Acessibilidade / Reportar erro

Resposta do Feijoeiro Comum à Inoculação com Rizóbio e Suplementação com Nitrogênio Mineral em Dois Biomas Brasileiros

Response of Common Bean to Rhizobium Inoculation and Supplemental Mineral Nitrogen in Two Brazilian Biomes

Resumos

O feijoeiro comum (Phaseolus vulgaris L.) pode se beneficiar da fixação biológica de N2, mas respostas inconsistentes da cultura à inoculação com rizóbio indicam a necessidade de aplicação de N mineral complementar. Este trabalho teve por objetivo avaliar a resposta do feijoeiro à inoculação com rizóbio, associada à suplementação com N mineral, nos biomas Cerrado e Mata Atlântica. Foram conduzidos quatro experimentos de campo, dois em Santo Antônio de Goiás, GO, um em Valença, RJ e um em Macaé, RJ, onde a inoculação com estirpes comerciais de rizóbio foi comparada à inoculação com a estirpe BR 923 de Sinorhizobium sp., à adubação com N mineral e à suplementação com N na semeadura e em cobertura. A avaliação da população nativa de rizóbio indicou 105 células g-1 no solo na área experimental em Goiás, anteriormente cultivada com feijão, e 102células g-1 em Valença, anteriormente mantida com pastagem. Nos dois experimentos em Goiás, o rendimento de grãos, da ordem de 2.100 kg ha-1, não diferiu entre os tratamentos testemunha absoluta, inoculação com rizóbio ou aplicação de 120 kg ha-1 de N. Em Valença, a inoculação com estirpes comerciais forneceu rendimentos da cultivar Ouro Negro superiores à testemunha absoluta, na ausência de adubação de cobertura; na presença de 40 kg ha-1 de N em cobertura, a inoculação com rizóbio proporcionou rendimento de 3.420 kg ha-1, superior aos demais tratamentos. Na média das diferentes fontes de N na semeadura, a adubação de cobertura aumentou a produção de grãos de 2.367 para 2.542 kg ha-1. Em Macaé, em solo com alto teor de matéria orgânica, os maiores rendimentos foram obtidos com inoculação das estirpes comerciais associada a 40 kg ha-1 de N em cobertura, com efeito deletério da adubação de 80 kg ha-1 de N no plantio. Concluiu-se que em áreas sem cultivo prévio de feijão, a inoculação com estirpes comerciais de rizóbio aumentou o rendimento de grãos, em particular quando associada à adubação de cobertura com N.

fixação biológica de nitrogênio; Phaseolus vulgaris; adubação de cobertura


Common bean (Phaseolus vulgaris L.) may benefit from biological N2fixation, but inconsistent responses of the crop to rhizobium inoculation indicate the need for supplemental mineral N fertilization. In this study, we aimed to evaluate the response of the common bean crop to rhizobium inoculation in association with supplemental mineral N in the Cerrado (Brazilian tropical savanna) and Atlantic Forest biomes. Four field experiments were carried out, two in Santo Antônio de Goiás (State of Goiás), one in Valença (State of Rio de Janeiro), and another in Macaé (State of Rio de Janeiro), all in Brazil. Inoculation with commercial rhizobium strains was compared to inoculation with strain BR 923 of Sinorhizobium sp., to mineral N fertilization, and to supplementation with N at sowing and in topdressing. Evaluation of the native rhizobium population indicated 105 cells g-1 in the soil of the experimental area in Goiás, previously cultivated with common bean, and 102 cells g1 in the soil in Valença, previously kept in pasture. In both experiments in Goiás, grain yields of around 2,100 kg ha-1 did not differ among the control treatments, rhizobia inoculation, or the application of 120 kg ha-1 of N. In Valença, inoculation with commercial strains provided yields from the cultivar Ouro Negro higher than the absolute control, in the lack of topdressing N fertilization. With 40 kg ha-1 of N in topdressing, rhizobium inoculation led to 3,420 kg ha-1 of grain yield, higher than the other treatments. In the mean of different N sources at sowing, topdressing fertilization increased grain yield from 2,367 to 2,542 kg ha-1. In Macaé, in a soil with high organic matter content, the highest yields were obtained with inoculation of commercial strains associated with 40 kg ha-1 of N in topdressing, and there were deleterious effects from application of 80 kg ha-1 of N at sowing. We conclude that in areas without a previous common bean crop, inoculation with commercial rhizobium strains increases grain yield, particularly when associated with topdressing N fertilization.

biological nitrogen fixation; Phaseolus vulgaris; topdressing fertilization


INTRODUÇÃO

O feijoeiro comum (Phaseolus vulgaris L.) está presente em distintos sistemas de produção do Brasil, abrangendo desde pequenos produtores até sistemas altamente tecnificados da agricultura empresarial. A espécie é capaz de se associar simbioticamente a diversas bactérias do grupo dos rizóbios, formando nódulos nas raízes onde ocorre o processo de transformação do N2 atmosférico em NH3 assimilável pelas plantas, a fixação biológica de N (FBN). No feijoeiro comum, têm sido reportadas contribuições relevantes da FBN em condições de campo, como valores de N2 fixado atingindo 90 kg ha-1 de N, correspondente a 50 % do N acumulado na maturação (Westermann et al., 1981Westermann DT, Kleinkopf GE, Porter LK, Leggett GE. Nitrogen sources for bean seed production. Agron J. 1981;73:660-4.), entre 40 e 125 kg ha-1 de N em diferentes cultivares (Rennie e Kemp, 1983Rennie RJ, Kemp GA. N2-fixation in field beans quantified by 15N isotope dilution. II. Effect of cultivars of beans. Agron J. 1983;75:645-9.), entre 21 e 44 kg ha-1 de N nos grãos de diversos genótipos (Pereira et al., 1989Pereira PAA, Burris RH, Bliss FA. 15N-determined dinitrogen fixation potential of genetically diverse bean lines (Phaseolus vulgaris L.). Plant Soil. 1989;120:171-9.), e valores médios em sete diferentes países de 35 % do N derivado da atmosfera, com valores máximos de 70 % sob condições favoráveis (Hardarson et al., 1993Hardarson G, Bliss FA, Cigales-Rivero MR, Henson RA, Kipe-Nolt JA, Longeri L, Manrique A, Peña-Cabriales JJ, Pereira PAA, Sanabria CA, Tsai SM. Genotypic variation in biological nitrogen fixation by common bean. Plant Soil. 1993;152:59-70.). No entanto, a inoculação do feijoeiro com rizóbio pode não proporcionar a quantidade de N necessária para atingir altos níveis de produtividade em condições comerciais de cultivo.

A baixa ocupação nodular do feijoeiro pelas estirpes inoculadas (Vargas et al., 2000Vargas MAT, Mendes IC, Hungria M. Response of field grown bean (Phaseolus vulgaris L.) to Rhizobiuminoculation and nitrogen fertilization in two Cerrado soils. Biol Fertil Soils. 2000;32:228-33.), a capacidade da planta em nodular com grande diversidade de espécies de rizóbio (Michiels et al., 1998Michiels J, Dombrecht B, Vermeiren N, Xi C, Luyten E, Vanderleyden J. Phaseolus vulgaris is a non-selective host for nodulation. FEMS Microbiol Ecol. 1998;26:193-205.) e a existência no solo de uma população indígena abundante adaptada às condições tropicais (Grange e Hungria, 2004Grange L, Hungria M. Genetic diversity of indigenous common bean (Phaseolus vulgaris) rhizobia in two Brazilian ecosystems. Soil Biol Biochem. 2004;36:1389-98.; Kaschuk et al., 2006Kaschuk G, Hungria M, Andrade DS, Campo RJ. Genetic diversity of rhizobia associated with common bean (Phaseolus vulgaris L.) grown under no-tillage and conventional systems in Southern Brazil. Appl Soil Ecol. 2006;32:210-20.) são fatores associados às respostas inconsistentes da inoculação com rizóbio na cultura do feijoeiro comum em condições de campo. A maioria dos solos com histórico de cultivo de feijão contém rizóbios nativos que podem interferir no estabelecimento e na eficácia das estirpes inoculadas, reduzindo as respostas à inoculação (Vlassak et al., 1996Vlassak K, Vanderleyden J, Franco A. Competition and persistence ofRhizobium tropici and Rhizobium etli in tropical soil during successive bean (Phaseolus vulgaris L.) cultures. Biol Fertil Soils. 1996;21:61-8.; Vargas et al., 2000Vargas MAT, Mendes IC, Hungria M. Response of field grown bean (Phaseolus vulgaris L.) to Rhizobiuminoculation and nitrogen fertilization in two Cerrado soils. Biol Fertil Soils. 2000;32:228-33.; Raposeiras et al., 2006Raposeiras R, Marriel IE, Muzzi MRS, Paiva E, Pereira Filho IA, Carvalhais LC, Passos RVM, Pinto PP, Sá NMH. Rhizobium strains competitiveness on bean nodulation in Cerrado soils. Pesq Agropec Bras. 2006;41:439-47.).

Uma das alternativas para alcançar maior eficiência da FBN em feijoeiro seria a inoculação de estirpes de rizóbio mais competitivas e adaptadas às regiões tropicais. No Brasil, há diversos trabalhos visando o isolamento, a caracterização e a seleção de estirpes de Rhizobium spp., como nos Cerrados (Mostasso et al., 2002Mostasso L, Mostasso FL, Dias BG, Vargas MAT, Hungria M. Selection of bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobial strains for the Brazilian Cerrados. Field Crops Res. 2002;73:121-32.; Raposeiras et al., 2006Raposeiras R, Marriel IE, Muzzi MRS, Paiva E, Pereira Filho IA, Carvalhais LC, Passos RVM, Pinto PP, Sá NMH. Rhizobium strains competitiveness on bean nodulation in Cerrado soils. Pesq Agropec Bras. 2006;41:439-47.), na Região Sul (Hungria et al., 2000Hungria M, Andrade DS, Chueire LMO, Probanza A, Guttierrez-Mañero FJ, Megías M. Isolation and characterization of new efficient and competitive bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobia from Brazil. Soil Biol Biochem. 2000;32:1515-28.; Hungria et al., 2003Hungria M, Campo RJ, Mendes IC. Benefits of inoculation of the common bean (Phaseolus vulgaris) crop with efficient and competitive Rhizobium tropici strains. Biol Fertil Soils. 2003;39:88-93.; Stocco et al., 2008Stocco P, Santos JCP, Vargas VP, Hungria M. Avaliação da biodiversidade de rizóbios simbiontes do feijoeiro (Phaseolus vulgarisL.) em Santa Catarina. R Bras Ci Solo. 2008;32:1107-20.) e na Região Sudeste (Soares et al., 2006Soares ALL, Ferreira PAA, Pereira JPAR, Vale HMM, Lima AS, Andrade MJB, Moreira FMS. Eficiência agronômica de rizóbios selecionados e diversidade de populações nativas nodulíferas em Perdões (MG). II - Feijoeiro. R Bras Ci Solo. 2006;30:803-11.;Lombardi et al., 2009Lombardi MLCO, Moreira M, Ambrósio LA, Cardoso EJBN. Occurrence and host specificity of indigenous rhizobia from soils of São Paulo State, Brazil. Sci Agric. 2009;66:543-8.; Torres et al., 2009Torres AR, Cursino L, Muro-Abad JI, Gomes EA, Araújo EF, Hungria, M, Cassini STA. Genetic diversity of indigenous common bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobia from the state of Minas Gerais, Brazil. Braz J Microbiol. 2009;40:852-6.). Além dessas estirpes deRhizobium, grande número de isolados classificados comoSinorhizobium sp. (atualmente Ensifer sp.) foi recuperado de nódulos de leguminosas em solos brasileiros, com potencial para introdução em inoculantes (Straliotto et al., 1997Straliotto R, Cunha CO, Ferreira ME, Rumjanek NG. Diversidade genética do rizóbio que nodula o feijoeiro em regiões tropicais:Sinorhizobium, um novo gênero nodulando eficientemente o feijoeiro em condições de estresse térmico. In: Resumos do 19º Congresso Brasileiro de Microbiologia; 1997; Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Microbiologia; 1997.).

Outra estratégia para maximizar os resultados obtidos com a inoculação com rizóbio no feijoeiro comum consiste na combinação com a aplicação de N mineral. Pacheco et al. (2012)Pacheco RS, Brito LF, Straliotto R, Pérez DV, Araújo AP. Seeds enriched with phosphorus and molybdenum as a strategy for improving grain yield of common bean crop. Field Crops Res. 2012;136:97-106. registraram que a inoculação, combinada com a aplicação de 40 kg ha-1 de N em cobertura, forneceu rendimento de grãos e acumulação de N nos grãos similares à aplicação de 60 kg ha-1 de N. A inoculação, em conjunto com a adubação com 20 kg ha-1 de N no plantio, possibilitou obter rendimento de grãos e acréscimo de receita líquida na cultura de feijoeiro equivalente à aplicação de até 160 kg ha-1 de N (Pelegrin et al., 2009Pelegrin R, Mercante FM, Otsubo IMN, Otsubo AA. Resposta da cultura do feijoeiro à adubação nitrogenada e à inoculação com rizóbio. R Bras Ci Solo. 2009;33:219-26.). A inoculação das sementes, associada à aplicação de 15 kg ha-1 de N na semeadura e no início do florescimento do feijoeiro, forneceu rendimento de grãos superior a todos os diferentes tratamentos com a aplicação de N na semeadura e em cobertura (Hungria et al., 2003Hungria M, Campo RJ, Mendes IC. Benefits of inoculation of the common bean (Phaseolus vulgaris) crop with efficient and competitive Rhizobium tropici strains. Biol Fertil Soils. 2003;39:88-93.).

No Brasil, o bioma Cerrado ocupa uma área de 2 milhões de km2. Seus solos são distróficos, de baixa fertilidade, elevada acidez, com relevo predominantemente plano favorável à mecanização (Adámoli et al., 1986Adámoli J, Macedo J, Azevedo LG, Madeira Neto J. Caracterização da região do cerrado. In: Goedert WJ, editor. Solos dos cerrados: Tecnologias e estratégias de manejo. Planaltina: Embrapa CPAC; São Paulo: Nobel; 1986. p.33-74.). O Estado de Goiás tem 97 % do seu território dentro do bioma Cerrado (IBGE, 2004Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Mapa de Biomas do Brasil, primeira aproximação. Rio de Janeiro: 2004. [Acesso em 14 ago 2011]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br.
http://www.ibge.gov.br...
), onde existem produtores de feijão tecnificados, que utilizam irrigação e cuja produtividade na terceira safra supera os 2.500 kg ha-1 (Conab, 2013Companhia Nacional de Abastecimento - Conab. Acompanhamento da safra brasileira: grãos, décimo segundo levantamento, setembro 2013. Brasília: 2013. [Acesso em 10 abr 2014]. Disponível em: http://www.conab.gov.br.
http://www.conab.gov.br...
). O bioma Mata Atlântica ocupa uma área de 1,1 milhão de km2, sendo considerado um dos hotspots de biodiversidade do mundo, apresentando vegetação florestal variada, solo e relevo diversificados (Galindo-Leal e Câmara, 2003Galindo-Leal C, Câmara IG. The Atlantic Forest of South America: Biodiversity status, threats, and outlook. Washington: Island Press, Center for Applied Biodiversity Science at Conservation International; 2003.). O Estado do Rio de Janeiro tem a totalidade do seu território dentro do bioma Mata Atlântica (IBGE, 2004Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Mapa de Biomas do Brasil, primeira aproximação. Rio de Janeiro: 2004. [Acesso em 14 ago 2011]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br.
http://www.ibge.gov.br...
), e sua produção de feijão caracteriza-se pelo predomínio de pequenos agricultores, com menor uso de tecnologia e de insumos externos, com rendimentos geralmente em torno de 1.000 kg ha-1 (Conab, 2013Companhia Nacional de Abastecimento - Conab. Acompanhamento da safra brasileira: grãos, décimo segundo levantamento, setembro 2013. Brasília: 2013. [Acesso em 10 abr 2014]. Disponível em: http://www.conab.gov.br.
http://www.conab.gov.br...
).

O objetivo deste trabalho foi avaliar a resposta do feijoeiro comum à inoculação com estirpes de rizóbio, associada à suplementação com N mineral, nos biomas Cerrado (Estado de Goiás) e Mata Atlântica (Estado do Rio de Janeiro).

MATERIAL E MÉTODOS

Caracterização das áreas experimentais

Os dois experimentos na região do Cerrado (Goiás I e Goiás II) foram conduzidos de junho a setembro de 2009, no campo experimental da Embrapa Arroz e Feijão, em Santo Antônio de Goiás, GO, localizado na latitude 16º 28’ 00” S, longitude 49º 17” 00” W e altitude de 823 m. Segundo a classificação de Köppen, o clima é do tipo Aw, tropical de savana, megatérmico, com precipitação pluvial média anual de 1.485 mm e temperatura média anual de 23 °C. Os dois experimentos foram conduzidos simultaneamente em área contígua, em solo classificado como Latossolo Vermelho. Nos dois anos anteriores, a área destinada aos experimentos foi utilizada com cultivo de feijoeiro comum, sob irrigação por pivô central.

O primeiro experimento no bioma Mata Atlântica foi conduzido de maio a agosto de 2009, no campo experimental da Embrapa Gado de Leite, no município de Valença, RJ, com latitude 22° 21’ 00’’ S, longitude 43° 42’ 00’’ W e altitude de 364 m. A região apresenta clima classificado pelo sistema de Köppen como Cwa, com inverno moderadamente frio e verão quente, com precipitação pluvial média anual de 1.280 mm e temperatura média anual de 22,5 °C. O solo no local do experimento está classificado como Argissolo Vermelho-Amarelo. Nos dois anos anteriores, a área do experimento foi utilizada para o cultivo de milho para ensilagem e pousio com vegetação espontânea.

O segundo experimento no bioma Mata Atlântica foi conduzido de agosto a outubro de 2012, na propriedade rural Fazenda Ilha da Saudade, no município de Macaé, RJ, localizada na latitude 22° 22’ 15” S, longitude 41° 47’ 13” W e altitude de 2 m. O clima nessa região é classificado como Cwa segundo Köppen, com precipitação pluvial média anual de 1.164 mm e temperatura média anual de 22,6 °C. O solo no local do experimento está classificado como Gleissolo Háplico, localizado em uma várzea sistematizada para plantio de arroz inundado, que após o ciclo do arroz era drenada e cultivada com feijão, sem o uso de irrigação.

Os solos das áreas experimentais foram classificados de acordo com Embrapa (2013)Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Sistema brasileiro de classificação de solos. 3ª.ed. Brasília: 2013.. Os resultados das análises de fertilidade dos solos das áreas experimentais na profundidade de 0-20 cm, realizada de acordo com Embrapa (1997)Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Manual de métodos de análise de solo. 2ª.ed. Rio de Janeiro: 1997., são apresentados no quadro 1.

Quadro 1
Caracterização química dos solos das áreas experimentais, na profundidade de 0-20 cm

Cultivares, estirpes e inoculantes

Foram utilizadas as cultivares Ouro Negro e Carioca. A cultivar Ouro Negro tem hábito de crescimento tipo III, arquitetura semiprostada, ciclo de 90 dias, com grãos pretos e massa de 100 grãos de 24 g. A cultivar Carioca tem hábito de crescimento tipo III, arquitetura prostrada, ciclo de 90 dias, com grãos do grupo carioca e massa de 100 grãos de 29 g.

O inoculante comercial utilizado nos experimentos foi composto das estirpes deRhizobium tropici BR 322 (CIAT 899, SEMIA 4077), isolada na Colômbia por Peter H. Graham; BR 520 (PRF 81, SEMIA 4080), isolada no Estado do Paraná (Hungria et al., 2000Hungria M, Andrade DS, Chueire LMO, Probanza A, Guttierrez-Mañero FJ, Megías M. Isolation and characterization of new efficient and competitive bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobia from Brazil. Soil Biol Biochem. 2000;32:1515-28.); e BR 534 (CPAC H12), isolada na região do Cerrado (Mostasso et al., 2002Mostasso L, Mostasso FL, Dias BG, Vargas MAT, Hungria M. Selection of bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobial strains for the Brazilian Cerrados. Field Crops Res. 2002;73:121-32.). O outro inoculante testado era composto pela estirpe BR 923 de Sinorhizobium sp., atualmente classificada como Ensifer sp. (Judicial Commission of the International Committee on Systematics of Prokaryotes, 2008Judicial Commission of the International Committee on Systematics of Prokaryotes. The genus name Sinorhizobium Chen et al. 1988 is a later synonym of Ensifer Casida 1982 and is not conserved over the latter genus name, and the species name ‘Sinorhizobium adhaerens’ is not validly published. Opinion 84. Int J Syst Evol Microbiol. 2008;58:1973.), isolada de nódulos de Leucaena leucocephala e que apresenta boa resistência a antibióticos e alta competitividade (Souza et al., 2003Souza MFM, Vale HMM, Straliotto R. Competitividade de estirpes pertencentes a diferentes espécies de rizóbio para ocupação nodular em feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.). Agronomia. 2003;37:59-63.), além de tolerar temperaturas elevadas (Straliotto et al., 1997Straliotto R, Cunha CO, Ferreira ME, Rumjanek NG. Diversidade genética do rizóbio que nodula o feijoeiro em regiões tropicais:Sinorhizobium, um novo gênero nodulando eficientemente o feijoeiro em condições de estresse térmico. In: Resumos do 19º Congresso Brasileiro de Microbiologia; 1997; Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Microbiologia; 1997.). Como a inclusão do grupo Sinorhizobium dentro do gênero Ensifer suscita polêmicas (Young, 2010Young JM. Sinorhizobium versusEnsifer: May a taxonomy subcommittee of the ICSP contradict the Judicial Commission? Int J Syst Evol Microbiol. 2010;60:1711-3.), optou-se por manter neste trabalho a denominação Sinorhizobium. Todas as cepas foram obtidas da Coleção de Culturas da Embrapa Agrobiologia.

Os inoculantes foram preparados por meio da injeção de caldo de cultivo contendo as estirpes, em sacos plásticos selados, com 50 g de turfa autoclavada, conforme o protocolo da Rede de Laboratórios para a Recomendação, Padronização e Difusão de Tecnologia de Inoculantes Microbianos de Interesse Agrícola (RELARE). A qualidade do inoculante foi avaliada pela quantificação da população de rizóbio conforme o método proposto pela RELARE (2004)RELARE. Rede de Laboratórios para Recomendação, Padronização e Difusão de Tecnologia de Inoculantes Microbianos de Interesse Agrícola [home page] 2004. [Acesso em: out 2011]. Disponível em: http://www.relare.org.br.
http://www.relare.org.br...
, apresentando valores superiores a 1011 unidades formadoras de colônia por grama de inoculante, compatível com o padrão exigido pelo Ministério da Agricultura.

Quantificação da população de rizóbios nativos do solo

Previamente ao plantio de cada experimento, a população nativa de rizóbio do solo foi quantificada pela técnica do Número Mais Provável (NMP), segundo Somasegaran e Hoben (1985)Somasegaran P, Hoben HJ. Methods in legume-Rhizobiumtechnology. Hawai: Niftal Project, Mircen; 1985.. Foram utilizados vasos de Leonard autoclavados, contendo 500 cm3 de areia e vermiculita (1:1 v:v), com três vasos para cada diluição. Foram semeadas quatro sementes da cultivar Carioca por vaso, sendo mantidas duas plantas por vaso após desbaste, aos 10 dias após emergência (DAE). A partir de 10 DAE, os vasos foram abastecidos com solução nutritiva de Norris modificada, isenta de N. As plantas foram coletadas na floração plena, verificando-se a presença de nódulos nas raízes e estimando-se o número de células de rizóbio por g de solo (Somasegaran e Hoben, 1985Somasegaran P, Hoben HJ. Methods in legume-Rhizobiumtechnology. Hawai: Niftal Project, Mircen; 1985.).

Delineamento experimental e amostragens

Para os quatro experimentos, foi adotado o delineamento experimental em blocos ao acaso. O experimento Goiás I foi disposto em fatorial 2 × 4 com cinco repetições, combinando duas cultivares de feijoeiro (Carioca e Ouro Negro) e quatro fontes de N, que consistiram de: testemunha absoluta (sem aplicação de N mineral e sem inoculação); testemunha nitrogenada (com aplicação de 80 kg ha-1 de N no plantio e 40 kg ha-1 de N em cobertura); inoculação com as estirpes comerciais (BR 322 + BR 520 + BR 534); e inoculação com a estirpe BR 923. O experimento Goiás II tinha cinco repetições e seis fontes de N como tratamentos: testemunha absoluta; testemunha nitrogenada (com aplicação de 80 kg ha-1 de N no plantio e 40 kg ha-1 de N em cobertura); inoculação com as estirpes comerciais (BR 322 + BR 520 + BR 534); inoculação com as estirpes comerciais mais aplicação de 40 kg ha-1 de N em cobertura; inoculação com a estirpe BR 923; e inoculação com a estirpe BR 923 mais aplicação de 40 kg ha-1 de N em cobertura. Foi utilizada a cultivar Ouro Negro. A adubação de plantio nos dois experimentos foi de 35 kg ha-1 de P, utilizando superfosfato simples, 35 kg ha-1de K, como de cloreto de potássio, e N mineral, na forma de ureia. Os experimentos foram irrigados por pivô central.

O experimento em Valença foi disposto em fatorial 2 × 4 × 2, com cinco repetições, combinando duas cultivares de feijoeiro (Carioca e Ouro Negro), quatro fontes de N na semeadura (testemunha absoluta; testemunha nitrogenada com aplicação de 20 kg ha-1 de N; inoculação com as estirpes comerciais (BR 322 + BR 520 + BR 534); e inoculação com a estirpe BR 923), e dois níveis de adubação nitrogenada em cobertura (ausência de adubação nitrogenada em cobertura ou 40 kg ha-1 de N em cobertura). Dessa forma, a testemunha nitrogenada com adubação de cobertura recebeu um total de 60 kg ha-1de N. Essa dose de N foi adotada considerando a expectativa de rendimento para o cultivo, conforme experimento anterior conduzido na mesma unidade experimental (Pacheco et al., 2012Pacheco RS, Brito LF, Straliotto R, Pérez DV, Araújo AP. Seeds enriched with phosphorus and molybdenum as a strategy for improving grain yield of common bean crop. Field Crops Res. 2012;136:97-106.). A adubação de plantio foi feita com 40 kg ha-1 de K, na forma de cloreto de potássio, 30 kg ha-1 de P, como superfosfato simples, e N mineral, como ureia. A adubação de cobertura foi efetuada aos 25 dias após emergência utilizando ureia. O experimento foi irrigado por aspersão.

O experimento em Macaé tinha quatro repetições e consistia de cinco tratamentos: testemunha absoluta; testemunha nitrogenada (aplicação de 80 kg ha-1de N no plantio e 40 kg ha-1 de N em cobertura); inoculação com as estirpes comerciais (BR 322 + BR 520 + BR 534); inoculação com as estirpes comerciais mais aplicação de 80 kg ha-1 de N no plantio; e inoculação com as estirpes comerciais mais aplicação de 40 kg ha-1 de N em cobertura. Foi utilizada a cultivar Ouro Negro. No sulco de plantio, foram aplicados 40 kg ha-1 de P, utilizando superfosfato simples, 25 kg ha-1 de K como cloreto de potássio, e N mineral, na forma de ureia. O experimento foi conduzido em sistema de sequeiro.

Em todos os experimentos, as parcelas tinham seis linhas de 4 m de comprimento espaçadas, 0,5 m entre si, com densidade de 12 sementes por metro linear. Durante a condução dos experimentos, foram realizados os tratos culturais necessários para o bom desenvolvimento da cultura como controle fitossanitário de pragas e doenças e controle de plantas invasoras, por meio de capinas em Macaé e aplicação de herbicidas em Goiás e Valença.

Nos experimentos, foram efetuadas amostragens de biomassa no período da floração plena, em torno de 35 dias após emergência, exceto no experimento em Macaé, onde a amostragem realizou-se aos 45 dias após emergência, na formação das vagens. Nas amostragens, foram coletadas as plantas contidas em 1 m linear de uma linha da parcela destinada a esse propósito. Nas amostragens, foram coletadas a parte aérea, o sistema radicular e os nódulos, que foram destacados das raízes. Todo o material vegetal coletado foi seco em estufa com circulação forçada de ar a 65 °C por 72 h e pesado. A colheita de grãos foi efetuada na área útil de 3 m2 cada parcela. As vagens foram trilhadas manualmente, e os grãos foram pesados. Uma amostra de 100 grãos foi pesada, seca em estufa a 65 °C por 72 h e pesada novamente, obtendo-se o teor de umidade dos grãos de cada parcela. O rendimento de grãos foi padronizado para 13 % de teor de umidade. Nessa amostra dos grãos, foi determinado o teor de N pelo método semimicro Kjeldahl (Malavolta et al., 1997Malavolta E, Vitti GC, Oliveira SA. Avaliação do estado nutricional das plantas. 2ª.ed. Piracicaba: Associação Brasileira para Pesquisa da Potassa e do Fosfato; 1997.), e o conteúdo de N foi obtido pelo produto entre o teor e a massa de matéria seca dos grãos.

Análises estatísticas

Para os experimentos Goiás II e em Macaé, a análise de variância foi feita considerando um único fator, as fontes de N. Para o experimento Goiás I, a análise de variância foi efetuada como um fatorial duplo entre cultivares e fontes de N. Para o experimento em Valença, a análise de variância foi efetuada como um fatorial triplo entre cultivares, fontes de N na semeadura e adubação de cobertura. As médias foram comparadas pelo teste de Duncan a 5 %.

RESULTADOS

A avaliação da população indígena de rizóbio no solo apresentou resultados distintos nas diferentes áreas experimentais: enquanto nas áreas dos dois experimentos no Cerrado, em região de cultivo de feijoeiro, a população foi de 105células g-1 de solo, nas áreas em Valença e Macaé foram encontradas 102 células g-1 de solo.

Experimento Goiás I

Na cultivar Carioca, a massa de matéria seca de parte aérea (MSPA) no estádio de plena floração foi superior nas plantas que receberam N mineral do que nas plantas inoculadas com estirpes comerciais de rizóbio. Na cultivar Ouro Negro, a MSPA foi superior nas plantas sob N mineral que nas inoculadas com a estirpe BR 923 (Figura 1). A massa de nódulos no tratamento com aplicação de N foi inferior aos tratamentos testemunha absoluta e inoculação com estirpes comerciais, na cultivar Carioca, e ao tratamento com estirpes comerciais, na cultivar Ouro Negro (Figura 1). O rendimento médio de grãos do experimento foi de 2.008 e 2.091 kg ha-1, para as cultivares Carioca e Ouro Negro, respectivamente. Não houve diferença significativa entre as diferentes fontes de N avaliadas, tanto para produção de grãos quanto para a acumulação de N nos grãos, nas duas cultivares (Figura 1).

Figura 1
Produção de matéria seca da parte aérea e matéria seca de nódulos quando da floração, da produção de grãos e do conteúdo de N acumulado nos grãos na maturação, das cultivares de feijoeiro comum Carioca e Ouro Negro, no experimento Goiás I, sem adubação nitrogenada (TA - testemunha absoluta) e três fontes de N: NM- testemunha nitrogenada (80 kg ha-1 de N no plantio e 40 kg ha-1 de N em cobertura), EC - inoculação com estirpes comerciais de rizóbio (BR 322 + BR 520 + BR 534) e 923 - inoculação com a estirpe BR 923 de rizóbio. Barras sobrepostas pela mesma letra, dentro de cada cultivar, indicam que médias não diferem pelo teste de Duncan a 5 %. Coeficientes de variação experimental: produção de parte aérea - 18,6 %; massa de nódulos - 40,3 %; e produção de grãos - 18,1 %.

Experimento Goiás II

A MSPA da cultivar Ouro Negro quando da floração foi superior nas plantas que receberam 120 kg ha-1 de N que nas plantas inoculadas com a estirpe BR 923 ou nas plantas inoculadas com as estirpes comerciais com complementação de 40 kg ha-1 de N em cobertura (Figura 2). A massa de nódulos foi superior nos tratamentos testemunha absoluta e inoculação com a estirpe BR 923 do que nos tratamentos com 120 kg ha-1 de N e com a estirpe BR 923 mais 40 kg ha-1 de N em cobertura (Figura 2). O rendimento médio de grãos do experimento foi 2.145 kg ha-1. A produção de grãos foi superior no tratamento inoculado com a estirpe BR 923 mais N em cobertura que no tratamento apenas inoculado com a estirpe BR 923; as demais fontes de N não diferiram entre si. A acumulação de N nos grãos foi superior no tratamento inoculado com a estirpe comercial mais N em cobertura do que na testemunha absoluta (Figura 2).

Figura 2
Produção de matéria seca da parte aérea e matéria seca de nódulos quando da floração, da produção de grãos e do conteúdo de N acumulado nos grãos na maturação, da cultivar de feijoeiro comum Ouro Negro, no experimento Goiás II, sem adubação nirogenada (TA - testemunha absoluta) e cinco fontes de N: NM - testemunha nitrogenada (80 kg ha-1 de N no plantio e 40 kg ha-1 de N em cobertura), EC - inoculação com estirpes comerciais de rizóbio (BR 322 + BR 520 + BR 534), 923 - inoculação com a estirpe BR 923 de rizóbio, EC+cob - inoculação com estirpes comerciais e 40 kg ha-1 de N em cobertura e 923+cob - inoculação com a estirpe BR 923 e 40 kg ha-1 de N em cobertura. Barras sobrepostas pela mesma letra indicam que médias não diferem pelo teste de Duncan a 5 %. Coeficientes de variação experimental: produção de parte aérea - 16,3 %; massa de nódulos - 52,9 %; e produção de grãos - 16,6 %.

Experimento em Valença

Na cultivar Carioca, a MSPA na floração foi maior nas plantas que receberam inoculação com estirpes comercias do que nas plantas sob N mineral, na ausência de adubação de cobertura (Figura 3). Nos tratamentos que receberam cobertura com 40 kg ha-1 de N, a MSPA foi maior nas plantas inoculadas com a estirpe BR 923 do que na testemunha absoluta. Na cultivar Ouro Negro sem adubação de cobertura, a MSPA foi maior nos tratamentos com N mineral e com inoculação com as estirpes comercias do que nas plantas inoculadas com a estirpe BR 923 (Figura 3). Com adubação de cobertura, a MSPA foi maior em plantas inoculadas com estirpes comerciais do que adubadas com N mineral ou inoculadas com a estirpe BR 923 (Figura 3). A massa seca de nódulos das cultivares Carioca e Ouro Negro foi superior nas plantas inoculadas com as estirpes comerciais que nos demais tratamentos, tanto na ausência ou na presença de adubação nitrogenada de cobertura (Figura 3).

Figura 3
Produção de matéria seca da parte aérea e matéria seca de nódulos quando da floração e produção de grãos das cultivares de feijoeiro comum Carioca e Ouro Negro, no experimento em Valença, RJ, sem adubação nitrogenada na semeadura (TA - testemunha absoluta) e três fontes de N: NM - testemunha nitrogenada com 20 kg ha-1 de N, EC - inoculação com estirpes comerciais de rizóbio (BR 322 + BR 520 + BR 534) e 923 - inoculação com a estirpe BR 923 de rizóbio, e com a ausência ou presença de adubação em cobertura com 40 kg ha-1 de N. Barras sobrepostas pela mesma letra, dentro de cada cultivar e modo de adubação de cobertura, indicam que médias não diferem pelo teste de Duncan a 5 %. Coeficientes de variação experimental: produção de parte aérea - 37,3 %; massa de nódulos - 63,1 %; e produção de grãos - 26,1 %.

Na cultivar Carioca, não houve diferenças significativas entre as fontes de N avaliadas no plantio para a produção de grãos, tanto na ausência quanto na presença de adubação nitrogenada de cobertura (Figura 3). Todavia, cabe ressaltar aumento de 25 % no rendimento com a inoculação das estirpes comerciais, em comparação ao controle não inoculado, na ausência de adubação de cobertura. Na cultivar Ouro Negro, os tratamentos com N mineral e inoculação com estirpes comerciais proporcionaram maior rendimento de grãos que os tratamentos testemunha e inoculados com a estirpe BR 923, na ausência de adubação de cobertura, enquanto na presença de adubação de cobertura, a inoculação com as estirpes comerciais forneceu maior rendimento que a testemunha absoluta ou a adição de N mineral (Figura 3). Considerando as médias das fontes de N avaliadas na semeadura, a adubação de cobertura com 40 kg ha-1 de N aumentou a produção de grãos de 2.367 para 2.542 kg ha-1. Esses aumentos de rendimento da adubação de cobertura vieram associados a aumentos significativos no número de vagens por planta, de 7,4 para 9,5, na cultivar Carioca, e de 8,9 para 9,8, na cultivar Ouro Negro, sem modificações significativas no número de grãos por vagem e na massa de 100 grãos. Como os diferentes tratamentos não interferiram de forma significativa a concentração de N nos grãos de feijão, o acúmulo de N nos grãos seguiu a mesma tendência observada para a produção de grãos, e esses dados não são apresentados.

Experimento em Macaé

A MSPA da cultivar Ouro Negro quando da formação das vagens foi superior nas plantas sob N mineral do que nas plantas que receberam inoculação com estirpes comerciais mais cobertura com 40 kg ha-1 de N (Figura 4). As plantas nos tratamentos testemunha ou com inoculação com estirpes comerciais apresentaram maior massa de nódulos que as plantas que receberam 120 kg ha-1 de N ou inoculadas com estirpes comerciais mais 80 kg ha-1 de N no plantio. O rendimento médio de grãos do experimento foi 1.675 kg ha-1. A produção de grãos foi superior com a inoculação com estirpes comerciais mais cobertura com 40 kg ha-1 de N do que nas demais fontes de N. Além disso, a inoculação com estirpes comerciais associada com 80 kg ha-1 de N no plantio reduziu a produção de grãos (Figura 4).

Figura 4
Produção de matéria seca da parte aérea e matéria seca de nódulos quando da formação de vagens e produção de grãos, da cultivar de feijoeiro comum Ouro Negro, no experimento em Macaé, RJ, sem adubação nitrogenada (TA - testemunha absoluta) e quatro fontes de N: NM - testemunha nitrogenada (80 kg ha-1 de N no plantio e 40 kg ha-1 de N em cobertura), EC - inoculação com estirpes comerciais de rizóbio (BR 322 + BR 520 + BR 534), EC+pl - inoculação associada com 80 kg ha-1 de N no plantio e EC + cb - inoculação associada com 40 kg ha-1 de N em cobertura. Barras sobrepostas pela mesma letra indicam que médias não diferem pelo teste de Duncan a 5 %. Coeficientes de variação experimental: produção de parte aérea - 21,2 %; massa de nódulos - 89,7 %; e produção de grãos - 13,4 %.

DISCUSSÃO

Nos dois experimentos em Goiás, em áreas de cultivos prévios com feijoeiro comum, ocorreu expressiva nodulação nas plantas testemunha não inoculadas (Figuras 1 e 2), o que denota a presença de elevada população nativa de rizóbio, como indicado pela contagem de 105 células g-1 de solo. Cultivos prévios de feijoeiro nessas áreas experimentais podem ter favorecido o estabelecimento de estirpes nativas eficientes e competitivas, resultando em baixas respostas à inoculação com as estirpes comerciais de rizóbio ou com a estirpe BR 923 de Sinorhizobium, e mesmo à aplicação de N mineral.

A presença em solos brasileiros de uma população nativa de rizóbio bem estabelecida e com elevada diversidade é uma das principais limitações para o sucesso da inoculação no feijoeiro comum (Hungria et al., 2000Hungria M, Andrade DS, Chueire LMO, Probanza A, Guttierrez-Mañero FJ, Megías M. Isolation and characterization of new efficient and competitive bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobia from Brazil. Soil Biol Biochem. 2000;32:1515-28.;Grange e Hungria, 2004Grange L, Hungria M. Genetic diversity of indigenous common bean (Phaseolus vulgaris) rhizobia in two Brazilian ecosystems. Soil Biol Biochem. 2004;36:1389-98.). Em áreas sem cultivo prévio de feijoeiro em Planaltina, DF, as populações indígenas de rizóbios eram baixas, e altos rendimentos puderam ser alcançados apenas com a inoculação das sementes; entretanto, em solo anteriormente cultivado com feijão com elevada população de rizóbios nativos, a formação de nódulos pelas estirpes inoculadas foi limitada, demandando a complementação com fertilizante nitrogenado para obter maiores rendimentos (Vargas et al., 2000Vargas MAT, Mendes IC, Hungria M. Response of field grown bean (Phaseolus vulgaris L.) to Rhizobiuminoculation and nitrogen fertilization in two Cerrado soils. Biol Fertil Soils. 2000;32:228-33.).Vlassak et al. (1996)Vlassak K, Vanderleyden J, Franco A. Competition and persistence ofRhizobium tropici and Rhizobium etli in tropical soil during successive bean (Phaseolus vulgaris L.) cultures. Biol Fertil Soils. 1996;21:61-8., em uma área sem histórico de plantio de feijão em Seropédica, RJ, verificaram que a inoculação com rizóbio resultou em aumentos na nodulação e na atividade da nitrogenase no sistema radicular no 1º ano de cultivo; no entanto, a reintrodução do inoculante no 3º ano de plantio não teve qualquer efeito já que a população de rizóbios da área saltou de 30 células g-1 de solo, no 1º ano, para 104 células g-1 de solo no 3º ano. Tajini et al. (2008)Tajini F, Drevon JJ, Lamouchi L, Aouani ME, Trabelsi M. Response of common bean lines to inoculation: comparison between the Rhizobium tropici CIAT899 and the native Rhizobium etli 12a3 and their persistence in Tunisian soils. World J Microbiol Biotechnol. 2008;24:407-17. observaram em um solo na Tunísia que a inoculação com rizóbio no 1º ano de cultivo do feijão foi capaz de manter plena ocupação nodular do rizóbio inoculado por até três ciclos de crescimento, mas que essa ocupação nodular caiu drasticamente a partir do 2º ano de cultivo. Entretanto, Mostasso et al. (2002)Mostasso L, Mostasso FL, Dias BG, Vargas MAT, Hungria M. Selection of bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobial strains for the Brazilian Cerrados. Field Crops Res. 2002;73:121-32., em solo sem cultivo de feijão por três anos, mas com elevada população nativa de rizóbio, obtiveram respostas à inoculação, que foram ainda maiores após a reinoculação das bactérias no ano seguinte; e Hungria et al. (2003)Hungria M, Campo RJ, Mendes IC. Benefits of inoculation of the common bean (Phaseolus vulgaris) crop with efficient and competitive Rhizobium tropici strains. Biol Fertil Soils. 2003;39:88-93. verificaram que a inoculação de estirpes selecionadas aumentou a ocupação dos nódulos de feijoeiro com essas estirpes, mesmo em solos com elevada população autóctone de rizóbios, com aumento da ocupação obtido com a reinoculação em cultivo posterior. Essas evidências indicam a adequação da inoculação das sementes em todos os anos de cultivo do feijoeiro, visando manter elevada ocupação dos nódulos com as estirpes mais eficientes introduzidas no inoculante.

Um dos desafios da pesquisa científica sobre a tecnologia de inoculação em feijoeiro é o desenvolvimento de inoculantes adaptados às diferentes regiões agroecológicas brasileiras, que poderiam ser produzidos a partir de estirpes adaptadas às condições edáficas dessas áreas, potencializando a resposta à inoculação. Pode-se considerar que esse desafio tenha sido superado para o Cerrado, região de origem de diversas estirpes eficientes de R. tropici (Hungria et al., 2003Hungria M, Campo RJ, Mendes IC. Benefits of inoculation of the common bean (Phaseolus vulgaris) crop with efficient and competitive Rhizobium tropici strains. Biol Fertil Soils. 2003;39:88-93.). Todavia, essa abordagem esbarra na morosidade e dificuldades inerentes do processo de seleção e recomendação de estirpes para cada um dos ambientes, além das limitações práticas do processo produtivo de inoculantes, pois reduz os ganhos de escala nas plantas industriais. A alternativa que tem sido adotada é o uso de inoculantes mistos com estirpes selecionadas em diferentes regiões produtoras e que evidenciam diferentes graus de eficiência de resposta em campo, alternativa que atende à recomendação de manter o processo de reinoculação nessas áreas e potencializa a ocupação nodular pelas estirpes selecionadas.

Também em Macaé, em propriedade rural com cultivo frequente de feijão, não foram observadas diferenças entre os tratamentos-controle, com inoculação ou com aplicação de 80 kg ha-1 de N no plantio, em termos de MSPA e produção de grãos (Figura 4). Apesar de o histórico de cultivo frequente de feijoeiro, a população de rizóbio em Macaé foi de 10-2 células g-1 de solo, similar ao solo de Valença sem histórico de cultivo de feijão, e bem inferior aos experimentos em Goiás. Essa baixa população pode ser explicada pelo sistema de cultivo em Macaé, onde a várzea sofre periodicamente inundação para cultivo de arroz, e posterior drenagem para o plantio de feijão. Em um sistema de rotação soja-arroz na Austrália, a população deBradyrhizobium era de 2,2 × 105 células g-1 de solo, após o cultivo de soja; porém, após a área ser inundada para cultivo de arroz, a população foi reduzida para 3,7 × 102 células g-1 de solo (Roughley et al., 1995Roughley RJ, Gault RR, Gemell LG, Andrews JA, Brockwell J, Dunn BW, Griffiths GW, Hartley EJ, Hebb DM, Peoples MB, Thompson JA. Autecology ofBradyrhizobium japonicum in soybean-rice rotations. Plant Soil. 1995;176:7-14.). Dessa forma, a ausência de resposta à aplicação de 120 kg ha-1 de N e à inoculação com rizóbio em Macaé pode ser atribuída principalmente ao elevado teor de C orgânico no solo (Quadro 1), que pode ter possibilitado a liberação de quantidades suficientes de N por meio da mineralização da matéria orgânica, acarretando inclusive redução no rendimento no tratamento inoculado com aplicação de 80 kg ha-1 de N no plantio (Figura 4). É importante ressaltar que a nodulação não foi totalmente inibida nesse solo, e o aproveitamento do N pela FBN nesse cultivo é evidenciado pela maior produtividade obtida quando da inoculação associada com a aplicação de N em cobertura (Figura 4).

Brutti et al. (1999)Brutti L, Piantanida N, Ljunggren H, Berggren I, Martensson A. Competition between strains of Bradyrhizobium japonicum for nodulation of soybeans in Argentine arable soils. Appl Soil Ecol. 1999;12:1-6. observaram alterações na competitividade de Bradyrhizobium japonicum, que nodula a soja, em solo com alto teor de matéria orgânica; todavia, a matéria orgânica do solo contribuiu para o estabelecimento da população nativa de rizóbio, o que resultou em alta nodulação e produtividade promovidas por essas bactérias. Em uma várzea drenada, com solo de alta fertilidade natural e alto teor de matéria orgânica cultivado anteriormente com feijão, Arf et al. (1991)Arf O, Fornasieri Filho D, Malheiros EB, Saito SMT. Efeito da inoculação e adubação nitrogenada em feijoeiro (Phaseolus vulgarisL.) cultivar carioca 80. I. Solo de alta fertilidade. R Cient. 1991;19:29-38. obtiveram níveis de produtividade elevados do feijoeiro, mesmo na ausência de adubação nitrogenada ou inoculação com rizóbio. Em um solo com histórico de cultivo de feijão, com população de rizóbio de 105 células g-1 de solo e elevado teor de matéria orgânica, Raposeiras et al. (2006)Raposeiras R, Marriel IE, Muzzi MRS, Paiva E, Pereira Filho IA, Carvalhais LC, Passos RVM, Pinto PP, Sá NMH. Rhizobium strains competitiveness on bean nodulation in Cerrado soils. Pesq Agropec Bras. 2006;41:439-47. obtiveram elevados rendimentos de grãos no controle não inoculado e respostas à inoculação pouco evidentes.

Respostas mais consistentes à inoculação com rizóbio ocorreram em Valença (Figura 3), em área previamente cultivada com pastagem e sem histórico de cultivo de feijão, com população nativa de rizóbio estimada em 102 células g-1 de solo. Nesse caso, a inoculação com as estirpes comerciais de rizóbio aumentou a MSPA e a massa de nódulos das cultivares Carioca e Ouro Negro e a produção de grãos da cultivar Ouro Negro (Figura 3). Além disso, a inoculação com rizóbio em Valença, associada à adubação de cobertura com 40 kg ha-1 de N, forneceu os maiores rendimentos (3420 kg ha-1) na cultivar Ouro Negro. Em dois cultivos em Selvíria, MS, Romanini Junior et al. (2007)Romanini Junior A, Arf O, Binotti FFS, Sá ME, Buzetti S, Fernandes FA. Avaliação da inoculação de rizóbio e adubação nitrogenada no desenvolvimento do feijoeiro, sob sistema plantio direto. Biosci J. 2007;23:74-82. observaram que a inoculação das sementes com rizóbio aumentou em 17 % o rendimento do feijoeiro em sistema de plantio direto. Aumentos do rendimento de grãos do feijoeiro comum em resposta à inoculação com rizóbio no Brasil também foram reportadas por Vargas et al. (2000)Vargas MAT, Mendes IC, Hungria M. Response of field grown bean (Phaseolus vulgaris L.) to Rhizobiuminoculation and nitrogen fertilization in two Cerrado soils. Biol Fertil Soils. 2000;32:228-33., Mostasso et al. (2002)Mostasso L, Mostasso FL, Dias BG, Vargas MAT, Hungria M. Selection of bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobial strains for the Brazilian Cerrados. Field Crops Res. 2002;73:121-32., Hungria et al. (2000Hungria M, Andrade DS, Chueire LMO, Probanza A, Guttierrez-Mañero FJ, Megías M. Isolation and characterization of new efficient and competitive bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobia from Brazil. Soil Biol Biochem. 2000;32:1515-28.,2003Hungria M, Campo RJ, Mendes IC. Benefits of inoculation of the common bean (Phaseolus vulgaris) crop with efficient and competitive Rhizobium tropici strains. Biol Fertil Soils. 2003;39:88-93.) e Pelegrin et al. (2009)Pelegrin R, Mercante FM, Otsubo IMN, Otsubo AA. Resposta da cultura do feijoeiro à adubação nitrogenada e à inoculação com rizóbio. R Bras Ci Solo. 2009;33:219-26., confirmando a viabilidade da tecnologia de inoculação do feijoeiro com estirpes eficientes de rizóbio.

A estirpe BR 923 de Sinorhizobium sp. apresentou desempenho similar às estirpes comerciais no primeiro experimento conduzido em Goiás, tanto na produtividade quanto nos demais parâmetros avaliados nas duas cultivares de feijoeiro (Figura 1). No segundo experimento, no mesmo local, as plantas inoculadas com a estirpe BR 923 apresentaram boa nodulação, e a produtividade no tratamento inoculado com essa estirpe que recebeu suplementação de N em cobertura superou 2.500 kg ha-1 na cultivar Ouro Negro (Figura 2). Em Valença, apesar de a inoculação com a estirpe BR 923 propiciar nodulação inferior, a cultivar Carioca inoculada com essa estirpe, com ou sem suplementação de N em cobertura, evidenciou produtividade similar aos demais tratamentos (Figura 3). Isso indica um potencial da utilização de estirpes deSinorhizobium em inoculantes para o feijoeiro, que tem que ser confirmado em ensaios de campo adicionais onde seja avaliada sua eficiência e competitividade, em comparação às atuais estirpes recomendadas para utilização no inoculante comercial.

Nos dois experimentos em Goiás, a aplicação de N na semeadura aumentou a biomassa de parte aérea na floração, estímulo que não se refletiu em maiores rendimentos de grãos (Figuras 1 e 2). A aplicação de N no plantio acarretou redução na nodulação das plantas inoculadas com a estirpe comercial no experimento em Macaé (Figura 4), e com as estirpes nativas nos experimentos em Goiás, como observado na comparação das testemunhas nitrogenadas com as testemunhas absolutas (Figuras 1 e 2). Esses resultados comprovam a sensibilidade do processo de FBN ao aumento da disponibilidade de N no solo e o efeito deletério da aplicação de N no plantio na formação dos nódulos de feijoeiro (Leidi e Rodríguez-Navarro, 2000Leidi EO, Rodríguez-Navarro DN. Nitrogen and phosphorus availability limit N2 fixation in bean. New Phytol. 2000;147:337-46.). Além disso, a adubação nitrogenada pode reduzir a ocupação dos nódulos pelas estirpes introduzidas no inoculante comercial (Vargas et al., 2000Vargas MAT, Mendes IC, Hungria M. Response of field grown bean (Phaseolus vulgaris L.) to Rhizobiuminoculation and nitrogen fertilization in two Cerrado soils. Biol Fertil Soils. 2000;32:228-33.).

Todavia, o efeito do N aplicado na semeadura do feijoeiro comum pode variar de acordo com a dose empregada. Pelegrin et al. (2009)Pelegrin R, Mercante FM, Otsubo IMN, Otsubo AA. Resposta da cultura do feijoeiro à adubação nitrogenada e à inoculação com rizóbio. R Bras Ci Solo. 2009;33:219-26.não observaram prejuízos à nodulação das plantas de feijoeiro que foram inoculadas e adubadas com 20 kg ha-1 de N no plantio; o rendimento de grãos desse tratamento foi equivalente à aplicação de 160 kg ha-1 de N. Entretanto, a aplicação de 40 kg ha-1 de N na semeadura reduziu em 10 % o N derivado da atmosfera, porém com marcadas variações entre os genótipos de feijoeiro comum, indicando a possibilidade de seleção de genótipos com maior eficiência da FBN sob adubação mineral (Rennie e Kemp, 1983Rennie RJ, Kemp GA. N2-fixation in field beans quantified by 15N isotope dilution. II. Effect of cultivars of beans. Agron J. 1983;75:645-9.). Esses resultados indicam a necessidade de estudos mais extensos em condições de campo para avaliar a compatibilidade da aplicação de N na semeadura e o processo de nodulação do feijoeiro.

Foi possível identificar efeitos positivos da adubação nitrogenada de cobertura sobre o rendimento de grãos nos experimentos em Goiás II e Macaé, quando da inoculação com a estirpe BR 923 (Figura 2) e com as estirpes comerciais (Figura 4), respectivamente, além de aumento médio de 8 % no rendimento de grãos em Valença, considerando as diferentes fontes de N aplicadas na semeadura (Figura 3). Pacheco et al. (2012)Pacheco RS, Brito LF, Straliotto R, Pérez DV, Araújo AP. Seeds enriched with phosphorus and molybdenum as a strategy for improving grain yield of common bean crop. Field Crops Res. 2012;136:97-106. também observaram, em experimentos de campo no Rio de Janeiro e em Goiás, que a inoculação do feijoeiro, combinada com 40 kg ha-1 de N em cobertura, forneceu produtividade e acumulação de N nos grãos similar à aplicação de 60 kg ha-1 de N. Em experimentos no Paraná, foi observado efeito sinérgico positivo da adubação nitrogenada e da inoculação com rizóbio, em termos de aumento na produção de grãos (Hungria et al., 2003Hungria M, Campo RJ, Mendes IC. Benefits of inoculation of the common bean (Phaseolus vulgaris) crop with efficient and competitive Rhizobium tropici strains. Biol Fertil Soils. 2003;39:88-93.).

Os efeitos benéficos da aplicação de N em cobertura, em complementação à inoculação com rizóbio no feijoeiro, podem estar associados à elevada demanda do cultivo no início dos estádios reprodutivos (Araújo e Teixeira, 2008Araújo AP, Teixeira MG. Relationships between grain yield and accumulation of biomass, nitrogen and phosphorus in common bean cultivars. R Bras Ci Solo. 2008;32:1977-86.). Com o início do enchimento de vagens no feijoeiro, os nódulos passam por uma série de alterações estruturais e fisiológicas, que resultam na sua senescência e perda da capacidade de fixar N2 durante um estádio de alta demanda metabólica para a formação dos grãos (Fernández-Luqueño et al., 2008Fernández-Luqueño F, Dendooven L, Munive A, Corlay-Chee L, Serrano-Covarrubias LM, Espinosa-Victoria D. Micro-morphology of common bean (Phaseolus vulgaris L.) nodules undergoing senescence. Acta Physiol Plant. 2008;30:545-52.), que assim não será suprida por meio da simbiose. Nessas situações, e quando o suprimento de N no solo não é suficiente, a demanda de N do cultivo pode ser satisfeita com o fertilizante nitrogenado aplicado em cobertura (Franco et al., 1979Franco AA, Pereira JC, Neyra CA. Seasonal patterns of nitrate reductase and nitrogenase activities in Phaseolus vulgaris L. Plant Physiol. 1979;63:421-4.; Soratto et al., 2011Soratto RP, Fernandes AM, Souza EFC, Souza-Schlick GD. Produtividade e qualidade dos grãos de feijão em função da aplicação de nitrogênio em cobertura e via foliar. R Bras Ci Solo. 2011;35:2019-28.). Deve-se também considerar que a resposta do feijoeiro comum à adubação de cobertura pode variar conforme o genótipo avaliado (Furtini et al., 2006Furtini IV, Ramalho MAP, Abreu AFB, Furtini Neto AE. Resposta diferencial de linhagens de feijoeiro ao nitrogênio. Ci Rural. 2006;36:1696-700.) e o sistema de cultivo (Farinelli et al., 2006Farinelli R, Lemos LB, Penariol FG, Egéa MM, Gasparoto MG. Adubação nitrogenada de cobertura do feijoeiro, em plantio direto e convencional. Pesq Agropec Bras. 2006;41:307-12.).

Os resultados deste estudo, obtidos em dois biomas distintos, confirmaram as evidências de que em áreas com cultivos prévios de feijão ocorre o estabelecimento de uma população nativa de rizóbio capaz de competir com as estirpes introduzidas pelo inoculante comercial, reduzindo as respostas à inoculação. Já em áreas com baixa população nativa de rizóbio no solo, a inoculação de estirpes eficientes de rizóbio pode resultar em aumentos significativos na nodulação, no crescimento e no rendimento de grãos de feijão. Em ambos os biomas, a cultura beneficiou-se da FBN, tanto por meio das estirpes nativas de rizóbio ou do uso de inoculantes eficientes, apresentando produtividade comparável à aplicação de doses elevadas de fertilizante nitrogenado. A inoculação com estirpes comerciais de rizóbio pode substituir a aplicação de N na semeadura, reduzindo os custos de produção da cultura. Os maiores rendimentos podem ser obtidos com a inoculação com rizóbio associada à adubação de cobertura com N mineral.

CONCLUSÕES

Em áreas com cultivos anteriores de feijoeiro comum e com população elevada de rizóbio nativo no solo, a inoculação com estirpes comerciais de rizóbio ou a adubação com 120 kg ha-1 de N mineral não aumentou o rendimento de grãos do feijoeiro.

Em área sem cultivo prévio de feijoeiro comum, a inoculação com estirpes comerciais de rizóbio elevou o rendimento de grãos de feijão, em particular quando associada à adubação de cobertura com 40 kg ha-1 de N.

O potencial de produtividade do feijoeiro inoculado com rizóbio associado à suplementação com N em cobertura pode alcançar 2.500 kg ha-1 no bioma Cerrado e 3.000 kg ha-1 no bioma Mata Atlântica, na cultivar Ouro Negro.

REFERÊNCIAS

  • Adámoli J, Macedo J, Azevedo LG, Madeira Neto J. Caracterização da região do cerrado. In: Goedert WJ, editor. Solos dos cerrados: Tecnologias e estratégias de manejo. Planaltina: Embrapa CPAC; São Paulo: Nobel; 1986. p.33-74.
  • Araújo AP, Teixeira MG. Relationships between grain yield and accumulation of biomass, nitrogen and phosphorus in common bean cultivars. R Bras Ci Solo. 2008;32:1977-86.
  • Arf O, Fornasieri Filho D, Malheiros EB, Saito SMT. Efeito da inoculação e adubação nitrogenada em feijoeiro (Phaseolus vulgarisL.) cultivar carioca 80. I. Solo de alta fertilidade. R Cient. 1991;19:29-38.
  • Brutti L, Piantanida N, Ljunggren H, Berggren I, Martensson A. Competition between strains of Bradyrhizobium japonicum for nodulation of soybeans in Argentine arable soils. Appl Soil Ecol. 1999;12:1-6.
  • Companhia Nacional de Abastecimento - Conab. Acompanhamento da safra brasileira: grãos, décimo segundo levantamento, setembro 2013. Brasília: 2013. [Acesso em 10 abr 2014]. Disponível em: http://www.conab.gov.br.
    » http://www.conab.gov.br
  • Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Manual de métodos de análise de solo. 2ª.ed. Rio de Janeiro: 1997.
  • Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Sistema brasileiro de classificação de solos. 3ª.ed. Brasília: 2013.
  • Farinelli R, Lemos LB, Penariol FG, Egéa MM, Gasparoto MG. Adubação nitrogenada de cobertura do feijoeiro, em plantio direto e convencional. Pesq Agropec Bras. 2006;41:307-12.
  • Fernández-Luqueño F, Dendooven L, Munive A, Corlay-Chee L, Serrano-Covarrubias LM, Espinosa-Victoria D. Micro-morphology of common bean (Phaseolus vulgaris L.) nodules undergoing senescence. Acta Physiol Plant. 2008;30:545-52.
  • Franco AA, Pereira JC, Neyra CA. Seasonal patterns of nitrate reductase and nitrogenase activities in Phaseolus vulgaris L. Plant Physiol. 1979;63:421-4.
  • Furtini IV, Ramalho MAP, Abreu AFB, Furtini Neto AE. Resposta diferencial de linhagens de feijoeiro ao nitrogênio. Ci Rural. 2006;36:1696-700.
  • Galindo-Leal C, Câmara IG. The Atlantic Forest of South America: Biodiversity status, threats, and outlook. Washington: Island Press, Center for Applied Biodiversity Science at Conservation International; 2003.
  • Grange L, Hungria M. Genetic diversity of indigenous common bean (Phaseolus vulgaris) rhizobia in two Brazilian ecosystems. Soil Biol Biochem. 2004;36:1389-98.
  • Hardarson G, Bliss FA, Cigales-Rivero MR, Henson RA, Kipe-Nolt JA, Longeri L, Manrique A, Peña-Cabriales JJ, Pereira PAA, Sanabria CA, Tsai SM. Genotypic variation in biological nitrogen fixation by common bean. Plant Soil. 1993;152:59-70.
  • Hungria M, Andrade DS, Chueire LMO, Probanza A, Guttierrez-Mañero FJ, Megías M. Isolation and characterization of new efficient and competitive bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobia from Brazil. Soil Biol Biochem. 2000;32:1515-28.
  • Hungria M, Campo RJ, Mendes IC. Benefits of inoculation of the common bean (Phaseolus vulgaris) crop with efficient and competitive Rhizobium tropici strains. Biol Fertil Soils. 2003;39:88-93.
  • Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Mapa de Biomas do Brasil, primeira aproximação. Rio de Janeiro: 2004. [Acesso em 14 ago 2011]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br.
    » http://www.ibge.gov.br
  • Judicial Commission of the International Committee on Systematics of Prokaryotes. The genus name Sinorhizobium Chen et al. 1988 is a later synonym of Ensifer Casida 1982 and is not conserved over the latter genus name, and the species name ‘Sinorhizobium adhaerens’ is not validly published. Opinion 84. Int J Syst Evol Microbiol. 2008;58:1973.
  • Kaschuk G, Hungria M, Andrade DS, Campo RJ. Genetic diversity of rhizobia associated with common bean (Phaseolus vulgaris L.) grown under no-tillage and conventional systems in Southern Brazil. Appl Soil Ecol. 2006;32:210-20.
  • Leidi EO, Rodríguez-Navarro DN. Nitrogen and phosphorus availability limit N2 fixation in bean. New Phytol. 2000;147:337-46.
  • Lombardi MLCO, Moreira M, Ambrósio LA, Cardoso EJBN. Occurrence and host specificity of indigenous rhizobia from soils of São Paulo State, Brazil. Sci Agric. 2009;66:543-8.
  • Malavolta E, Vitti GC, Oliveira SA. Avaliação do estado nutricional das plantas. 2ª.ed. Piracicaba: Associação Brasileira para Pesquisa da Potassa e do Fosfato; 1997.
  • Michiels J, Dombrecht B, Vermeiren N, Xi C, Luyten E, Vanderleyden J. Phaseolus vulgaris is a non-selective host for nodulation. FEMS Microbiol Ecol. 1998;26:193-205.
  • Mostasso L, Mostasso FL, Dias BG, Vargas MAT, Hungria M. Selection of bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobial strains for the Brazilian Cerrados. Field Crops Res. 2002;73:121-32.
  • Pacheco RS, Brito LF, Straliotto R, Pérez DV, Araújo AP. Seeds enriched with phosphorus and molybdenum as a strategy for improving grain yield of common bean crop. Field Crops Res. 2012;136:97-106.
  • Pelegrin R, Mercante FM, Otsubo IMN, Otsubo AA. Resposta da cultura do feijoeiro à adubação nitrogenada e à inoculação com rizóbio. R Bras Ci Solo. 2009;33:219-26.
  • Pereira PAA, Burris RH, Bliss FA. 15N-determined dinitrogen fixation potential of genetically diverse bean lines (Phaseolus vulgaris L.). Plant Soil. 1989;120:171-9.
  • Raposeiras R, Marriel IE, Muzzi MRS, Paiva E, Pereira Filho IA, Carvalhais LC, Passos RVM, Pinto PP, Sá NMH. Rhizobium strains competitiveness on bean nodulation in Cerrado soils. Pesq Agropec Bras. 2006;41:439-47.
  • RELARE. Rede de Laboratórios para Recomendação, Padronização e Difusão de Tecnologia de Inoculantes Microbianos de Interesse Agrícola [home page] 2004. [Acesso em: out 2011]. Disponível em: http://www.relare.org.br.
    » http://www.relare.org.br
  • Rennie RJ, Kemp GA. N2-fixation in field beans quantified by 15N isotope dilution. II. Effect of cultivars of beans. Agron J. 1983;75:645-9.
  • Romanini Junior A, Arf O, Binotti FFS, Sá ME, Buzetti S, Fernandes FA. Avaliação da inoculação de rizóbio e adubação nitrogenada no desenvolvimento do feijoeiro, sob sistema plantio direto. Biosci J. 2007;23:74-82.
  • Roughley RJ, Gault RR, Gemell LG, Andrews JA, Brockwell J, Dunn BW, Griffiths GW, Hartley EJ, Hebb DM, Peoples MB, Thompson JA. Autecology ofBradyrhizobium japonicum in soybean-rice rotations. Plant Soil. 1995;176:7-14.
  • Soares ALL, Ferreira PAA, Pereira JPAR, Vale HMM, Lima AS, Andrade MJB, Moreira FMS. Eficiência agronômica de rizóbios selecionados e diversidade de populações nativas nodulíferas em Perdões (MG). II - Feijoeiro. R Bras Ci Solo. 2006;30:803-11.
  • Somasegaran P, Hoben HJ. Methods in legume-Rhizobiumtechnology. Hawai: Niftal Project, Mircen; 1985.
  • Soratto RP, Fernandes AM, Souza EFC, Souza-Schlick GD. Produtividade e qualidade dos grãos de feijão em função da aplicação de nitrogênio em cobertura e via foliar. R Bras Ci Solo. 2011;35:2019-28.
  • Souza MFM, Vale HMM, Straliotto R. Competitividade de estirpes pertencentes a diferentes espécies de rizóbio para ocupação nodular em feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.). Agronomia. 2003;37:59-63.
  • Stocco P, Santos JCP, Vargas VP, Hungria M. Avaliação da biodiversidade de rizóbios simbiontes do feijoeiro (Phaseolus vulgarisL.) em Santa Catarina. R Bras Ci Solo. 2008;32:1107-20.
  • Straliotto R, Cunha CO, Ferreira ME, Rumjanek NG. Diversidade genética do rizóbio que nodula o feijoeiro em regiões tropicais:Sinorhizobium, um novo gênero nodulando eficientemente o feijoeiro em condições de estresse térmico. In: Resumos do 19º Congresso Brasileiro de Microbiologia; 1997; Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Microbiologia; 1997.
  • Tajini F, Drevon JJ, Lamouchi L, Aouani ME, Trabelsi M. Response of common bean lines to inoculation: comparison between the Rhizobium tropici CIAT899 and the native Rhizobium etli 12a3 and their persistence in Tunisian soils. World J Microbiol Biotechnol. 2008;24:407-17.
  • Torres AR, Cursino L, Muro-Abad JI, Gomes EA, Araújo EF, Hungria, M, Cassini STA. Genetic diversity of indigenous common bean (Phaseolus vulgaris L.) rhizobia from the state of Minas Gerais, Brazil. Braz J Microbiol. 2009;40:852-6.
  • Vargas MAT, Mendes IC, Hungria M. Response of field grown bean (Phaseolus vulgaris L.) to Rhizobiuminoculation and nitrogen fertilization in two Cerrado soils. Biol Fertil Soils. 2000;32:228-33.
  • Vlassak K, Vanderleyden J, Franco A. Competition and persistence ofRhizobium tropici and Rhizobium etli in tropical soil during successive bean (Phaseolus vulgaris L.) cultures. Biol Fertil Soils. 1996;21:61-8.
  • Westermann DT, Kleinkopf GE, Porter LK, Leggett GE. Nitrogen sources for bean seed production. Agron J. 1981;73:660-4.
  • Young JM. Sinorhizobium versusEnsifer: May a taxonomy subcommittee of the ICSP contradict the Judicial Commission? Int J Syst Evol Microbiol. 2010;60:1711-3.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    2 Jun 2014
  • Aceito
    24 Abr 2015
Sociedade Brasileira de Ciência do Solo Secretaria Executiva , Caixa Postal 231, 36570-000 Viçosa MG Brasil, Tel.: (55 31) 3899 2471 - Viçosa - MG - Brazil
E-mail: sbcs@ufv.br