Acessibilidade / Reportar erro

Representações da homossexualidade no Espiritismo

Representation of homosexuality in Spiritism

Resumos

Resumo

Neste artigo, apresenta-se uma análise do processo de construção das representações da homossexualidade na doutrina espírita brasileira e da percepção de homens gays praticantes do Espiritismo a partir de dados coletados entre os anos de 2016 e 2019, na cidade de Campina Grande, Paraíba. Os resultados apresentados foram frutos de pesquisa realizada, inicialmente, na obra de Allan Kardec e em discursos e publicações de médiuns brasileiros contemporâneos. Após, para alargar o debate, foram realizadas entrevistas com homens gays praticantes do Espiritismo. Levou-se em consideração a Análise do Discurso de linha francesa enquanto vertente teórico-metodológica. Observa-se que as representações apresentadas pelos interlocutores coadunam, em parte, com aquelas pensadas pelos doutrinadores espíritas, mas existem resistências, mostrando que a subjetividade do indivíduo interfere e ajuda a ressignificar conceitos e práticas religiosas. Por meio deste trabalho, portanto, busca-se contribuir para o alargamento do debate em torno da sociologia da religião em interface com a sexualidade e, por fim, expandir o debate em torno do Espiritismo brasileiro.

Palavras-chave:
Espiritismo; Sexualidade; Análise do Discurso; Gênero; Homossexualidade


Abstract

This article presents an analysis of the construction process of the representations of homosexuality in the Brazilian Spiritist Doctrine and the perception of spiritist gay men from data collected during 2016 to 2019 in Campina Grande, Paraíba. The results obtained were products of research initially carried out in the work of Allan Kardec and from contemporary Brazilians mediums’ speeches and publications. To expand the debate, interviews with spiritist gay men were conducted. The French Discourse Analysis was taken in consideration as theoretical-methodological aspect. It is observed that the representations presented by the interlocutors correspond, in parts, with those thought by the spiritists, however, there are resistance showing that the individual’s subjectivity hampers and helps to resignify concepts and religious practices. Therefore, through this work, it seeks to contribute to broadening the debate over the sociology of religion in interface with sexuality and, to conclude, to expand the debate over the Brazilian spiritism.

Keywords:
Spiritism; Sexuality; Discourse Analysis; Gender; Homosexuality


Introdução

O interesse por estudar a relação entre sexualidade e Espiritismo surgiu de uma inquietação pessoal do presente pesquisador a partir de observações empíricas. Ocorreu que, durante participações em palestras e outros eventos em centros espíritas de Campina Grande (PB), observou ou reconheceu a presença de diversos colegas, conhecidos e amigos gays nas plateias, mas nunca em posição de palestrantes ou de comando. O desconforto perante essa situação despertou o interesse acadêmico, pois, por ser um homem gay praticante da doutrina espírita, não se sentiu representado. A falta de representação estimulou-o a pesquisar essa situação.

Neste texto, busca-se analisar as representações da homossexualidade não apenas na doutrina espírita, mas na interpretação e posicionamento de homens gays espíritas. A tarefa foi difícil; muitos homens se negaram a conceder entrevista com a justificativa de que o tema era sensível. Dito isso, também realizou-se um pequeno recorte histórico sobre o Espiritismo como forma de analisar a produção e reprodução do Espiritismo no Brasil, apenas como forma de situar o leitor.

Ademais, adotou-se a Análise do Discurso de linha francesa enquanto estratégia metodológica analítica, especialmente a obra A ordem do discurso, de Foucault ([1970]FOUCAULT, Michel. ([1970] 1996), A ordem do discurso. São Paulo, Loyola. 1996), que marca a transição do autor em suas análises arqueológicas para as genealógicas.

Assim, além desta seção introdutória, o artigo encontra-se dividido em mais três seções principais, nas quais, em um primeiro momento, discute-se o Espiritismo no Brasil relacionado ao discurso de sexualidade, para, em seguida, apresentarem-se mais detalhadamente os aspectos metodológicos empregados no processo de investigação desta pesquisa. Por fim, a análise das representações e identidades construídas a partir da vivência de homens gays1 1 Deve-se ressaltar que, entre o rol de interlocutores, para a tese, foram selecionadas apenas duas entrevistas para a análise neste artigo. com o Espiritismo, seguida da seção voltada para a apresentação das considerações finais.

Espiritismo no Brasil e o discurso de sexualidade

O surgimento do Espiritismo data do século XIX na França, quando fenômenos inexplicáveis começaram a movimentar a Europa, a exemplo de mesas giratórias e “inteligentes”. Chamaram a atenção do, até então, Hippolyte Leon Denizard Rivail, o qual adotaria, posteriormente, o pseudônimo de Allan Kardec, tornando-se o codificador da doutrina que viria a florescer e a ganhar espaço no Brasil (Arribas, 2017ARRIBAS, Célia da Graça. (2017), “Autoridades espíritas: critérios para tipologias e repartições das lideranças no espiritismo”, in A. R. de Souza; P. Simões & R. Toniol (org.), Espiritualidade e espiritismo: reflexões para além da religiosidade, São Paulo, Porto de Ideias.).

Nesse diapasão, observam-se as bases da doutrina: razão iluminista e positivista, sempre em contraposição às transformações vividas pelas religiões cristãs. Nessa perspectiva, Lewgoy (2008, pLEWGOY, Bernado. (2008), “A transnacionalização do espiritismo kardecista brasileiro: uma discussão inicia”. Relig. soc., 28, 1: 84-104. DOI: 10.1590/S0100-85872008000100005.
https://doi.org/10.1590/S0100-8587200800...
. 85) argumenta que “Allan Kardec, o criador do Espiritismo, encarnou como poucos o ideal racionalista do século XIX, quando a ciência, a filosofia da história e o determinismo passaram a tomar o lugar do voluntarismo subjetivo na imaginação moral”.

A partir desse contexto, surgem as obras que inauguram e servem de base moral e espiritual da doutrina espírita, reunidas no Pentateuco Espírita – O livro dos espíritos, O livro dos médiuns, O evangelho segundo o Espiritismo, O céu e o inferno e A gênesis – codificadas2 2 Codificação é o termo usado entre os espíritas para referirem-se ao processo de organização escrita das primeiras obras de Allan Kardec, compreende que ele não foi o autor, mas aquele que conseguiu codificar as informações. por Allan Kardec.

Sobre o contexto brasileiro, Lewgoy (2008)LEWGOY, Bernado. (2008), “A transnacionalização do espiritismo kardecista brasileiro: uma discussão inicia”. Relig. soc., 28, 1: 84-104. DOI: 10.1590/S0100-85872008000100005.
https://doi.org/10.1590/S0100-8587200800...
afirma que, ao chegar no Brasil, no século XIX, o Espiritismo ganhou novo formato, apresentando o mesmo processo pelo qual passou o Catolicismo ao se tornar um distante de Roma.

No caso brasileiro, houve dois deslocamentos importantes em relação ao cientificismo kardequiano: o deslocamento da ênfase na mensagem para a ênfase no carisma do médium e o deslocamento da comunicação espírita em três indivíduos desconhecidos num mesmo espaço mediúnico impessoal para a mediação relacional entre seres já ligados por nexos anteriores, geralmente familiares. Comparando a inserção do Espiritismo nas histórias francesa e brasileira Aubrée e Laplantine mostraram que, comparada à França do século XIX, na sessão espírita no Brasil do século XX predominou um espaço familiar antes que um espaço impessoal. Por isso, as mães e mulheres, figuras centrais na mediação familiar, são tão importantes no desenrolar das sessões. (Lewgoy, 2008, pLEWGOY, Bernado. (2008), “A transnacionalização do espiritismo kardecista brasileiro: uma discussão inicia”. Relig. soc., 28, 1: 84-104. DOI: 10.1590/S0100-85872008000100005.
https://doi.org/10.1590/S0100-8587200800...
. 86)

O Espiritismo brasileiro seguiu por um viés diferenciado do pensado por Kardec, que o idealizou influenciado pelo pensamento da laicidade, progresso e espírito científico. O formato adotado se deve, em grande medida, ao seu enxerto nos lares católicos. Com isso, pode-se afirmar que o modo de ser espírita nacional não tem apenas fortes influências do catolicismo brasileiro, mas construiu-se por meio de um fluxo contínuo entre as duas religiões a partir do trânsito religioso de seus fiéis.

Hoje, observa-se o crescimento do Espiritismo no Brasil, década após década. No último censo do IBGE (2010)“Censo Demográfico e Populacional Brasileiro de 2010”. (2010), INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Disponível em <https://censo2010.ibge.gov.br/>, consultado em 20/01/2020.
https://censo2010.ibge.gov.br/...
, a população espírita era constituída por 3.848.876 indivíduos, sendo 1.581.701 homens e 2.267.176 mulheres. O censo ainda reforçava a quantidade de simpatizantes, que chegou ao número de 18 milhões, ou seja, 10% da população do Brasil na época.

Para melhor explicitar a compreensão doutrinária sobre a sexualidade, serão abordados os conceitos de sexo e homossexualidade preconizados pela doutrina espírita e por alguns doutrinadores mais proeminentes como Francisco Cândido Xavier – Chico Xavier – e Divaldo Pereira Franco. A escolha dos nomes decorre da personificação ocorrida no Espiritismo brasileiro, primeiro em torno de Chico Xavier, sendo ele o nome que melhor personificou a doutrina espírita no Brasil, e, segundo, Divaldo Pereira Franco, que é tido entre os espíritas como o sucessor de Chico. Divaldo continua a produzir e proferir palestras, tendo se colocado no centro de um debate ferrenho sobre Ideologia de Gênero3 3 Deve-se ressaltar que Teoria e Ideologia de Gênero têm significados diferentes, o primeiro surgiu do debate acadêmico científico, o segundo é terminologia êmica, construída em oposição aos discursos públicos derivados da primeira. no ano de 2018, ao afirmar que seria uma produção comunista. É o que se pode depreender do trecho, exposto a seguir, retirado de sua fala proferida no 34º Congresso Espírita do Estado de Goiás, disponível em vídeo publicado no Canal de Homero Negro no YouTube em 2018:

Eu diria em frase muito breve, que é um momento de alucinação psicológica da sociedade (risos e palmas). Mesmo porque, nós vamos olhar a criança graças a sua anatomia, como sendo o tipo ideal, e a criança nesse período não tem discernimento sobre o sexo, a tese é profundamente comunista, e ela foi lançada por Marx, sobre outras condições, que a melhor maneira de submeter um povo não era escravizá-lo economicamente, era escravizá-lo moralmente, como nós vemos através de vários recursos que tem sido aplicados no Brasil nos últimos nove anos, dez [...]. (Franco apud Canal Homero Negro, 2018NEGRO, Homero. (2018), Divaldo e a ideologia de gênero. 34º Congresso Espírita do Estado de Goiás, Goiânia, 10 a 13 de fevereiro. Disponível em <https://youtu.be/3KZ3bH3U_ec>, consultado em 10/01/2021.
https://youtu.be/3KZ3bH3U_ec...
)4 4 A fala de Divaldo gerou reação por parte da comunidade espírita. O grupo intitulado Espíritas Progressistas lançaram uma carta, contestando a fala polêmica, sendo ratificada por diversos espíritas, intelectuais, diretores de Centros e médiuns.

Os demais médiuns/doutrinadores foram escolhidos por terem se debruçado explicitamente sobre os temas aqui abordados e se filiarem a uma corrente que ainda é majoritária dentro do Espiritismo brasileiro, que é a religiosa e a filantropa.5 5 Embates entre religiosos e científicos existiram durante as primeiras cinco décadas do século XX, ocorrendo um acordo chamado de Pacto áureo na década de 50 e respaldando o poder da FEB para estabelecer parâmetros doutrinários espíritas brasileiro.

As primeiras palavras sobre o sexo no discurso espírita podem ser encontradas na obra O livro dos espíritos, que é dividido em questões e respostas, mesma estratégia encontrada nos demais livros da codificação doutrinária espírita. O extrato a seguir é sintomático quanto ao tema em questão:

200. Têm sexos os Espíritos?

“Não como o entendeis, pois que os sexos dependem da organização. Há entre eles amor e simpatia, mas baseados na concordância dos sentimentos.”

201. Em nova existência, pode o Espírito que animou o corpo de um homem animar o de uma mulher e vice-versa?

“Decerto; são os mesmos os Espíritos que animam os homens e as mulheres.”

202. Quando errante, que prefere o Espírito: encarnar no corpo de um homem, ou no de uma mulher?

“Isso pouco lhe importa. O que o guia na escolha são as provas por que haja de passar.”

Os Espíritos encarnam como homens ou como mulheres, porque não têm sexo. Visto que lhes cumpre progredir em tudo, cada sexo, como cada posição social, lhes proporciona provações e deveres especiais e, com isso, ensejo de ganharem experiência. Aquele que só como homem encarnasse só saberia o que sabem os homens. (Kardec, 1997, pKARDEC, Allan. (1997), O livro dos espíritos. São Paulo, Editora Petit.. 115-116)

Segundo o que é veiculado pela doutrina, o espírito pode trocar, ou não, de sexo a cada encarnação. Os espíritas acreditam que faz parte desse processo aprender e se educar em ambos os sexos, ficando a cargo do livre arbítrio do sujeito a escolha. Essa ideia é consensual. Pode ocorrer a definição do sexo como forma de prova e expiação devido à situação anterior vivida, bem como por uma missão escolhida, tudo dependerá do nível evolutivo. Contudo, o que ora interessa é destacar que, para além dessas questões e respostas, o sexo não é discutido de forma explícita, mas sim de modo homeopático, na tentativa de se desresponsabilizarem pelo que é dito sobre o assunto.

As representações sobre o sexo construídas a partir das ideias de Divaldo Pereira Franco podem ser observadas e analisadas em obras mais recentes como Sexo e consciência, de 2016, e Amor e sexualidade: a conquista da alma, de 2018, compilações que reúnem textos e discursos proferidos por Divaldo ao longo da sua vida e organizadas por Luiz Fernando Lopes. Assim compreende o que é o sexo:

Sexo: Conceito – Os lexicógrafos conceituam o sexo como a “conformação particular do ser vivo que lhe permite uma função ou papel especial no ato da geração”. Biologicamente, são os “caracteres estruturais e funcionais pelos quais um ser vivo é classificado como macho e fêmea...” [...] Fundamental na espécie humana para o “milagre” procriativo é dos mais importantes fatores constitutivos da personalidade [...] O sexo, porém, queira-se ou não, nas suas funções importantes em relação à vida, procede do Espírito, cujo comportamento numa existência insculpe na vindoura as condições emocionais e estruturais necessárias à evolução moral. (Franco, 2018, pFRANCO, Divaldo [pelo espírito Joanna de Ângelis]. (2018), Amor e sexualidade: a conquista da alma. Organização de Luiz Fernando Lopes. Salvador, Editora Leal.. 17-18)

A adoção de termos da biologia e psicologia transpessoal dão um ar de cientificidade ao conteúdo, fato que corrobora para uma não contestação direta entre os adeptos, especialmente por serem discursos de autoridades religiosas como Chico Xavier e Divaldo Franco, nomes que personificaram a doutrina espírita no Brasil.

Em Vida e sexo, de 2016, psicografado por Chico Xavier, analisa-se o comportamento sexual aliado à conduta moral na perspectiva espírita; “o Espírito se revela, no plano físico, pelas tendências que registra nos recessos do ser, tipificando-se na condição de homem ou de mulher, conforme as tarefas que lhe cabe realizar” (Xavier, 2016, pXAVIER, Francisco Cândido [pelo espírito Emmanuel]. (2016), Vida e sexo. 27a edição, 3a impressão, Brasília, FEB.. 9).

Observa-se o reforço à lógica aplicada pela doutrina espírita, de que o espírito reencarna conforme suas necessidades evolutivas, corroborando o princípio da biologia sobre a conformação biológica dos corpos e discordando do processo evolutivo e biológico, ao afirmar que o sexo é definido em esferas espirituais antes da sua concepção. Para além da biologia, há a constituição de um padrão, uma normalização do sexo. Acerca do sexo, Xavier (2016)XAVIER, Francisco Cândido [pelo espírito Emmanuel]. (2016), Vida e sexo. 27a edição, 3a impressão, Brasília, FEB. faz ainda a seguinte complementação:

O sexo se define, desse modo, por atributos não apenas respeitáveis mas profundamente santo da natureza. Exigindo educação e controle. Por meio dele dimanam forças criativas, às quais devemos, na Terra, o instituto da reencarnação, o templo do lar, as bênçãos da família, as alegrias revitalizadoras do afeto e o tesouro inapreciável dos estímulos espirituais. (Xavier, 2016, pXAVIER, Francisco Cândido [pelo espírito Emmanuel]. (2016), Vida e sexo. 27a edição, 3a impressão, Brasília, FEB.. 9-10)

Divaldo Franco, em determinado momento na obra Divaldo Franco responde, de 2013, organizada por Claudia Saegusa, foi instado a refletir sobre a homossexualidade. No primeiro tópico do livro, “Causas da homossexualidade”, Divaldo é questionado sobre os motivos que levam as pessoas a adotarem comportamentos homossexuais. Citando a Organização Mundial da Saúde (OMS), responde que o órgão retirou da categoria de doenças a homossexualidade, não sendo, assim, um problema psiquiátrico, mas uma questão de escolha ou, melhor dizendo, opção. Porém, deixa nítido e reforça que a homossexualidade é uma “tendência que tem origem na vida espiritual” (Saegusa, 2013, pSAEGUSA, Claudia (org). (2013), Divaldo Franco responde, Vol. 2. São Paulo, InteLítera.. 119).

Na obra Sexo e consciência, de 2016, mais precisamente no capítulo sete, intitulado “Homossexualidade”, ele torna a tratar desse tema de forma mais específica e contundente. É o que se pode depreender do trecho a seguir:

É importante que o indivíduo que opta por se relacionar com pessoas do mesmo sexo evite posturas de confronto com aqueles que o não compreende ou não aceitem. Será inútil uma explosão de amargura ou atitude autodestrutiva, na ânsia de ferir e dar uma resposta incisiva à sociedade que o oprime. São posturas absolutamente injustificáveis, haja vista que nenhum desafio existencial será revolucionado por intermédio de exibição agressiva de nossos dramas íntimos. O respeito ao grupo social é fator preponderante. Ninguém deve impor sua orientação sexual como se ela fosse um comportamento que todos devem reproduzir. (Franco, 2016, pFRANCO, Divaldo. (2016), Sexo e consciência. Organização de Luiz Fernando Lopes. Salvador, Editora Leal.. 206)

Divaldo insere-se entre os escritores que compartilham da ideia do heterossexismo. Deste modo, seu discurso é norteado por uma heterossexualidade compulsória, ou seja, uma imposição como modelo das relações amorosas e sexuais (Miskolci, 2012MISKOLCI, Richard. (2012), Teoria queer: um aprendizado pelas diferenças. Belo Horizonte, Autêntica Editora.). Divaldo aconselha os homossexuais a aceitarem sua condição de forma recatada, resguardar seus sofrimentos e preconceitos que possam vir a sofrer. Justifica, ainda, qualquer atitude de agressão, afirmando que agressores encontram-se “na gaveta”, ou “enrustidos”, e refletem nos outros a sua ira, porque gostariam de ter a mesma coragem de assumir a sua manifestação desta ou daquela natureza.

Metodologia

Muito se discute a respeito do conceito de Análise do Discurso (AD), pois, enquanto metodologia de análise, não se restringe apenas à área linguística. A História, a Antropologia e a Sociologia também utilizam a AD como ferramenta analítica. Deve-se, dessa forma, explicitar que o emprego da AD não é particularidade do campo linguístico; não é pelo fato de trazer em seu cerne o termo ‘discurso’, que ficará recluso ao campo das letras, da linguística ou da gramática.

A análise do Discurso, tendo o discurso como objeto de investigação, trabalha com a linguagem sob suas diferentes possibilidades de existência, e a considera em uma relação direta com a história – esta como o que determina as possibilidades de realização daquela – e com os sujeitos. O discurso é exterior à língua, mas depende dela para sua possibilidade de existência material, ou seja, o discurso materializa-se em forma de texto, de imagens, sob determinações históricas. (Fernandes, 2012, pFERNANDES; Claudimar Alves. (2012), Discurso e sujeito em Michel Foucault. São Paulo, Intermeios.. 16)

Esta pesquisa apoia-se na perspectiva de Foucault ([1969]FOUCAULT, Michel. ([1969] 2008), A arqueologia do saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves. 7a edição, Rio de Janeiro, Forense Universitária. 2008; [1970] 1996) para pensar, estudar e analisar o discurso, os sujeitos produtores e a reverberação de seus acontecimentos. De forma breve, pode-se afirmar que a AD é uma forma de analisar a história enquanto produto do discurso, dependente de determinadas condições políticas, filosóficas e ideológicas.

Por ser aplicada em diversos campos e áreas, a AD não tem uma definição única, “existem várias, desde orientações mais linguísticas até mais psicossociológicas, e nenhuma pretende ser absolutamente definitiva” (Nogueira, 2001, pNOGUEIRA, Conceição. (2001), “Análise do discurso”, in L. Almeida & E. Fernandes (org.), Métodos e técnicas de avaliação: novos contributos para a prática e investigação, Braga, CEEP.. 22). Buscando aprofundar e delimitar melhor uma proposta do conceito de AD, a pesquisa se atém a Foucault e à sua produção, usando como ponto de partida o seu texto em ocasião da Aula Inaugural no Collège de France, em 2 de dezembro de 1970, A ordem do discurso (Cf. Foucault, [1970]FOUCAULT, Michel. ([1970] 1996), A ordem do discurso. São Paulo, Loyola. 1996).

Escolhe-se esse texto ou, se preferir, momento, por marcar a transição entre duas fases da produção intelectual de Foucault. A primeira seria a arqueológica, encontrada em As palavras e as coisas, de 1966, e em Arqueologia do saber, de 1969, obras nas quais se voltou para a história da loucura, medicina e dos campos dos saberes – “tratara-se, nesse momento, de investigar os saberes que embasaram a cultura ocidental, de buscar o método arqueológico para entender a história desses saberes” (Gregolin, 2006, pGREGOLIN, Maria do Rosário. (2006), Foucault e Pêcheux na análise do discurso: diálogos & duelos. São Carlos, Editora Clara Luz.. 55). O segundo momento está em A ordem do discurso (1970).

Na primeira fase, ele apresenta conceitos importantes que ajudaram a definir a sua perspectiva de AD, como, por exemplo, acontecimento discursivo, enunciado, formação discursiva, implicando no conceito de discurso, compreendido como,

[...] um conjunto de enunciados, na medida em que se apoiem na mesma formação discursiva; [...] é constituído de um número limitado de enunciados para os quais podemos definir um conjunto de condições de existência; [...] é, de parte a parte, histórico – fragmento de história, unidade e descontinuidade na própria história, que coloca o problema de seus próprios limites, de seus cortes, de suas transformações, dos modos específicos de sua temporalidade, e não de seu surgimento abrupto em meio às cumplicidades do tempo. (Foucault, [1969]FOUCAULT, Michel. ([1969] 2008), A arqueologia do saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves. 7a edição, Rio de Janeiro, Forense Universitária. 2008, p. 133)

Observa-se que, no primeiro momento, existe a busca pela ruptura, descontinuidade e transformação, pois Foucault crê que o discurso é prática e ação, não algo estático, contínuo e linear, como se observa na noção tradicional de História. Assim, o pressuposto foucaultiano apresenta uma nova perspectiva e definição para o discurso, como sendo “um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, em uma dada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da função enunciativa” (Foucault, [1969]FOUCAULT, Michel. ([1969] 2008), A arqueologia do saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves. 7a edição, Rio de Janeiro, Forense Universitária. 2008, p. 133).

Depois de A ordem do discurso de 1970, Foucault percorre outros dois momentos de produção. O primeiro focado nas práticas divergentes, em que empreende a análise das articulações entre saberes e os poderes, traçando uma genealogia do poder em Vigiar e punir, de 1975, e em Microfísica do poder, de 1979; no segundo, “ele investigou a subjetivação a partir de técnicas de si, [...] do governo de si e dos outros, orientando suas pesquisas na direção da sexualidade, da constituição histórica de uma ética e estética de si (História da sexualidade, em três volumes, 1976, 1984, 1984)” (Gregolin, 2006, pGREGOLIN, Maria do Rosário. (2006), Foucault e Pêcheux na análise do discurso: diálogos & duelos. São Carlos, Editora Clara Luz.. 55). Deve-se ressaltar que as fases mencionadas não são estanques e separadas; elas se complementam e se reconfiguram.

Por meio da construção teórica da AD por Foucault, esta pesquisa atém-se à análise dos discursos espíritas de quatro doutrinadores:6 6 Doutrinadores são os teóricos do mundo religioso espírita, da mesma forma que existem os doutrinadores para a fé no catolicismo. São pessoas que dedicam sua vida religiosa a estudar determinados temas e divulgar a doutrina espírita. Chico Xavier, Divaldo Franco, Alírio de Cerqueira Filho (2014)CERQUEIRA FILHO, Alírio de. (2014), Sexualidade e saúde espiritual: reflexões sobre sexo, sexualiade e sexualismo. Cuiabá, Espiritizar. e Roberto Lucio Vieira de Souza (2003)SOUZA, Roberto Lucio Vieira de. (2003), “A visão Espírita da Homossexualidade: Quais os fatores que levam uma pessoa a sentir atração por outra do mesmo sexo? Como lidar com o homossexual?”. Revista da Associação Médico-Espírita do Brasil., mais Allan Kardec, que codificou/fundou a religião. Seus discursos7 7 Dado o espaço e a missão do artigo, não se referenciarão os termos ou conceitos propriamente; deter-se-á a apresentar análise prévia da lógica existente e divulgada pelos doutrinadores. As referências aos textos serão realizadas de modo indireto. serão analisados a partir da concepção teórica foucaultiana. Assim, busca-se compreender os efeitos causados pela formação discursiva doutrinária espírita na construção das representações subjetivas dos interlocutores, homens gays e espíritas, desta pesquisa.

O primeiro8 8 Registram-se aqui os agradecimentos in memoriam a Pedro, que, durante a escrita deste artigo, desencarnou. interlocutor foi Pedro,9 9 Usou-se nomes fictícios, buscando-se preservar a face dos interlocutores. 30 anos, trabalhador do comércio, formado em pedagogia e auto descrito como vindo de “família pobre do interior, de cidade pequena, do interior da Paraíba”. O segundo, Paulo, 32 anos, apenas disse que era um brasileiro comum; ao ser solicitado que especificasse melhor, informou que era natural de Campina Grande, descendente de portugueses e profissional liberal.

Ambos frequentaram a mesma universidade pública em diferentes momentos e em diferentes graduações. Definiam-se enquanto eleitores com perspectivas ideológicas mais à esquerda. Apenas Paulo é natural de Campina Grande, Pedro residiu por mais de 10 anos na cidade até seu falecimento, que ocorreu durante a revisão deste trabalho. Ambos são brancos. Paulo de classe média e Pedro de classe baixa. Este último viveu sua sexualidade sem maiores problemas e de modo aberto para a família. Paulo ainda não consegue viver de tal forma, é dependente financeiramente dos pais, que são homofóbicos e eleitores de Bolsonaro. Não serão aprofundados, aqui, os dados biográficos de Paulo, devido ao fato de não ser “assumido” perante a família; assim, por receio de ser reconhecido, evitar-se-á fornecer mais detalhes sobre ele.

Observa-se que são da mesma geração. Ambos já frequentaram, em algum momento, a Fraternidade, ou Sociedade, Espírita Joanna de Angelis (SEJA), a instituição que o presente pesquisador frequentava como praticante espírita e que, posteriormente, tomou como lócus de pesquisa. Dos dois interlocutores, apenas Paulo desenvolveu atividades junto à Casa. Ambos estavam, em 2019, filiados a alguma Casa Espírita. Atualmente, Paulo desenvolve suas atividades como trabalhador espírita no Centro Leopoldo Machado. Pedro, por sua vez, iniciou sua vida na doutrina na Fraternidade Espírita a Caminho da Luz e migrou para a Casa do Caminho.

Paulo teve seu primeiro contato com um Centro Espírita ao buscar tratamento espiritual para um problema relacionado à ansiedade que vivenciava, tendo recorrido à União Fraternal Espírita. É comum ouvir e ler depoimentos e relatos desse gênero, de que se “chegará” ao Espiritismo pelo amor ou pela dor, expressão popular entre os espíritas. Não obrigatoriamente se chegará ao Espiritismo por essas duas vias, mas a maior parte dos relatos informam que o caminho da dor prevalece. Somente depois de passar por problemas diagnosticados como espirituais, ou não ter diagnóstico algum sobre o que se vivencia, é que se chega à Casa Espírita, podendo ou não ocorrer uma fidelização do sujeito. Esse processo de fidelização passa por outros níveis além da busca de tratamento espiritual.

Representações e identidades construídas a partir do espiritismo

A percepção de que o sujeito é entrelaçado, que se liga, desliga e se reconecta em diversas redes ajuda a refletir sobre identidade e processos identitários a partir do contato e vivência com a religião espírita. Assim, Thompson (1981)THOMPSON, Edward P. (1981), A miséria da teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro, Zahar. reflete sobre o sujeito, de modo que este não seria apenas parte de uma consciência coletiva, mas de uma consciência heterogênea e subjetiva:

E quanto à ‘experiência’ fomos levados a reexaminar todos esses sistemas densos, complexos e elaborados pelos quais a vida familiar e social é estruturada e a consciência social encontra realização e expressão [...]: parentesco, costumes, as regras visíveis e invisíveis da regulação social, hegemonia e deferência, formas simbólicas de dominação e resistência, fé religiosa e impulsos milenaristas, maneiras, leis, instituições e ideologias – tudo o que, em sua totalidade, compreende a ‘genética’ de todo processo histórico, sistemas que se reúnem todos, num certo ponto, na experiência humana comum, que exerce ela própria (como experiências de classe peculiares) sua pressão sobre o conjunto. (Thompson, 1981, pTHOMPSON, Edward P. (1981), A miséria da teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro, Zahar.. 188-189)

Thompson (1981)THOMPSON, Edward P. (1981), A miséria da teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro, Zahar. privilegia a noção de experiência enveredando pela análise da expressividade cultural. Essa aproximação legitima a subjetividade como dimensão política da vida social (Ennes e Marcon, 2014ENNES, Marcelo Alario; MARCON, Frank. (2014), “Das identidades aos processos identitários: repensando conexões entre cultura e poder”. Sociologias, 16, 35: 274-305.). Thompson (1981)THOMPSON, Edward P. (1981), A miséria da teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro, Zahar. parte de uma crítica à concepção que por muito tempo naturalizou o conceito de identidade. O uso do conceito, neste trabalho, não busca naturalizá-lo, muito menos respaldar a lógica que afirma que a identidade é fixa, imutável. Segue-se aqui pela via contrária. Pode-se adotar vários aspectos ou identidades para compor um repertório único; não como um quebra-cabeças, mas um agenciamento, em busca de uma representação identitária que concorra nas relações de poder. Esse processo identitário faz parte da constituição das representações socialmente construídas.

Nesse sentido, não se pode afirmar que alguém seria apenas gay, mas também branco, negro, pobre, classe média, escolarizado, analfabeto, de subúrbio, professor, médico, advogado. Ou, ainda, poderia ser um homem trans gay, o que provoca confusão na compreensão do que é ser homem e sua relação com o desejo, especialmente para aqueles que acreditam que tudo se relaciona ao ato sexual e que “creem” em um sistema fálico. Desse modo, são vários os aspectos que integram a identidade, podendo arregimentar cada um em diferentes momentos.

Para realizar as entrevistas, buscou-se um aspecto em comum entre os sujeitos: que todos se reconhecessem como gays. Mesmo sabendo de antemão que assim se identificavam, questionou-se sua orientação sexual. O entrevistado Pedro relatou, durante a entrevista, que se percebeu gay a partir do desconforto que o discurso católico lhe proporcionou; entendeu que “não estava no caminho certo”, o caminho pensado pela Igreja, e, por isso, afirmou: “Eu sou... gay! (risos) Eu sou viado!”. Já Paulo relatou que foi difícil compreender a sua orientação sexual, que só conseguiu respostas claras ao estudar a doutrina espírita.

Paulo: Com certeza... assim... a gente sabe que, para o Espiritismo, sexualidade é definida no planejamento espiritual, então a gente tem encarnações do sexo masculino, e encarnações do sexo feminino, durante várias encarnações, e a transição entre uma e outra é onde dá a homossexualidade. Um exemplo... eu passei várias encarnações vindo como sexo masculino, pra aprender lições que apenas o sexo masculino vão me ensinar, e depois eu posso vir numa sequência de encarnações como mulher, só que essa transição pode ser justamente a homossexualidade. Você não tá entre homem e você não tá em mulher, você tem que aprender uma nova lição, entre esses dois sexos.

Pesquisador: Quer dizer que nascer gay...

Paulo: É uma escolha sua, mas não aqui, no planejamento. Porque é uma forma de... é uma prova que você vai ter que cumprir. (Paulo, 2019PAULO. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 10 de janeiro de 2019, Campina Grande, Paraíba.)

Paulo contou que vive sua sexualidade em segredo. Apenas poucos amigos sabem, mas sua família não, diferentemente de Pedro, que vive a sua sexualidade de modo explícito. Por meio desses relatos, é possível perceber dois sujeitos em posições contrárias, mas que, no final das contas, corroboram a perspectiva espírita quanto à homossexualidade ser algo “natural” – consideram que nasceram gays, o que não determina a vivência dessa sexualidade, percepção que recai em outro discurso, que se verá mais à frente.

Essas afirmações corroboram a ideia de Foucault (2014)FOUCAULT, Michel. (2014), História da sexualidade: o uso dos prazeres, vol 2. Rio de Janeiro/São Paulo, Paz e Terra., quando escreve que as formulações discursivas de formas de saber-poder surtem efeitos inesperados, originando reações, resistências e novas tramas discursivas. O enunciado sobre sexo, desejo e sexualidade demonstra potencial produtor, não apenas de novos discursos, mas de sujeitos, com vivências e representações que se chocam com a(s) regra(s) estabelecida(s). Surgem essas demandas com os novos movimentos sociais: o movimento feminista e o movimento Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgênero (LGBT), desde a década de 1990, que, hoje, é chamado de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Travestis, Transgêneros, Queer, Intersexuais, Assexuais e Mais (LGBTTQIA+). A própria sigla representa o agrupamento de sujeitos que reivindicam uma identidade sem, necessariamente, se adequar a todas as características do grupo, ou seja, um sujeito descentrado capaz de produzir representações e vivências diversas. Eles buscam a reordenação de interesses em espaços de discussão e tomada de decisão e poder. A esse respeito, são relevantes as seguintes palavras de Ennes e Marcon (2014)ENNES, Marcelo Alario; MARCON, Frank. (2014), “Das identidades aos processos identitários: repensando conexões entre cultura e poder”. Sociologias, 16, 35: 274-305.:

Num contexto de múltiplas concepções sobre o sujeito, as discussões sobre identidade estiveram em grande evidência durante o século XX, movidas em grande parte pelos discursos políticos de pertencimento (de nação e de classe) e pelos discursos científicos de classificação (grupos sociais, religiosos, linguísticos, sexuais, raciais, étnicos, etc). No entanto, as reivindicações particularistas e ao mesmo tempo as contestações sobre os rótulos por parte das pessoas demonstraram o caráter eminentemente frágil das dimensões atributivas de identidades aos grupos. Isto contribuiu para o surgimento das disputas e da validade sobre a auto-atribuição. De certo modo, tal debate resultou na possibilidade de visibilidade política e teórica de novos sujeitos sociais, de novas demandas, de novos direitos e desestabilizou uma forma ordenada e tangível de vermos o mundo, pulverizando interesses e multiplicando singularidades. (Ennes e Marcon, 2014, pENNES, Marcelo Alario; MARCON, Frank. (2014), “Das identidades aos processos identitários: repensando conexões entre cultura e poder”. Sociologias, 16, 35: 274-305.. 285)

Verifica-se que eles conseguem articular a identidade espírita com a identidade gay, o que leva a considerar uma identidade pensada como espírita gay, sendo diferente de ser católico gay, umbandista gay, evangélico gay ou apenas ser gay. Essa identidade se constrói a partir das representações construídas pela doutrina espírita em contraponto aos desejos não apenas sexuais, pois se compreende que a sexualidade está para além de uma prática sexual.

A justificativa para tal diferenciação de uma identidade espírita gay reside nos seguintes fatos: “primeiro, a visão espírita de que ser homossexual ou gay é normal; segundo, por reinterpretar a noção de pecado ligada ao cristianismo, pois o que rege as escolhas e a ação dos sujeitos são as leis divinas, as quais existem para orientar, e não condenar” (Pereira, 2020, pPEREIRA, Francisco Jomário. (2020), “TRANSAR PODE, MAS VOCÊ NÃO DEVERIA”: A Representação da Homossexualidade no Discurso Espírita Brasileiro. Tese de Doutorado. Universidade Federal da Paraíba, Paraíba.. 180). Ocorre, assim, um deslocamento não só da ideia, mas principalmente de uma possível penalidade eterna. Essas noções estão inscritas na consciência do indivíduo e são acionadas conforme o grau de evolução moral e espiritual de cada ser. Assim, elas norteiam o processo subjetivo de identificação, que está embasado nas relações de poder, pois, a cada demanda, são acionadas particularidades que arregimentam a identidade, conforme a necessidade de reivindicação: seja ela por aproximação ou distanciamento. Dessa forma, vai-se ao encontro do que Ennes e Marcon (2014)ENNES, Marcelo Alario; MARCON, Frank. (2014), “Das identidades aos processos identitários: repensando conexões entre cultura e poder”. Sociologias, 16, 35: 274-305. defendem:

Defendemos a ideia de que os processos identitários precisam ser analisados, sobretudo, como expressão de relações de poder geradoras de estratificação, hierarquização e localização, mas também, por vezes, de transgressão social. Tal perspectiva se opõe às análises pautadas exclusivamente na identificação de atributos e elementos que caracterizariam determinados grupos e expressariam suas identidades (como gênero, cor de pele, nacionalidade, tradições culturais, entre outros). Tais atributos seriam mais bem empregados na análise social se os considerássemos como marcadores produzidos ou construídos através das relações sociais. (Ennes e Marcon, 2014, pENNES, Marcelo Alario; MARCON, Frank. (2014), “Das identidades aos processos identitários: repensando conexões entre cultura e poder”. Sociologias, 16, 35: 274-305.. 286)

Observa-se a força que a religião pode desempenhar, bem como a capacidade de transgredir a compreensão imposta. Paulo é um exemplo disso, pois se desloca da lógica mais recorrente no espiritismo de que ninguém pede para nascer gay, mas sim para aprender a respeitar a polaridade que vilipendiou vidas passadas, ou seja, a homossexualidade só seria opção quando se trata de missão, o que ele reconhece não viver. Assim, Paulo, em trecho transcrito anteriormente, reconfigura a representação, tomando para si toda e qualquer responsabilidade por seus atos anteriores ao nascimento. Com isso, escolheu nascer gay ao mesmo tempo em que não se encontra em missão, transgredindo a lógica imposta, ao manter sua identidade orientada às práticas homossexuais, tidas como desviantes na doutrina espírita. Deve-se explicitar a lógica espírita: nascer gay é normal; a vivência de uma orientação sexual homossexual é que não seria vista como normal. Logo, alguém pode até ser homossexual, mas não deve praticar a vivência sexual homoafetiva.

Paulo compra a ideia e a lógica de que o espírito não teria um sexo definido enquanto não reencarnado. Além disso, inova ao afirmar que o espírito, ao reencarnar homossexual, não estaria nem como homem nem como mulher. Essa percepção é curiosa, pois, logo em seguida, ele volta a integrar a representação espírita, a partir da necessidade de se educar, aprender uma nova lição, levando-se em consideração o corpo e a orientação sexual que decidiu vivenciar.

No processo de análise das obras de Divaldo, Alírio e Roberto, observa-se que a homossexualidade ocorreria (o que não é necessariamente aceito entre todos os espíritas, médiuns e doutrinadores) devido a uma não adequação da polaridade psíquica ao corpo físico ou devido a vícios trazidos de outra vida. Assim, os três dividem a mesma perspectiva. A esse respeito, convém apresentar as seguintes palavras de Cerqueira Filho (2014)CERQUEIRA FILHO, Alírio de. (2014), Sexualidade e saúde espiritual: reflexões sobre sexo, sexualiade e sexualismo. Cuiabá, Espiritizar.:

Por exemplo, um homem que se vicia de maneira heterossexual, tendo conúbio com muitas mulheres, sem respeitá-las, e isso passa a ser uma constante em sua vida, agravando o vício psíquico reencarnação após reencarnação, quando o Espírito reencarna na outra polaridade para aprender a valorizar os patrimônios femininos, o psiquismo está viciado, logo, a sua psicologia íntima não consegue pensar em termos de psicologia feminina no que se refere ao sexo, pensa em psicologia masculina porque não é a Lei jamais derrogada e o indivíduo no uso de seu livre-arbítrio precisa se responsabilizar por aquilo que escolheu. (Cerqueira Filho, 2014CERQUEIRA FILHO, Alírio de. (2014), Sexualidade e saúde espiritual: reflexões sobre sexo, sexualiade e sexualismo. Cuiabá, Espiritizar., p. 55)

Pedro reforça a concepção espírita defendida por Paulo, ao apresentar a seguinte afirmação:

Assim, a doutrina em si ela não, ela não vai dizer muita coisa, ela só vai partir do pressuposto que somos espíritos, não temos sexo, propriamente dito, nós nos afinizamos com certo tipo de sexo, ou nos percebemos dessa forma, acho que é a forma mais clara de eu conseguir expressar isso agora. É, mas só que também, lembrando que nós somos seres humanos e ainda estamos presos a muito preconceito, e alguns evitam esse tipo de assunto, uma pela falta de conhecimento e outras por suas questões pessoais também. Porque o preconceito independentemente se é espírita ou não, ele existe. (Pedro, 2019Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba.)

Divaldo Franco compreende que a homossexualidade, apenas em poucos casos, serve como missão e que, na verdade, torna-se uma prova pelo fato de tentar adequar o corpo físico à polaridade anteriormente escolhida, bem como pela necessidade da preservação da energia sexual. Por isso, Divaldo afirma que o ideal “seria que cada um de nós mantivéssemos o equilíbrio entre a polaridade psicológica e a organização física” (Saegusa, 2013, pSAEGUSA, Claudia (org). (2013), Divaldo Franco responde, Vol. 2. São Paulo, InteLítera.. 128). Segundo o intelectual espírita, ninguém pede para ser gay, mas, ao ocorrer a disfunção entre o corpo e a psique, aconteceria a prova. A prova e a expiação ocorrem na busca de uma vida mais regrada, na necessidade constante de sublimação.

Paulo crê fielmente que escolheu nascer gay para ser testado e expiar os abusos de vidas passadas; ele não fala em pecados. Pedro (2019)Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba. reforça essa lógica: “O pecado não. O pecado não. Tem responsabilidades, e você assume as responsabilidades, mas você não é, por um erro, você vai ser condenado, isso a doutrina não traz. Não existe condenação”.

A ideia de que nascer gay seria parte de um planejamento espiritual que busca ajudar na prova, expiação e evolução, é muito forte na concepção dos dois interlocutores. Esses sujeitos estão adquirindo seus significados a partir de outras pessoas, no caso, dos doutrinadores intelectuais espíritas, já que a Doutrina, ou melhor, Allan Kardec, não informa sobre a homossexualidade.

É o que percebe Pedro:

E, em relação à sexualidade, ela também não, até o momento que é o que eu tenho estudado, o que eu tenho visto, ela não se pronuncia, porque até então, também, na época de Kardec, não tinha essa visibilidade que a homossexualidade, a bissexualidade, a sexualidade têm como tem hoje. (Pedro, 2019Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba.)

Vale ressaltar que Pedro estuda há 10 anos o Espiritismo. Ele desconhece a tese foucaultiana sobre o processo de disciplinamento das sexualidades,10 10 Foucault ([1969] 2008) ensina que a ideia de normal é construída; levando os indivíduos a se adequarem a um processo de normalização da sua conduta e dos seus corpos, essa adequação passa pelo processo de controle de tensões e da sexualidade tida como anormal, a que foge da ideia do bom sexo. desenvolvida justamente no período de surgimento do espiritismo, quando muito se falava e se debatia na Europa sobre o tema da sexualidade, especialmente, entre os religiosos, juristas e estudiosos das ciências médicas. Assim, historicamente, Allan Kardec não estava longe do debate, já que ele integrava o Instituto Histórico de Paris, a Academia Real de Arras (1831) e a Academia de Ciências Naturais (1834), ou seja, era um homem das Ciências.

A fala que leva a pensar na existência da repressão sobre a sexualidade já não é capaz de justificar a exclusão do tema das obras de Kardec. Existem outras explicações. A que ora se sustenta é a de que o tema não é explicitado, mas sim diluído, evitando-se embates. Imperaria a lógica de que se não existe o debate, não existiria o problema. Porém, esse é um debate necessário para pensar nas estratégias de constituição identitária, pois a identidade e as representações acarretam implicações políticas, disputas que perpassam as desigualdades sociais e econômicas. Percebe-se que tais implicações favorecem o processo de consciência de si, mediado por relações subjetivas, linguísticas e experiências sociais, no caso em estudo, por meio do contato com a doutrina espírita. A identidade é tomada como algo fugidio, que muda, se transforma. Pensar em identidade é pensar em processos identitários, mas é sempre necessário observar que essas relações de mudança e ressignificação são passíveis de serem plasmadas para uma compreensão sociológica das relações de poder existentes.

Nessa medida, plasmam-se essas identidades a partir da relação com a doutrina espírita, que se insere no campo religioso, sendo um espaço social caracterizado pelas disputas entre especialistas religiosos e leigos (agentes) (Weiss de Jesus, 2010WEISS DE JESUS, Fátima. (2010), “A cruz e o arco-íris: refletindo sobre gênero e sexualidade a partir de uma ‘igreja inclusiva’ no Brasil”. Ciencias Sociales y Religión, 12: 131-146. DOI: 10.22456/1982-2650.12731.
https://doi.org/10.22456/1982-2650.12731...
). Essa compreensão é respaldada por Arribas (2017)ARRIBAS, Célia da Graça. (2017), “Autoridades espíritas: critérios para tipologias e repartições das lideranças no espiritismo”, in A. R. de Souza; P. Simões & R. Toniol (org.), Espiritualidade e espiritismo: reflexões para além da religiosidade, São Paulo, Porto de Ideias., sendo marcada por disputas e pela tentativa de imposição do saber religioso e das diferentes maneiras de desempenhar as ações religiosas, buscando o acúmulo do capital religioso e estabelecendo-se, assim, no poder.

Portanto, analisou-se como os interlocutores receberam e processaram as representações da homossexualidade, preconizada pelo Espiritismo. Primeiramente, eles reconheceram que, publicamente, não existe um discurso voltado para o tema da homossexualidade nas palestras religiosas:

Porque esse tipo de assunto é polêmico. No entanto, a homossexualidade, ele não é muito tratado dentro da doutrina, porque não tem muitos estudos sobre. São poucos, pouquíssimos os palestrantes que trabalham com isso, os que trabalham geralmente são da, são psicólogos, psiquiatras, pessoas que trabalham nessa área da psicologia. (Pedro, 2019Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba.)

A compreensão de Pedro corrobora o pensamento de Weiss de Jesus (2010)WEISS DE JESUS, Fátima. (2010), “A cruz e o arco-íris: refletindo sobre gênero e sexualidade a partir de uma ‘igreja inclusiva’ no Brasil”. Ciencias Sociales y Religión, 12: 131-146. DOI: 10.22456/1982-2650.12731.
https://doi.org/10.22456/1982-2650.12731...
e Arribas (2017)ARRIBAS, Célia da Graça. (2017), “Autoridades espíritas: critérios para tipologias e repartições das lideranças no espiritismo”, in A. R. de Souza; P. Simões & R. Toniol (org.), Espiritualidade e espiritismo: reflexões para além da religiosidade, São Paulo, Porto de Ideias., ao afirmarem que existe uma disputa entre os especialistas religiosos, aqui denominados intelectuais e/ou médiuns, quanto à construção de narrativas e representações pós-Kardec:

Paulo: Tem sido mais recorrente... a gente tem trabalhado os palestrantes pra... os palestrantes mais novos...

Pesquisador: Preconceito o que, falar sobre ou com os homossexuais?

Pedro: Preconceito com os homossexuais, alguns comentários, que, embora digam que não é preconceito, mas a gente sempre que tem um pouco de... de... [...] [Cita o nome do palestrante], excelente palestrante, mas certos comentários dele parecem... soam um pouco homofóbicos e machistas. A última vez que eu parei pra assistir palestra dele foi na SEJA, quando ele fez uma palestra no Dia das Mães, agora em maio. Dia das mães é em maio, né? É... sobre a importância da mulher. E..., na realidade, eu achei a palestra machista e ele soou um pouco homofóbico também. Então, de lá pra cá, eu parei de assistir palestras. E, conversando com alguns amigos, também, que são homossexuais e espíritas, eles também pararam, porque sentiram a mesma coisa que eu. É... aí tem palestrantes novos, por exemplo, é... lá na casa... tem... [Cita o nome de três palestrantes] principalmente. É... enfim. São pessoas que têm trazido muito o tema homossexualidade, suicídio... [Cita o nome do palestrante] fez uma palestra semana passada com o tema... sobre suicídio, como a gente deve identificar e desmistificar essa ideia de que... que a depressão é frescura. Aborto...

Pesquisador: Eu... eu sou bem sincero é... com você, eu nunca assisti uma palestra específica sobre homossexualidade em nenhum Centro que eu frequento.

Pedro: Não, não são palestras específicas. São palestras que citam a homossexualidade... Por exemplo, uma palestra sobre é... família. Então, ele fala sobre os vários tipos de família ou, então, uma palestra sobre... É... isso. Ou, então, uma palestra sobre... respeitar as diferenças... aí, tá dentro também. São palestras assim, eles tratam a homossexualidade como algo normal, como qualquer outro tema normal. (Pedro, 2019Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba.)

A divulgação da representação da homossexualidade ocorre por meio dos oradores espíritas. Não existe uma repressão quanto ao tema; o que existe é uma seleção do que, onde e, especialmente, quem pode falar. Existe uma dissolução do conteúdo, uma fragmentação, pois este é oferecido em doses homeopáticas, de forma que não estimule o debate ou que seja percebido como preconceito a esse público.

Diferentemente dos evangélicos, que observam com maior atenção às sexualidades não hegemônicas (Natividade, 2008NATIVIDADE, Marcelo Tavares. (2008), Deus me aceita como eu sou? A disputa sobre o significado da homossexualidade entre evangélicos no Brasil. Tese de doutorado. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.), buscando maior controle e prevenção, criticando e combatendo publicamente, os espíritas adotam outra abordagem: mais discreta, seletiva e não ofensiva ao público gay. Ocorre uma tentativa de direcionar essa sexualidade não normativa para outras formas de prazer, por exemplo, escrever, pintar, estudar, trabalhar em prol da caridade e da doutrina. Assim, buscam um controle via redirecionamento do desejo sexual. Não existe a busca por modificar o homem gay, mas sim a prática sexual.

Mesmo tendo a convicção de que os discursos não confrontam a vivência de uma vida homoafetiva, identificaram-se relatos de experiências negativas dentro de Centros espíritas. Os interlocutores reforçaram que isso não faz parte do Espiritismo, mas que, geralmente, é algo bem específico, de modo que eles justificaram tais discursos a partir da retórica espírita e mostraram a incorporação da representação oferecida.

Pedro (2019)Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba., por exemplo, disse que já observou olhares “atravessados” voltados para os sujeitos afeminados: “Não. Não, mas sabemos que o preconceito tá... nunca sofri preconceito. Mas, já observei olhares pra certas pessoas um pouco mais afeminada, com olhar meio discriminatório”. Paulo (2019)PAULO. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 10 de janeiro de 2019, Campina Grande, Paraíba., por seu turno, reforçou essa ideia, “porque infelizmente tem palestrante mais antigo que sente um pouco de preconceito, o que é normal porque naquela época eles eram mais velados”.

Como esclarece Borrillo (2015)BORRILLO, Daniel. (2015), Homofobia: história e crítica de um preconceito. 5ª edição, Belo Horizonte, Autêntica Editora., esses olhares de reprovação estão alicerçados nas justificativas dos papéis sociais atribuídos ao homem e à mulher. Mesmo afirmando que o sujeito, ao nascer, porta duas polaridades, anima e animus, ou seja, o feminino e o masculino em um só corpo, certos olhares enviesados persistem, pois a vivência de uma homossexualidade santificada (Natividade, 2008NATIVIDADE, Marcelo Tavares. (2008), Deus me aceita como eu sou? A disputa sobre o significado da homossexualidade entre evangélicos no Brasil. Tese de doutorado. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.) deve ser regida por padrões heterossexistas.

Os interlocutores conseguiram informar a concepção que adotam sobre a homossexualidade, sendo ela baseada nas representações espíritas. Partindo-se da compreensão de que os interlocutores constituem suas identidades a partir de uma relação intrínseca com a doutrina espírita, acredita-se, aqui, que o termo espírita gay serve como forma de demarcar o foco da análise. O termo é utilizado como forma de distinguir os sujeitos gays, que são espíritas, de outros sujeitos que são cristãos e não cristãos. Além disso, justifica-se tal uso pelo fato de o Espiritismo conceber a homossexualidade como algo natural. Esse fato é novo entre as religiões cristãs, de tal modo que influencia fortemente a concepção e vivência das carreiras afetivo-sexuais dos interlocutores.

Ao tornar a homossexualidade como algo “natural” ou inato ao sujeito, é perceptível um distanciamento da noção de pecado em relação à existência dessa orientação sexual, ao mesmo tempo em que se concebe a lógica da Lei de Ação e Reação, que estaria contida na Lei Divina, que deve regular o livre-arbítrio.

Percebe-se, ainda, que, ao passo que se procede à estratégia de retirar a ideia de culpa ou pecado em torno da homossexualidade, surgem estratégias para controlar e conter a prática sexual. No entanto, como o poder não é exercido apenas pela imposição, não se concebe, aqui, essa relação de modo tradicional, como uma coerção, mas como um agenciamento. E, como tal, existe a resistência agenciando aspectos da identidade, na busca da vivência da sexualidade.

Pede-se licença para uma longa, mas interessante, composição de ideias, pois é necessária para uma melhor compreensão sobre a percepção de possíveis posições contrárias à espíritas gays em Centros, bem como para entender o que seria uma vivência sexual saudável e direcionada pelas Leis Divinas, inscritas na consciência do ser. Ou, como diria Natividade (2008)NATIVIDADE, Marcelo Tavares. (2008), Deus me aceita como eu sou? A disputa sobre o significado da homossexualidade entre evangélicos no Brasil. Tese de doutorado. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro., uma homossexualidade santificada. A esse respeito, é bastante sintomático o trecho da fala a seguir:

Por exemplo, se houver alguma situação, por exemplo, de olhares, eu não me sinto ofendido, porque eu compreendo hoje que o problema não é, não sou eu, o problema é a forma de pensar da outra pessoa. Se ela tem preconceitos ou não, é uma fase que ela se encontra. (Pedro, 2019Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba.)

Pedro assimilou a lógica do processo evolutivo, pois, da mesma forma que a homossexualidade é um momento da sua vida, os outros podem estar em estados evolutivos mais avançados ou não, particularmente no que diz respeito ao preconceito. Observa-se, assim, a mesma lógica ao mencionar sua vivência sexual ou, hipoteticamente, como seriam orientadas suas ações no campo sexual:

Pesquisador: Como é que a doutrina, e como é que você, vê a questão do ato sexual entre dois homens?

Pedro: Normal. Normal. Desde que tenha um... que busquem, não só entre homens, mas também com mulher, homem e mulher, independente da forma, com quem seja, de respeito ao outro e sem excessos. O excesso, pra mim, seria hoje, por exemplo, é usando objetos, é... um que venha denegrir o outro, colocando o outro na posição de quem é submisso. Dessas formas. Submisso... que constranja a outra pessoa a fazer o sexo, por exemplo. Situações que constranjam a outra pessoa a fazer sexo. A imposição. A imposição de suas vontades. [...] Mas, nem sempre permite, de bom grado. Às vezes, permite só pra que o outro sinta prazer.

Pesquisador: Já vivenciou isso?

Pedro: Não. Não, porque, assim, o que eu não quero fazer, eu não faço. O que pode é aquilo que vai me fazer sentir bem. Por exemplo... Não, eu não... não concordo, porque é... sexo, pra mim, é o envolvimento um com o outro. Envolvimento de carinho, de atenção, é forma de fazer com que o outro sinta o prazer sem necessidade de outro... outras coisas. Porque é uma completude, um do outro.

Pesquisador: Quer dizer que outras coisas não poderiam ser utilizadas durante o ato sexual?

Pedro: Eu não vejo necessário... se uma pessoa vir a me convidar, eu simplesmente coloco que eu não gosto, e eu não faria. A permissão é de cada pessoa. Referindo a mim, eu não faço uso, porque não... não seria pra mim... como é que eu posso... não me daria prazer. Tanto usar em mim como usar em outras pessoas. Porque, pra mim, isso já é o excesso. O respeito. Tem que ter o respeito, independente da forma como vá fazer, mas tem que ter o respeito. É como eu falei, se, por exemplo, colocando a situação de espíritas que gostam de usar apetrechos. Beleza, é ali, é eles que gostam... Não deixam de ser espíritas. E não é (excesso) pra eles não. Para a doutrina, Se é... já entraram a questão da falta do respeito para com o outro, sim. A doutrina, ela se baseia na sua consciência. É o seu nível de consciência, só isso, não tem como medir. A doutrina vai estipular por exemplo, um número, a doutrina não estipula nada. Ela lhe dá a liberdade de você ter a consciência.

Pesquisador: Pra você, enquanto espírita, o que seria regular ou normal pra você em quantidade de vezes de sexo, por exemplo?

Pedro: Não tem quantidade. Existe a questão da outra... dos dois se sentirem bem. Se sentirem bem, fazendo sexo todos os dias, ótimo, se não, tudo bem. Pra mim, por exemplo, eu me imponho. No sentido de que, se tu tiver hoje, se hoje for dia de eu participar de uma reunião mediúnica, eu sei que a energia do sexo, ela é fundamental pra questão mediúnica, que a energia sexual é da criação. É a energia criadora. Tudo que está relacionado à criação parte da energia sexual. É... como eu sei que a doutrina, como eu sei que a doutrina não... como eu sei que eu participando da reunião mediúnica a minha energia sexual, ela vai ser bastante usada, nas comunicações, eu prefiro não fazer sexo. Mas há pessoas que fazem. Vai depender do nível de consciência ou de querer de cada um.

Pesquisador: Quer dizer, se você transar vai interferir de alguma forma?

Pedro: No meu pensamento, sim. A energia que eu poderia usar no dia... a partir do momento que você vai estudando, você vai adquirindo e colocando os seus limites ou é... formulando o que você pensa de cada assunto. (Pedro, 2019Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba.)

No discurso de Pedro, percebem-se as estratégias e as influências da vivência de sua sexualidade. Esta é sempre baseada na lógica do respeito, um respeito preconizado na moral religiosa da doutrina espírita. Pedro consegue articular a lógica do livre-arbítrio para respaldar a prática de sua sexualidade, mesmo que Alírio de Cerqueira Filho informe que é um vício a ser vencido e mesmo que Divaldo Franco aconselhe a sublimação.

Além disso, Pedro reforça parte do discurso Espírita, no qual há uma imposição de limites sobre o que é uma relação homossexual saudável, ao mesmo tempo que burla a imposição da sublimação, afastando-se da representação da homossexualidade como algo pervertido e imoral ao recorrer à palavra respeito.

O discurso sobre o respeito é baseado nos ensinamentos de Divaldo Franco. Nota-se, implicitamente, a influência de conceitos como autocontrole e educação mental, quando ele diz não fazer uso de objetos ou de outros apetrechos sexuais durante o ato, bem como da realização de fantasias sexuais. Divaldo, por sua vez, aconselha a limpar a mente de situações que estimulem algo que não seja natural, que estimule o sexo que não seja pautado no amor e no respeito, evitando-se, assim, a estimulação de instintos animalescos.

A gestão que Pedro faz de si é baseada não no silêncio, mas na adesão à cosmologia espírita, que dialoga com a moral cristã católica. Porém, o Espiritismo permite outra forma de gestão de si, baseada no livre-arbítrio e em um eterno confessionário, que controla, de forma onipotente, do alto da Lei de Ação e Reação. Pedro incorpora a mesma estratégia que a Doutrina utiliza ao tratar do tema sexualidade. Ele discorre, fala sobre, e vivencia sua sexualidade em doses homeopáticas.

Essa nova gestão de si ocorre a partir da confissão diária, por meio de um confessionário instaurado na consciência do ser. Assim, por uma “simples” consulta à Lei Divina, existente na consciência, confessa-se, ao passo em que regula as ações. A fala de Pedro denota essa relação que, em um primeiro momento, aparenta ser simples, mas não é.

Desse modo, ao manter uma relação homoafetiva, Pedro não estaria desrespeitando a Lei Divina. Em sua concepção, bastaria consultar sua consciência para saber se já havia atingido o seu limite de tolerância quanto ao padrão moral, pois, quanto mais evoluído o espírito, mais restrito e limitado se tornam os conceitos e suas vivências práticas.

Portanto, por se encontrar em determinado ponto evolutivo, sua homoafetividade é aceitável. Pedro não estaria em desobediência pontual aos preceitos do Espiritismo, mas em plena comunhão com a Lei de Ação e Reação e também com a Lei Divina, inscrita em sua consciência. Tudo é calculado a partir das doses necessárias para vivenciar sua sexualidade, não desrespeitando, assim, a Lei Divina. Vale dizer, relembrando o que foi dito por Natividade (2008)NATIVIDADE, Marcelo Tavares. (2008), Deus me aceita como eu sou? A disputa sobre o significado da homossexualidade entre evangélicos no Brasil. Tese de doutorado. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro., que não existe tensão, ao menos aparente, entre a sua orientação sexual e os valores religiosos.

Não, não, a Doutrina. Não traindo a Doutrina, mas, sim, indo de contra já um pouco de... entra a questão do que, caramba, eu já sei disso, é a sua consciência, começando a despertar. Eu já sei disso e por que é que eu faço isso? Por exemplo, é... sair com dois homens, ao mesmo tempo, não que eu tenha feito isso... fiz uma vez... Risos. (Pedro, 2019Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba.)

A fala de Pedro remete à ideia de Rubin (1998)RUBIN, Gayle. (1998), “Thinking sex: notes for a radical theory of the politics of sexuality”, in P. Nardi & B. Schneider, Social perspectives in lesbian and gay studies – a reader, London/New York, Routledge., que afirma que a sexualidade, como um produto da atividade humana, sempre será uma questão política e de poder.

Considerações finais

Compreende-se que as concepções e ideias apresentadas por Divaldo Franco e Alírio de Cerqueira Filho se inserem na tentativa de responder a uma demanda social que surge mediante a despatologização da homossexualidade, política e moral. A demanda pode ser pensada a partir do seguinte questionamento: como tratar aqueles que vivenciam uma sexualidade fora da heteronorma sem agredir os seus corpos ou restringir os seus direitos civis? Antes de 1992,11 11 O ano de 1992 é emblemático, ano em que a homossexualidade deixou de constar do Código Internacional de Doenças. Fruto de um movimento político e social anterior à década de 90, mas que gerou grande revolução nas lutas por igualdade e direitos sociais de pessoas homoafetivas. ano de mudança no paradigma, era simples: terapia, medicalização e psiquiatria, afinal, era uma doença.

Porém, o que fazer a partir da pós-mudança? O próprio dispositivo da sexualidade responde, tendo em vista que ele apropria e adequa o discurso ao seu interesse. Foucault (2014)FOUCAULT, Michel. (2014), História da sexualidade: o uso dos prazeres, vol 2. Rio de Janeiro/São Paulo, Paz e Terra. informa sobre esse fenômeno ao afirmar que existe uma estratégia que perpassa pelo controle-estimulação. Ou seja, deve-se eleger, designar, quem e onde se pode falar sobre o tema. Assim, Divaldo Franco, Alírio de Cerqueira Filho e a Federação Espírita Brasileira, por exemplo, são vistos como pessoas/entidades capacitadas para debaterem o tema sexualidade/homossexualidade no contexto Espírita, de modo que o espaço reservado ao debate seria o Centro Espírita, sempre sob supervisão da Doutrina. Compreendemos que Alírio e Divaldo seguem propagando os comandos criados pelo dispositivo da sexualidade, nos quais a lógica é imperativa: “é homossexual e não consegue sublimar a sexualidade? Case-se, constitua família, compre uma casa, viva uma união estável, crie laços afetivos, mas que não sejam necessariamente laços sexuais”. A lógica do amor sublimado.

Os discursos analisados direcionam o sujeito homossexual para uma “normalidade”, buscada na tentativa de aceitação e agregação na teia social. O homossexual ainda é visto como um sujeito que não se enquadra na lógica binária homem/mulher, macho/fêmea, colocando em risco, conforme Foucault (2014)FOUCAULT, Michel. (2014), História da sexualidade: o uso dos prazeres, vol 2. Rio de Janeiro/São Paulo, Paz e Terra., os códigos morais estabelecidos. Sendo assim, o sujeito deve se resguardar.

Ressalta-se que a homossexualidade não pode ser vista, na doutrina proposta por Divaldo Franco, como uma transgressão à conduta moral. Deve-se esclarecer que ser homossexual na doutrina espírita é algo normal, o erro existe na prática sexual, ou na homossexualidade, como reforça Cerqueira Filho (2014)CERQUEIRA FILHO, Alírio de. (2014), Sexualidade e saúde espiritual: reflexões sobre sexo, sexualiade e sexualismo. Cuiabá, Espiritizar.. A sublimação é a saída mais acertada para que a evolução moral e espiritual ocorra. A lógica de amar o pecador e rejeitar o pecado é encontrada em outras religiões cristãs, mas observa-se certa divergência quanto à Espírita, tendo em vista que ela seria mais enfática que as demais lógicas religiosas institucionalizadas. Considera-se que isso seja um avanço considerável, mas ainda reforça o estereótipo em relação ao homem gay, de que ele é um ser sexualizado, para o qual tudo se resume a práticas sexuais.

Os discursos e representações apresentados não rompem com os binarismos e os conceitos cristãos adaptados, reinterpretados e contidos na Doutrina Espírita, que estão ancorados na heterossexualidade e orientam as identidades e as representações coletivas que deveriam gerir as relações sociais dentro da religião, ou dentro do espaço público religioso. Ainda, a partir de uma lógica patriarcal, percebe-se que as representações são orientadas pelo modelo heterossexual ancorado na lógica reprodutiva, familiar e religiosa. Portanto, a partir das análises, a Doutrina Espírita aparece como um dispositivo normativo, dotado de múltiplas estratégias de produção de sujeitos normalizados. Os interlocutores acabam adotando essa lógica, obtendo o mínimo de mobilidade para viverem de forma discreta as suas sexualidades.

  • 1
    Deve-se ressaltar que, entre o rol de interlocutores, para a tese, foram selecionadas apenas duas entrevistas para a análise neste artigo.
  • 2
    Codificação é o termo usado entre os espíritas para referirem-se ao processo de organização escrita das primeiras obras de Allan Kardec, compreende que ele não foi o autor, mas aquele que conseguiu codificar as informações.
  • 3
    Deve-se ressaltar que Teoria e Ideologia de Gênero têm significados diferentes, o primeiro surgiu do debate acadêmico científico, o segundo é terminologia êmica, construída em oposição aos discursos públicos derivados da primeira.
  • 4
    A fala de Divaldo gerou reação por parte da comunidade espírita. O grupo intitulado Espíritas Progressistas lançaram uma carta, contestando a fala polêmica, sendo ratificada por diversos espíritas, intelectuais, diretores de Centros e médiuns.
  • 5
    Embates entre religiosos e científicos existiram durante as primeiras cinco décadas do século XX, ocorrendo um acordo chamado de Pacto áureo na década de 50 e respaldando o poder da FEB para estabelecer parâmetros doutrinários espíritas brasileiro.
  • 6
    Doutrinadores são os teóricos do mundo religioso espírita, da mesma forma que existem os doutrinadores para a fé no catolicismo. São pessoas que dedicam sua vida religiosa a estudar determinados temas e divulgar a doutrina espírita.
  • 7
    Dado o espaço e a missão do artigo, não se referenciarão os termos ou conceitos propriamente; deter-se-á a apresentar análise prévia da lógica existente e divulgada pelos doutrinadores. As referências aos textos serão realizadas de modo indireto.
  • 8
    Registram-se aqui os agradecimentos in memoriam a Pedro, que, durante a escrita deste artigo, desencarnou.
  • 9
    Usou-se nomes fictícios, buscando-se preservar a face dos interlocutores.
  • 10
    Foucault ([1969]FOUCAULT, Michel. ([1969] 2008), A arqueologia do saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves. 7a edição, Rio de Janeiro, Forense Universitária. 2008) ensina que a ideia de normal é construída; levando os indivíduos a se adequarem a um processo de normalização da sua conduta e dos seus corpos, essa adequação passa pelo processo de controle de tensões e da sexualidade tida como anormal, a que foge da ideia do bom sexo.
  • 11
    O ano de 1992 é emblemático, ano em que a homossexualidade deixou de constar do Código Internacional de Doenças. Fruto de um movimento político e social anterior à década de 90, mas que gerou grande revolução nas lutas por igualdade e direitos sociais de pessoas homoafetivas.
  • DOI: 10.1590/3811000/2023

Bibliografia

  • ARRIBAS, Célia da Graça. (2017), “Autoridades espíritas: critérios para tipologias e repartições das lideranças no espiritismo”, in A. R. de Souza; P. Simões & R. Toniol (org.), Espiritualidade e espiritismo: reflexões para além da religiosidade, São Paulo, Porto de Ideias.
  • BORRILLO, Daniel. (2015), Homofobia: história e crítica de um preconceito. 5ª edição, Belo Horizonte, Autêntica Editora.
  • “Censo Demográfico e Populacional Brasileiro de 2010”. (2010), INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Disponível em <https://censo2010.ibge.gov.br/>, consultado em 20/01/2020.
    » https://censo2010.ibge.gov.br/
  • CERQUEIRA FILHO, Alírio de. (2014), Sexualidade e saúde espiritual: reflexões sobre sexo, sexualiade e sexualismo Cuiabá, Espiritizar.
  • ENNES, Marcelo Alario; MARCON, Frank. (2014), “Das identidades aos processos identitários: repensando conexões entre cultura e poder”. Sociologias, 16, 35: 274-305.
  • FERNANDES; Claudimar Alves. (2012), Discurso e sujeito em Michel Foucault. São Paulo, Intermeios.
  • FOUCAULT, Michel. ([1970] 1996), A ordem do discurso São Paulo, Loyola.
  • FOUCAULT, Michel. ([1969] 2008), A arqueologia do saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves. 7a edição, Rio de Janeiro, Forense Universitária.
  • FOUCAULT, Michel. (2014), História da sexualidade: o uso dos prazeres, vol 2 Rio de Janeiro/São Paulo, Paz e Terra.
  • FRANCO, Divaldo. (2016), Sexo e consciência Organização de Luiz Fernando Lopes. Salvador, Editora Leal.
  • FRANCO, Divaldo [pelo espírito Joanna de Ângelis]. (2018), Amor e sexualidade: a conquista da alma Organização de Luiz Fernando Lopes. Salvador, Editora Leal.
  • GREGOLIN, Maria do Rosário. (2006), Foucault e Pêcheux na análise do discurso: diálogos & duelos São Carlos, Editora Clara Luz.
  • KARDEC, Allan. (1997), O livro dos espíritos. São Paulo, Editora Petit.
  • LEWGOY, Bernado. (2008), “A transnacionalização do espiritismo kardecista brasileiro: uma discussão inicia”. Relig. soc, 28, 1: 84-104. DOI: 10.1590/S0100-85872008000100005.
    » https://doi.org/10.1590/S0100-85872008000100005
  • MISKOLCI, Richard. (2012), Teoria queer: um aprendizado pelas diferenças Belo Horizonte, Autêntica Editora.
  • NATIVIDADE, Marcelo Tavares. (2008), Deus me aceita como eu sou? A disputa sobre o significado da homossexualidade entre evangélicos no Brasil Tese de doutorado. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
  • NEGRO, Homero. (2018), Divaldo e a ideologia de gênero 34º Congresso Espírita do Estado de Goiás, Goiânia, 10 a 13 de fevereiro. Disponível em <https://youtu.be/3KZ3bH3U_ec>, consultado em 10/01/2021.
    » https://youtu.be/3KZ3bH3U_ec
  • NOGUEIRA, Conceição. (2001), “Análise do discurso”, in L. Almeida & E. Fernandes (org.), Métodos e técnicas de avaliação: novos contributos para a prática e investigação, Braga, CEEP.
  • PEREIRA, Francisco Jomário. (2020), “TRANSAR PODE, MAS VOCÊ NÃO DEVERIA”: A Representação da Homossexualidade no Discurso Espírita Brasileiro Tese de Doutorado. Universidade Federal da Paraíba, Paraíba.
  • PAULO. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 10 de janeiro de 2019, Campina Grande, Paraíba.
  • Pedro. Entrevista anônima para a tese de doutorado. Francisco Jomário Pereira. 20 de março de 2019, Campina Grande, Paraíba.
  • RUBIN, Gayle. (1998), “Thinking sex: notes for a radical theory of the politics of sexuality”, in P. Nardi & B. Schneider, Social perspectives in lesbian and gay studies – a reader, London/New York, Routledge.
  • SAEGUSA, Claudia (org). (2013), Divaldo Franco responde, Vol. 2 São Paulo, InteLítera.
  • SOUZA, Roberto Lucio Vieira de. (2003), “A visão Espírita da Homossexualidade: Quais os fatores que levam uma pessoa a sentir atração por outra do mesmo sexo? Como lidar com o homossexual?”. Revista da Associação Médico-Espírita do Brasil
  • THOMPSON, Edward P. (1981), A miséria da teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro, Zahar.
  • WEISS DE JESUS, Fátima. (2010), “A cruz e o arco-íris: refletindo sobre gênero e sexualidade a partir de uma ‘igreja inclusiva’ no Brasil”. Ciencias Sociales y Religión, 12: 131-146. DOI: 10.22456/1982-2650.12731.
    » https://doi.org/10.22456/1982-2650.12731
  • XAVIER, Francisco Cândido [pelo espírito Emmanuel]. (2016), Vida e sexo 27a edição, 3a impressão, Brasília, FEB.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    09 Jul 2021
  • Aceito
    02 Out 2022
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais - ANPOCS Av. Prof. Luciano Gualberto, 315 - sala 116, 05508-900 São Paulo SP Brazil, Tel.: +55 11 3091-4664, Fax: +55 11 3091-5043 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: anpocs@anpocs.org.br