Acessibilidade / Reportar erro

Classificação de horizontes diagnósticos em níveis hierárquicos inferiores com base nas frações húmicas

Classification of diagnostic horizons in lower hierarchical levels on the basis of humic fractions

Resumos

Com desenvolvimento da classificação dos solos até o quarto nível categórico do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos SiBCS, busca-se a elaboração e padronização de propostas para a classificação dos solos no quinto e sexto níveis categóricos (família e série). Nesse sentido, o presente trabalho teve como objetivo verificar a viabilidade das frações húmicas para a classificação de horizontes diagnósticos no quinto ou sexto níveis categóricos (família e série) do SiBCS. Para o desenvolvimento da proposta, foram utilizados 169 horizontes diagnósticos distribuídos entre O hístico, H hístico, A chernozêmico, A húmico e B espódico. Esses horizontes foram analisados quanto à composição química e física. Também foram quantificados os teores de C orgânico nas frações: ácidos fúlvicos (C-FAF), ácidos húmicos (C-FAH) e humina (C-HUM), extrato alcalino (C-EA). Foram calculadas as relações C-FAH/C-FAF, C-EA/C-HUM (C-EA = C-FAF + C-FAH) e a %FAF, %FAH e %HUM. As propostas de classes estabelecidas para cada horizonte diagnóstico no quinto ou sexto níveis categóricos estão relacionadas ao C-FAH e C-HUM e às relações C-FAH/C-FAF e C-EA/C-HUM, identificadas a partir de correlações significativas com os atributos químicos e físicos. Quanto aos horizontes O e H hístico, apresentam-se classes com base na relação C-FAH/C-FAF. Nos horizontes A chernozêmico e A húmico há duas classes para cada um deles, tendo como base C-HUM e a relação C-FAH/C-FAF, para o primeiro, e C-FAH e C-HUM, para o segundo. Para os horizontes B espódico, apresentam-se três classes, a partir do C-FAH e das relações C-FAH/C-FAF e C-EA/C-HUM.

SiBCS; matéria orgânica e classes de classificação


With the development of soil classification to the fourth category level of the Brazilian Soil Classification System - SiBCS, it seeks the development and standardization of proposals for the classification of soils in 5 th and 6 th categorical levels (family and series). In this sense, this paper aims to available the viability of the humic fractions for the classification of diagnostic horizons in the 5th or 6th categorical levels (family and series) of SiBCS. For the development of the proposal a total of 169 diagnostic horizons distributed among Folistic Epipedon (O hístico), Histic Epipedon (H hístico), Mollic Epipedon (A chernozêmico), Umbric Epipedon (A húmico) and Spodic Horizon (B espódico) were used. These horizons were analyzed for chemical and physical composition. Also quantified the levels of organic carbon fractions: fulvic acids (C-FAF), humic acids (C-HAF) and humin (C-HUM) and alkaline extract (C-AE). Relations were calculated C-HAF/C-FAF, C-AE/C-HUM (AE = C-FAF + C-HAF) and %FAF, % FAH and %HUM. Proposals for classes completed for each diagnostic horizons in the 5th or 6th categorical levels are related to the C-FAH, C-HUM and C-HAF/C-FAF and C-AE/C-HUM ratios, identified from significant correlations with the chemical and physical attributes. For O and H Epipedons presents classes based on the C-HAF/C-FAF ratio. The Mollic and Umbric Epipedons have been two classes for each horizon, based on the C-HUM and C-HAF/C-FAF ratio for the first and the C-HAF and C-HUM, for the second. For Spodic Horizon, are presented three classes, from the C-HAF and C-HAF/C-FAF and C-AE/C-HUM ratios.

SiBCS; organic matter and classification classes


DIVISÃO 1 - SOLO NO ESPAÇO E NO TEMPO

1.2 - LEVANTAMENTO E CLASSIFICAÇÃO DO SOLO

Classificação de horizontes diagnósticos em níveis hierárquicos inferiores com base nas frações húmicas1 1 Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor no Curso de Pós-Graduação em Agronomia Ciência do Solo, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro UFRRJ.

Classification of diagnostic horizons in lower hierarchical levels on the basis of humic fractions

Ademir FontanaI; Marcos Gervasio PereiraII; Lúcia Helena Cunha dos AnjosII; Vinicius de Melo BenitesI

IPesquisador, Embrapa Solos. Rua Jardim Botânico 1024, CEP 22460-000 Rio de Janeiro (RJ). E-mails: ademir.fontana@cnps.embrapa.br; vinicius@cnps.embrapa.br

IIProfessor Associado II, Departamento de Solos, UFRRJ. Bolsista do CNPq e da FAPERJ. E-mails: gervasio@ufrrj.br; lanjos@ufrrj.br

RESUMO

Com desenvolvimento da classificação dos solos até o quarto nível categórico do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos SiBCS, busca-se a elaboração e padronização de propostas para a classificação dos solos no quinto e sexto níveis categóricos (família e série). Nesse sentido, o presente trabalho teve como objetivo verificar a viabilidade das frações húmicas para a classificação de horizontes diagnósticos no quinto ou sexto níveis categóricos (família e série) do SiBCS. Para o desenvolvimento da proposta, foram utilizados 169 horizontes diagnósticos distribuídos entre O hístico, H hístico, A chernozêmico, A húmico e B espódico. Esses horizontes foram analisados quanto à composição química e física. Também foram quantificados os teores de C orgânico nas frações: ácidos fúlvicos (C-FAF), ácidos húmicos (C-FAH) e humina (C-HUM), extrato alcalino (C-EA). Foram calculadas as relações C-FAH/C-FAF, C-EA/C-HUM (C-EA = C-FAF + C-FAH) e a %FAF, %FAH e %HUM. As propostas de classes estabelecidas para cada horizonte diagnóstico no quinto ou sexto níveis categóricos estão relacionadas ao C-FAH e C-HUM e às relações C-FAH/C-FAF e C-EA/C-HUM, identificadas a partir de correlações significativas com os atributos químicos e físicos. Quanto aos horizontes O e H hístico, apresentam-se classes com base na relação C-FAH/C-FAF. Nos horizontes A chernozêmico e A húmico há duas classes para cada um deles, tendo como base C-HUM e a relação C-FAH/C-FAF, para o primeiro, e C-FAH e C-HUM, para o segundo. Para os horizontes B espódico, apresentam-se três classes, a partir do C-FAH e das relações C-FAH/C-FAF e C-EA/C-HUM.

Termos de indexação: SiBCS, matéria orgânica e classes de classificação.

SUMMARY

With the development of soil classification to the fourth category level of the Brazilian Soil Classification System – SiBCS, it seeks the development and standardization of proposals for the classification of soils in 5 th and 6 th categorical levels (family and series). In this sense, this paper aims to available the viability of the humic fractions for the classification of diagnostic horizons in the 5th or 6th categorical levels (family and series) of SiBCS. For the development of the proposal a total of 169 diagnostic horizons distributed among Folistic Epipedon (O hístico), Histic Epipedon (H hístico), Mollic Epipedon (A chernozêmico), Umbric Epipedon (A húmico) and Spodic Horizon (B espódico) were used. These horizons were analyzed for chemical and physical composition. Also quantified the levels of organic carbon fractions: fulvic acids (C-FAF), humic acids (C-HAF) and humin (C-HUM) and alkaline extract (C-AE). Relations were calculated C-HAF/C-FAF, C-AE/C-HUM (AE = C-FAF + C-HAF) and %FAF, % FAH and %HUM. Proposals for classes completed for each diagnostic horizons in the 5th or 6th categorical levels are related to the C-FAH, C-HUM and C-HAF/C-FAF and C-AE/C-HUM ratios, identified from significant correlations with the chemical and physical attributes. For O and H Epipedons presents classes based on the C-HAF/C-FAF ratio. The Mollic and Umbric Epipedons have been two classes for each horizon, based on the C-HUM and C-HAF/C-FAF ratio for the first and the C-HAF and C-HUM, for the second. For Spodic Horizon, are presented three classes, from the C-HAF and C-HAF/C-FAF and C-AE/C-HUM ratios.

Index terms: SiBCS, organic matter and classification classes.

INTRODUÇÃO

Com a publicação da primeira edição do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos – SiBCS (Embrapa, 1999), que normatiza a classificação dos solos até o quarto nível categórico e sugere o emprego de alguns atributos para os demais níveis, foi iniciado o processo de validação e aperfeiçoamento desse sistema. Algumas mudanças foram apresentadas na segunda edição no ano de 2006 (Embrapa, 2006), onde as classes de solos foram estruturadas até o quarto nível categórico. O quinto e sexto níveis categóricos, que se encontram em fase de estruturação, são utilizados para atender funções pragmáticas, sendo avaliadas as características diferenciais e propriedades que possam vir a influenciar o uso e manejo do solo para fins diversos. Até o momento, conforme analisado o SiBCS, são apresentadas apenas propostas de critérios e atributos taxonômicos para sua definição, carecendo ainda de sugestões que visem concluir a classificação nesses níveis hierárquicos (Embrapa, 2006).

Nesse sentido, têm-se apresentado propostas para esses dois níveis categóricos voltadas para as frações húmicas que compõem a matéria orgânica do solo. O uso das frações húmicas como proposta de característica diferencial deve-se à relação da matéria orgânica com o uso e manejo dos solos, bem como ao crescimento das plantas, especialmente no desenvolvimento do sistema radicular, nas relações solo-água-planta e nas propriedades importantes para engenharia e geotécnica.

A utilização das frações húmicas tem por base a análise da sua distribuição ao longo do perfil de solo, condicionada pela mobilidade e também pela maior ou menor interação com a matriz mineral, que irá refletir na diferenciação dos horizontes, com reflexos em suas propriedades físicas e químicas. Para Anjos et al. (2008), as diferenças observadas na quantidade e na proporção das frações húmicas não só expressam variações na pedogênese, como tanbém permitem relacioná-las com atributos relevantes ao manejo dos solos.

Como proposta, Valladares et al. (2003) sugerem a utilização das frações húmicas na ordem dos Organossolos. Esses autores apresentaram uma subdivisão de classes com base nos teores de C das frações ácidos fúlvicos (C-FAF) e ácidos húmicos (C-FAH) e na relação entre o C do extrato alcalino (C-EA) e a humina (C-EA/C-HUM), sendo esta apresentada no SiBCS (Embrapa, 2006).

Nessa mesma linha de pesquisa, Fontana et al. (2008a,b), em estudos com diversas classes e horizontes diagnósticos de solos, relatam que a distribuição das frações húmicas pode ser usada para o entendimento dos processos pedogenéticos e para a caracterização de solos no nível de ordens e de horizontes diagnósticos do SiBCS. Nesses estudos, os autores têm destacado a utilização das frações húmicas nos horizontes diagnósticos H hístico, A chernozêmico e B espódico.

Fontana et al. (2010) apresentam uma proposta de características diferenciais para os níveis de família e série do SiBCS com base nas frações húmicas, sendo: matéria orgânica estável (horizontes minerais superficiais) com valores da relação do C-EA/C-HUM < 0,5; matéria orgânica iluvial (horizontes minerais subsuperficiais) com valores da relação do C-EA/C-HUM > 2,0; e potencial de lixiviação (sistema ou solo) com valores da relação do C-FAH/C-FAF e do C-EA/C-HUM > 1,0.

O presente trabalho teve como objetivo verificar a viabilidade das frações húmicas para a classificação de horizontes diagnósticos no quinto ou sexto níveis categóricos (família e série) do SiBCS.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados 169 horizontes diagnósticos, distribuídos entre O hístico, H hístico, A chernozêmico, A húmico e B espódico, conforme caracterização apresentada por Fontana et al. (2010). Esses horizontes foram selecionados em razão da maior participação da matéria orgânica em sua composição (Anjos et al., 2008). Os horizontes foram coletados em diferentes regiões fisiográficas do Brasil, sendo classificados segundo o Sistema Brasileiro de Classificação de Solos - SiBCS (Embrapa, 2006).

Foram avaliados os seguintes atributos químicos e físicos: pH em água, Ca2+, Mg2+, K+ e Na+, soma de bases (SB), H, Al3+, capacidade de troca de cátions a pH 7,0 (CTCpH 7,0), capacidade de troca de cátions efetiva (CTCe), saturação por bases (V %) e a granulometria, quantificando-se as frações areia, silte e argila pelo método da pipeta (Embrapa, 1997).

Também foram quantificadas as frações húmicas, segundo a técnica de solubilidade diferencial estabelecida pela Sociedade Internacional de Substâncias Húmicas (Swift, 1996), com adaptações (Benites et al., 2003a).

Na extração das frações húmicas foi utilizado 1,0 g de solo, o qual foi submetido ao contato com 20 mL de solução de NaOH a 0,1 mol L-1 por 24 h. Após esse período, o extrato alcalino foi separado do resíduo por meio de centrifugação a 5.000 gravidade por 30 min. Seguiu-se mais uma lavagem com a mesma solução, juntando-se o extrato com o anteriormente obtido, resultando em volume final de 40 mL. O resíduo foi retirado dos tubos de centrífuga, acondicionado em placa de Petri e secado a 65 ºC (secagem completa). O pH do extrato alcalino foi ajustado a 1,0 (± 0,1) com solução de ácido sulfúrico 20 %, seguido de decantação por 18 h em geladeira. Decorrido esse período, o precipitado (fração ácidos húmicos) foi separado da fração solúvel (fração ácidos fúlvicos) por filtragem e ambos os volumes aferidos a 50 mL com água destilada.

A quantificação do C orgânico nas frações ácidos fúlvicos e húmicos foi feita usando-se alíquotas de 5,0 mL de extrato, 1,0 mL de dicromato de potássio 0,042 mol L-1 e 5,0 mL de ácido sulfúrico concentrado, levado ao bloco digestor a 150 ºC até (30 min) e titulado com sulfato ferroso amoniacal 0,0125 mol L-1. No resíduo seco em estufa, foi determinado o carbono orgânico na fração humina, adicionando-se 5,0 mL de dicromato de potássio 0,1667 mol L-1 e 10,0 mL de ácido sulfúrico concentrado, em bloco digestor a 150 ºC (30 min) e titulação com sulfato ferroso amoniacal 0,25 mol L-1 e indicador ferroin (Yeomans & Bremner, 1988).

A partir dessa análise foram obtidos o C orgânico da fração ácidos fúlvicos (C-FAF), fração ácidos húmicos (C-FAH) e humina (C-HUM) e as relações C-FAH/C-FAF e C-EA/C-HUM, sendo (C-EA = C-FAF + C-FAH) (Benites et al., 2003a). Também foi calculado o percentual de cada fração em relação ao carbono orgânico total, % FAF, % FAH e % HUM.

Para a proposta de separação dos horizontes diagnósticos por classes no quinto e sexto níveis categóricos, foi analisada a distribuição das frações húmicas referentes aos valores quantitativos (C-FAF, C-FAH, C-HUM) e qualitativos (C-FAH/C-FAF e C-EA/C-HUM), que se destacaram pela magnitude e, ou, participação, além da capacidade de formação de grupos distintos em cada horizonte diagnóstico. Também, como análise auxiliar na tomada de decisão, fez-se uso da correlação de Pearson entre as frações húmicas e os atributos químicos e físicos de cada horizonte diagnóstico. Os valores participativos (% FAF, % FAH e % HUM) foram testados, porém apresentaram baixa capacidade de formação de grupos distintos.

Os valores das classes foram estabelecidos com base nas medidas de tendência central (média ou mediana) e, ou, na distribuição de frequências. Para validação, os horizontes foram submetidos à classificação proposta e realizou-se a comparação dos dados dos atributos químicos (pH, SB, H, Al3+, CTCpH 7,0, CTCe e V %) e físicos (areia, silte e argila) das classes estabelecidas.

Para comparação nas classes estabelecidas, os dados foram submetidos a teste de homogeneidade de variâncias e distribuição normal dos dados; quando atendidas as premissas, foi empregada a análise paramétrica, sendo realizada a análise de variância e avaliação do teste F para as classes das frações húmicas. Quando não atendidas as premissas, utilizou-se a análise não paramétrica, com a realização do teste de Mann-Whitney. Como nível de significância (intervalo de confiança) para ambos os testes foi utilizado o valor p < 0,10, uma vez que neste trabalho a confiança é suficiente para estabelecer as classes de classificação. Quanto à análise multivariada, fez-se uso da análise da distância generalizada de Mahalanobis (Johnson & Wichern, 1992; Khattree & Naik, 2000).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Horizontes O hístico

Nesses horizontes orgânicos, devido à natureza do material de origem, os teores das frações húmicas e dos atributos químicos apresentaram ampla variação (Quadro 1), destacando-se os altos valores de H e CTCpH 7,0. Esse padrão é indicativo da heterogeneidade entre os materiais orgânicos que compõem a origem desses horizontes, bem como reflexo da intensidade do processo de humificação a que a matéria orgânica é submetida e da composição da solução do solo.


Pela avaliação da correlação de Pearson, verificaram-se correlações positivas entre o C-FAH e a relação C-FAH/C-FAF com H (0,69 e 0,72). Para a relação C-FAH/C-FAF, verificou-se correlação positiva com Al3+ e CTCpH 7,0 (0,66 e 0,63) e negativa com pH (-0,66). A relação C-EA/C-HUM apresentou correlação negativa com SB, CTCe e V %. Essas correlações demonstram a influência das frações húmicas na acidez potencial e ativa, onde os grupos funcionais COOH e OH das estruturas orgânicas dissociam-se em valores de pH 3,0, liberando o H para a solução (Carey & Sundberg, 1990), e as cargas negativas geradas irão contribuir na acidez potencial e na capacidade de retenção de cátions (Sposito, 1989; Stevenson, 1994; Canellas et al., 2008).

Para o estabelecimento das classes, a variável C-FAH/C-FAF apresentou maior potencial e assim denominado de classes fúlvico-húmico e hiper-húmico (Quadro 2). Pela análise entre os atributos químicos de cada classe, verificaram-se diferenças significativas entre os valores de pH, H e CTCpH 7,0. Os valores de pH foram maiores na classe fúlvico-húmico, enquanto os valores de H e CTCpH 7,0 foram maiores na classe hiper-húmico (Quadro 3).



Horizontes H hístico

Assim como nos horizontes O hístico, os teores das frações húmicas e dos atributos químicos apresentaram ampla variação, observando-se altos valores da relação C-FAH/C-FAF e, de maneira geral, maiores que 2,0, além dos altos valores de H e CTCpH 7,0 (Quadro 4).


Pela avaliação da análise de correlação, foram observadas correlações negativas entre o C-FAH e a relação C-FAH/C-FAF com pH (-0,65 e -0,57) e positivas destas com H (0,67 e 0,69), assim como apresentado para os horizontes O hístico.

Nestes horizontes, além das propostas já apresentadas por Valladares et al. (2003), observa-se nova possibilidade de separação de classes com o uso da relação C-FAH/C-FAF (Quadro 5).


Foram verificadas diferenças significativas na maioria dos atributos, exceto para SB e CTCe (Quadro 6). Os menores valores de pH e V % foram observados na classe hiper-húmico, enquanto os valores de H, CTCpH 7,0 e Al3+ foram menores na classe fúlvico-húmico. Em relação aos menores valores de pH, observa-se a influência do tiomorfismo, uma vez que a maior parte dos baixos valores está relacionada a horizontes com subscrito ''j", assim como a sua maior acidez potencial (Quadro 4). Esses resultados indicam que os solos hiper-húmicos tendem a apresentar menor fertilidade natural. Valladares et al. (2003) observaram padrão semelhante em relação à presença de horizontes tiomórficos na classe húmico (C-FAH > 90 g kg-1) da proposta de classificação com base nas frações húmicas para Organossolos.


Horizontes A chernozêmico

Diferindo dos horizontes anteriores, esses minerais apresentaram menor variação dos teores das frações húmicas e dos atributos químicos e físicos (Quadro 7). Observa-se o predomínio da humina, com altos valores da %HUM, além de altos valores de pH e SB. Esse padrão é indicativo de maior homogeneidade desses horizontes quanto à intensidade do processo de humificação da matéria orgânica e da composição da solução do solo.


Na avaliação das correlações, destacam-se as positivas entre C-FAF e C-FAH com silte (0,50). O C-HUM apresentou correlação positiva com SB, CTCpH 7,0 e CTCe (0,49, 0,54 e 0,49) e com silte (0,58), e negativa com areia (-0,47). A relação C-FAH/C-FAF mostrou correlação positiva com H (0,49), e a relação C-EA/C-HUM, negativa com os atributos químicos, exceto H (-0,54).

Para esses horizontes foram estabelecidas classes com base em duas variáveis, sendo a relação C-FAH/C-FAF, já proposta por Lobova (1965), com valor > 1,0 para Chernossolos da Ásia ocidental; contudo, a atual proposta apresenta diferença no valor-limite das classes (Quadro 8).


Pela comparação entre as classes hipo-humina e humina, verificou-se que entre os atributos químicos houve diferenças significativas para os valores de SB, CTCpH 7,0, CTCe e entre os atributos físicos para areia e silte (Quadro 9). Para os atributos químicos e o silte, os maiores valores estão na classe humina, enquanto para areia o maior valor foi observado na classe hipo-humina. O padrão observado para os atributos químicos e físicos na classe humina reflete a importância das bases trocáveis como agente potencializador da estabilidade entre a fração orgânica e a matriz mineral desses solos.


Na comparação entre as classes fúlvico e húmico, verificaram-se diferenças significativas entre os valores de pH, H e V % (Quadro 9). Os valores de pH foram maiores na classe fúlvico e refletem solos com menor acidez potencial, como evidenciado pelos menores valores de H e V %.

Horizontes A húmico

Diferentemente dos horizontes minerais anteriores, nesse horizonte mineral os teores das frações húmicas e dos atributos químicos e físicos apresentaram ampla variação (Quadro 10). Esse padrão demonstra a heterogeneidade da composição desses horizontes, uma vez que para a sua classificação no SiBCS são avaliados os teores de COT em uma seção de controle preestabelecida.


Nesses horizontes foram observadas, com destaque, correlações positivas entre o C-FAH e C-HUM com H (0,41 e 0,57) e CTC (0,42 e 0,66). Para o C-HUM também se observa a correlação positiva com Al3+ (0,42), CTCe (0,64) e silte (0,47).

As classes estabelecidas tiveram como base duas variáveis (Quadro 11). Em relação aos demais horizontes em estudo, a alta variabilidade entre os horizontes A húmicos contribui para o estabelecimento de classes distintas.


Pela análise entre as classes hipo-húmico e húmico e entre hipo-humina e humina, verificaram-se diferenças significativas entre os valores de H, Al3+, CTCpH 7,0 e CTCe (Quadro 12). No entanto, para as classes hipo-humina e humina observou-se diferença significativa entre os valores de silte. Em ambos os atributos, os maiores valores ocorreram na classe húmico e humina, refletindo a importância da relação entre os ácidos húmicos e humina com a acidez potencial e capacidade de troca catiônica.


Horizontes B espódico

Nesses solos verificou-se o predomínio das frações alcalino-solúveis nesse caso, as frações ácidos fúlvicos e ácidos húmicos. Esse predomínio também pode ser observado pelos altos valores da relação C-EA/C-HUM, a qual na sua maioria foi superior a 2,0 (Quadro 13). Segundo estudos nestes solos, os altos valores dessa relação indicam zonas de acúmulo de C orgânico (Benites et al., 2001, 2003b). Como características de pedoambiente, destacam-se os altos valores de areia, a qual se apresenta como fator de influência para o processo de eluviação/iluviação de C orgânico na forma de complexos organometálico (Buol et al., 1980; Gomes et al., 1998; Benites et al., 2001).


Observaram-se correlações positivas de C-FAH com H (0,61), Al3+ (0,52), CTCpH 7,0 (0,64) e CTCe (0,50) e, por outro lado, correlação negativa com pH (-0,61). Assim como nos solos apresentados anteriormente, os ácidos húmicos têm participação efetiva na dinâmica de troca de cátions dos solos (Sposito, 1989; Stevenson, 1994; Canellas et al., 2008). A relação C-EA/C-HUM apresentou correlação positiva com Al (0,51), o que indica possível participação das frações alcalino-solúveis na translocação dos íons Al para os horizontes subsuperficiais. Quanto a estes horizontes, foram selecionadas três variáveis para o estabelecimento das classes (Quadro 14). Como o acúmulo de matéria orgânica iluvial é a principal característica diagnóstica desses horizontes, a proposta destacou principalmente a participação das frações alcalino-solúveis.


Pela análise dos atributos entre as classes hipo-húmico e húmico, não foram verificadas diferenças estatísticas nos valores de SB e atributos físicos (Quadro 15). Os maiores valores de pH foram observados na classe hipo-húmico, indicando a menor influência da acidez potencial, uma vez que nela verificaram-se os menores valores de H e Al3+. Os maiores valores da CTCpH 7,0 e CTCe foram encontrados na classe húmico, indicando a participação dos ácidos húmicos como contribuintes de cargas negativas.


Nas classes fúlvico-húmico e hiper-húmico, foram observadas diferenças significativas entre os valores de pH, Al3+, CTCpH 7,0 e CTCe (Quadro 15). Os maiores valores de pH foram encontrados na classe fúlvico-húmico, indicando, assim como na classe anterior, a menor influência da acidez potencial – nesse caso, do Al3+; os maiores valores de CTCpH 7,0 e CTCe ocorreram na classe hiper-húmico.

Nas classes hipoalcalino-solúvel e alcalino-solúvel, não foram observadas diferenças entre os valores de SB, V %, areia e silte (Quadro 15). Os maiores valores de pH foram observados na classe hipoalcalino-solúvel, indicando a menor influência da acidez potencial, como observado pelos menores valores de H e Al3+. Nessas classes, destacam-se as diferenças estatísticas entre os teores de argila, sendo maiores na classe hipoalcalino-solúvel.

Ademais, com o intuito de avaliar a capacidade de separação dos horizontes com base nas frações húmicas em cada horizonte diagnóstico, foi realizada a classificação proposta e, a partir dos dados dos atributos químicos e físicos, realizada a análise da distância generalizada de Mahalanobis. Com essa análise, é possível analisar a probabilidade de semelhança entre as classes estabelecidas em cada horizonte diagnóstico. Nesse sentido, observou-se que os valores de probabilidade de semelhança ficaram entre 0,01 e 13,78 %, ambos para as classes dos horizontes A chernozêmico. De maneira geral, as probabilidades de semelhanças não ultrapassaram 2,00 %, com exceção do O hístico e A chernozêmico, ambos na classe com C-FAH/C-FAF.

As observações apresentadas pela distância de Mahalanobis qualificam as classes de classificação com base nas frações húmicas. Assim, mesmo nas classes que apresentaram certa semelhança, pode ser considerado resultado satisfatório, uma vez que os dados utilizados na validação foram os mesmos usados no estabelecimento das classes. Assim, a aplicação com dados de outros horizontes não constantes deste trabalho será necessária, com vistas a testar a classificação proposta por todas as variáveis apresentadas.

CONCLUSÕES

O estabelecimento de classes a partir dos valores de C-FAH, C-HUM e das relações C-FAH/C-FAF e C-EA/C-HUM foi eficiente para a individualização de grupos distintos a partir da comparação com os atributos químicos e físicos, o que valida a proposta de utilização das variáveis relacionadas às frações húmicas para a classificação desses horizontes no quinto ou sexto níveis categóricos (família ou série) do SiBCS, uma vez que os atributos então comparados apresentam influência marcante na fertilidade natural dos solos.

AGRADECIMENTOS

Ao CPGA-CS / UFRRJ, CNPq e Embrapa Solos.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em janeiro de 2010 e aprovado em janeiro de 2011.

  • ANJOS, L.H.C.; PEREIRA, M.G. & FONTANA, A. Matéria orgânica e pedogênese. In: SANTOS, G.A.; SILVA, G.A.; CANELLAS, L.P. & CAMARGO, F.A.O., eds. Fundamentos da matéria orgânica do solo: Ecossistemas tropicais & subtropicais. 2.ed. Porto Alegre, Metrópole, 2008. p.65-86.
  • BENITES, V.M.; SCHAEFER, C.E.G.R.; MENDONÇA, E.S. & MARTIN NETO, L. Caracterização da matéria orgânica e micromorfologia de solos sob campos de altitude no Parque Estadual da Serra do Brigadeiro (MG). R. Bras. Ci. Solo, 25:661-674, 2001.
  • BENITES, V.M.; MADARI, B. & MACHADO, P.L.O.A. Extração e fracionamento quantitativo de substâncias húmicas do solo: Um procedimento simplificado de baixo custo. Rio de Janeiro, Embrapa Solos, 2003a. 7p. (Embrapa Solos. Comunicado Técnico, 16)
  • BENITES, V.M.; COELHO, M.R.; MENDONÇA-SANTOS, M.L.; SOUZA, L.F.; MADARI, B.; MACHADO, P.L.O.A.; SILVA, E.F.; TROMPOWSKY, P.M. & SANTOS, H.G. Fracionamento de substâncias húmicas em Espodossolos do Estado do Rio de Janeiro. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO, 29., Ribeirão Preto, 2003. Anais... Ribeirão Preto, Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, 2003b. CD ROM.
  • BUOL, S.W.; HOLE, F.D. & MC CRACKEN, R.J. Soil genesis and classification. Ames, Iowa State University Press, 1980. 404p.
  • CANELLAS, L.P.; MENDONÇA, E.S.; DOBBS, L.B.; BALDOTTO, M.A.; VELLOSO, A.C.X.; SANTOS, G.A. & AMARAL SOBRINHO, N.M.B. Reações da matéria orgânica. In: SANTOS, G.A.; SILVA, G.A.; CANELLAS, L.P. & CAMARGO, F.A.O., eds. Fundamentos da matéria orgânica do solo: Ecossistemas tropicais & subtropicais. 2.ed. Porto Alegre, Metrópole, 2008. p.45-64.
  • CAREY, F.A. & SUNDBERG, J. Advanced organic chemistry structure and mechanisms. 3.ed. New York, Plenum Press, 1990. 802p.
  • EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA - EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa do Solo. Manual de métodos de análise de solos. Rio de Janeiro, 1997. 212p.
  • EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA - EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa do Solo. Sistema brasileiro de classificação de solos. Brasília, Embrapa Produção de Informação. Rio de Janeiro, 1999. 412p.
  • EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA - EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa do Solo. Sistema brasileiro de classificação de solos. 2.ed. Rio de Janeiro, 2006. 306p.
  • FONTANA, A.; PEREIRA, M.G.; ANJOS, L.H.C. & BENITES, V.M. Distribution of organic carbon in the humic fractions of diagnostic horizons from Brazilian soils. Comm. Soil Sci. Plant Anal., 39:951-971, 2008a.
  • FONTANA, A.; BENITES, V.M.; PEREIRA, M.G. & ANJOS, L.H.C. Substâncias húmicas como suporte à classificação de solos Brasileiros. R. Bras. Ci. Solo, 32:2073-2080, 2008b.
  • FONTANA, A.; PEREIRA, M.G.; ANJOS, L.H.C. & BENITES, V.M. Quantificação e utilização das frações húmicas como característica diferencial em horizontes diagnósticos de solos Brasileiros. R. Bras. Ci. Solo, 34:1241-1257, 2010.
  • GOMES, J.B.V.; RESENDE, M.; REZENDE, S.B. & MENDONÇA, E.S. Solos de três áreas de restinga. II Dinâmica de substâncias húmicas, ferro e alumínio. Pesq. Agropec. Bras., 33:1921-1932, 1998.
  • JOHNSON, R.A. & WICHERN, D.W. Applied multivariate statistical analysis. 3.ed. Englewood Cliffs, Prentice Hall, 1992. 642p.
  • KHATTREE, R. & NAIK, D.N. Multivariate data reduction and discrimination with SAS software. Cary, SAS Institute, 2000. 558p.
  • LOBOVA, H. Sur les principes de la subdivision des zones en fácies. D'aprés le type d'altération, lê type d'humus et lê caractere de la salinité dês sols. In: AMERYCKX, J.; De LEENHEER, L.; DONIS, C.; FRIPIAT, J.; LAUDELOUT, H.; MANIL, G.; NOIRFALISE, A.; SCHEYS, G.; STENUIT, D.; TAVERNIER, R. & van den HENDE, A., eds. Classification des sols, Symposium International, 3.; Pedologie, pp.165-175, 1965.
  • SPOSITO, G. The chemistry of soils. New York, Oxford Academic Press, 1989. 227p.
  • STEVENSON, F.J. Humus chemistry: Genesis, composition, reactions. 2.ed. New York, John Wiley & Sons, 1994. 496p.
  • SWIFT, R.S. Organic matter characterization. In: SPARKS, D.L.; PAGE, A.L.; HELMKE, P.A.; LOEPPERT, R.H.; SOLTANPOUR, P.N.; TABATABAI, M.A.; JOHNSTON, C.T. & SUMNER, M.E., eds. Methods of soil analysis: Chemical methods. Madison, Soil Science Society of America/American Society of Agronomy, 1996. Part 3. p.1011-1020. (Soil Science Society of America Book Series, 5)
  • VALLADARES, G.S.; BENITES, V.M.; PEREIRA, M.G.; ANJOS, L.H.C. & EBELING, A.G. Proposta para classificação de Organossolos em níveis inferiores com base nas frações Húmicas. Campinas, Embrapa Monitoramento por Satélite, 2003. 35p. (Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento, 2)
  • YEOMANS, J.C. & BREMNER, J.M. A rapid and precise method for routine determination of organic carbon in soil. Comm. Soil Sci. Plant Anal., 19:1467-1476, 1988.
  • 1
    Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor no Curso de Pós-Graduação em Agronomia Ciência do Solo, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro UFRRJ.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Maio 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2011

    Histórico

    • Recebido
      Jan 2010
    • Aceito
      Jan 2011
    Sociedade Brasileira de Ciência do Solo Secretaria Executiva , Caixa Postal 231, 36570-000 Viçosa MG Brasil, Tel.: (55 31) 3899 2471 - Viçosa - MG - Brazil
    E-mail: sbcs@ufv.br