Open-access Acúmulo de ácido oxálico e cristais de cálcio em ectomicorrizas de eucalipto.: II- formação de cristais de oxalato de cálcio induzida por fungos ectomicorrízicos em raízes laterais finas

Accumulation of oxalic acid and calcium crystals in ectomycorrhizas of eucalypt.: II- calcium oxalate crystal formation induced by ectomicorrhizal fungi in fine lateral roots

Resumos

O eucalipto é eficiente na aquisição de Ca do solo, mas pouco se sabe sobre a participação das ectomicorrizas e dos ácidos orgânicos nesse processo em campo. O acúmulo de cristais de Ca (CaOx) foi avaliado em, aproximadamente, 2.100 raízes laterais finas e ectomicorrizas do híbrido de Eucalyptus grandis x Eucalyptus urophylla, cultivado por 2,5 anos em área com topografia típica em meia laranja, com vertente côncavo-convexa, na região de Viçosa, MG. Técnicas de microscopia óptica e microscopia eletrônica de varredura foram usadas para a visualização dos CaOx. Em 73,7 % das raízes, ocorreu abundante acúmulo de drusas e grânulos de CaOx nas células do córtex. A presença conspícua de CaOx foi observada em 56,2 % das ectomicorrizas e em 17,5 % das raízes laterais finas não colonizadas, evidenciando o papel das micorrizas no acúmulo de Ca em eucalipto. A forma predominante dos CaOx foram as drusas nas ectomicorrizas e os grânulos cristalinos nas raízes. Os dez morfotipos de ectomicorrizas observados na área diferiram quanto à presença e à morfologia dos CaOx, o que pode representar distintas capacidades dos fungos ectomicorrízicos em fornecer Ca para a planta hospedeira. A análise da superfície do manto das ectomicorrizas por microscopia eletrônica de varredura não evidenciou a presença de CaOx nessa estrutura, confirmando que, nas condições avaliadas, o acúmulo de cristais limita-se ao córtex radicular. Este é o primeiro relato da ocorrência de CaOx em ectomicorrizas de eucalipto no Brasil, com dados que comprovam que há mecanismos de armazenamento de Ca nas ectomicorrizas em áreas com baixa disponibilidade do elemento.

Ectomicorriza; drusa; nutrição mineral; ácidos orgânicos; microscopia


Eucalypt is efficient at taking up Ca from the soil, however little is known about the contribution of ectomycorrhizas and organic acids to this process under field conditions. The accumulation of calcium oxalate crystals (CaOx) was evaluated in, approximately, 2,100 fine lateral roots and ectomycorrhizas of a 2.5-year-old Eucalyptus grandis x Eucalyptus urophylla hybrid, grown in a mountainous area at Viçosa, MG, Brazil. Optical and scanning electron microscopy techniques were used for CaOx observation. Abundant accumulation of calcium as druses or grains in the root cortex cells was observed in 73.7 % of the fine lateral roots. The conspicuous presence of CaOx was observed in 56.2 % of the ectomycorrhizal and in 17.5 % of the nonmycorrhizal fine lateral roots, evidencing the role of the ectomycorrhizal association in calcium storage of eucalypt roots. In the ectomycorrhizal root, druses were the predominant CaOx form, while in nonmycorrhizal roots crystalline grains were more frequent. The 10 ectomycorrhizal morphotypes observed varied in relation to the CaOx content in the root cortex, possibly representing distinct capacities of each ectomycorrizal fungi to supply Ca to the host plant. The analysis of the mantle surface of the different ectomycorrhizal morphotypes by scanning electron microscopy did not detect the presence of CaOx in this structure, confirming that under the conditions evaluated, CaOx accumulation in the association is limited to the root cortex. This is the first report on the occurrence of CaOx in eucalypt ectomycorrhizas in Brazil, with data that demonstrate the existence of calcium storage mechanisms in the ectomycorrhizas in areas with low calcium availability.

ectomycorrhiza; druse; mineral nutrition; organic acids; microscopy


SEÇÃO III - BIOLOGIA DO SOLO

Acúmulo de ácido oxálico e cristais de cálcio em ectomicorrizas de eucalipto. II- formação de cristais de oxalato de cálcio induzida por fungos ectomicorrízicos em raízes laterais finas(1)

Accumulation of oxalic acid and calcium crystals in ectomycorrhizas of eucalypt. II- calcium oxalate crystal formation induced by ectomicorrhizal fungi in fine lateral roots

Jhon Alexander Zambrano GonzalezI; Maurício Dutra CostaII; Ivo Ribeiro SilvaIII; Júlio César Lima NevesIII; Nairam Félix de BarrosIV; Arnaldo Chaer BorgesV

IEstudante de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Microbiologia Agrícola, Universidade Federal de Viçosa - UFV. Av.PH Rolfs s/n, CEP 36570-000 Viçosa (MG). E-mail: alexfungi@yahoo.com.mx

IIProfessor Adjunto do Departamento de Microbiologia, UFV. E-mail: mdcosta@ufv.br

IIIProfessor Adjunto do Departamento de Solos, UFV. E-mails: ivosilva@ufv.br; julio_n2003@yahoo.com.br

IVProfessor Titular do Departamento de Solos, UFV. E-mail: nfbarros@ufv.br

VProfessor Titular do Departamento de Microbiologia, UFV. E-mail: chaer@ufv.br

RESUMO

O eucalipto é eficiente na aquisição de Ca do solo, mas pouco se sabe sobre a participação das ectomicorrizas e dos ácidos orgânicos nesse processo em campo. O acúmulo de cristais de Ca (CaOx) foi avaliado em, aproximadamente, 2.100 raízes laterais finas e ectomicorrizas do híbrido de Eucalyptus grandis x Eucalyptus urophylla, cultivado por 2,5 anos em área com topografia típica em meia laranja, com vertente côncavo-convexa, na região de Viçosa, MG. Técnicas de microscopia óptica e microscopia eletrônica de varredura foram usadas para a visualização dos CaOx. Em 73,7 % das raízes, ocorreu abundante acúmulo de drusas e grânulos de CaOx nas células do córtex. A presença conspícua de CaOx foi observada em 56,2 % das ectomicorrizas e em 17,5 % das raízes laterais finas não colonizadas, evidenciando o papel das micorrizas no acúmulo de Ca em eucalipto. A forma predominante dos CaOx foram as drusas nas ectomicorrizas e os grânulos cristalinos nas raízes. Os dez morfotipos de ectomicorrizas observados na área diferiram quanto à presença e à morfologia dos CaOx, o que pode representar distintas capacidades dos fungos ectomicorrízicos em fornecer Ca para a planta hospedeira. A análise da superfície do manto das ectomicorrizas por microscopia eletrônica de varredura não evidenciou a presença de CaOx nessa estrutura, confirmando que, nas condições avaliadas, o acúmulo de cristais limita-se ao córtex radicular. Este é o primeiro relato da ocorrência de CaOx em ectomicorrizas de eucalipto no Brasil, com dados que comprovam que há mecanismos de armazenamento de Ca nas ectomicorrizas em áreas com baixa disponibilidade do elemento.

Termos de indexação: Ectomicorriza, drusa, nutrição mineral, ácidos orgânicos, microscopia.

SUMMARY

Eucalypt is efficient at taking up Ca from the soil, however little is known about the contribution of ectomycorrhizas and organic acids to this process under field conditions. The accumulation of calcium oxalate crystals (CaOx) was evaluated in, approximately, 2,100 fine lateral roots and ectomycorrhizas of a 2.5-year-old Eucalyptus grandis x Eucalyptus urophylla hybrid, grown in a mountainous area at Viçosa, MG, Brazil. Optical and scanning electron microscopy techniques were used for CaOx observation. Abundant accumulation of calcium as druses or grains in the root cortex cells was observed in 73.7 % of the fine lateral roots. The conspicuous presence of CaOx was observed in 56.2 % of the ectomycorrhizal and in 17.5 % of the nonmycorrhizal fine lateral roots, evidencing the role of the ectomycorrhizal association in calcium storage of eucalypt roots. In the ectomycorrhizal root, druses were the predominant CaOx form, while in nonmycorrhizal roots crystalline grains were more frequent. The 10 ectomycorrhizal morphotypes observed varied in relation to the CaOx content in the root cortex, possibly representing distinct capacities of each ectomycorrizal fungi to supply Ca to the host plant. The analysis of the mantle surface of the different ectomycorrhizal morphotypes by scanning electron microscopy did not detect the presence of CaOx in this structure, confirming that under the conditions evaluated, CaOx accumulation in the association is limited to the root cortex. This is the first report on the occurrence of CaOx in eucalypt ectomycorrhizas in Brazil, with data that demonstrate the existence of calcium storage mechanisms in the ectomycorrhizas in areas with low calcium availability.

Index terms: ectomycorrhiza, druse, mineral nutrition, organic acids, microscopy.

INTRODUÇÃO

A biomineralização corresponde ao processo no qual organismos vivos formam cristais inorgânicos ou agregados cristalinos intra e extracelulares (Webb, 1999). No caso das plantas, a precipitação e a armazenagem de CaOx têm sido descritas na maioria dos tecidos e órgãos (Zuñiga et al., 2003). Os depósitos intracelulares geralmente estão nos vacúolos de células especializadas na formação do cristal, chamadas de idioblastos (Franceschi & Nakata, 2005).

A formação de cristais minerais em fungos ectomicorrízicos (FEM) tem sido observada como incrustações de morfologia variada no manto, podendo apresentar-se na forma mono ou diidratada (Tait et al., 1999; Franceschi & Nakata, 2005). Diversos estudos encontraram materiais cristalinos incrustados nas hifas fúngicas e os classificaram, de acordo com a sua forma, em verrugosos, granulosos e filamentosos (Malajczuk & Cromack, 1982; Whitney & Arnott, 1987; Connolly & Jellison, 1995; Arocena et al., 2001).

A formação dos CaOx tem sido atribuída a necessidades funcionais diversas. Gourlay & Grime (1994) sugerem que os CaOx são consequência da destoxificação do ambiente radicular em alta concentração de Ca, danosa à célula, como nos solos calcários. Já em muitos ecossistemas naturais e perturbados, a acidificação do solo, a elevada precipitação, a quantidade limitante de minerais essenciais e a lixiviação de cátions podem levar à formação de CaOx no tecido vegetal como forma de estocar minerais para garantir o crescimento normal das plantas (Graustein et al., 1977; Malajczuk & Cromack, 1982; Entry et al., 1992; Cumming et al., 2001).

A deficiência de Ca, Mg, e P, o baixo pH e a presença de Al em concentrações tóxicas são fatores responsáveis pelo menor desenvolvimento das plantações florestais em campo. No Brasil, as áreas utilizadas para a cultura de eucalipto apresentam topografia diversa, solos de reação ácida, com pH inferior a 5,5 (Vale et al., 1996) e concentrações limitantes de nutrientes, como o Ca (Ritchey et al 1982). No entanto, os plantios de eucalipto apresentamelevada mobilização desse elemento em função do seurápido crescimento. O acúmulo de Ca na biomassa de plantações maduras pode variar de 236 a 736 kg ha-1. Nas condições descritas, torna-se relevante a elucidaçãodo papel dos FEM na absorção, no armazenamento eno suprimento de Ca para o hospedeiro.

Plantios florestais, a exemplo do eucalipto e dopinho, encontram-se associados a FEM de váriasespécies (Campos, 2004; Giachini et al., 2004),possivelmente como resultado de uma adaptação daplanta à baixa disponibilidade de nutrientes (Wallenderet al., 1997; Lapeyrie et al., 1990). Graustein et al. (1977) evidenciaram que o fungo ectomicorrízico Hysterangium sp. produz CaOx em altasconcentrações e sugeriram que, em solos jovens, aprodução de ácidos orgânicos pode aumentar aintemperização do solo, incrementando a ciclagem decátions, especialmente Ca, Fe e Al.

Os estudos sobre a presença de CaOx em fungosectomicorrízicos são escassos e voltados para áreastemperadas com elevadas concentrações do elementono solo (Connolly & Jellison, 1995; Entry et al., 1992;Arocena et al., 2001). Assim, este trabalho teve comoobjetivo avaliar o acúmulo de Ca na forma de CaOxnas ectomicorrizas e raízes de eucalipto cultivado emsolo com baixa disponibilidade de Catrocável na regiãode Viçosa, MG.

MATERIAL E MÉTODOS

Descrição da área e caracterização física e química do solo - Gonzalez et al. (2009)

Amostragem de raízes e ectomicorrizas

Para a quantificação da percentagem de raízes e ectomicorrizas contendo CaOx, efetuou-se a amostragem aleatória do sistema radicular de plantas nas diferentes posições topográficas, na camada de 0-10 cm, sendo coletados fragmentos de raízes lateraisfinas não colonizadas e ectomicorrizas de forma a constituir uma amostra composta. A frequência de CaOx foi determinada nas raízes laterais finas e ectomicorrizas dividindo-se o número de fragmentos observados contendo CaOx pelo número total defragmentos observados vezes 100. Foram avaliados 2.172 fragmentos de raiz, sendo 1.246 de raízeslaterais finas não colonizadas e 926 ectomicorrizas.

Para a determinação do número de morfotiposectomicorrízicos nas áreas de estudo, bem como darelação entre dado morfotipo e a presença de CaOx,foram coletadas ectomicorrizas na mesma profundidade, em seis árvores escolhidas aleatoriamente em cada parcela, nas três posições topográficas (topo,encosta, baixada). O material coletado foi encaminhado ao laboratório em câmara úmida para os procedimentos de caracterização dos morfotipos, diafanização,microscopia óptica e microscopia eletrônica de varredura.

Caracterização dos morfotipos

Os morfotipos de ectomicorrizas mais predominantes, associados à cultura de eucalipto em cada posição topográfica, foram observados sob lupa estereoscópica, fotografados e descritos baseando-se na forma e nacor das ectomicorrizas frescas descritas por Agerer(1992). Posteriormente, foram submetidos às técnicas de diafanização e microscopia eletrônica de varredura.

Diafanização e microscopia ótica de luzpolarizada de raízes e ectomicorrizas

Amostras de raízes e de ectomicorrizas foram submetidas a três lavagens com tampão fosfato, pH7,2, com o intuito de retirar o solo aderido à superfície.As raízes e ectomicorrizas foram desidratadas em series de etanol 10, 30, 50, 70 e 90 % (v/v), durante10 min cada. Em seguida, o material foi mantido emetanol 95 % (v/v), durante 12 h. Após esta fase, asamostras foram submetidas a técnicas de clareamento em solução de hipoclorito de sódio 1,8 % (v/v), segundo modificações de Ilarslan et al. (2001). As estruturas diafanizadas foram montadas em lâminas semipermanentes com gelatina glicerinada (Johansen,1940). Efetuou-se a visualização dos CaOx e registro fotográfico com fotomicroscópio óptico, com filtros deluz polarizada (AX70TRF, Olympus Optical).

Microscopia eletrônica de varredura da superfície do manto

Ectomicorrizas que representavam os diferentes morfotipos encontrados na área de estudo foram fixadas em glutaraldeído 2,5 % em tampão fosfato1 mol L-1, pH 6,8-7,0, na proporção 1:1, por 1 h, lavadas em tampão fosfato 1 mol L-1, pH 6,8-7,0, durante 10 min. Após as lavagens, as amostras foram desidratadas em série etílica (10, 30, 50, 70 e 90 % v/v)e secas em ponto crítico (Bal.Tec. 030), utilizando carbono líquido. Posteriormente, as amostras foram metalizadas com ouro (Balzer, SCA010) e, finalmente, o material foi analisado em microscópio eletrônico devarredura (LEO, VP 1430).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Morfologia e frequência de CaOx em raízesfinas e ectomicorrizas de eucalipto

A microscopia óptica de luz polarizada de fragmentos diafanizados de raízes não colonizadas ede ectomicorrizas evidenciou a presença de depósitos de CaOx estendendo-se de forma basípeta a partir dos meristemas radiculares (Figura 1). De forma geral, foi possível observar duas formas de CaOx: cristais do tipo grânulos, caracterizados como cristais amorfos,sem distribuição uniforme (Figura 1C, G), e do tipodrusas, caracterizados como conglomerados globulares, constituídos de cristais em forma de agulha (Figura 1A, B, D). Observou-se, também, que os CaOx com forma de drusas, presentes principalmente emectomicorrizas, são maiores que os CaOx do tipogrânulos presentes em raízes não colonizadas (Figura 1D, H). Borchert (1985) e Mazen et al. (2004)relataram que o tamanho e a forma do cristalapresentam grande variação em relação à célula emque se encontra e ao ambiente onde é formado.Também, a quantidade de Ca2+ e de ácido oxálico disponível, entre outros fatores ambientais, são determinantes para essas características. Da mesma forma, os cristais variam quanto à distribuição, à frequência, à ocorrência, ao tamanho e à forma, dependendo da planta (Osuji et al., 1997), sendo amorfologia e distribuição dos CaOx elementos cruciaispara a função potencial no organismo (Webb, 1999).


 








Observou-se que 52,6 % das ectomicorrizas apresentaram abundante acúmulo de CaOx. Já as raízes não colonizadas apresentaram frequência de acúmulo de CaOx substancialmente mais baixa,17,5 %, indicando que as ectomicorrizas associadas a Eucalyptus sp. induzem o armazenamento de Ca na forma de CaOx no sistema radicular da planta hospedeira.

Esses resultados evidenciam que a exploração do solo pelos FEM pode aumentar o Ca disponível para aplanta nas raízes micorrizadas. A constituição de reservatórios de Cana raiz na forma de CaOx, induzida pela colonização por FEM, sugere papel importante desses microrganismos no suprimento de Ca para o eucalipto, especialmente durante a etapa de maior crescimento da planta, quando a demanda pelo elemento é alta e sua disponibilidade no solo é baixa(Ritchey et al., 1982; Barros & Novais, 1996). Alguns autores relatam que os CaOx não são reservatórios inertes de Ca, já que podem ser redissolvidos, mas constituem uma fonte de Ca para a célula (Franceschi,1989; Webb, 1999).

Embora a função dos CaOx em plantas e fungos não seja bem conhecida (Webb et al., 1995; Webb,1999), a presença desses elementos podem trazer alguns benefícios para os organismos que os produzem. Alguns autores afirmam que os CaOx constituem estratégias de defesa da planta contra organismos herbívoros (Saltz & Ward, 2000); regulam a concentração de Ca intracelular (Franceschi, 2001) e atuam na destoxificação de diferentes substâncias, como metais pesados e ácido oxálico na célula (Silvaet al., 2001; Mazen, 2004). Hipoteticamente, a presença de CaOx nas raízes e ectomicorrizas de eucalipto podeter papel na destoxificação de elementos tóxicos nosolo, a exemplo do alumínio, presente em altas concentrações no solo da área em estudo (ver Parte I).

Distribuição de CaOx em morfotipos predominantes de ectomicorrizas

Foram observados quatro morfotipos de ectomicorriza no topo (Figura 2) e na encosta (Figura 3) e dois na baixada (Figura 4). As ectomicorrizas associadas ao eucalipto apresentaram forma variada, sem pelos radiculares e com mantore cobrindo a superfície. Os 10 morfotipos de ectomicorriza relatados ilustram a diversidade de FEM que interage com as raízes da planta hospedeira naárea estudada. Giachini et al. (2000) descreveram 49 espécies de FEM em plantações de Pinus sp. e Eucalyptus sp. no Estado de Santa Catarina e, recentemente, Campos (2004) observou 20 morfotipos distintos de FEM em povoamentos de eucalipto no Estado de Minas Gerais. Embora o número de morfotipos observados neste trabalho tenha sidomenor, demonstrou-se que, mesmo em área ocupada inicialmente com pastagens e posteriormente cultivada com eucalipto por apenas 2,5 anos, a presença de FEM no plantio é significativa.




A diversidade de morfotipos observada nasdiferentes posições topográficas sugere interação entreas características do ambiente e a prevalência dedeterminadas espécies fúngicas. Observou-se número superior de morfotipos ectomicorrízicos no topo e naencosta (Figuras 2 e 3), que apresentaram menor teorde Ca e Mg (Quadro 1 - Parte I). Já na baixada, omenor número de morfotipo de FEM pode estarrelacionado aos teores mais elevados desses cátions no solo. A distribuição local das ectomicorrizas nafloresta parece, de fato, ser controlada pelo hospedeiroem função das características ambientais, como adisponibilidade de nutrientes e água (Allen et al., 1995).

Meyer et al. (1988) observaram que, em plantio dePicea abies, há correlação negativa entre a distribuiçãodas ectomicorrizas associadas às árvores e as concentrações de cátions no solo.

Os diversos morfotipos de ectomicorriza das três posições topográficas submetidas a técnicas de diafanização apresentaram variada distribuição de CaOx nas células radiculares (Figuras 2, 3 e 4B, E, H, K).

Os CaOx observados nos morfotipos da encosta (Figura 3), onde o teor de Ca2+ foi virtualmente nulo (Quadro 1- Parte I), apresentaram abundantes cristais com morfologia granular. Já os morfotipos do topo eda baixada apresentaram cristais predominantemente na forma de drusas. Este fato está de acordo com o relato de Mazen et al. (2004), que observaram que, em raízes de Lemma minor, o tamanho e número de cristais aumentaram em função do aumento de Ca2+ no solo.

Neste trabalho, demonstrou-se que, mesmo embaixa disponibilidade de Ca2+ no solo, os FEM induzem o armazenamento de Ca pela planta, sugerindo maior aquisição do elemento quando as raízes encontram-secolonizados pelos FEM. Este fato deve-se, possivelmente, à maior disponibilização do Ca no solo em decorrênciada maiores concentrações de ácidos orgânicos na ectomicorrizosfera (Parte I).

Os CaOx observados não estavam associados ao manto fúngico, como foi evidenciado pela análise da superfície do manto por microscopia eletrônica de varredura (Figuras 2, 3 e 4C, F, I, L). O depósito de CaOx no manto de fungos ectomicorrízicos, comum em solos calcários, sugere que a formação dos cristais nesta estrutura típica das ectomicorrizas constitui estratégia de tolerância às elevadas concentrações do elemento (Cromack et al., 1979; Connolly & Jellison,1995; Tait et al., 1999; Arocena et al., 2001). Os depósitos cristalinos observados sugerem que os FEMinduzem a formação dos CaOx nas células radiculares corticais por meio do incremento na concentração de Ca e exsudação de ácidos orgânicos pelo fungo. Em estudos de campo e casa de vegetação, foram evidenciados a absorção e o transporte de Ca emrizomorfos de FEM a partir de fontes minerais como apatita, resultando em teores de Ca de duas a três vezes maiores nos rizomorfos em comparação ao sápices radiculares (Wallender et al., 2002).

Este trabalho constitui o primeiro relato doacúmulo de Ca na forma de cristais de oxalato induzido pela associação ectomicorrízica nas raízes deeucalipto, sugerindo papel importante dos fungosectomicorrízicos na aquisição de Ca para a planta combaixa disponibilidade do elemento no solo. No entanto, estudos são necessários para definir o quão disponível para as plantas são estas formas cristalizadasde Ca e quais são os fatores que controlam sua formação.

CONCLUSÕES

1. O acúmulo CaOx ocorre tanto nas raízes laterais finas não colonizadas quanto nas ectomicorrizas de eucalipto.

2. Fungos ectomicorrízicos associados às raízes laterais finas induzem maior acúmulo de CaOx nas células do córtex radicular da planta hospedeira.

3. A morfologia e a distribuição de CaOx variamcom o morfotipo de ectomicorriza, evidenciando papéisdistintos dos fungos ectomicorrízicos em induzir aformação de depósitos de Ca.

4. Maior quantidade de CaOx nas ectomicorrizasevidencia a contribuição de FEM na aquisição de Capelo eucalipto, mesmo em baixa disponibilidade do elemento no solo.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em abril de 2008 e aprovado em março de 2009.

Referências bibliográficas

  • AGERER, R. Characterization of ectomycorrhiza. In: NORRIS,J.R.; READ, D.J. & VARMA, A.K., eds. Techniques of mycorrhizal research. San Diego, Academic Press, 1992.928p.
  • ALLEN, E.; ALLEN, M.F.; HELM, D.; TRAPPE, J.M.; MOLINA, R. & RINCON, E. Patterns and regulation of mycorrhizal plant and fungal diversity. Plant Soil, 170:47-62, 1995.
  • AROCENA, J.M.; GLOWA, K.R. & MASSICOTTE, H.R. Calcium-rich hypha encrustations on Piloderma Mycorrhiza, 10:209-215, 2001.
  • BARROS, N.F. & NOVAIS, R.F. Eucalypt nutrition and fertilizer regimes in Brazil. In: ATTIWILL, P.M. & ADAMS, M.A., eds. Nutrition of eucalypts. Collingwood, CSIRO Publishing, 1996. 440p.
  • BORCHERT, R. Calcium-induced patterns of calcium-oxalate crystals in isolated leaflets of Gleditsia triacanthos L. and Albizia julibrissin Durazz. Planta, 165:301-310, 1985.
  • CAMPOS, D.T.S. Diversidade de fungos ectomicorrízicos em povoamentos de eucalipto. Viçosa, MG, Universidade Federal de Viçosa, 2004. 82p. (Tese de Doutorado)
  • CONNOLLY, J. & JELLISON, J. Calcium translocation, calcium oxalate accumulation, and hyphal sheath morphology in the white-rot fungus Resinicium bicolor Can. J. Bot., 73:927-936, 1995.
  • CROMACK, K.; GRAUSTEIN, W.C.; SPEIDEL, K.; TODD, A.W.; SPYCHER, G.; LI, C.Y. & TODD, R.L. Calcium oxalate accumulation and soil weathering in mats of Hysterangium crassum. Soil Biol. Biochem., 11:463-468, 1979.
  • CUMMING, J.R.; SWIGER, T.; KURNIK, B.E. & PANNACCIONE, G. Organic acid exudation by Laccaria bicolor and Pisolithus tinctorius exposed to aluminium in vitro Can. J. For. Res., 31:703-710, 2001.
  • ENTRY, J.A.; ROSE, C. & CROMACK, K. Microbial biomass and nutrient concentrations in hyphal mats of the ectomycorrhizal fungus Hysterangium setchellii in a coniferous forest soil. Soil Biol. Biochem., 5:447-453, 1992.
  • FRANCESCHI, V.R. Calcium oxalate formation is a rapid and reversible process in Lemna minor L. Protoplasma, 148:130-137, 1989.
  • FRANCESCHI, V.R. Calcium oxalate in plants. Trends Plant Sci., 6:331, 2001.
  • FRANCESCHI, V.R. & NAKATA, P. Calcium oxalate in plants: Formation and function. Ann. Rev. Plant. Biol., 56:41-71, 2005.
  • GIACHINI, A.J.; OLIVEIRA, V.L.; CASTELLANO, M.A. & TRAPPE, J.M. Ectomycorrhizal fungi in Eucalyptus and Pinus plantation in Southern Brazil. Mycologia, 92:1166-1177, 2000.
  • GOURLAY, I.D. & GRIME, G.W. Calcium oxalate crystals in African Acacia species and their analysis by scanning proton microprobe (SPM). IAWA J., 2:137-148, 1994.
  • GRAUSTEIN, W.C.; CROMACK, K. & SOLLINS, P. Calcium oxalate: Ocurrence in soils and effect on nutrient and geochemical cycles. Science, 4323:1252-1254, 1977.
  • ILARSLAN, H.R.; PALMER, G. & HORNER, H.T. Calcium oxalate crystals in developing seeds of soybean. Ann. Bot., 88:243-257, 2001.
  • LAPEYRIE, F.; PICATTO, C.; GERARD, J. & DEXHEIMER, J.T. Study of intracellular and extracellular calcium oxalate accumulation by ectomycorrhizal fungi in pure culture or in association with Eucalyptus seedlings. Symbiose, 9:163-166, 1990.
  • JOHANSEN, D.A. Plant microtechnique. New York: McGraw-Hill. 1940. 523p.
  • MALAJCZUCK, N. & CROMACK, K. Accumulation of calcium oxalate in the mantle of ectomycorrhizal roots of Pinus radiata and Eucalypthus marginata New Phytol., 4:527-531, 1982.
  • MAZEN A.; ZHANG, D.Z. & FRANCESCHI, V.R. Calcium oxalate formation in Lemna minor: Physiological and ultrastructural aspects of high capacity calcium sequestration. New Phytol., 161:435-448, 2004.
  • MAZEN, A. Calcium oxalate deposits in leaves of Corchorus olitotius as related to accumulation of toxic metals. Russ. J. Plant Physiol., 51:281-285, 2004.
  • MEYER, J.; SCHNEIDER, B.U.; WERK, K.; OREN, R. & SCHULZE, E.D. Performance of two Picea abies (L.) Karst. stands at different stages of decline. V. Root tips and ectomicorrhiza development and their relations to above ground and soil nutrients. Oecologia, 77:7-13, 1988.
  • OSUJI, J.; OKOLI, B. & ORTIZ, R. Histochemical localization of calcium oxalate crystals in fruits of plantain and banana cultivars. Fruits, 52:5-10, 1997.
  • RITCHEY, K.D.; SILVA, E. & COSTA, U. Calcium deficiency in clay B horizons of Savanna Oxisols. Soil Sci., 6:378-382, 1982.
  • SALTZ, S. & WARD, D. Responding to a three-pronged attack: Desert lilies subject to herbivory by dorcas gazelles. Plant Ecol., 148:127-138, 2000.
  • SILVA, I.R.; SMYTH, T.J.; RAPER, C.D.; CARTER, T.E. & RUFTY, T.W. Differential aluminium tolerance in soybean: An evaluation of the role of organic acids. Plant Physiol., 112:200-210, 2001.
  • TAIT, K.; SAYER, J.; GHARIEB, M.E. & GADD, G. Fungal production of calcium oxalate in leaf litter microcosms. Soil Biol. Biochem., 31:1189-1192, 1999.
  • VALE, F.R.; FURTINI, N.; RENÓ, N.B.; FERNANDES, L.A. & RESENDE, A.V. Crescimento radicular de espécies florestais em solo ácido. Pesq. Agropec. Bras., 9:609-616, 1996.
  • WALLENDER, H.; WICKMAN, T. & JACKS, G. Apatite as a P source in mycorrhizal and non-mycorrhizal Pinus sylvestris seedlings. Plant Soil, 196:123-131, 1997.
  • WALLENDER, H.; JOHANSSON, J. & PALLON, J. PIXEL analysis to estimate the elemental composition of ectomycorrhizal rhizomorphs grown in contact with different minerals in Forest soil. FEMS Microbiol. Ecol., 9:147-156, 2002.
  • WEBB, M. Cell-mediated crystallization of calcium oxalate in plants. Plant Cell, 11:751-761, 1999.
  • WEBB, M.; CAVALETTO, J.; CARPITA, N.C.; LOPEZ, L.E. & ARNOTT, H.J. The intravacuolar organic matrix associated with calcium oxalate crystals in leaves of Vitis Plant J., 7:663-648, 1995.
  • WHITNEY, K. & ARNOTT, H.J. Calcium oxalate crystal morphology and development in Agaricus bisporus Mycology, 79:180-187, 1987.
  • ZUÑIGA, D.; GRAJEDA, J.; SEPULVEDA, J.; WITAKER, J. & MORENO, A. Cristallochemical characterization of calcium oxalate crystals isolated from seed coast of Phaseolus vulgaris and leaves of Vitis vinifera J. Plant Physiol., 190:239-245, 2003.
  • (1
    ) Parte da Tese de Mestrado do primeiro autor apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Microbiologia Agrícola daUniversidade Federal de Viçosa - UFV.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Ago 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Aceito
      Mar 2009
    • Recebido
      Abr 2008
    location_on
    Sociedade Brasileira de Ciência do Solo Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, Departamento de Solos - Edifício Silvio Brandão, s/n, Caixa Postal 231 - Campus da UFV, CEP 36570-900 - Viçosa-MG, Tel.: (31) 3612-4542 - Viçosa - MG - Brazil
    E-mail: sbcs@sbcs.org.br
    rss_feed Stay informed of issues for this journal through your RSS reader
    Acessibilidade / Reportar erro