessoal. Ou seja, a regra do sistema acaba por determinar a vida dos indivíduos. A liberdade, portanto, não passa nunca dos limites da jaula”.
  • FINANCIAMENTO

    O presente trabalho não contou com apoio financeiro de qualquer natureza para sua elaboração.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Maio 2023
  • Aceito
    03 Ago 2023
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