Resumos
O histórico de uso e o manejo da adubação influenciam a capacidade de suprimento de P pelo solo. Neste trabalho, foram avaliadas as frações de P num Argissolo Vermelho da região do Cerrado, adubado com fosfatos de reatividade distinta, em diferentes modos de aplicação e cultivado com milho durante três safras. A área, que já havia sido adubada em épocas passadas, estava coberta por braquiária. O delineamento experimental foi o de blocos casualizados com quatro repetições, num esquema fatorial 4 x 3 + 1, envolvendo quatro fontes de P, na quantidade de 180 kg ha-1 de P2O5 (superfosfato triplo, termofosfato magnesiano, fosfato natural reativo de Arad e fosfato natural de Araxá), três formas de aplicação (a lanço em área total no primeiro ano, localizada no sulco de plantio no primeiro ano e parcelada anualmente no sulco) e uma testemunha (sem P) como tratamento adicional. O P foi fornecido considerando-se os teores totais do nutriente nas fontes. Após três cultivos de milho, foram retiradas amostras de solo na profundidade de 0-20 cm para o fracionamento do P. A interação entre fontes e modos de aplicação de P interfere nas frações do nutriente no solo no final do cultivo de milho. De modo geral, o parcelamento da adubação condiciona maior teor do nutriente nas frações inorgânica (todas as fontes) e orgânica (fontes mais reativas). O fato de a área ter sido anteriormente adubada e ocupada por braquiária influenciou os efeitos dos tratamentos, pois a produção de milho foi relativamente elevada onde não houve aplicação de P. Houve evidências da participação de frações consideradas pouco lábeis no suprimento de P para o milho, em função da diminuição dessas frações no solo.
Cerrado; fracionamento de fósforo; formas de fósforo; fósforo orgânico; adubação fosfatada
The land use history and management of fertilization influence the soil phosphorus supply capacity. In this study, the P fractions in a Red Argisol (Ultissol) of the cerrado region were evaluated under different application methods and with phosphorus sources of different solubility, after three successive corn crops. The area had already been fertilized and cultivated in the past and remained covered with Brachiaria grass. A randomized block design with four replications was used, in a 4 x 3 + 1 factorial scheme, involving four P sources at a rate of 180 kg ha-1 P2O5 (triple superphosphate, magnesium thermophosphate, Arad reactive rock phosphate, and Araxá rock phosphate), three application methods (broadcasted in the first year, in-furrow application in the first year, and annually in-furrow split applications), and a control plot (without P) as additional treatment. The applied P rate was based on the total P2O5 content of each fertilizer. After three corn cropping seasons, soil samples were collected at a depth of 0-20 cm to determine the P fractions. The interaction between P sources and application methods interferes with the P fractions in the soil towards the end of the growing season. In general, split fertilization resulted in a higher values of inorganic (all sources) and organic P fractions (soluble sources). The fact that the area had previously been fertilized and cultivated with Brachiaria grass influenced the treatment effects, as shown by the relatively high crop yield of the control treatment not fertilized with P. There are evidences for the participation of less-labile P fractions in P supply to corn due to the observed reduction of these fractions in the soil.
Cerrado; phosphorus fractionation; phosphorus forms; organic phosphorus; phosphate fertilization
SEÇÃO IV - FERTILIDADE DO SOLO E NUTRIÇÃO DE PLANTAS
Frações de fósforo em solo adubado com fosfatos em diferentes modos de aplicação e cultivado com milho
Phosphorus fractions in soil cultivated with corn as affected by different phosphates and application methods
José Zilton Lopes SantosI; Antonio Eduardo Furtini NetoIII; Álvaro Vilela de ResendeII; Nilton CuriIII; Leandro Flávio CarneiroIV; Sérgio Ely Valadão Gigante de Andrade CostaV
IPós-Graduando do Departamento de Ciência do Solo, Universidade Federal de Lavras UFLA. Caixa Postal 3037, CEP 37200-000 Lavras (MG). E-mail: ziltton@yahoo.com.br
IIPesquisador da Embrapa Cerrados. Rodovia BR 020, Km 18, Caixa Postal 08223, CEP 73310-970 Planaltina (DF). E-mail: alvaro@cpac.embrapa.br
IIIProfessor do Departamento de Ciência do Solo, UFLA. Bolsista do CNPq. E-mail: afurtini@ufla.br; niltcuri@ufla.br
IVPós-Graduando do Departamento de Ciência do Solo, UFLA. E-mail: leoflacar@yahoo.com.br
VEngenheiro Agrônomo, Departamento de Ciência do Solo, UFLA. E-mail: sergioelycosta@hotmail.com
RESUMO
O histórico de uso e o manejo da adubação influenciam a capacidade de suprimento de P pelo solo. Neste trabalho, foram avaliadas as frações de P num Argissolo Vermelho da região do Cerrado, adubado com fosfatos de reatividade distinta, em diferentes modos de aplicação e cultivado com milho durante três safras. A área, que já havia sido adubada em épocas passadas, estava coberta por braquiária. O delineamento experimental foi o de blocos casualizados com quatro repetições, num esquema fatorial 4 x 3 + 1, envolvendo quatro fontes de P, na quantidade de 180 kg ha-1 de P2O5 (superfosfato triplo, termofosfato magnesiano, fosfato natural reativo de Arad e fosfato natural de Araxá), três formas de aplicação (a lanço em área total no primeiro ano, localizada no sulco de plantio no primeiro ano e parcelada anualmente no sulco) e uma testemunha (sem P) como tratamento adicional. O P foi fornecido considerando-se os teores totais do nutriente nas fontes. Após três cultivos de milho, foram retiradas amostras de solo na profundidade de 020 cm para o fracionamento do P. A interação entre fontes e modos de aplicação de P interfere nas frações do nutriente no solo no final do cultivo de milho. De modo geral, o parcelamento da adubação condiciona maior teor do nutriente nas frações inorgânica (todas as fontes) e orgânica (fontes mais reativas). O fato de a área ter sido anteriormente adubada e ocupada por braquiária influenciou os efeitos dos tratamentos, pois a produção de milho foi relativamente elevada onde não houve aplicação de P. Houve evidências da participação de frações consideradas pouco lábeis no suprimento de P para o milho, em função da diminuição dessas frações no solo.
Termos de indexação: Cerrado, fracionamento de fósforo, formas de fósforo, fósforo orgânico, adubação fosfatada.
SUMMARY
The land use history and management of fertilization influence the soil phosphorus supply capacity. In this study, the P fractions in a Red Argisol (Ultissol) of the cerrado region were evaluated under different application methods and with phosphorus sources of different solubility, after three successive corn crops. The area had already been fertilized and cultivated in the past and remained covered with Brachiaria grass. A randomized block design with four replications was used, in a 4 x 3 + 1 factorial scheme, involving four P sources at a rate of 180 kg ha-1 P2O5 (triple superphosphate, magnesium thermophosphate, Arad reactive rock phosphate, and Araxá rock phosphate), three application methods (broadcasted in the first year, in-furrow application in the first year, and annually in-furrow split applications), and a control plot (without P) as additional treatment. The applied P rate was based on the total P2O5 content of each fertilizer. After three corn cropping seasons, soil samples were collected at a depth of 020 cm to determine the P fractions. The interaction between P sources and application methods interferes with the P fractions in the soil towards the end of the growing season. In general, split fertilization resulted in a higher values of inorganic (all sources) and organic P fractions (soluble sources). The fact that the area had previously been fertilized and cultivated with Brachiaria grass influenced the treatment effects, as shown by the relatively high crop yield of the control treatment not fertilized with P. There are evidences for the participation of less-labile P fractions in P supply to corn due to the observed reduction of these fractions in the soil.
Index terms: Cerrado, phosphorus fractionation, phosphorus forms, organic phosphorus, phosphate fertilization.
INTRODUÇÃO
Devido às condições de intenso intemperismo, os solos de regiões tropicais apresentam reduzida fração de P biodisponível, muitas vezes abaixo das exigências mínimas das culturas. Essa característica está associada à alta capacidade que esses solos têm em reter o P na fase sólida, na forma de compostos de baixa reatividade. Contudo, os sistemas de cultivo e o manejo da adubação fosfatada podem influenciar o potencial de suprimento do nutriente no solo e o seu aproveitamento pelas culturas (Sousa & Lobato, 2003).
O P é, entre os macronutrientes primários, o que apresenta maior opção de fontes no mercado, as quais podem variar quanto à reatividade. Os fosfatos de alta reatividade correspondem a mais de 90 % do P2O5 utilizado na agricultura brasileira. Apresentam alta eficiência agronômica em curto prazo e elevado custo por unidade. Há forte competição entre o solo e planta pelo P desses fosfatos (Novais et al., 2007). Como alternativa às fontes solúveis, há fosfatos de menor reatividade, como os naturais reativos. Estes, embora apresentem menor disponibilidade imediata do nutriente para as plantas, normalmente apresentam menor custo (Horowitz & Meurer, 2004). De acordo com Novais & Smyth (1999), nas condições de solo-dreno, o uso dessas fontes menos reativas pode ser mais conveniente, desde que a menor reatividade não implique restrição do processo de difusão, que garante o suprimento de P à planta.
Além da escolha da fonte de P, é necessário definir a melhor forma de aplicação. O manejo da adubação deve favorecer a absorção e diminuir os processos de fixação pelo solo e, conseqüentemente, aumentar o aproveitamento do P pelas plantas (Novais & Smyth, 1999). Tradicionalmente, tem-se recomendado a aplicação das fontes solúveis de maneira localizada no sulco de plantio (Prado et al., 2001). No caso dos fosfatos naturais, a dissolução depende da superfície de contato com o solo, sendo aumentada se o fertilizante for aplicado em área total e incorporado (Sousa & Lobato, 2003; Horowitz & Meurer, 2004), o que, não necessariamente, resulta em aumento na eficiência da adubação (Novais & Smyth, 1999).
O P liberado pelos fertilizantes pode apresentar-se no solo em formas de maior ou menor complexidade, ligado, principalmente, a compostos de Fe, Al, Ca e à matéria orgânica do solo (MOS) (Raij, 2004). Para que haja melhor entendimento dos condicionantes da disponibilidade de P, vários métodos têm sido desenvolvidos para fracionar suas formas no solo e, com isso, estudar suas transformações. O método proposto por Hedley et al. (1982) apresenta como vantagem a obtenção de informações sobre a disponibilidade de P a curto e longo prazos, por meio da determinação dos teores das frações de P com vários graus de disponibilidade para as plantas (Silva et al., 2003), além de quantificar o P orgânico lábil no solo (Tokura et al., 2002).
Nesse contexto, estudos que visem à determinação das diferentes frações de P no solo possibilitam conhecer o comportamento do nutriente, podendo, dentro do sistema de produção adotado, indicar um manejo mais eficiente da adubação. Este trabalho teve como objetivo quantificar frações inorgânicas e orgânicas de P em solo da região do Cerrado, em função de diferentes modos de aplicação de fontes de P com reatividade distinta, após três cultivos de milho.
MATERIAL E MÉTODOS
Um estudo de fracionamento de P foi realizado no Departamento de Ciência do Solo da Universidade Federal de Lavras, utilizando-se amostras de solo provenientes de um experimento em que se comparavam fontes e modos de aplicação de P para a cultura do milho (Resende et al., 2006). Este experimento foi realizado de 2000 a 2003, na Fazenda Boa Vista, município de Itumirim, MG, situado a 21 ° 19 ' 02 '' de latitude sul e 44 ° 52 ' 14 " de longitude oeste, a uma altitude média de 871 m.
A área experimental onde foram coletadas as amostras de solo apresenta um Argissolo Vermelho distrófico típico textura argilosa. A área havia sido cultivada e adubada no passado e, há dez anos, encontrava-se coberta por vegetação espontânea, dominada por capim braquiária (Brachiaria brizantha), servindo ao pastejo bovino.
As parcelas foram delimitadas com área total de 27 m2, considerando uma área útil central de 10 m2. O experimento foi instalado em delineamento de blocos casualizados, com quatro repetições, num arranjo fatorial 4 x 3 + 1, combinando quatro fontes de P na dose de 180 kg ha-1 de P2O5 (ST-superfosfato triplo, 46,1 % de P2O5; TM-termofosfato magnesiano Yoorin, 18,1 % de P2O5; FR-fosfato reativo de Arad, 33,1 % de P2O5; e FA-fosfato de Araxá, 22,7 % de P2O5), três modos de aplicação (a lanço em área total no primeiro ano; aplicada no sulco de plantio no primeiro ano; e parcelada no sulco em três anos). Na aplicação parcelada, a dose total de 180 kg ha-1 de P2O5 foi dividida em aplicações anuais no sulco de semeadura, fornecendo-se, portanto, 60 kg ha-1 de P2O5 a cada cultivo; mais uma testemunha, sem o fornecimento de P (tratamento adicional). A quantidade a ser aplicada de cada fonte foi calculada com base no teor de P2O5 total dos fertilizantes.
No primeiro ano, antes do preparo do solo, a área recebeu calcário dolomítico em dosagem determinada pelo método da curva de incubação em laboratório (1,5 t ha-1, PRNT = 100 %), visando obter valores de pH próximos de 5,5. Cerca de 40 dias após a calagem, foram abertos os sulcos de semeadura e aplicados os tratamentos.
Na aplicação de P a lanço em área total, os fertilizantes foram distribuídos manualmente em toda a área da parcela experimental e incorporados, com enxada, a 10 cm de profundidade. Na aplicação localizada, os fertilizantes foram distribuídos no fundo do sulco de plantio. Nesses casos, a adubação fosfatada foi realizada apenas no primeiro cultivo, sendo as safras subseqüentes dependentes do efeito residual dos tratamentos.
Para o segundo e terceiro cultivos, não foi feito preparo do solo, sendo os sulcos de semeadura abertos com enxada, seguindo a localização do primeiro cultivo. Após o último cultivo de milho, foram retiradas as amostras de solo para o fracionamento do P. A amostragem foi feita retirando-se dez amostras simples na área útil de cada parcela (sendo sete amostras coletadas perpendicularmente ao sentido de uma das linhas de plantio e mais três amostras em outros pontos da parcela), na profundidade de 020 cm. Com as dez amostras simples, fez-se uma amostra composta. Dessa maneira, os 13 tratamentos, em quatro repetições, totalizaram 52 amostras, nas quais foram determinadas as diferentes frações de P.
Como referência, foi coletada uma amostra composta do solo sob vegetação nativa (profundidade de 020 cm), adjacente à área do experimento. Amostras coletadas na parcela testemunha, no primeiro e no segundo ano do experimento, também foram analisadas, a fim de se caracterizarem as frações iniciais de P no solo.
As amostras foram secas ao ar e passadas em peneira de 2 mm e analisadas (Quadro 1).
A determinação das frações inorgânicas (Pi) e orgânicas (Po) de P no solo foi realizada conforme método de Hedley et al. (1982), com adaptação para o uso de terra fina seca ao ar. As frações, determinadas seqüencialmente, foram: (a) frações lábeis de P ou P disponível, correspondendo ao P extraído pela resina de troca aniônica (P-res), e ao P inorgânico e orgânico, extraídos com NaHCO3 0,5 mol L-1 em pH 8,5 (Pi-bic e Po-bic); b) frações pouco lábeis de P, extraídas com NaOH 0,1 e 0,5 mol L-1, correspondentes às formas inorgânicas ligadas a Fe e a Al (Pi-hid) e orgânicas (Po-hid) associadas com compostos húmicos; c) frações não-lábeis de P, correspondendo ao P ligado a Ca, extraído com HCl 1,0 mol L-1 (Pi-HCl), e ao Pi e Po residuais (P-rdu), extraídos com H2SO4 concentrado e H2O2. O teor de Po das amostras foi estimado a partir da diferença entre o P total (Pi + Po) e o P inorgânico (Pi) recuperado no extrato, sendo o P total determinado numa alíquota que sofreu autoclavagem a 120 °C, e o Pi determinado após clarificação de alíquota do mesmo extrato em centrífuga.
Na extração com resina, foram utilizados saquinhos de polietileno de 400 µm de malha, contendo 0,6 g de resina de troca aniônica DOWAX2-X18 saturada com bicarbonato. Para todas as frações, o P foi determinado por colorimetria, segundo Murphy & Riley (1962).
Os resultados obtidos para as diferentes frações de P foram submetidos a análises de variância e comparações de médias. As médias dos tratamentos componentes do fatorial foram comparadas entre si, pelo teste de Tukey (p < 0,05). Por meio do teste de F (p < 0,05), obteve-se a significância do contraste, comparando-se a média dos tratamentos do fatorial com a testemunha.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nas avaliações do experimento, em termos de produção de grãos e de absorção de P pelo milho, foram observadas variações relativamente pequenas nas respostas a tratamentos de adubação muito contrastantes. Apesar da baixa disponibilidade inicial de P no solo (Quadro 1), o tratamento testemunha apresentou produtividade e suprimento de P consideráveis, sem alteração na disponibilidade do nutriente ao final dos três cultivos (Resende et al., 2006). Diante do exposto, a determinação do balanço de frações inorgânicas e orgânicas de P, resultantes dos diferentes fornecimentos do nutriente, após os três cultivos de milho, pode fornecer subsídios para o entendimento das respostas da cultura à adubação fosfatada e da dinâmica do P em áreas adubadas anteriormente.
Frações inorgânicas de fósforo
O P inorgânico do solo inclui as frações extraídas com resina (P-res), bicarbonato (Pi-bic), hidróxido de sódio (Pi-hid) e ácido clorídrico (P-HCl).
A aplicação de todas as fontes parcelada no sulco proporcionou o maior valor das frações consideradas disponíveis (P-res e Pi-bic), exceto a fonte FA, em que os modos de aplicação não diferiram significativamente na fração Pi-res (Quadro 2). O menor contato dessas fontes com o volume de solo na aplicação parcelada parece ter permitido formas mais prontamente disponíveis que seriam extraídas pela resina e bicarbonato. No caso do FA, tal comportamento para essa fração considerada disponível está de acordo com os resultados obtidos por Resende et al. (2006), que observaram que a produção final proporcionada pelo FA foi semelhante nos três métodos de aplicação, indicativo de que a limitada reatividade deve ter sido o principal fator condicionante da eficiência dessa fonte, independente do manejo da adubação.
Vale ressaltar que, em relação ao P-res e o Pi-bic, a primeira fração apresentou maior contribuição ligeiramente maior para o Pi total recuperado. Por outro lado, considerando que P-res e Pi-bic seriam as frações mais relacionadas com o P disponível, verificou-se que os tratamentos variando fontes e modos de aplicação de P não apresentaram diferenças marcantes no tocante ao residual dessas formas mais lábeis após os três cultivos de milho, principalmente quando o nutriente foi aplicado todo de uma só vez no primeiro cultivo (modos de aplicação "lanço" e "sulco") (Quadro 2). É preciso levar em conta que, apesar das diferenças de reatividade das fontes e das características de contato do P com o solo, conforme o tratamento, a absorção pela cultura e os processos de adsorção no decorrer dos três cultivos de milho devem ter contribuído para nivelar a disponibilidade do nutriente nesses dois tipos de manejo da adubação fosfatada.
De modo geral, verifica-se que houve predominância de participação das frações inorgânicas extraídas com hidróxido de sódio (0,1 e 0,5 mol L-1) sobre as demais no Pi total (Quadro 2), como normalmente relatado em estudos de frações de P em solos ácidos (Tokura et al., 2002).
Ao analisar o comportamento das frações Pi-hid 0,1 e 0,5 mol L-1 nos tratamentos com ST, verifica-se que a adubação a lanço levou a menor valor de Pi-hid 0,1 mol L-1 e maior de Pi-hid 0,5 mol L-1; comportamento inverso foi verificado na adubação parcelada, indicando que, quando ocorre maior contato dessa fonte com maior volume de solo, há favorecimento da conversão do P liberado do adubo para formas mais fortemente retidas (P-hid 0,5 mol L-1). No caso das demais fontes de menor solubilidade, houve diferença significativa entre os modos de aplicação apenas para os fosfatos naturais, de modo que a aplicação parcelada proporcionou o menor valor de Pi-hid 0,1 mol L-1 para a fonte FR e maior valor de Pi-hid 0,5 mol L-1 para o FA. Possivelmente, isso ocorreu em função de esse modo de aplicação restringir o contato dessas fontes com o solo e conseqüentemente sua solubilidade (Quadro 2).
Quanto ao P extraído com HCl, que estaria relacionado com as formas de P ligado a Ca (Hedley et al., 1982), os baixos valores detectados (sempre próximos a 1 mg dm-3) para a maioria dos modos de aplicação refletem a participação pouco expressiva dessa fração no compartimento de P inorgânico do solo em estudo (Quadro 2), a despeito da natureza química distinta das fontes de P utilizadas. Em parte, isso pode ser atribuído aos baixos conteúdos de Ca dos solos tropicais mais intemperizados, que favorecem a formação de compostos de P ligado a Fe e Al (Raij, 1991).
Para todas as fontes testadas, a aplicação localizada no sulco e de forma parcelada a cada cultivo de milho promoveu a manutenção de maior estoque de P inorgânico total, exceto para a fonte FR, em que os modos de aplicação do adubo não diferiram estatisticamente (Quadro 2). Em última instância, para a maioria das fontes testadas, esse manejo parece resultar em maior tamponamento de P no solo, o que pode proporcionar maior estabilidade de produção das culturas, especialmente em condições de baixo aporte do nutriente nas adubações.
Frações orgânicas de fósforo
As frações orgânicas de P incluem Po-bic e Po-hid (0,1 e 0,5 mol L-1). De modo geral, as frações de Po-hid, notadamente a 0,1 mol L-1 , foram as que tiveram maior contribuição para o compartimento Po-total (Quadro 3), comportamento semelhante ao que foi observado para as frações inorgânicas, em que o Pi-hid 0,1 mol L-1 foi a fração mais importante para o compartimento Pi total (Quadro 2). Predominância do Po no compartimento considerado pouco disponível (Po-hid) também foi observada para diferentes classes de solo em outros estudos (Araújo & Salcedo, 1997; Tokura et al., 2002).
A fonte ST, quando aplicada na forma parcelada, proporcionou o maior teor de Po-bic, o que não ocorreu no caso dos demais fosfatos (Quadro 3). Aparentemente, a pronta solubilidade do ST determina esse comportamento contrastante. Na aplicação parcelada, o P do ST seguiria uma dinâmica distinta do nutriente de outras fontes, sendo mais imediatamente absorvido, atendendo à demanda da cultura e, conseqüentemente, levando à preservação dos estoques de P orgânico mais lábil (Po-bic).
A fração Po-hid 0,5 mol L-1 agrega formas de P menos lábeis, conforme as pressuposições do fracionamento de Hedley et al. (1982). Entretanto, nos modos de aplicação que permitem menor contato da fonte com o solo, notadamente a aplicação parcelada no sulco para as fontes de média a alta solubilidade, foram determinados valores significativamente mais elevados de Po-hid 0,5 mol L-1 (Quadro 3). Esse comportamento está de acordo com o fato de que o contato do adubo com maior volume de solo ocasiona fixação parcial do P liberado, antes que o nutriente seja absorvido pela planta. Essa situação é típica de solos tropicais mais intemperizados, nos quais os componentes do solo representam o dreno preferencial de P (Novais & Smyth, 1999).
É importante destacar que, inversamente ao que se observa para a maioria das frações inorgânicas (Quadro 2), os valores das frações de P orgânico determinados no tratamento testemunha tenderam a ser maiores que aqueles obtidos para os tratamentos com adubação fosfatada, exceto a fração Po-bic (Quadro 3). Nessa fração, a diminuição dos valores em relação à média dos tratamentos que receberam P comprova que ela é biodisponível (Hedley et al., 1982), sendo plausível a hipótese de que tenha sido substancial a participação de formas orgânicas no suprimento total do nutriente para o milho, o que explica a produtividade observada no tratamento testemunha deste experimento (Resende et al., 2006). Por outro lado, esses resultados indicam que a adição de fosfatos ao solo alterou preferencialmente as frações inorgânicas de P. Na determinação das frações preferenciais de acumulação de P pela adição de doses de fosfato solúvel ao solo no sistema plantio direto, Conte et al. (2001) observaram diminuição linear da participação do Po em relação ao P total.
Fósforo inorgânico, orgânico e residual
De modo geral, o modo de aplicação parcelada no sulco, que permite menor exposição e tempo de contato das fontes com o solo, proporcionou maiores valores de Pi para a maioria das fontes, com exceção da fonte FR, em que os modos de aplicação não diferiram estatisticamente entres si (Quadro 4). No caso dessas fontes, o manejo envolvendo o parcelamento da dose total de P, ao longo dos três cultivos de milho, além de impor certa restrição à absorção pelas plantas, minimiza os processos de indisponibilização do P no solo, o que pode ter resultado em maior saldo de Pi ao final do experimento. Quanto à fração Po, observa-se que tal comportamento foi verificado apenas para as fontes mais solúveis.
Os maiores teores de P foram verificados na fração residual (P-rdu), que engloba formas inorgânicas e orgânicas mais recalcitrantes (Quadro 4). Em termos médios, a fração residual correspondeu à cerca de metade do P total recuperado.
Quanto ao P total recuperado (P total), nota-se que, de modo geral, os modos de aplicação que diminuem a reatividade da fonte com o solo (aplicação total no sulco e parcelada no sulco) proporcionaram as maiores concentrações de P total recuperado. Além disso, vale ressaltar que a fonte de menor solubilidade (FA) contribuiu com os maiores valores de P total recuperado em relação às demais fontes, principalmente nos modos de aplicação que limitam o contato da fonte com maior volume de solo (Quadro 4). Isto possivelmente seja em função da elevada concentração dos produtos da dissolução, Ca2+ e H2PO4-, saturando o ambiente de reação do fosfato e acabando por restringir a própria solubilização. No entanto, esperava-se que as fontes mais solúveis (ST e TM) apresentassem comportamentos similares entre si e contrastantes com o das fontes menos solúveis (FR e FA), em função da variação na reatividade dos fertilizantes (Braga et al., 1991). Porém, neste trabalho, o manejo (modos de aplicação da fonte) parece reger o comportamento dos adubos fosfatados em detrimento das características intrínsecas de cada fonte. Por outro lado, a diferença entre os tratamentos na recuperação do P total, após os três cultivos de milho, não refletiu na produção de grãos (Resende et al., 2006), mas chamou a atenção o que poderia ser considerado um nivelamento de respostas do milho aos tratamentos, principalmente quando o nutriente foi aplicado todo de uma só vez no primeiro cultivo (modos de aplicação "lanço" e "sulco"), situação atípica em experimentos de adubação fosfatada na região do Cerrado.
De acordo com os resultados do experimento de campo, o tratamento testemunha (sem adição de P) apresentou produção de grãos e extração de P bastante consideráveis, correspondendo, respectivamente, a cerca de 65 e 51 % da maior produção e extração de P obtidas nos tratamentos com fornecimento do nutriente (Resende et al., 2006). Portanto, dada a baixa disponibilidade inicial de P no solo, determinada pelos extratores Mehlich-1, e resina de troca iônica nas análises de rotina (Quadro 1), pode-se aventar a possibilidade de uma participação expressiva de outras formas de P (entre as quais o P orgânico) que não seriam detectadas pelos extratores de rotinas no suprimento de P durante os cultivos de milho. Essa pressuposição é reforçada pelos resultados do fracionamento de P em amostras de solo coletadas na parcela testemunha no início do primeiro e do segundo cultivos no experimento de campo. No ano de instalação do experimento, o tratamento testemunha apresentava teores de P residual (P-rdu) (Quadro 5) muito mais elevados que o P-rdu no final dos três anos de cultivo, o que indica uma utilização dessa fração considerada não disponível (a curto e médio prazo) na ausência do fornecimento do nutriente.
Conforme o histórico da referida área, há indícios de que o capim braquiária teve papel decisivo na dinâmica e ciclagem do P adicionado em épocas que precederam (cerca de 10 anos antes) a instalação do experimento. A braquiária é considerada por alguns autores (Silva et al., 2003) de grande potencial para ciclar o P no solo, a ponto de incrementar substancialmente as taxas de recuperação do nutriente nos sistemas em que essa gramínea faz parte da sucessão de culturas (Sousa & Lobato, 2003).
De acordo com Rao (2001), os fatores que contribuem para melhor aquisição de P pela braquiária são maior crescimento da raiz, tolerância ao Al, absorção eficiente do nutriente e maior habilidade em usar o P em condições de baixa disponibilidade. Essa melhor habilidade seria função da maior atividade da fosfoenolpiruvato carboxilase em condições de baixo P e pH (Begum et al., 2006). Essa enzima está estreitamente relacionada ao metabolismo de ácido orgânico e à ciclagem de Pi principalmente em plantas C3. Além disso, outros mecanismos, como aumento no catabolismo do açúcar e indução da atividade de diversas enzimas (fosfohidrolases), como fosfatase ácida e ribonuclease (Nanamori et al., 2004), contribuem para melhor aquisição de P quando sua disponibilidade está baixa.
Disponibilidade de fósforo
Os teores de P nas frações consideradas lábeis (P-res + Pi-bic + Po-bic), pouco lábeis (Pi-hid + Po-hid) e não-lábeis (P-HCl + P-rdu) são apresentados no Quadro 6.
Em relação à fração lábil, os modos de aplicação que diminuem o contato da fonte com o volume de solo, principalmente na forma parcelada, apresentaram os maiores valores de P nessa fração, com exceção da fonte FA, em que a aplicação a lanço não foi significativamente diferente da aplicação parcelada (Quadro 6). A maior solubilidade dessas fontes, aliada ao contato com reduzido volume de solo, e a restrição do tempo de reação dos fosfatos, quando comparada aos modos de aplicação implementados no primeiro cultivo, justificam tal resultado. Em conjunto, essas condições parecem ter implicado menor perda do P para o solo pelos processos de fixação, proporcionando assim melhor tamponamento dessa fração para atender à demanda do milho.
O parcelamento da adubação favoreceu maior acúmulo de P nas frações pouco lábeis para as fontes de maior solubilidade e nas frações não-lábeis no caso dos fosfatos naturais (Quadro 6). Comparando as frações não-lábeis e pouco lábeis (todas as fontes) e pouco lábeis e lábeis (fosfatos naturais), os resultados mostram que há uma certa dependência entre elas, indicando que a fração menos disponível parece tamponar a mais disponível (Quadro 6). No entanto, as alterações mais sensíveis se deram nas frações pouco lábeis e não-lábeis. Convém ressaltar que a maior parte do P do compartimento considerado pouco lábil encontra-se na fração P-hid 0,1 mol L-1 (Quadros 2 e 3), a qual é considerada a mais dinâmica no solo dentre as frações pouco lábeis (Rheinheimer et al., 2000).
Numa análise conjunta dos resultados deste estudo, pode-se destacar que os efeitos da reatividade diferencial das fontes sobre as frações de P do solo ao final dos cultivos de milho foram mais visíveis apenas quando a adubação foi parcelada. Com o parcelamento, a reatividade da fonte passou a ser o principal fator condicionante da disponibilidade de P para o milho no último cultivo e acabou por afetar também o balanço de suas frações após a colheita. No caso do superfosfato triplo e termofosfato, a pronta solubilização e liberação do P fizeram com que o atendimento da demanda pelo milho fosse menos dependente das reservas do solo, o que levou à manutenção dos estoques de P de frações inorgânicas e orgânicas, lábeis e pouco lábeis. Já para as demais fontes, a liberação mais lenta de P fez com que houvesse maior mobilização das reservas inorgânicas e orgânicas do solo para atender à demanda da cultura, provocando sensível redução nos estoques das frações mais lábeis de Pi e Po.
A gradual e restrita liberação do P das fontes menos solúveis, associada ao parcelamento da adubação, parece ter resultado num efeito residual diferenciado em relação às fontes mais solúveis e aos demais modos de aplicação. Essas condições certamente contribuíram para que as plantas de milho otimizassem o aproveitamento do P disponibilizado. Após os três cultivos, o resultado desse processo foi um aparente acúmulo do nutriente nas frações menos lábeis de Pi e, principalmente, de Po. Na realidade, esse acúmulo aparente seria conseqüência de maior preservação ou menor esgotamento das reservas do solo, especialmente dos estoques orgânicos menos lábeis (Po-hid 0,5 mol L-1), uma vez que a ciclagem do P das frações mais lábeis, aquelas constantemente repostas graças ao residual das fontes de menor solubilidade, já seria suficiente para garantir o suprimento do nutriente ao milho.
Segundo essa hipótese, a aplicação parcelada e continuada de fontes menos solúveis seria uma prática favorável à manutenção ou mesmo ao aumento do estoque de P orgânico no solo, principalmente no caso das fontes de maior reatividade, o que seria altamente desejável nas condições de solos tropicais mais intemperizados, como na região do Cerrado.
CONCLUSÕES
1. As fontes e os modos de aplicação de P afetaram, de maneira variável, as frações do nutriente no solo após o cultivo de milho. De modo geral, o parcelamento da adubação condicionou maior teor do nutriente nas frações inorgânica (todas as fontes) e orgânica (fontes mais solúveis).
2. O P residual teve maior participação no P total, seguido do P orgânico e, por último, do P inorgânico. O solo apresentou mais teor de P no compartimento não-lábil, seguido pelas frações pouco lábeis e lábeis. Há evidências de participação das frações consideradas menos lábeis no suprimento de P para o milho em função da diminuição dessas frações.
LITERATURA CITADA
Recebido para publicação em setembro de 2005 e aprovado em novembro de 2007.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
26 Jun 2008 -
Data do Fascículo
Abr 2008
Histórico
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Aceito
Nov 2007 -
Recebido
Set 2005