Resumo:
O artigo analisa três grupos de fatores que influenciam as práticas e a construção de esquemas de categorização do público por burocratas de nível de rua (BNR) do Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família e Indivíduos: i) características profissionais e relacionais dos BNR; ii) fatores organizacionais; iii) características dos usuários. A pesquisa envolveu 11 BNR atuantes em Belo Horizonte, com observação intensiva da rotina e de atendimentos, entrevistas e análise de Prontuários de Acompanhamento, codificados no Atlas.Ti. Concluiu-se que as características individuais dos BNR e os aspectos organizacionais são menos relevantes que os atributos dos usuários para a atuação no nível de rua. Demandas impactam encaminhamentos e atendimentos, a motivação e a capacidade de modificar condutas influenciam a categorização de tipos de usuários. Tais atributos geram casos únicos, resultando em atuações personalizadas e na implementação flexível e adaptativa do serviço.
Palavras-chave:
implementação de políticas públicas; burocratas de nível de rua; fatores de influência; Sistema Único de Assistência Social
Abstract:
This article analyzes three groups of factors that influence the practices and public categorization schemes of street-level bureaucrats (SLBs) in the Service for the Protection and Care of Families and Individuals: (i) professional and relational factors of SLBs; (ii) organizational factors; and (iii) client characteristics. The research studied 11 SLBs working in Belo Horizonte, employing intensive observation of daily routines and services provided, interviews, and analysis of follow-up records, coded using Atlas.ti. The findings suggest that individual characteristics of SLBs and organizational aspects are less significant than client attributes in shaping street-level work. Client demands influence referrals and assistance, while SLBs’ motivation and capacity to modify behavior impact user categorization. These attributes generate unique cases, leading to personalized actions and a flexible, adaptive service implementation.
Keywords:
policy public implementation; street-level bureaucracy; influence factors; Brazilian social assistance system
Introdução
Este artigo discute três grupos de fatores que influenciam a atuação de burocratas de nível de rua (BNR) nos processos de implementação do Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família e Indivíduos (Paefi), do Sistema Único de Assistência Social (Suas). Os fatores analisados são os atributos profissionais e relacionais dos BNR pesquisados, as características dos usuários atendidos e os elementos do contexto organizacional de trabalho desses burocratas.
Os estudos de implementação de políticas públicas, desde os anos 1970, estão interessados em descrever e analisar como as intervenções funcionam na prática e o que influencia o funcionamento e os resultados delas. Certas abordagens consideram que, mesmo quando os tomadores de decisão estabelecem claramente as normas de execução, há fatores que interferem no processo, como os contextos institucionais locais, a ação e as relações dos atores e organizações envolvidas. Deste modo, o jogo político de negociação e decisão inerente ao processo de produção de políticas públicas não se interrompe nas práticas de formulação, seguindo para a etapa de implementação. Essa literatura conceitua a implementação como um processo contínuo de interação e negociações entre diferentes atores, que provoca a constante adaptação do conteúdo das políticas, ou certa “ordem negociada” (Barrett, 2004, tradução nossa). A política original é transformada no momento da execução, e esta resulta das interações entre diferentes atores inseridos em arranjos institucionais e em estruturas de relações pessoais e profissionais que podem limitar ou ampliar a ação de tais atores.
Com essas premissas, os BNR (Lipsky, 2019), aqueles que executam diretamente os serviços na interação com os cidadãos, distribuindo benefícios e sanções, tornam-se variáveis centrais para a análise do processo político. O estudo sobre estes burocratas tornou-se campo específico da análise de políticas públicas, buscando desvendar como eles atuam como agentes nos processos de implementação, tomando decisões e fazendo julgamentos para lidar com as incertezas e condições inadequadas de trabalho. O comportamento dos BNR é caracterizado pela discricionariedade, pois eles tomam decisões alocativas no encontro cotidiano com os usuários para entregar bens e serviços, interpretando e classificando suas condições e necessidades. A discricionariedade pode causar variações no processo de implementação e efeitos potenciais sobre as condições de vida dos usuários. Por isso, essa literatura considera que as decisões tomadas pelos BNR, suas rotinas e estratégias de enfrentamento ao contexto dinâmico de trabalho, tornam-se, concretamente, parte dos serviços públicos implementados (Brodkin, 2011; Hupe; Hill, 2007; Lipsky, 2019; Lotta, 2019).
Este é o tema do artigo - a prática de agentes implementadores de políticas públicas -, especificamente de serviço socioassistencial tipificado pelo Suas brasileiro. A análise utiliza resultados de pesquisa empírica sobre o Serviço de Proteção e Atendimento Especializado à Família e Indivíduos (Paefi). Destinado a famílias em situação de violação de direitos, o Paefi oferta acompanhamento socioassistencial baseado em práticas de construção de vínculo e referência entre os BNR e o público, demandando uma atuação com algum espaço de discricionariedade e julgamentos. A pesquisa focou na atuação dos BNR a partir de duas dimensões inter-relacionadas: as práticas (atividades cotidianas previstas e imprevistas) e os esquemas de categorização do público atendido (classificações extraoficiais baseadas em estereótipos sociais), identificando os fatores que afetam a atuação dos agentes implementadores.
O Paefi está orientado a dar respostas a problemas complexos, permeados por tensões familiares e comunitárias, que podem acarretar fragilização ou até mesmo rompimento de vínculos. Tratam-se de fenômenos sociais multicausais que abarcam aspectos econômicos, sociais, culturais e subjetivos, posicionando esse serviço no nível especializado de proteção social do Suas. Esse serviço é uma oferta obrigatória do Centro Especializado de Assistência Social (Creas) - unidades físicas públicas ou privadas responsáveis por prover as ofertas do sistema, sendo os serviços socioassistenciais uma delas (Brasil, 2011, 2012, 2014).
É implementado da seguinte maneira: os casos de famílias com pessoas em situação de violação de direitos relacionais (negligência, abandono, violências, trabalho infantil, etc.) são encaminhados por outros equipamentos do Suas, da política de saúde ou educação, de conselhos tutelares ou conselhos de direitos e de órgãos de defesa do sistema de justiça (defensorias, Ministério Público) e direcionados para os BNR, assistentes sociais e psicólogos. Eles devem avaliar as condições de elegibilidade do caso e estabelecer um plano de acompanhamento com a família, composto por diversas práticas de atenção especializada, como atendimentos para escuta, fornecimento de orientações gerais e de questões sociojurídicas, visitas domiciliares, encaminhamentos para serviços, oficinas de arte-educação.
Além de recursos humanos e tempo suficientes para realizar um acompanhamento com proximidade e constância, a implementação do Paefi depende de uma estrutura organizacional baseada em orientações sobre a prática profissional, em fluxos de trabalho e disponibilidade de recursos e serviços de outras políticas. Mas seu principal insumo direto é a escuta, o tempo e a interação do BNR que conduz o acompanhamento com a família.
Os agentes de rua do Paefi também dependem da articulação com a rede socioassistencial3 de referência do Creas e com agentes de políticas de transferência de renda, de saúde, educação, habitação, trabalho e emprego, etc. (Brasil, 2011, 2012, 2014; Belo Horizonte, 2020). Tal como a literatura sobre BNR desvelou (Hupe; Hill, 2007; Lipsky, 2019; Lotta, 2015; Meyers; Vorsanger, 2003), essas condições organizacionais e relacionais também têm implicações para a atuação dos BNR no serviço, influenciando suas práticas de implementação.
Como também influenciam a atuação as próprias características dos BNR, pois muito embora se espere a observância de uma ordem impessoal pelo quadro administrativo burocrático, em uma concepção típica-ideal da burocracia (Weber, 2000, 2011), os estudos empíricos sobre o comportamento burocrático evidenciam que eles também orientam suas práticas por julgamentos morais, baseados em estereótipos sociais (Maynard-Moody; Musheno, 2003), bem como pela lógica, conhecimento e experiência profissionais (Harrits; Cecchini, 2019).
Isso não seria diferente para os BNR do Paefi, tendo em vista, por um lado, sua focalização nas situações de violação de direitos, envolvidas em um conjunto de representações e estereótipos com significados associados à criminalização, punição e culpabilização (Carmona, 2019). Tais estereótipos ampliam o espaço para os BNR atuarem fazendo julgamentos, categorizando os usuários que acompanham. Por outro lado, a atuação profissional de psicólogos e assistentes sociais no Suas é de conhecida notoriedade, não só porque compõem obrigatoriamente as equipes de referência dos serviços socioassistenciais (Brasil, 2006), como também seus Conselhos Profissionais já publicaram parâmetros para atuação na política, incentivando as particularidades da intervenção de cada profissão no serviço (Brasil, 2016; CFESS, 2011; CFP; CONPAS, 2016). Pressupõe-se, em consequência, que tais parâmetros profissionais também afetem as práticas de implementação adotadas pelos BNR do Paefi.
À luz de tais pressupostos: i) sobre a atuação dos BNR na implementação; e ii) sobre os atributos do Paefi que ampliam o espaço para o exercício discricionário desses agentes; este artigo traz um recorte dos resultados da referida pesquisa. Como mencionado, seu objetivo é analisar três conjuntos de fatores que influenciam as práticas operadas e os esquemas de categorização do público construídos por agentes implementadores do Paefi. Os fatores são:
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características individuais dos BNR: profissionais (profissão e conhecimentos especializados, trajetória e satisfação profissional) e relacionais (engajamento dos agentes em grupos sociais e relação com pares, com a gestão e com a rede de serviços);
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características dos usuários (atributos pessoais, demandas, comportamentos, motivação com o serviço);
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contexto organizacional de implementação do serviço (normativas sobre o serviço, orientações referentes às condições gerais de trabalho e ao arranjo local de implementação).
A pergunta que orienta o artigo é: de que forma o conhecimento profissional dos BNR do Paefi, bem como as relações que estabelecem no trabalho e o perfil dos usuários que atendem, são considerados nas decisões acerca de quais práticas realizarem e nos julgamentos para as classificações dos usuários no processo de implementação do serviço?
A análise apresentada resulta de um estudo de caso de tipo interpretativo, com equipe de referência composta por 11 BNR atuantes no serviço em Belo Horizonte. A coleta triangulada de dados utilizou técnicas de observação direta intensiva da rotina de implementação - reuniões de trabalho, atendimentos presenciais e remotos, atividades coletivas - entrevistas semiestruturadas com as burocratas, gestores e usuárias, e registros administrativos dos Prontuários de Acompanhamento de casos. Todo esse material foi sistematizado com o procedimento de codificação manual no Atlas.Ti, à luz de orientações da análise qualitativa temática de dados (Domenico, 2020).
O foco da análise dos fatores de influência na atuação de BNR do Paefi não é explicar a variação individual da atuação das agentes pesquisadas, mas observar como tais fatores afetam a sua atuação em uma perspectiva mais agregada. Isso porque a pesquisa é sobre um caso único, com número reduzido de burocratas da equipe de referência, o que já traz desafios para identificar variações expressivas ou representativas no comportamento delas.
Mesmo com essa ressalva, foi feita uma tentativa de análise individualizada e, efetivamente, identificou-se que era inadequada para avaliar possíveis variações. Isso porque o perfil das agentes pesquisadas revelou que alguns fatores profissionais (como situação funcional, experiência prévia ao Paefi) e relacionais (como engajamento relacional e percepções sobre a intensidade, finalidade e avaliação das relações interorganizacionais) são bastante homogêneos entre elas e, se não variam, não podem ser associados a diferenças individuais da atuação. Também já se sabia que os fatores organizacionais são comuns a todas as agentes pesquisadas, já que o estudo é de um único Creas.
De todo modo, ao problematizar os fatores que influenciam a atuação de agentes implementadores de políticas públicas e evidenciar o peso das características dos usuários para as decisões e classificações, a principal contribuição do estudo empírico apresentado para a literatura da área é evidenciar que serviços cuja implementação depende da participação ativa e de mudanças de comportamentos dos usuários, como o Paefi, são, na linha de frente, coproduzidos na interação entre BNR e os cidadãos.
Além desta introdução e das considerações conclusivas, o artigo divide-se em três seções: i) argumentos da literatura sobre os fatores de influência da atuação dos BNR; ii) nota metodológica; iii) análise da atuação dos BNR do Paefi à luz das práticas realizadas e dos esquemas de categorização do público, respondendo, em que medida e de que forma os três conjuntos de fatores influenciam, isolada ou conjuntamente, a sua atuação. Por fim, apresentam-se as conclusões.
Atuação dos BNR e fatores de influência
A conceituação de burocracia do nível de rua de Lipsky (2019) diz respeito a um trabalho no setor público restrito a algumas situações típicas: i) a interação face a face constante com os cidadãos na rotina de trabalho; ii) a existência de discricionariedade para exercer autoridade; e iii) os efeitos potenciais do trabalho sobre os cidadãos são bastante extensos. A título de exemplo, são BNR os agentes de segurança, os policiais, os professores, os profissionais de saúde, os técnicos de referência nos Centros de Assistência Social, os juízes e os defensores públicos nos tribunais.
Tais funcionários atuam em condições de trabalho conflituosas, caracterizadas por recursos escassos, objetivos e metas ambíguos, medidas de desempenho insuficientes e pressões cruzadas de gestores e usuários. Para lidar com esses conflitos e pressões, eles disciplinam e categorizam usuários, distribuem benefícios e estruturam o contexto de interação, usando a discricionariedade para implementar as políticas. Também criam mecanismos de enfrentamento a essas pressões, quebrando regras, usando recursos pessoais, burocratizando o atendimento, priorizando casos fáceis, ou direcionando suas práticas às demandas dos usuários, buscando satisfação com o trabalho (Brodkin, 2011; Hupe; Hill, 2007; Lipsky, 2019; Lotta, 2019; Tummers et al., 2015).
A discricionariedade da burocracia em nível de rua tem uma dimensão mais estrutural ou delegada em referência às regras, que caracteriza o espaço existente para interpretá-las, decidir e agir, e uma dimensão mais prática, que expressa o que as burocracias do nível de rua realmente fazem (Hupe, 2013; Lotta; Santiago, 2017).Também pode ser compreendida como agência, numa perspectiva mais sociológica, referente à habilidade tipicamente humana de usar a linguagem para formar julgamentos e agir (Maynard-Moody; Musheno, 2012).
Essa visão geral sobre o trabalho e o exercício discricionário das burocracias do nível de rua permite que sua atuação seja analisada em três dimensões: prática, estilos de interação e processos de categorização do público. Em conjunto, elas conformam o que os agentes concretamente fazem na implementação e operacionalizam analiticamente as tarefas centrais de seu trabalho, ou seja, os BNR atuam construindo práticas dentro de contextos interativos e usando categorias para classificar o público. As práticas (de natureza mais “dura”), os estilos de interação e os esquemas de categorização social do público (de natureza mais “branda”) (Hoff, 2013; Nunes; Lotta, 2019) são dimensões interligadas da atuação dos BNR e são influenciadas por diferentes fatores.
Isso porque a análise de implementação de políticas públicas supõe que as burocracias do nível de rua são “sistemas abertos”, permeáveis a pressões ambientais e externas em concorrência com as pressões internas e com os valores da burocracia (Lotta, 2019). A compreensão da atuação da burocracia de nível de rua deve considerar, ademais da identificação e descrição de suas dimensões, os distintos fatores que a influenciam ou as várias fontes da discricionariedade. Alguns destes estudos focam nas dinâmicas que explicam a atuação dos agentes implementadores (Hupe; Hill, 2007; Gofen; Sella; Gassner, 2019; Lotta, 2019; Meyers; Vorsanger, 2003).
A literatura já avançou bastante na compreensão dos fatores que influenciam a discricionariedade e identificou algumas fontes: i) as características do próprio trabalhador (atributos pessoais, trajetória profissional, traços de personalidade ou valores e crenças individuais); ii) atributos socioculturais e comportamentais dos usuários e seu valor social; iii) aspectos organizacionais (regras, procedimentos normativos e treinamentos, mecanismos de incentivo, condições de trabalho); iv) a natureza da política em termos de ambiguidade e de conflito de objetivos, instrumentos e metas; v) códigos e normas da profissão dos BNR, dentre outros (Gofen; Sella; Gassner, 2019). Interessa revisar aqui os fatores analisados para o caso do Paefi: as características dos burocratas, dos usuários e os aspectos organizacionais.
Atributos pessoais, valores, relações e profissões dos BNR
Os estudos que analisam as relações entre as características pessoais dos agentes implementadores e sua atuação enfatizam atributos pessoais, como o de Keiser (2010), que descobriu que, para eleger os beneficiários da aposentadoria por invalidez nos EUA, os BNR são influenciados por características de sua personalidade, como rapidez no atendimento e a adesão às metas e à missão da agência. Na mesma linha, Nielsen (2006) descobriu que o gênero afeta a atuação de agentes do nível de rua de seis profissões públicas dinamarquesas, mostrando que as mulheres seguem mais regras que os colegas homens com as mesmas funções.
Já os valores e crenças individuais, e as políticas, afetam a atuação dos BNR especialmente quando vão definir a condição social do público (Lipsky, 2019), o personagem e a identidade do usuário, ou construir o que a literatura chama de esquemas de categorização do público (Møller; Harrits, 2013; Møller, 2016). Os agentes de rua usam qualificadores raciais, geográficos e outros recursos que intensificam e/ou acentuam certas características e comportamentos, segmentando o público com base em valores e estereótipos sociais sobre o que é adequado, normal ou merecido (Maynard-Moody; Musheno, 2003).
Neste sentido, o trabalho no nível de rua é necessariamente relacional e as múltiplas relações que os agentes estabelecem no cotidiano também influenciam a própria atuação (Lipsky, 2019). Eles atuam como “codecisores”, a partir das redes de relações em que estão inseridos (Hupe; Hill, 2007). Sobre este tema, Maroulis (2017) verificou que quanto mais extensas as redes e laços sociais dentro da escola, mais inovadoras são as práticas de professores de ensino médio numa escola urbana americana. No mesmo país, Siciliano (2015) observou que professores investem tempo nas relações com os colegas para buscar conselhos, acessar recursos e informações e melhorar as práticas em sala de aula. Gale e colaboradores (2017) observaram que profissionais de saúde negociam suas decisões com outros colegas e com as comunidades em que atuam para adaptar a intervenção à área local, atuando com o que chamam de “diplomacia de nível de rua”. Mas para além destas relações interorganizacionais, os distintos pertencimentos, afiliações e trânsitos sociais dos agentes de rua em instituições, grupos e redes são outras relações importantes para a sua atuação discricionária (Lotta, 2015), mas ainda pouco pesquisadas (Lotta; Marques, 2020).
Por fim, fatores profissionais são outra característica dos BNR considerada pelos estudos. Møller (2016) apontou que o profissionalismo nada puro dos agentes de rua afeta o raciocínio de trabalho, levando-o a atuar ora de forma organizacional (com discricionariedade reduzida), ora ocupacional (com discricionariedade abrangente). Harrits e Cecchini (2019) descobriram que professores agem segundo seus conhecimentos técnicos e experiências anteriores para interpretarem a situação e definirem suas práticas, ao passo que Evans (2013) identificou que assistentes sociais acionam o profissionalismo continuamente como um compromisso com as necessidades dos usuários e com a liberdade no trabalho, limitando o controle gerencial. Pires e Santos (2021) verificaram que, mesmo fazendo parte da equipe multiprofissional de um mesmo serviço de saúde voltado à redução de danos, psicólogos e assistentes sociais entendem e realizam o seu trabalho com um “escopo ampliado”, ao passo que terapeutas ocupacionais, técnicos em enfermagem e médicos fazem-no sob uma percepção de “caminho para abstinência”.
Portanto, um amplo conjunto de características dos BNR podem influenciar o exercício da discricionariedade no nível de rua. Aspectos individuais, como gênero e a personalidade, mais aderentes aos objetivos organizacionais, já foram mapeados pela literatura, bem como os valores e estereótipos de normalidade e de merecimento dos agentes, suas relações interorganizacionais com os pares e a rede de serviços, além do conhecimento e formação profissional.
Atributos dos usuários
Desde as formulações iniciais sobre o trabalho dos BNR, a relevância dos atributos e das relações com os usuários para a atuação destes agentes é destacada (Lipsky, 2019). A percepção dos burocratas sobre o valor do usuário é fundamental para a realização dos esforços de implementação (Harrits; Møller, 2014; Maynard-Moody; Musheno, 2003). Essa influência parece ser em cadeia: as características reais dos usuários influenciam o julgamento do BNR, que está relacionado à sua atuação. Características socioculturais, como classe (Harrits, 2018), raça e etnia (Bundgaard; Nørgaard, 2018), e qualidades comportamentais, como motivação e desempenho dos usuários (Guul; Pedersen; Petersen, 2021; Møller, 2016; Tummers, 2017), são geralmente consideradas como fontes da discricionariedade na linha de frente (Gofen; Sella; Gassner, 2019).
Harrits (2018) encontrou que professores modificam sua preocupação e atenção com o problema do aluno quando a condição de classe varia, seja para a baixa ou para a alta. Bundgaard e Nørgaard (2018) observaram que profissionais da saúde atuam de maneira diferenciada com usuários nativos em comparação com usuários estrangeiros, evidenciando a influência da etnia dos usuários. Guul, Pedersen e Petersen (2021) perceberam que a atenção e os esforços de assistentes sociais variam a depender da motivação e do desempenho do público. Já Møller (2016) confirmou que a percepção sobre a motivação de pessoas desempregadas candidatas a benefícios é um dos julgamentos operados por assistentes sociais para a construção do seu merecimento.
Apesar de avanços nas pesquisas sobre estas relações, o papel dos usuários no trabalho da linha de frente foi pouco desenvolvido teoricamente e pouco estimado empiricamente (Guul; Pedersen; Petersen, 2021), e ainda não se chegou a um consenso sobre as representações sociais envolvidas nestes julgamentos, especialmente sobre quem é o usuário merecedor, fácil e difícil (Gofen; Sella; Gassner, 2019).
Aspectos organizacionais
Agentes implementadores atuam em equipamentos de nível de rua, onde a intervenção é realizada com certa autonomia na realização das tarefas e dificuldade de gestão direta (Gofen; Sella; Gassner, 2019). As características destas organizações regulam ou delimitam os repertórios de ação dos trabalhadores na implementação e influenciam a escolha dos cursos de ação dentro das condições presentes (Lotta, 2015).
Fatores organizacionais podem ser diversos. Um deles são as condições de trabalho incertas e conflitivas comuns na linha de frente, com regras organizacionais ambíguas, contraditórias (Harrits; Møller, 2014; Hupe; Hill, 2007; Lipsky, 2019) ou excessivas (Evans, 2013); recursos insuficientes (Hupe; Buffat, 2014); incertezas informacionais (Raaphorst, 2018) e sobrecarga de trabalho e de casos a se atender (Brodkin, 2011; Lipsky, 2019; Thomann, 2015). Por exemplo, a ausência de treinamentos orientadores e a percepção da insuficiência de recursos afetam o exercício da discricionariedade de profissionais de saúde (Lima; D’Ascenzi, 2017).
As normativas e os documentos orientadores que guiam a implementação são geralmente falhos em nortear o que os BNR devem fazer, levando-os a buscar mecanismos para simplificar o trabalho e influenciando o que se faz no nível de rua (Hupe; Hill, 2007; Lipsky, 2019). O nível de conflito e de ambiguidade dos objetivos e meios de uma política pode levar a distintos tipos de implementação (Matland, 1995), e a maior ou menor programabilidade das tarefas e da necessidade de interação com os usuários também são importantes para definir as dinâmicas de implementação (Nogueira, 1998).
Elementos gerenciais, como o nível de controle e de centralização da chefia e seu modo de gerenciar mais ou menos flexível (Evans, 2013) e a adoção de mecanismos de incentivo ao desempenho (Brodkin, 2011), também são fatores que influenciam a ação dos BNR. Por exemplo, em equipamentos de oferta de serviços de saúde com maior controle do trabalho, onde as regras são mais aplicadas, as equipes trabalham integradas e os gestores acompanham os agentes de perto, há menos espaço para a discricionariedade e menor variação de práticas (Lotta, 2015; Lotta; Marques, 2020).
Assim, as configurações organizacionais do trabalho no nível de rua delimitam as possibilidades de ação dos BNR, levando-os a fazer escolhas, a realizar suas práticas de formas diversas e com distintos níveis de desempenho. Em cada contexto de implementação haverá fatores organizacionais específicos, que podem ampliar ou reduzir o exercício e o espaço para a discricionariedade.
O Quadro 1 sistematiza os diversos fatores que influenciam a atuação dos BNR revisados.
Nota metodológica
Os dados utilizados nesta pesquisa resultam de oito meses de trabalho de campo em um dos nove Creas de Belo Horizonte entre 2021 e 2022. A seleção do caso utilizou o Índice de Desenvolvimento das Unidades Creas (Idcreas) de 2017, último ano disponível no momento desta etapa da pesquisa. O Índice avalia a qualidade da gestão destes equipamentos nas dimensões: estrutura física, serviços e recursos humanos, em uma escala de 1 (mais distante do ideal) a 5 (mais próximo do ideal). A média do Idcreas dos nove Creas de Belo Horizonte em 2017 foi de 3,26. O escolhido seria aquele mais próximo da média, evitando vieses relativos ao bom ou baixo desempenho no indicador, mas dois equipamentos apresentaram a mesma nota (3,17). Foi realizado um sorteio entre eles, chegando, por fim, ao Creas selecionado,4 onde 13 técnicas compunham a equipe de referência do Paefi e 11 aceitaram participar da pesquisa.
O trabalho de campo envolveu a realização de 11 entrevistas com BNR,5 3 com gestores do serviço e 2 com usuárias, além da sistematização em notas de campo de 13 atendimentos de usuários e de 12 reuniões de equipe observadas diretamente.6 Todo esse material foi sistematizado e codificado manualmente no ATLAS.ti, sem o uso de ferramentas de automação. Além disso, foram utilizados dados de 29 Prontuários de casos, disponíveis no arquivo morto do Creas até a data de corte da coleta de dados.7 Foram utilizados também registros administrativos do Sistema de Gestão de Políticas Sociais (SIGPS) da Prefeitura de Belo Horizonte. Esses relatórios e documentos foram lidos e digitados em um arquivo Excel, destacando as principais características do acompanhamento realizado, à luz das perguntas de pesquisa.
A sistematização dos dados coletados empregou o procedimento de codificação descrito por Domenico (2020). Inicialmente, realizou-se uma leitura exaustiva dos arquivos no software, identificando palavras, expressões, termos ou segmentos de textos relacionados aos fatores de influência sintetizados na revisão de literatura (Quadro 1), mas também buscando outros aspectos a partir do caso pesquisado. No segundo nível de codificação, os códigos iniciais foram agrupados em categorias por afinidade temática em relação ao tipo de fator de influência (por exemplo, fatores individuais, fatores profissionais, condições, rotinas, fluxos e recursos organizacionais, informações sobre o público atendido). No terceiro nível, os códigos foram reunidos nas categorias conceituais “características das agentes do Paefi”, “aspectos organizacionais do Creas” e “descrição dos usuários atendidos”. A análise posterior concentrou-se nas citações dessas categorias conceituais, identificando e interpretando, em seu conteúdo, padrões de associações entre os fatores e a atuação das técnicas do Paefi. Vale ressaltar que, em função do tipo de estudo de caso, as análises são válidas apenas para o contexto do caso pesquisado.
Como características das técnicas, foram considerados os seguintes elementos e atributos: i) fatores relacionais (engajamento dos agentes em grupo sociais e suas relações interorganizacionais, trabalho em equipe, relação com pares, gestores e rede socioassistencial); ii) fatores profissionais (profissão das técnicas, seus códigos e lógicas de trabalho, trajetória e motivação). Os aspectos relacionais foram identificados na observação direta da implementação e nas entrevistas. Também o foram os aspectos profissionais, com perguntas sobre a trajetória profissional e motivação das trabalhadoras, e pela interpretação de relatos de casos.
As características dos usuários, suas necessidades e demandas, e seus comportamentos foram identificados nos relatos dos casos dos Prontuários de Acompanhamento e nas entrevistas com as técnicas e usuárias. Os aspectos organizacionais referem-se às orientações e normativas sobre o serviço, às condições gerais de trabalho e ao arranjo local de implementação do Paefi. Eles foram identificados especialmente nos dados das observações das reuniões semanais da equipe de referência e nas entrevistas, em perguntas sobre os desafios da implementação do serviço.
A influência dos três conjuntos de fatores nas práticas e esquemas de categorização construídos foi interpretada a partir dos dados coletados. Ao mobilizar a literatura e considerar que a natureza do serviço prestado pelo Paefi, fundamentada na intensa interação entre funcionário/cidadão, leva à necessidade de construir alternativas assistenciais específicas para cada caso, essa análise partiu do seguinte pressuposto: as práticas implementadas e os esquemas de categorização do público construídos pelos BNR no serviço são influenciados pelos três conjuntos de fatores, ressaltando a complexidade envolvida no exercício discricionário destes agentes na linha de frente.
Análise de dados
Nesta seção, os achados da pesquisa serão apresentados, primeiro no que se refere à atuação das BNR pelas práticas realizadas e esquemas de categorização do público construídos e, na sequência, aos fatores que influenciam a atuação mais geral das agentes no processo de implementação do Paefi.
Como as técnicas do Paefi realizam as práticas?
Um dos elementos constituintes da atuação das burocracias do nível de rua são as práticas, atividades que os burocratas do nível de rua desenvolvem e que podem indicar formas próprias de fazer as coisas na sua rotina, ou de exercer sua discricionariedade, administrando os recursos à sua mão e interpretando as regras e orientações da política. Esses padrões habituais de execução das tarefas são, para os burocratas, a forma mais adequada - ou possível - de se fazer o trabalho dentro das restrições (Hupe; Hill, 2007; Lipsky, 2019).
As práticas previstas para implementação do Paefi são: a acolhida com escuta qualificada e avaliação interdisciplinar do caso, atendimentos individuais, coletivos (oficinas de arte-educação), acompanhamento socioassistencial (visitas, atendimentos remotos e presenciais, orientações sociojurídicas, encaminhamentos), articulação com a rede de serviços e discussão de casos (Brasil, 2011, 2016; Belo Horizonte, 2020). Ao observar a ocorrência delas na implementação concreta do Paefi pesquisado, observou-se que a atuação das BNR é alinhada às normativas.
De todas as 25 práticas previstas, apenas oito não foram mencionadas em entrevistas, nas observações de campo ou prontuários. Apesar disso, a estrutura normativa do Paefi não elimina a discricionariedade das técnicas, que usam o espaço reduzido, mas existente, escolhendo o que não fazer (como as atividades coletivas) ou interpretando as situações e características do caso para construir uma maneira de fazer o acompanhamento.
Elas combinam diferentes práticas previstas, iniciando com a acolhida, quando escutam os problemas e necessidades, para pactuar com as famílias o plano de acompanhamento. Elas parecem compor o processo com três práticas mais ocorrentes: i) atendimentos - conjunto de perguntas para verificar o estado dos usuários e o cumprimento dos combinados; ii) visitas domiciliares - para ampliar a visão da família e da dinâmica domiciliar; e iii) encaminhamentos - oferta objetiva do Paefi que se refere à destinação das famílias para outros serviços públicos (matrícula na escola, atendimentos no posto de saúde; processos judiciais no Centro de Defesa de Direitos; estágios e programas de aprendizagem etc.). Tais práticas são ainda dialogadas e construídas com a rede nas atividades de articulação e com a coordenação local na reunião de discussão de casos. Tendo realizado um conjunto de atividades e interpretado “à medida” que a família deu conta de responder ao processo, as técnicas seguem para o encerramento do caso, geralmente na reunião de gestão de casos com a coordenação. As seguintes citações evidenciam esses achados:
Eu vou pegar o roteiro ali, o que eu vou implantar para essa família. Fez, não fez? E o próximo passo, então eu vou pactuando com ela, “olha, a gente já fez isso, isso aqui você já deu conta de fazer, isso aqui tá [sic] faltando, então vamos pensar quando você pode fazer”. E ali também eu já vou propondo para família o que a gente pode pensar mais para este acompanhamento (Entrevista 02).
E aí a gente faz o acompanhamento, que é a visita, os atendimentos individuais, dentro do acompanhamento nosso, dentro da realidade do Paefi, o contato com a rede, ele é muito maior que o contato com a própria família. Então a gente precisa fazer essa articulação muito exaustivamente (Entrevista 05).
O acompanhamento não é só atendimento, é articulado com rede, com outras políticas públicas, é visita (Entrevista 06).
Assim, embora guiadas pelas orientações do serviço, as técnicas desenvolvem um “jeito de fazer” próprio, ajustando a lista de atividades às necessidades observadas. Isso reflete a visão jurídica da discricionariedade de Hupe (2013), onde a interpretação das normas orienta a escolha das ações mais relevantes para se implementar uma política pública.
Também foram identificadas duas práticas não previstas: “investigar” e “responder” sobre os casos. Assim, as BNR nomeiam, respectivamente, as práticas de apuração de casos com informações insuficientes e de prestação de informações, depoimentos sobre os casos que acompanham para os órgãos do sistema de justiça. Embora o protocolo do Suas esclareça que a averiguação de denúncia não é competência das técnicas, e que sua participação em oitivas para fins judiciais é proibida, as BNR descrevem tais atividades como fora do escopo técnico socioassistencial e, por isso, denotam práticas não previstas, à luz das evidências a seguir:
É assistência social, não é nosso papel investigar. Às vezes eu penso que eu sou uma policial civil, porque essa intimação, que vem esse discurso “não é pra investigar, mas você tem que ir lá ver se está tendo isso mesmo pra você investigar” (Entrevista 06).
E chamam para responder sobre relatórios, a gente não tem suporte quase nenhum da prefeitura, a gente dá a cara a tapa lá sobre isso [...] inclusive respostas que não são nossas. A gente tem [o órgão central de relação com o SGD] para filtrar isso, para dar uma tratativa, mas a gente recebe caso sem nome pra poder atender. Então eu não sei até que ponto que isso está funcionando, sabe (Entrevista 05).
Portanto, as BNR do Paefi pesquisado aderem, em grande parte, à lista de atividades previstas. As poucas escolhas e adaptações e o “roteiro” comum para tocar o acompanhamento expressam algum uso do espaço de discricionariedade, mas suas práticas tendem mais para a padronização do que para a divergência.
Quais esquemas de categorização dos usuários as técnicas mobilizam?
Como mencionado, a categorização do público pelos BNR é uma de suas tarefas centrais (Lotta, 2019) para controlar os conflitos das condições de trabalho. As categorias oficiais estabelecem uma categorização no âmbito das práticas administrativas e que reflete os critérios de elegibilidade. Porém, a dimensão social desse processo de ordenamento, comparação e alocação dos cidadãos em categorias administrativas de acesso não é automático e inequívoco, pois deixa espaço para a criação de outras categorias, baseadas em critérios particulares adotados pelos burocratas diante de usuários de carne e osso com situações específicas. Portanto, a categorização do público-alvo das políticas públicas é resultado tanto de uma decisão política ou normativa, quanto dos julgamentos morais dos próprios BNR, sendo reproduzidos na interação com o público e (re)construídos nos limites das categorias formais (Maynard-Moody; Musheno, 2003).
A atuação das técnicas do Paefi analisada pelos esquemas de categorização demonstrou que quando elas se deparam com pessoas e situações reais, acionam dois esquemas de categorização comportamental: o do usuário “resistente-aderente” (já identificados em estudos correlatos); e, o do usuário “organizado-desorganizado”, ainda pouco observado em estudos sobre BNR.
A expectativa comportamental de que a família participe ativamente do Paefi e, mais, que o coproduza com as técnicas, é considerada para classificá-los em “aderentes” ou “resistentes”. Os primeiros são os que criam vínculo, cumprem os encaminhamentos e se conectam com a BNR. Os “resistentes” são vistos como desconfiados, agressivos, não estabelecem vínculo e não se abrem, sendo considerados “difíceis” de trabalhar. Portanto, a motivação e o engajamento no serviço são os atributos dos usuários julgados para essas categorizações.
O segundo esquema segmenta o público a partir do julgamento dos comportamentos frente à sua própria condição de violação. São categorizados idiomaticamente pelas técnicas como “organizados” ou “desorganizados”. O primeiro se comporta de forma ativa perante às suas condições, conscientizando-se de seus atos, mudando certas atitudes ou tomando providências para se tornar protetivo e superar a violação. Algumas atitudes dos “organizados” são mais objetivas: “arrumar um especial” para o filho ir à escola, “levar o idoso para passear”, passar a “escutar” a família, “romper com a relação abusiva”, “ter regras” de convivência. Mas há descrições comportamentais menos concretas, como “descobrir formas” de administrar o cuidado, “fazer um movimento”, “conseguir compreender” e fazer um “corte nesse ciclo de violação”. Já o usuário “desorganizado” age diferente: “não fala com ninguém” em casa, “não faz favor para o outro”, “não consegue formular uma pergunta”. Assim, essa classificação é acionada para representar os usuários em termos de sua capacidade de realizar mudanças comportamentais para superar a violação de direitos. As citações a seguir evidenciam as categorizações:
São as famílias que não compreendem muitas vezes o porquê do encaminhamento. A família com resistência ela não se abre, ela não quer falar. Agora, uma família que não está disposta, a gente tem que o tempo todo estar buscando estratégias de comunicação com essa família (Entrevista 04).
A família que adere normalmente te recebe nos atendimentos, nas visitas, ela vai até o Creas, os encaminhamentos que você faz, ela tende a cumprir os encaminhamentos, esse trato com a família é mais tranquilo e bem mais fácil (Entrevista 08).
A organização é quando há o rompimento da relação abusiva, ou resolve com o irmão como acolher o idoso, quando a gente percebe que a criança não estava indo para a escola e está, não estava indo no posto e agora está, aí a família foi se organizando mais (Entrevista 09).
Mas pode ser uma família super desorganizada, que ninguém fala com ninguém, uma família que ninguém interage, ninguém faz favor um para o outro, não convive, não se fala. Aqui é muito comum encontrar a família tão desorganizada que ela não consegue formalizar uma demanda, ela não consegue falar para você o que ela está sentindo, ela não consegue dizer “estou bem” (Entrevista 07).
Portanto, nas interações com os usuários, as técnicas atuam usando categorias comportamentais para classificar o público julgando atitudes que os diferenciam como “resistentes” versus “aderentes”, “organizados” versus “desorganizados”. As classificações revelam a atuação das técnicas como agentes, ou o exercício de sua discricionariedade sociológica (Maynard-Moody; Musheno, 2012), ao operarem julgamentos dos comportamentos de motivação e capacidade de superar as violações, envoltos em estereótipos de normalidade e de público dependente.
Mas o que influencia as práticas das técnicas e os esquemas de categorização dos usuários construídos por elas? Essa resposta é apresentada na próxima seção.
A influência do conhecimento profissional das técnicas e de suas relações internas
No geral, o grupo de técnicas pesquisadas tem trajetórias profissionais similares, (experientes, com pouco engajamento social ou comunitário). As características profissionais que mais variaram no conjunto das BNR foram o tempo de atuação no serviço, a profissão e a satisfação com o trabalho. Constatou-se que das 11 técnicas, seis atuavam no Paefi há até quatro anos e cinco delas de quatro a oito anos. Essa é a mesma proporção entre técnicas motivadas (seis) e desmotivadas (cinco). Em relação às profissões, seis eram assistentes sociais, três psicólogas, uma advogada e uma artista. A motivação pareceu maior entre as técnicas com menos tempo de trabalho no serviço e as psicólogas foram, proporcionalmente, mais desmotivadas que as assistentes sociais.
Foram feitos exercícios para verificar se essas características profissionais poderiam estar associadas a diferenças de sua atuação, mas o cruzamento destas características individuais com as práticas de acompanhamento não se mostrou adequado em termos analíticos para este caso, porque, como mencionado, pelas práticas, as técnicas atuam de uma maneira aderente às normas e de forma padronizada ao fazer o acompanhamento dos casos. Mesmo os cruzamentos entre as características do perfil profissional que variavam (profissão, satisfação e tempo de atuação) e os dois esquemas de categorização identificados não indicaram resultados relevantes.
Não havendo achados expressivos na análise das diferenças individuais da atuação das técnicas segundo profissão, tempo e satisfação profissional, buscou-se identificar se estes aspectos e os demais fatores considerados (relacionais, atributos dos usuários e aspectos organizacionais) influenciavam, de forma geral, as práticas e os esquemas de categorização de usuários.
O que se descobriu sobre a influência do conhecimento profissional no comportamento das técnicas é que elas compartilhavam uma orientação socioassistencial para o trabalho que diluía as especificidades da formação profissional. Ainda assim, articulavam saberes específicos de suas profissões para realizar certas práticas na implementação do serviço, na mesma direção de outros estudos (Harrits; Cecchini, 2019; Pires; Santos, 2021). A citação adiante evidencia essa consideração:
Esse cargo nosso você não é assistente social e nem é psicólogo, é um cargo técnico, você é analista de política pública, é claro que a sua formação profissional afeta o seu olhar sobre os casos, mas não existe uma unidade de serviço social aqui dentro (Entrevista 06).
Essa influência da orientação socioassistencial revelou-se de duas formas. Primeiro, na utilização da expressão “terapêutico”, típica do campo de conhecimento da psicologia clínica, aplicada justamente por duas das três psicólogas entrevistadas para caracterizar parte do trabalho de acompanhamento realizado no Paefi. Segundo, nas referências típicas do campo do conhecimento do serviço social utilizadas diversas vezes por uma das assistentes sociais, para indicar os limites - associados à digitalização dos serviços públicos - e possibilidades de o Paefi contribuir com a superação da situação de violação de direitos da família, que passa pela “inclusão social” e o “emprego”. Os trechos abaixo ilustram essas considerações:
É meio que a gente fala na psicologia que aqui é assistência social mas não tem jeito, essa aliança terapêutica que você cria sendo psicóloga, sendo assistente social [...], fazer um quebra gelo, pra depois, quando a pessoa, quando ela estar se sentindo bem [...], aí ela vai falar um pouco de si e construir o plano (Entrevista 07).
Eu tinha que entender a relação dessa vó com essa mãe, porque que essa mãe agia com essas meninas dessa forma e aí ia tentando pontuar para cada um o lugar delas, o que elas estavam fazendo para melhorar essa relação [...]. Às vezes surte efeito, às vezes não, é bem terapêutico, não deixa de ser (Entrevista 03).
A terceirização, precarização, e ainda tinha essa questão da plataforma digital que entrou, o capital incorporou tanto a tecnologia, quer dizer robôs, internet, que não tem espaço para o trabalho humano. É claro, vai ter porque o capital ganha em cima da exploração do trabalho. A exclusão digital, quantas crianças de famílias que eu acompanho que não tem internet, que a mãe não tem celular (Entrevista 06).
Já as relações interorganizacionais que mais afetavam a realização de práticas pelas técnicas foram as estabelecidas entre elas mesmas e com a rede socioassistencial, o que reforça a importância da “microrede de relações múltiplas” em que os agentes da linha de frente fazem o seu trabalho (Hupe; Hill, 2007). À luz de estudos revisados (Maroulis, 2017; Siciliano, 2015), a relação com as colegas é considerada para pedir ajuda para discutir dúvidas, dificuldades e condução de caminhos possíveis nos casos acompanhados, ou para sanar questões jurídicas específicas, bem como para atividades coletivas com a arte-educadora. À exemplo, em um atendimento presencial observado no Creas, uma técnica contatou a orientadora jurídica para obter orientações sobre um processo de pensão relacionado a uma usuária adolescente. A orientadora, de forma solícita, explicou que se tratava de uma ação simples, que exigia alguns documentos, a autorização dos pais e o posterior encaminhamento à defensoria pública (Atendimento observado 10).
Com a rede socioassistencial, a relação demostrou ser fundamental para as técnicas, seja para interpretarem a situação dos usuários na avaliação preliminar do caso, para decidir os encaminhamentos ou discutir o caso. A relação com a rede no nível de rua do Paefi traz uma dimensão cognitiva para a realização das práticas: compreender, em conjunto com outros profissionais, a família, discutir o caso, pensar em estratégias, é visto como algo bastante positivo e necessário para atuar no serviço, ainda que haja limitações de recursos, conforme evidenciam as seguintes citações:
A gente faz discussão de caso, a gente discute com a rede, é bom, uma forma também que a gente tem de conhecer a família (Entrevista 05).
A gente tem apoio muito grande, apoio e retorno muito grande do NIR, que é o Núcleo Intersetorial Regional, a gente pauta um caso, quando você precisa de alguma interlocução com a rede, o que a rede está fazendo, até para evitar fazer trabalho, o retrabalho e a gente tem um retorno muito bom (Entrevista 07).
A criança está fora da escola, cadê a vaga na creche? Não tem. Cadê a vaga na escola integrada? É uma luta para você conseguir (Entrevista 06).
Em resumo, não se observou significativas influências da profissão na atuação das técnicas em termos de variações individuais. Elas compartilhavam uma orientação socioassistencial comum para o trabalho, mas pareceram articular saberes específicos de sua formação profissional para caracterizar a prática de acompanhamento na implementação do serviço. Já as relações internas influenciaram certa lógica de construção coletiva da atuação das BNR, com troca de informações, conhecimentos e definição de estratégias entre elas e outros burocratas da rede socioassistencial. Isso traz à tona o fundamento político da intersetorialidade, ou seja, a sua incorporação concreta ao desenho das políticas públicas (Grau, 2014).
A influência do contexto organizacional
A pesquisa revelou que o contexto organizacional de implementação do Paefi é caracterizado por um trabalho complexo, pela sobrecarga de demandas, com fila de espera de casos para acompanhamento constante, por recursos considerados insuficientes, e pela escassez de alguma regulação de fluxos de trabalho e encaminhamentos para a rede e sistema de justiça. O arranjo local de implementação do Paefi prevê a participação de um conjunto de atores e de dinâmicas relacionais para o caso entrar e sair do serviço, operando com um movimento em cadeia com quatro momentos (inserção do caso, destinação para técnicas, acompanhamento sistemático do caso e desligamento formal), com dinâmicas de funcionamento e de participantes específicos a cada um deles. Por todo esse contexto, supõe-se que as técnicas do Paefi façam interpretações e realizem decisões discricionárias para lidar com as pressões e as circunstâncias percebidas como incertas e inadequadas. Esse contexto de atuação das técnicas pesquisadas é um elemento comum a todas elas. Mas o comportamento geral no processo de implementação do serviço parece ser influenciado por três conjuntos de fatores organizacionais: i) a estrutura normativa da política; ii) as condições de trabalho; e iii) e o próprio arranjo local de implementação.
A densa normatização do Paefi, expressa na extensa lista de práticas previstas para a implementação, é realizada pelas técnicas de forma bastante aderente às orientações, havendo pouca divergência entre o previsto e o realizado na linha de frente. Essa estrutura normativa limita a atuação discricionária das agentes pela realização das práticas, mas não a elimina, pois elas escolhem o que não fazer dentro das opções e combinam as práticas previstas às possibilidades reais dos casos, construindo um como fazer o acompanhamento a partir da interpretação das condições de entrada e de saída dos usuários. Uma possível explicação para isso é a natureza pouco programada (Nogueira, 1998) do acompanhamento, que traz ambiguidade aos meios de implementação (Matland, 1995), pois cada caso é um caso, e parece abrir o espaço de discricionariedade circunscrito pelas normas.
Sobre as condições de trabalho, destaca-se a sobrecarga laboral, que parece estar relacionada à priorização de determinadas atividades a despeito de outras, especialmente a não realização de atendimentos coletivos e a resistência de se realizar atendimentos por demanda. A percepção de insuficiência de fluxos de trabalho mais claros com a rede e o sistema de justiça geram dúvidas sobre os encaminhamentos a se realizar, trazendo incertezas e demandas de capacitação específicas.
Por sua vez, o arranjo de implementação influencia a atuação das técnicas porque os casos encaminhados pelos órgãos do sistema de justiça levam-nas à prática de investigar e responder o caso. Outras duas evidências sugerem o intercruzamento deste aspecto organizacional com as relações internas das BNR, influenciando de forma agregada a sua atuação. Primeiro, a prevista (e necessária) relação com a rede leva às práticas de encaminhamento. Segundo, no desfecho formal do caso, que é realizado conjuntamente pelas técnicas e a coordenação, na qual retoma-se o acompanhamento e apresenta-se justificativas para a decisão, baseadas em interpretações da capacidade de resposta da família ao acompanhamento. As citações a seguir ilustram essas influências:
Aí, eu penso no acompanhamento propriamente dito, isso inclui conseguir a vinculação da família, pensar o acompanhamento como vai se dar, as articulações que são feitas com a rede e é uma coisa que toma muito, porque às vezes quando se fala do acompanhamento no Paefi as pessoas restringem o trabalho ao atendimento (Entrevista 03).
Quando a gente entrou, teve uma reunião uma vez em que uma gestora veio falar do trabalho que está escrito. E o que está escrito é o que está ali nas normas, só para todas as normas você tem que definir fluxos, e isso ainda falta muito (Entrevista 05).
Teve um caso que eu peguei que era um boletim de ocorrência. Encaminhado pela Promotoria, a partir de um boletim de ocorrência, aí falei assim: “é, virei polícia mesmo” (Entrevista 02).
A influência dos atributos dos usuários
O perfil geral dos usuários pesquisados aponta o acompanhamento majoritário a idosos, seguidos de crianças e adolescentes, vítimas de violências e negligência (Tabela 1), encaminhados pelos órgãos de defesa de direitos e do sistema de justiça.
Algumas práticas e, especialmente, a construção de esquemas de categorização, são, de modo geral, influenciados por atributos dos usuários. Os encontros no nível de rua do Paefi são processos de coprodução pelos burocratas e o público, o que requer estabelecer consentimentos e acordos. Neste sentido, a motivação dos usuários face a esses acordos é determinante para o desenrolar do acompanhamento, ou seja, para decidir a próxima atividade ou o encaminhamento a ser dado - e a classificação do usuário como “aderente” ou “resistente”.
Por exemplo, se o usuário resolveu a pendência na receita, o próximo passo é dar a entrada no pedido do BPC, como observado em um atendimento. Se o usuário é pouco motivado e classificado como “resistente”, as técnicas decidem realizar visitas para compreender a “dinâmica” familiar. Também se o usuário “não atende”, elas fazem o contato com a rede para tentar outras vias de adesão. Isso revela uma lógica de atuação, dentro do caso, em que a motivação do usuário afeta a realização de certas práticas (visitas, contato com a rede), interligadas à categorização “resistente”. Essa lógica expressa a realização de julgamentos pelas técnicas sobre o que é ser ou estar motivado ou “resistente” para dar um próximo passo ou para desligar o caso.
Já a capacidade dos usuários de lidar e superar os seus problemas é outro comportamento considerado na classificação do usuário “organizado”, mas também é fonte para as interpretações e decisões tomadas no momento do desfecho do caso. Por exemplo, no caso de uma adolescente encaminhada pelo Conselho Tutelar como vítima de exploração sexual, a técnica ofertou um conjunto básico de práticas (atendimento remoto, atendimento individual e contato com a rede) e relatou que, durante o acompanhamento, mãe e filha “negaram a exploração sexual” e mostraram “forte vínculo” entre si. Nos últimos atendimentos, afirmaram que “os filhos estavam matriculados e realizando as atividades escolares”. Esses comportamentos parecem ter levado a técnica a interpretar que “a situação familiar está estável e a genitora busca oferecer um ambiente propício e protetivo para o desenvolvimento dos filhos”.8 O caso real indica que, ao interpretar a situação da família e julgar que ela foi capaz de se mostrar organizada, a técnica decidiu pelo desligamento do serviço.
Para além da motivação e da capacidade dos usuários, outras características influenciam a atuação. De saída, é de se esperar que a faixa etária defina certas práticas - como os encaminhamentos. Por exemplo, algumas entrevistadas relataram e observou-se em um atendimento que, quando o público é infanto-juvenil, as técnicas verificam a situação escolar para avaliar a necessidade de algum contato com a instituição. Se a usuária é mulher em situação de violência, embora haja dúvidas sobre os fluxos de ação, haverá encaminhamento para Centros de Defesa especializados, como discutido em reuniões observadas. Se é idoso e a técnica observa que há dependência de cuidados especializados no domicílio, ela desliga o caso e encaminha para o serviço especializado para esse tipo de público como identificado em casos dos Prontuários. Assim, a etapa do ciclo de vida do usuário relaciona-se a certos tipos de práticas de encaminhamento. Para atender a condição objetiva da idade, as técnicas articulam escolhas dentro do espaço de discricionariedade das práticas disponíveis, respondendo quase automaticamente a elas.
Nesta mesma direção, as demandas que os usuários apresentam ao longo do acompanhamento também afetam as práticas de encaminhamento, especialmente se são demandas mais objetivas, isto é, relativas a acesso ou recebimento de serviços e benefícios. Por outro lado, quando os usuários param de apresentar demandas deste tipo, as técnicas parecem interpretar que as possibilidades de intervenção “esgotaram-se” e isso pode ser importante para o desligamento do caso.
Por fim, as condições físicas de saúde e mobilidade dos usuários somam-se a estas considerações. Para algumas técnicas, se o usuário é uma pessoa idosa e “acamada” ou tem dificuldades de “deslocar-se” até a regional, elas escolhem realizar visitas, ou, quando o deslocamento não é um impedimento, o atendimento presencial no Creas é realizado. Os excertos do Quadro 2 evidenciam as associações entre atributos dos usuários e a atuação das técnicas:
A influência dos atributos dos usuários também pode ser explorada a partir de seu intercruzamento com os outros fatores considerados. A orientação socioassistencial que as profissionais compartilham e que as fazem atuarem mais como técnicas do que como assistentes sociais ou psicólogas agrega-se aos comportamentos (motivação e capacidade de resposta) dos usuários influenciando a atuação das técnicas. Neste caso, os dois fatores agregados são determinantes tanto para a prática de pactuar o Plano de Acompanhamento, quanto para a nomeação dos usuários como “aderentes-resistentes” e “organizados-desorganizados”. Isso porque, como visto, os comportamentos dos usuários são avaliados pelos BNR para dar o próximo passo e para julgar a sua capacidade de realizar “movimentos” que levem à superação da situação de direitos e com isso, ao seu processo de “organização”.
Essas expectativas são ancoradas em duas orientações operacionais dos serviços socioassistenciais do Suas: i) a família como núcleo básico de intervenção, que pode ser fortalecida com os serviços e proteger e cuidar de seus membros (Brasil, 2012); ii) a necessidade de participação ativa dos usuários no processo de acompanhamento para a “dinâmica processual” e quase nunca acabada, da superação da violação de direitos (Carmona, 2019).
Assim, aqueles que aderem e se tornam capazes, ou seja, “organizam-se”, são desligados do Paefi, podendo ser encaminhados para outros serviços quando seguem apresentando alguma vulnerabilidade. Com os “resistentes” e os que não se organizam, por outro lado, elas seguem, ou como dizem, “insistem” no acompanhamento, o que sugere uma diferenciação positiva dos casos pelas técnicas e prática de implementação convergente aos objetivos do Paefi. Insistem até que a família se recuse a seguir adiante, ou até se “esgotarem as possibilidades” de intervenção.
As falas a seguir ilustram como os esquemas de categorização são influenciados, de forma agregada, pelos seus comportamentos e pela orientação socioassistencial compartilhada pelas BNR:
na assistência social, se a família não comparece ao atendimento você faz busca ativa, você vai na casa, você busca, insiste, você manda telegrama, você tenta contato telefônico, você faz uma visita domiciliar na tentativa de sensibilizar uma pessoa para ela compreender que você está ali enquanto assistência social (Entrev_Tec.06).
Eu tentei as intervenções e a família não está aderindo à intervenção é um motivo para desligar o caso, esgotou as possibilidades intervenção, a gente desliga. Ou esgotamento de um caso em que vejo que a idosa estava numa situação de risco, mas no acompanhamento o que eu percebi não é uma idosa que sofre violência, maus tratos, está super bem cuidada (Entrev_Tec.01).
Desliga quando a gente observa que aquela família já conseguiu ter uma compreensão da situação que gerou aquela inserção no serviço, talvez não quer dizer que aquela situação não vai ocorrer mais, mas que a pessoa conseguiu fazer uma leitura e ela conseguiu se organizar de forma que ela hoje vivencia, como eu diria, ela tem uma vivência diferente daquela que chegou para a gente (Entrev_Tec.04).
Já a idade dos usuários agrega-se com os conhecimentos profissionais das técnicas, oriundos de suas formações em psicologia e serviço social, conduzindo a prática mais específica de mediação da interação das técnicas com os usuários nos atendimentos. Isso se revela na utilização de dinâmicas e de recursos pedagógicos, à exemplo do desenho com crianças, jogos lúdicos com adolescentes, ilustrados pelas citações que seguem:
Eu gosto muito de usar o genograma, que é um gráfico que a gente faz, é um desenho que eu vou fazendo com a família, para ela, por exemplo, “oh, me conta a história, como que é a sua família, desde os seus avós, o que você sabe, onde que surge a violência” (Entrevista 06).
Crianças e adolescentes, às vezes a criança usa desenho ou algum brinquedo, a gente tinha uma brinquedoteca, que agora foi desativada, usava algum elemento para poder fluir alguma conversa. Adolescente, tento, no meu conhecimento mínimo de coisas atualizadas, trazer algum assunto que seja do interesse deles, buscar gostos, o que que eles gostam, conhecer a vivência (Entrevista 03).
Em suma, o comportamento mais ou menos motivado e ativo frente ao que se pactua no acompanhamento é fundamental para se decidir o passo a passo, os encaminhamentos, quando visitar a família e se soma à orientação socioassistencial, para definir o usuário “resistente” e insistir com o caso. A motivação dos usuários também é um atributo importante para o comportamento dos BNR, à luz de Tummers (2017), Møller (2016), Guul, Pedersen e Petersen (2021).
Já os comportamentos dos usuários julgados com movimentos para a superação das violações (matricular o filho na escola, melhorar o autocuidado, conscientizar-se da violência sofrida ou praticada, criar vínculos afetivos) parecem ser determinantes, junto com a lógica profissional socioassistencial, para classificar o usuário “organizado” podendo levar ao desligamento do caso. Atributos pessoais, como ser idoso, criança ou adolescente e o tipo de demandas trazidas por eles, especialmente aquelas mais concretas e relativas à acesso a serviços e benefícios, são considerados pelas técnicas para a proposição dos encaminhamentos e para mediar a relação com recursos pedagógicos. Condições físicas, mobilidade e saúde são consideradas para realizar visitas domiciliares ou atendimentos presenciais no Creas.
O quadro 3 sistematiza os achados sobre a relação isolada e agregada entre os atributos dos usuários e as práticas e esquemas de categorização do público na implementação do Paefi pelas BNR.
Por fim, ainda que não seja o foco deste artigo, caberia explorar as implicações da atuação das técnicas nos objetivos do Paefi ou nos processos de reprodução das desigualdades imbricados na linha de frente da implementação. Nessa linha, para fins de registro, a pesquisa cujo recorte apresenta-se neste artigo também identificou os processos de diferenciação de tratamento dos usuários engendrados em suas práticas e nos esquemas de categorização. Observou-se que, conforme o tipo de usuário acompanhado, as técnicas selecionam os casos para insistir ou desligar. Casos de “resistentes” são escolhidos para insistir, seguindo a orientação socioassistencial do Suas. Casos de “organizados” são selecionados para desligamento, porque foram capazes de superar as violações, podendo ainda ser encaminhados a outros serviços da rede se ainda apresentarem vulnerabilidade. Nestes casos, as diferenciações parecem ser positivas e indicariam uma atuação voltada aos objetivos do serviço e com menos riscos para reprodução de desigualdades (Assis, 2023).
Considerações conclusivas
Por se tratar de um estudo de caso único, com poucas técnicas, com perfil relacional de engajamento em grupos sociais homogêneo, além da constatação da atuação padronizada em termos de práticas realizadas, a análise das influências das características das técnicas na variação de sua atuação não se mostrou adequada. Os exercícios realizados associaram profissão, tempo de serviço e satisfação profissional com os esquemas de categorização e não se verificou variações relevantes.
Mas diante da impossibilidade de se concluir categoricamente sobre a inexistência de influência dos fatores profissionais ou destas sutis influências, empreendeu-se um esforço interpretativo de associação das relações internas, dos atributos dos usuários e elementos organizacionais com a realização de práticas e mobilização dos esquemas de categorização social dos usuários, buscando compreender como eles influenciam o comportamento mais geral no processo de implementação do Paefi.
Esse esforço evidenciou que o saber especializado das profissões de assistente social e psicólogo parece se diluir aos princípios do campo de intervenção socioassistencial construído para o Suas, mas, ainda assim, são utilizados como referências por elas para atuar no serviço. Além disso, a ação das agentes ocorre em um contexto bastante coletivo, em que decisões são tomadas em equipe, com a gestão local e em rede, cuja capacidade de oferta também parece ser fundamental para as práticas no nível de rua. O mesmo pode se dizer das condições organizacionais, bastante estruturadas pelas regras do serviço, mas também com desafios reais de sobrecarga e disponibilidade de certos recursos.
Mas esses elementos conformam só uma parte da atuação das BNR do Paefi. Isso porque a maior parte pareceu ser condicionada pelas características dos usuários atendidos, seus comportamentos e algumas condições físicas, que poderiam ainda se intercruzar com o conhecimento profissional das técnicas para influenciar práticas e a construção dos esquemas de categorização. Estes atributos, isolados ou agregados, são considerados para encaminhamentos e, em destaque, para os julgamentos operados na construção dos esquemas de categorização comportamental do público. Isso reforça a importância destes fatores para a atuação de BNR, corroborando estudos anteriores (Guul; Pedersen; Petersen, 2021; Møller, 2016). Em síntese, as técnicas se orientam menos por seus fatores individuais, que parecem se diluir tanto no contexto estruturado e coletivo em que a implementação acontece, quanto na natureza de um serviço que não cabe completa formalização, porque precisa, muito além das técnicas, do usuário.
A natureza do Suas e do Paefi podem ser a chave explicativa para este resultado. O Paefi é pouco programável porque é coproduzido com os usuários em cada atendimento, a partir de seu engajamento nas atividades e de suas respostas frente às mudanças necessárias para superar os seus problemas. Assim, no nível da rua, o serviço é feito na hora, o que exige uma ação flexível e adaptada à realidade do caso e da oferta da rede. Essa é uma contribuição deste caso empírico à literatura: os achados evidenciam o reduzido espaço para discricionariedade em um serviço muito regulado, aliado à necessidade de flexibilidade das práticas, como determinantes para a atuação de BNRs em políticas que dependem de alta participação dos usuários para sua implementação, como é o caso do Paefi.
Outra contribuição para a literatura é a identificação do esquema do usuário “organizado” versus “desorganizado”, especialmente porque está envolto em uma representação de usuário dependente, indo além dos estereótipos de merecimento já discutidos. O artigo contribui como desenho de pesquisa que integra diversas fontes de dados e estratégias, com ênfase na observação etnográfica, evidenciando conexões metodológicas das ciências sociais na análise de políticas públicas.
Em um nível acima de contribuição, tais achados também convergem com pressupostos das abordagens mistas de implementação, desenvolvidas na década de 1990, com os elementos “fortes” das perspectivas hegemônicas rompendo o binômio “de cima para baixo e de baixo para cima”. De modo geral, tais abordagens percebem o processo de implementação em função de um “escopo de limitações para a ação (regras e papéis) e do uso feito desse escopo” (Barrett, 2004, p. 257, tradução nossa), sendo importantes e interligados para a atuação, tanto as metas e os recursos quanto a ação dos operadores e dos beneficiários e (Lotta, 2019; Pülzl; Treib, 2007).
Portanto, a implementação de políticas públicas que visam alterar o comportamento e incentivar a participação ativa de usuários são justamente mais dependentes de suas demandas e motivação para acontecer e dar certo. Isso é mais evidente para o Paefi e, talvez, para os serviços do Suas, que preveem o engajamento e a capacidade de resposta das famílias como bases para a coprodução da intervenção e superação das violações. Tais fatores tornam-se centrais para a atuação de BNR no serviço, seja induzindo improvisações e escolhas ad hoc nas salas de atendimento, seja embasando classificações do público. Ao fim e ao cabo, confirmando os pressupostos da literatura, mas refinando-os a partir do caso pesquisado, observou-se que a atuação geral das agentes de Paefi resulta de um conjunto de fatores contextuais no processo de implementação e dos casos que elas acompanham.
Referências
- ASSIS, Marcos Arcanjo de. Burocratas de nível de rua do Sistema Único de Assistência Social: o que fazem, como interagem e classificam os usuários? 2023. 282 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) - Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Belo Horizonte, 2023.
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1
O autor agradece à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - Fapemig pelo fomento na elaboração do artigo no âmbito do projeto APQ 05331-23, Chamada 09/2023.
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3
Compõe-se pela articulação entre todas as unidades de provisão das diversas ofertas do Suas nos territórios, ou seja, com os demais serviços do Suas dos outros níveis de proteção (Brasil, 2011).
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Os números de identificação dos dois equipamentos com nota igual mais próxima da média são: 13106201882 e 13106202206, tendo sido o último o sorteado.
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A partir deste ponto, o termo “técnicas” será usado para se referir à atuação das BNR estudadas, que se identificam e são chamadas dessa maneira no cotidiano, independentemente do cargo ou formação profissional (serviço social, psicologia, direito, artes).
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6
A pesquisa foi aprovada por Comitê de Ética em Pesquisa vinculado à Plataforma Brasil, conforme Parecer Final (número CAAE: 36201720.1.0000.5149), prevendo a utilização de Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para a realização das entrevistas, que foram devidamente aplicados.
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7
O acesso aos Prontuários foi autorizado por um Termo de Compromisso de Utilização de Dados (TCUD), assinado pelo setor responsável da gestão municipal do Suas.
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8
Fonte: Relatório Socioassistencial do Prontuário 5.
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Editoras
Débora Rezende de AlmeidaRebecca Neaera Abers
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
04 Jul 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
24 Jan 2024 -
Aceito
24 Jan 2025
