Open-access Uma Medida de PIB Mensal Para o Brasil Usando o Term Spread

Resumo

Neste trabalho, construímos uma medida de PIB mensal brasileiro utilizando um modelo na forma espaço de estados, estimado via filtro de Kalman impondo uma restrição de agregação no tempo: a soma da taxa instantânea de crescimento do PIB mensal nos meses de cada trimestre é igual à taxa instantânea de crescimento trimestral do PIB divulgado pelo IBGE. As variáveis explicativas do modelo foram selecionadas utilizando critérios estatísticos e tendo em vista um modelo estrutural, fundamentado na Equação de Apreçamento dos Ativos. A performance de previsão do PIB mensal se mostrou superior à do IBC-Br (BACEN) e do IAE (FGV).

Palavras-chave PIB mensal; interpolação; atividade econômica; back-cast; nowcast

Abstract

In this work, we have constructed a monthly Brazilian GDP measure based on a state space model that was estimated by Kalman filter imposing a time aggregation constraint: the monthly GDP instantaneous growth rate must add up to the quarterly GDP instantaneous growth rate published by IBGE. The explanatory variables of the model were selected based on statistical criteria and in view of a structural model, which is based on the Asset Pricing Equation. The monthly GDP forecast performance showed better results than that of IBC-Br (BACEN) and IAE (FGV).

1. Introdução

Um dos principais interesses dos agentes em uma economia é enxergar de forma clara o estado atual da atividade econômica. Todavia, grande parte dos dados econômicos são publicados com defasagem e sofrem revisões frequentes, gerando incerteza sobre o estado atual da economia. O PIB é a série econômica mais utilizada para representar a atividade econômica de um país, porém está disponível apenas trimestralmente e com grande atraso na sua divulgação. Por conta disso, a partir do trabalho pioneiro de Burns e Mitchell (1946), os indicadores coincidentes e antecedentes da atividade econômica passaram a ser amplamente utilizados como proxies do estado corrente e futuro da atividade econômica, podendo ser estimados em tempo real.

Atualmente, no contexto internacional, destacam-se os indicadores antecedentes compostos (CLI) divulgados mensalmente pela Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD), contemplando uma variedade de países. A construção desse indicador é feita através da agregação de séries pré-selecionadas através de esquemas simples de ponderação e o propósito desse indicador é sinalizar antecipadamente os turning points da atividade econômica. Para a Zona do Euro, destaca-se o indicador antecedente do ciclo de negócios (ALI) divulgado pelo European Central Bank, cuja metodologia se baseia na aplicação do filtro band pass em um conjunto de séries econômicas antecedentes. Para os Estados Unidos, merecem destaque os indicadores coincidentes e antecedentes divulgados pelo The Conference Board (TCB) e pelo Federal Reserve Bank of Philadelphia.

No contexto nacional, a Fundação Getulio Vargas (FGV), em parceria com o TCB, divulga um indicador mensal cujo objetivo é antecipar a direção da economia brasileira no curto prazo: o Indicador Antecedente Composto da Economia (IACE). O indicador permite uma comparação direta dos ciclos econômicos do Brasil com os de outros 11 países e regiões já cobertos pelo TCB. Complementar ao IACE, a FGV e o TCB coordenam o Indicador Coincidente Composto da Economia (ICCE), que mede as condições econômicas atuais e a intensidade da atividade econômica em bases mensais. Vale menção também o esforço do Banco Central do Brasil, que publica mensalmente o IBC-Br - o Índice de Atividade Econômica do Banco Central do Brasil - que é um indicador criado para tentar antecipar o resultado do PIB brasileiro em tempo real.

Embora esses indicadores sejam amplamente utilizados, a metodologia neles empregada é extremamente simples, não envolvendo fundamentos econômicos que justifiquem a escolha dos pesos e das variáveis. Nesse sentido, carecem do uso de um modelo estrutural que possa guiar como combinar as co-variáveis a serem usadas no backcast, nowcast e forecast da atividade econômica.

O objetivo deste trabalho é criar o PIB mensal da economia brasileira, um indicador capaz de prever o crescimento do PIB tanto em trimestres passados ainda não divulgados (backcast) quanto no trimestre corrente (nowcast). Ao contrário dos indicadores listados acima, o nosso será construído a partir de um modelo estrutural baseado na Equação de Apreçamento dos Ativos (cf. Cochrane, 2002). O modelo econométrico será colocado na forma espaço de estados, em linha com o proposto em Bernanke, Gertler, e Watson (1997) e Monch e Uhlig (2005), e estimado por meio do filtro de Kalman. Faremos uso de variáveis auxiliares escolhidas com base em critérios estatísticos e também tendo em vista um modelo estrutural que relaciona spreads de retornos de ativos com vencimentos distintos - o term spread.

Esse indicador permitirá um acompanhamento mais eficaz da atividade econômica, trazendo informações complementares ao PIB em dois aspectos. O primeiro é a frequência mais alta das estimativas, isto é, mensais ao invés de trimestrais. O segundo é o fato de ser capaz de gerar estimativas da atividade econômica em tempo real, resolvendo o problema de defasagem na divulgação dos dados de PIB.

Sob a perspectiva de análise do ciclo de negócios, este trabalho se relaciona com os trabalhos de Cuche e Hess (2000), Liu e Hall (2001), Mariano e Murasawa (2003), Aruoba, Diebold, e Scotti (2009), Altissimo, Cristadoro, Forni, Lippi, e Veronese (2010), Issler, Notini, Rodrigues, e Soares (2013) e Issler e Notini (2016).

Uma contribuição original deste trabalho é a construção e implementação empírica de um modelo estrutural que integra macroeconomia e finanças, abrindo a possibilidade de utilizar dados financeiros nos modelos de previsão da atividade econômica. A partir deste modelo, que se fundamenta na Equação de Apreçamento dos Ativos, verificamos que o spread atual entre os retornos de ativos com maturidades distintas é um importante previsor da taxa de crescimento da atividade econômica futura.

Do ponto de vista empírico, a capacidade dos retornos dos ativos de prever a taxa de crescimento de agregados macroeconômicos é extensamente documentada na literatura. Estrella e Hardouvelis (1991), Haubrich e Dombrosky (1996) e Hamilton e Kim (2002) documentam que o spread entre as taxas de juros de longo e curto prazos é útil para anteceder o nível da atividade econômica futura dos Estados Unidos, inclusive Estrella e Mishkin (1998) mostram que spread da curva de juros foi útil para prever recessões da economia norte-americana em análises de performance fora da amostra. Estrella e Mishkin (1997) mostraram que esse poder preditivo também se aplica às economias da Europa.

Outros trabalhos também evidenciam que a utilização de variáveis financeiras pode melhorar sensivelmente a performance dos modelos de previsão da atividade econômica. Andreou, Ghysels, e Kourtellos (2013) mostram que os modelos de frequência mista (MIDAS) que fazem uso de dados financeiros diários representam uma evolução em relação aos modelos de previsão tradicionais baseados apenas em dados agregados, além de serem úteis para estimar o estado atual da atividade econômica (nowcast). Na mesma linha, Ferrara e Marsilli (2013) mostram que dados financeiros possuíam poder preditivo de antecipar o crescimento do PIB da zona do euro durante o período da crise financeira de 2008.

Podemos citar também algumas contribuições que envolvem modelos econométricos de valor presente ligados à Equação de Apreçamento dos Ativos. Dentre eles destacam-se Guillén, Hecq, Issler, e Saraiva (2015) e Castro e Issler (2016). Em ambos os casos, a ideia é prever retornos usando dados macroeconômicos, mas a lógica pode ser facilmente invertida: usar dados financeiros para prever a atividade econômica.

O modelo na forma espaço de estados desenvolvido neste trabalho permite obter uma estimativa consistente do crescimento da atividade econômica mensal não observada, respeitando a restrição de que a soma da taxa de crescimento instantânea do PIB mensal dos três meses correspondentes a um dado trimestre deve ser igual a taxa de crescimento instantânea trimestral do PIB observado, divulgado pelo IBGE.

Os resultados empíricos do modelo mostraram que essa restrição imposta nas observações dentro da amostra gera maior precisão também nas estimativas do modelo fora da amostra.Quando comparamos a performance de previsão do PIB mensal àquela de dois indicadores importantes para o Brasil - o IBC-Br do BACEN e o Indicador de Atividade Econômica (IAE) da FGV - temos os seguintes resultados: desde 2004:T1 até 2018:T1, para o exercíco de backcast, nossa proxy do PIB mensal reduziu a estatística da raiz do erro quadrático médio da previsão fora da amostra em 53,8% vis-à-vis aquela do IBC-Br e em 45,5% vis-à-vis a do IAE-FGV. No exercíco de nowcast a redução foi um pouco menor - de 11,8% em relação ao IBC-Br e 5,8% em relação ao IAE. Vale notar que, nesse último exercício, usamos um conjunto de informação mais antigo do que usam tanto o IBC-Br quanto o IAE-FGV.

Este trabalho encontra-se estruturado da seguinte maneira: a seção 2 apresenta uma descrição sobre o modelo na forma espaço de estados utilizado na construção do PIB mensal; a seção 3 detalha um modelo teórico estrutural que justifica o uso de variáveis financeiras em modelos de previsão da atividade econômica; os dados utilizados na implementação empírica dos modelos encontram-se detalhados na seção 4; os resultados empíricos dos modelos são apresentados na seção 5; a seção 6 compara os nossos resultados com outros indicadores da atividade econômica existentes no Brasil; por fim, a seção 7 conclui o trabalho.

2. Modelo na forma Espaço de Estados e Filtro de Kalman

O filtro de Kalman é um método computacional recursivo capaz de gerar estimativas eficientes dos estados passado, presente e futuro de um processo estocástico. A partir de uma variável observável é possível estimar eficientemente uma variável não observável de interesse, uma vez que este filtro permite a estimação de parâmetros desconhecidos do modelo através da maximização da verossimilhança via decomposição do erro de previsão. Para que o sistema dinâmico possa ser analisado por meio do filtro de Kalman ele deve ser escrito em sua forma espaço de estados. Uma descrição mais detalhada pode ser encontrada em Harvey (1981) e Hamilton (1994).

A representação espaço de estados é composta por dois vetores de equações, a primeira é a equação de estado ou de transição, que descreve o processo Markoviano de primeira ordem que gera a variável não observada (ξt) que gostaríamos de estimar, a segunda é a equação de observação ou de mensuração, que relaciona a variável de estado à variável observável (yt) e séries relacionadas (xt), que são exógenas e pré-determinadas.

A representação espaço de estados para a dinâmica de yt, t = 1,..., T, onde T é o número de observações na amostra, é dado pelo seguinte sistema de duas equações:

(1) ξ t + 1 = F ξ t + v t + 1

(2) y t = Ax t + H ξ t + w t ,

onde F, A' e H' são matrizes de parâmetros com dimensões (r × r), (n × k) e (n × r), respectivamente. Assumimos que os termos de erro vt e wt, com dimensões (r × 1) e (n × 1), respectivamente, possuem distribuição Normal multivariada:

v t w t N 0 0 , Q 0 0 R .

Tanto as matrizes de coeficientes F, A' e H' quanto as matrizes de variância-covariância Q e R podem ser consistentemente estimadas por meio da maximização da função de máxima verossimilhança condicional do sistema, dadas condições iniciais para ξ1|0 e sua matriz de variância-covariância P1|0.

2.1 Modelo de Interpolação

Antes de descrever o modelo utilizado, é importante fazer algumas observações a respeito do termo interpolação. O PIB é uma variável de fluxo com observações trimestrais que gostaríamos de distribuir entre os meses de cada trimestre. Porém, vale notar que originalmente o problema de alocar uma variável de fluxo desta forma se refere a distribuição, enquanto o termo interpolação está ligado à variáveis de estoque (ver Harvey, 1990). Apesar disso, grande parte da literatura recente sobre o assunto utiliza o termo PIB interpolado, o que justifica o nome utilizado para o modelo desta seção.

Para obter o PIB mensal da economia brasileira, faremos uso de um modelo de interpolação baseado em Bernanke et al. (1997) e aplicado ao contexto brasileiro por Issler e Notini (2016). Nossa maior contribuição é a escolha das co-variáveis que entram no modelo estado de espaços. Aqui, nos baseamos na Equação de Apreçamento dos Ativos para propor o Term-Spread como co-variável chave.

Assumimos que a taxa de crescimento instantânea do PIB mensal não observado - definido por Δ In yt+ - segue um processo AR(p) e é explicado por regressores Δ In xt e um termo de erro AR(1). As variáveis em Δ In xt são pré-determinadas e possuem alta correlação com o PIB. O modelo proposto para Δ In yt+ é:

(3) 1 φ 1 L φ p L p Δ ln y t + = β Δ ln x t + u t u t = ρ u t 1 + ɛ t .

A taxa instantânea de crescimento do PIB trimestral observado - definido por Δ In yt - é a variável a ser interpolada da frequência trimestral para mensal. Sendo assim, imporemos que a estimativa mensal Δ In yt+ obedeça

(4) Δ ln y t = Σ i = 0 2 Δ ln y t i + , se t = 3 , 6 , 9 , 12 , , T ; 0 , caso contr á rio .

Assim, a taxa instantânea de crescimento do PIB trimestral, que pode ser observada apenas nos meses t = 3, 6, 9 ,12, ..., T, é a soma das taxas de crescimento dos PIBs mensais correspondentes ao trimestre. Nos demais meses em que não temos informação do PIB, imputamos o valor zero. Esses valores fictícios imputados quando não temos observação serão substituídos pela técnica utilizada no filtro de Kalman, uma vez que se imponha uma variância alta para os dados fictícios.

Assumindo que o polinômio (1 - ɸ1 L - ... - ɸpLp) em (3) é de ordem um, isto é, p = 1, com coeficiente ɸ, a representação espaço de estados é da forma

(5) ξ t = Δ ln y t + Δ ln y t 1 + Δ ln y t 2 + u t = ϕ 0 0 ρ 1 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 ρ Δ ln y t 1 + Δ ln y t 2 + Δ ln y t 3 + u t 1 + β Δ ln x t 0 0 0 + ɛ t 0 0 ɛ t ,

(6) Δ ln y t = H t ξ t ,

onde (5) é a equação de estado e (6) é a equação de observação. Além disso, ɸ é o coeficiente autorregressivo da taxa de crescimento do PIB mensal, ρ é o coeficiente autorregressivo do termo de erro ut (vide equação (3)) e β é o vetor de coeficientes das variáveis auxiliares presentes em Δ In xt.

A matriz Ht' varia no tempo e possui o seguinte formato:

(7) H t = 1 1 1 0 , se t = 3 , 6 , 9 , 12 , , T ; 0 0 0 0 , caso contr á rio .

Por meio deste modelo é possível obter estimativas mensais do PIB que sinalizam o quão aquecida está a economia em um determinado período de tempo, sendo possível realizar tanto o backcast quanto o nowcast da atividade econômica. Definimos como backcast a previsão do PIB de um trimestre que já se realizou, mas cuja estatística ainda não foi divulgada pelo IBGE, enquanto o nowcast é a previsão do PIB do trimestre corrente.

Para a construção do PIB mensal, basta que tenhamos observações das variáveis auxiliares até o mês de referência. Para realizar o backcast, faremos uso de variáveis coincidentes em relação ao ciclo de negócios, ao passo que para o nowcast utilizaremos variáveis antecedentes com avanço de alguns meses.

3. Modelo Estrutural

Na busca por fundamentos econômicos para a construção do PIB mensal, usaremos a chamada Equação de Apreçamento dos Ativos, que diz que o preço do retorno futuro de todo ativo é igual à unidade, 1, em todo período de tempo. Para qualquer ativo, esse retorno é descontado usando-se o fator estocástico de descontos, isto é, usa-se o mesmo desconto para todos os retornos. Logo, o fator estocástico de descontos é um fator comum aos retornos da economia. Em modelos com preferências Constant Relative Risk Aversion (CRRA), o fator estocástico de descontos é uma função da taxa de crescimento do consumo. Logo, há uma associação entre retornos e atividade econômica implícita à Equação de Apreçamento.

Considere um mundo onde os retornos e as taxas de crescimento do consumo tenham a distribuição Log-Normal. Nesse caso, pode-se resolver explicitamente a equação de apreçamento de um ativo de i períodos que não paga dividendos como

(8) p t = 𝔼 t m t , t + i p t i ,

onde pt é o preço no período t do ativo de i períodos; pti é o preço do ativo em t + i já conhecido em t; mt,t+i é o fator estocástico de descontos entre os períodos t e t + i; e 𝔼t [⋅] denota a esperança condicionada à informação disponível no período t. Dividindo ambos os lados da equação (8) por pt, obtemos

(9) 1 = 𝔼 t m t , t + i p t i p t = 𝔼 t m t , t + i R t i ,

onde Rti é o retorno bruto acumulado do ativo de i períodos, que já é conhecido no período t.

Note que podemos reescrever (9) como

(10) 1 = exp 𝔼 t ln m t , t + i R t i + σ i 2 2 ,

onde σi2 é a variância condicional de ln(mt,t+i Rti), que é constante sob a hipótese de homocedasticidade no tempo (ver Hansen & Singleton, 1983).

Tomando-se o logaritmo natural de (10), obtemos

(11) ln R t i = ln m t , t + i σ i 2 2 + e i , t ,

onde ei,t = ln(mt,t+i Rti) - 𝔼t [ln(mt,t+i Rti)]. Sob a hipótese de função utilidade CRRA, o fator estocástico de descontos é dado por mt,t+i = βi (ct+i/ct)-γ, onde ct denota o consumo no período t, γ é a aversão relativa ao risco e β é a taxa de desconto da utilidade futura. Tomando o logaritmo natural de mt,t+i, temos:

(12) ln m t , t + i = i ln β γ ln c t + i ln c t ,

em que ln ct+i - ln ct é a taxa de crescimento instantânea do consumo agregado i períodos à frente.

Combinando (11) e (12):

(13) ln c t + i ln c t = 1 γ i ln β + ln R t i + σ i 2 2 e i , t .

A equação (13) nos mostra que há uma relação contemporânea entre a taxa de crescimento instantânea do consumo i períodos à frente e o logaritmo do retorno do ativo de i períodos. Ela serve de base para a construção de indicadores coincidentes para o consumo baseados em retornos.

A Equação de Apreçamento também existe numa versão multi-períodos. Suponha que Rt1 seja o retorno do ativo que transfere riqueza de hoje para um período à frente e Rtk seja o retorno do ativo que transfere riqueza de hoje para k períodos à frente. Usando a equação (13) para os dois retornos e subtraindo a última da primeira, obtemos

(14) ln c t + k ln c t + 1 = k 1 γ ln β + 1 γ σ k 2 2 σ 1 2 2 1 γ ln R t 1 ln R t k + 1 γ e 1 , t e k , t .

A equação (14) ainda pode ser reescrita como

(15) Δ ln c t + k + Δ ln c t + k 1 + + Δ ln c t + 2 = k 1 γ ln β + 1 γ σ k 2 2 σ 1 2 2 1 γ ln R t 1 ln R t k + 1 γ e 1 , t e k , t

Deste modo, do ponto de vista teórico, o spread do logaritmo dos retornos de ativos com maturidades distintas, que é conhecido no período atual, antecede a taxa instantânea de crescimento acumulada do consumo futuro.

Vale notar que, a taxa de crescimento do PIB e a taxa de crescimento do consumo são sincronizadas, como atestam diversos estudos empíricos (ver, por exemplo, Issler & Vahid, 2001). De fato, Campbell e Mankiw (1989) argumentam que há uma proporcionalidade entre os dois no curto prazo, advinda da existência de restrição à liquidez de alguns agentes, de modo que:

(16) Δ ln c t = λ Δ ln y t + 1 λ ɛ t ,

onde Δ ln yt é a taxa instantânea de crescimento do PIB; Δ ln ct é a taxa instantânea de crescimento do consumo agregado; λ é a proporção de agentes com restrição à liquidez; εt é um termo de erro imprevisível.

Combinando (14) e (16), obtêm-se uma equação que relaciona o spread entre o logaritmo dos retornos de ativos com maturidade de 1 e k períodos com a taxa instantânea de crescimento do PIB k - 1 períodos à frente.

(17) ln y t + k ln y t + 1 = k 1 γ λ ln β + 1 γ λ σ k 2 2 σ 1 2 2 1 γ λ ln R t 1 ln R t k + 1 γ λ e 1 , t e k , t 1 λ λ ɛ t + 2 + + ɛ t + k .

A equação (17) ainda pode ser reescrita como:

(18) Δ ln y t + k + Δ ln y t + k 1 + + Δ ln y t + 2 = k 1 γ λ ln β + 1 γ λ σ k 2 2 σ 1 2 2 1 γ λ ln R t 1 ln R t k + 1 γ λ e 1 , t e k , t 1 λ λ ɛ t + 2 + + ɛ t + k .

Como ilustrado acima, o approach integrado de macroeconomia e finanças abre a possibilidade de usar dados financeiros para prever o estado atual da atividade econômica.

4. Dados

Com o objetivo de realizar um teste empírico do modelo da seção 3, fizemos uso das variáveis descritas na Tabela 1. Após deflacionar a taxa de juros CDI e as taxas referenciais de swaps DI pré-fixadas a partir da mediana das expectativas de mercado do IPCA, serão construídos os spreads dos retornos reais, definidos como ln(1 + CDI - swap DI).

Tabela 1
Base de Dados para o Teste Empírico do Modelo Estrutural.

Para a implementação do modelo de interpolação por meio do filtro de Kalman, foram utilizadas algumas séries temporais de variáveis econômicas auxiliares com frequência mensal e que possuem alta correlação com o PIB para compor o vetor Δ ln xt. Dentre elas encontram-se variáveis coincidentes e antecedentes em relação ao ciclo de negócios, que serão usadas respectivamente para o backcast e o nowcast da atividade econômica. As variáveis antecedentes serão utilizadas com o avanço de alguns meses, de modo a torná-las coincidentes. Defina como A(⋅) o operador avanço, para qualquer variável auxiliar antecedente wt, teremos: Ai (wt) = wt+i, onde i é o número de meses que iremos avançar a variável para torná-la coincidente.

A Tabela 2 mostra a base de dados utilizada na implementação empírica do modelo para realizar o backcast do PIB e as respectivas fontes, enquanto a Tabela 3 exibe as séries utilizadas no nowcast do PIB.

Tabela 2
Base de Dados (Backcast).
Tabela 3
Base de Dados (Nowcast).

A seleção das variáveis coincidentes, presentes na base de dados de Backcast, baseou-se na procura por séries de periodicidade mensal frequentemente utilizadas em análises do ciclo de negócios. Mariano e Murasawa (2003) argumentam que candidatos naturais seriam: Produção Industrial, Vendas no Varejo e Emprego. Com o objetivo de aumentar o número de séries coincidentes, seguimos Cardoso (1980) e selecionamos uma Variável de Produção de Autoveículos, além de uma variável de Sondagem produzida pela Fundação Getulio Vargas (FGV).

O próximo passo envolveu testar se essas variáveis selecionadas satisfazem alguns critérios estatísticos desejáveis. Primeiro testamos se as variáveis possuem a mesma ordem de integração do PIB. Por meio da aplicação do teste Dickey-Fuller Aumentado (ADF) nas séries em log e em primeira diferença, concluímos que tanto o PIB quanto as séries explicativas são I(1), como mostra a Tabela 4. Afim de verificar se as séries são coincidentes, o segundo passo envolveu analisar as correlações cruzadas entre as variáveis candidatas e o PIB, contemporaneamente e com defasagem, como mostra a Tabela 5. Trabalhou-se com as primeiras diferenças das séries dessazonalizadas em logaritmo. Para todas as séries coincidentes, a correlação é maximizada quando as séries são tomadas contemporaneamente, como esperado. Adicionalmente, investigamos a existência de tendência comum entre as séries coincidentes e o PIB por meio do teste de cointegração de Johansen (1991). A hipótese de não-existência de vetor de cointegração foi rejeitada ao nível de significância de 1% (Tabela 6). O procedimento de seleção das variáveis baseou-se em Duarte, Issler, e Spacov (2004).

Tabela 4
Teste ADF de Raíz Unitária.
Tabela 5
Análise de Correlação entre lags das variáveis auxiliares e PIB.
Tabela 6
Teste de Cointegração de Johansen.

O critério para a seleção das variáveis antecedentes baseou-se em Stock e Watson (1989), Stock e Watson (1993) e também aplicado ao contexto brasileiro em Duarte et al. (2004). O procedimento adotado se resume na escolha de variáveis que possuem poder preditivo em relação ao PIB. Após concluir que as variáveis candidatas possuem raíz unitária, trabalhamos com as séries dessazonalizadas, em logaritmo e primeira diferença. Por fim, as variáveis foram submetidas a testes de causalidade de Granger com o PIB, incluindo 3 lags. A Tabela 7 mostra que para ambas as séries analisadas, rejeita-se a hipótese nula de não-causalidade do PIB no sentido de Granger. Ademais, a utilização do spread dos retornos como uma das variáveis antecedentes auxiliares do modelo é justificada na seção 3.

Tabela 7
Teste de Causalidade de Granger.

Feita a seleção da base de dados, todas as séries foram utilizadas no modelo com ajuste sazonal (método ARIMA X-13), em logaritmo e em primeira diferença. Além disso, as variáveis foram padronizadas, isto é, divididas pelo seu desvio padrão.

5. Resultados Empíricos

5.1 Resultados Empíricos do Modelo Estrutural

A partir do modelo estrutural desenvolvido na seção 3, encontramos uma relação teórica entre o spread dos retornos conhecido no período atual entre dois ativos com maturidades distintas e a taxa de crescimento do consumo futuro. Agora nosso objetivo é investigar se essa relação também é observada empiricamente. A equação (14) pode ser reescrita como

(19) ln c t + k ln c t + 1 = α + θ S t + ɛ t ,

onde ln ct+k - ln ct+1 é a taxa de crescimento instantânea acumulada do consumo nos próximos k-1 trimestres; α é uma constante dada por α = ((k - 1)/γ) ln β+(1/γ)(σk2/2 - σ12/2); θ = -(1/ γ); St é o spread dos retornos dado pela diferença entre o retorno do ativo de prazo mais curto e o retorno do ativo de prazo mais longo; εt é o termo de erro dado por εt = (1/γ)(e1,t - ek,t).

Vale notar que para a previsão da taxa de crescimento do consumo acumulada 1 trimestre à frente construímos o spread dos retornos com base na taxa de curto prazo dada pelo CDI e na taxa de prazo mais longo dada pela taxa Swap DI pré-fixada com prazo de 90 dias. Para 2 trimestres à frente utilizamos a taxa de juros CDI e a taxa Swap DI pré-fixada com prazo de 180 dias, enquanto para 3 trimestres à frente utilizamos a diferença entre a taxa Swap DI pré-fixada com prazo de 90 dias e 360 dias1 e para 4 trimestres à frente as taxas CDI e Swap DI pré-fixada com prazo de 360 dias. Todas as taxas foram deflacionadas utilizando a mediana das expectativas de mercado do IPCA, divulgadas pelo Banco Central do Brasil.

A Tabela 8 exibe os resultados da estimação da regressão (19) por MQO separadamente para diferentes horizontes de tempo, utilizando erros-padrão consistentes com heterocedas-ticidade e autocorrelação (HAC). Nota-se que o coeficiente da inclinação da curva de juros é sempre significativo e positivo, conforme era esperado.

Tabela 8
Prevendo o crescimento do consumo k - 1 períodos à frente usando o spread da curva de juros.

É possível ainda utilizar o método Seemingly Unrelated Regressions (SUR) para obter estimatidores mais eficientes, uma vez que espera-se que os erros das regressões reportadas acima sejam correlacionados. A Tabela 9 mostra o resultado deste exercício, confimando que o conteúdo informacional atual presente na curva de juros é útil para prever o consumo futuro.

Tabela 9
Prevendo o crescimento do consumo k - 1 períodos à frente usando o spread da curva de juros (Método SUR).

Com o intuito de associar a taxa de crescimento do consumo com a taxa de crescimento do PIB, o exercício desenvolvido por Campbell e Mankiw (1989) foi replicado para o Brasil. Estimou-se a seguinte regressão pelo método de Variáveis Instrumentais:

(20) Δ ln c t = μ + λ Δ ln y t .

A Tabela 10 exibe os resultados. Na primeira estimativa, foram utilizados como instrumentos lags da taxa de crescimento do consumo, na segunda estimativa utilizou-se lags da taxa de crescimento da taxa de juros Selic e, por fim, na terceira utilizou-se lags da taxa de crescimento do PIB, do consumo, da taxa de juros Selic e a razão entre consumo e PIB. Em todas as estimativas, foram obtidos valores de λ significativamente diferentes de zero, além de não haver evidências de sobreidenticação nas restrições do modelo.

Tabela 10
Teste de proporcionalidade entre consumo e PIB.

Esses reultados sugerem que a taxa de crescimento do consumo e do PIB, ambas centradas, são proporcionais ao longo do tempo. Logo, é possível estimar (17) para diversos horizontes de tempo. Reescrevendo (17), obtemos:

(21) ln y t + k ln y t + 1 = α + θ S t + ɛ t ,

onde

α = k 1 γ λ ln β + 1 γ λ σ k 2 2 σ 1 2 2 , θ = 1 γ λ , ɛ t = 1 γ λ e 1 , t e k , t 1 λ λ ɛ t + 2 + + ɛ t + k .

A Tabela 11 exibe os resultados desse exercício. Nota-se que todas as estimativas são significativas, sinalizando que, de fato, o spread possui poder preditivo em relação à taxa de crescimento do PIB.

Tabela 11
Prevendo o crescimento do PIB k - 1 períodos à frente usando o spread da curva de juros (Método SUR).

5.2 Resultados do Filtro de Kalman

Uma vez comprovada empiricamente a capacidade preditiva do spread dos retornos, propomos a utilização desta variável para a construção do PIB mensal do Brasil a partir do modelo desenvolvido na seção 2.

A Tabela 12 exibe os parâmetros do modelo estimados por meio do filtro de Kalman, os coeficientes das variáveis auxiliares presentes no vetor Δ ln xt e seus respectivos desvios padrão entre parênteses. Para inicializar os parâmetros ɸ, ρ e β, agregamos as variáveis auxiliares da frequência mensal para trimestral e estimamos um MQO de yt em yt-1 e xt ; assim obtemos estimativas iniciais para ɸ e β. Afim de gerar uma estimativa inicial para ρ, regredimos o termo de erro ut da regressão anterior em ut-1.

Tabela 12
Resultados do Filtro de Kalman.

Para avaliar a qualidade da interpolação realizada pelo modelo, calculamos uma medida de R2 proposta por Bernanke et al. (1997):

R 2 = VAR Δ y ̂ t | T + VAR Δ y ̂ t | T + + VAR Δ u ̂ t | T ,

onde ŷt|T+ é o nosso PIB mensal, dado todo o conjunto de informação, e ût|T é a mesma estimativa para o termo de erro ut. O R2 de 0,89 sugere que as variáveis auxiliares utilizadas explicam grande parte da variabilidade da taxa instantânea de crescimento da atividade econômica. Vale ressaltar que pelo fato de termos obtido uma estimativa do parâmetro ρ muito próxima de zero e não significativa, optamos por estimar o modelo com parâmetros ρ = 0 e ɸ variável.

O modelo provê estimativas mensais para a taxa instantânea de crescimento mensal da atividade econômica (Δ ln yt+) para qualquer período de tempo no qual tenhamos as variáveis auxiliares disponíveis.

A partir das taxas de crescimento estimadas pelo modelo, construímos um índice mensal para o PIB. A Figura 1 mostra que, dentro da amostra, o PIB mensal construído se aproxima bastante do PIB trimestral divulgado pelo IBGE.

Figura 1
PIB Mensal e PIB Trimestral (IBGE).

5.3 Previsão Fora da Amostra

O modelo utilizado para a construção do PIB mensal possui uma restrição de que a soma da taxa instantânea de crescimento do PIB mensal nos meses correspondentes ao trimestre deve ser igual a taxa instantânea de crescimento do PIB trimestral, divulgado pelo IBGE. Deste modo, ao trimestralizar o PIB mensal, obtemos uma aderência perfeita dentro da amostra. Nos resta, portanto, avaliar as estimativas do modelo fora da amostra.

Entretanto, devemos ressaltar que a amostra que utilizamos equivale ao último dado do PIB disponibilizado pelo IBGE, isto é, após possíveis revisões terem sido feitas. Sendo assim, não testamos o modelo para a previsão das vintages do PIB, algo que pode ser feito em um trabalho futuro caso esses dados estejam disponíveis.

5.3.1 Backcast

O backcast da atividade econômica é a previsão do PIB do trimestre passado, mas que ainda não foi divulgado pelo IBGE, o que significa prever um trimestre à frente em relação ao último dado de PIB disponível.

Avaliaremos a acurácia dessas previsões a partir de um exercício de pseudo-real-time do primeiro trimestre de 2004 até o primeiro trimestre de 2018, isto é, em cada ponto do tempo são consideradas todas as informações disponíveis até aquele momento e então é feita a estimação do PIB mensal. Esse exercício permite avaliar o quão boas são as estimativas do modelo para o PIB um trimestre à frente (backcast).

As figuras 2, 3 e 4 comparam os resultados fora da amostra do PIB mensal trimestralizado com o PIB do IBGE, sendo que a Figura 2 avalia a variação ano contra ano (em relação ao mesmo trimestre do ano anterior), enquanto a Figura 3 exibe a variação trimestral (em relação ao trimestre imediatamente anterior) e a Figura 4 avalia o PIB mensal em nível. Nota-se que foi possível obter uma boa aproximação da taxa de crescimento do PIB um trimestre à frente.

Figura 2
Estimativa fora da Amostra do Backcast do PIB Mensal Trimestralizado e PIB do IBGE (Variação Ano contra Ano).

Figura 3
Estimativa fora da Amostra do Backcast do PIB Mensal Trimestralizado e PIB do IBGE (Variação Trimestral).

Figura 4
Estimativa fora da Amostra do Backcast do PIB Mensal Trimestralizado e PIB do IBGE (Nível).

5.3.2 Nowcast

O nowcast da atividade econômica é a previsão do PIB do trimestre corrente, o que significa prever dois trimestres à frente em relação ao último dado de PIB disponibilizado pelo IBGE. Para isto, utilizaremos a mesma estrutura do modelo de interpolação da seção 2.1, mas fazendo uso apenas de variáveis auxiliares antecedentes em relação ao ciclo de negócios. Utilizaremos estas variáveis com avanço de três meses, conforme já ressaltado na seção 4. A Tabela 13 exibe os parâmetros estimados pelo filtro de Kalman quando utilizamos apenas variáveis auxiliares antecedentes e a medida de R2, que sugere uma boa qualidade de interpolação.

Tabela 13
Resultados do Filtro de Kalman (Nowcast).

Realizamos mais um exercício de pseudo-real-time, contemplando o período do primeiro trimestre de 2010 até o primeiro trimestre de 2018, mas desta vez nosso objetivo foi avaliar o nowcast do PIB mensal construído. A Figura 5 exibe as previsões de nowcast do nosso PIB mensal e as realizações do PIB do IBGE, considerando a variação ano contra ano, enquanto a Figura 6 ilustra a variação trimestral.

Figura 5
Estimativa fora da Amostra do Nowcast do PIB Mensal Trimestralizado e do PIB do IBGE (Variação Ano contra Ano).

Figura 6
Estimativa fora da Amostra do Nowcast do PIB Mensal Trimestralizado e do PIB do IBGE (Variação Trimestral).

6. Comparação com outros indicadores da atividade econômica

O backcast da atividade econômica é a previsão do PIB do trimestre passado. Já o nowcast da atividade econômica é a previsão do PIB do trimestre corrente. Apesar dos nomes, ambos são previsões fora da amostra, pois o PIB é divulgado com uma defasagem maior do que um trimestre.

Nessa seção, avaliamos se nosso PIB mensal possui vantagens preditivias com relação a outras proxies de atividade econômica brasileiras. Um dos indicadores de atividade mais conhecidos no Brasil é o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) (BCB, 2016). Com o auxílio das tabelas de recursos e usos do Sistema de Contas Nacionais do IBGE, o IBC-Br é construído a partir da agregação de variáveis proxies para o volume de produção da agropecuária, da indústria, do setor de serviços e o volume de impostos, agregados com pêsos apropriados.

Nosso PIB mensal possui vantagens importantes em relação ao IBC-Br. A primeira delas é o ganho computacional. Enquanto o IBC-Br utiliza dezenas de séries temporais em sua construção, nosso PIB mensal faz uso de apenas seis variáveis econômicas altamente correlacionadas com o PIB. A segunda vantagem está no fato da metodologia do PIB mensal aqui proposto impor uma restrição para que o indicador trimestralizado coincida com o PIB, de modo que o PIB mensal reflita o mesmo comportamento que o PIB do IBGE tanto no curto quanto no longo prazo, por construção. O IBC-Br, por outro lado, não exige que seus ciclos de crescimento sejam sincronizados com os ciclos do PIB. Outra questão é a defasagem de cerca de dois meses na divulgação do IBC-Br representando, portanto, um backcast da atividade econômica. Em contrapartida, o modelo na forma espaço de estados permite realizar também o nowcast da atividade econômica.

Com o objetivo de realizar uma análise comparativa justa entre esses dois indicadores, iremos contrapor as previsões fora da amostra do backcast do nosso PIB mensal com as do IBC-Br, ambos trimestralizados, e compará-las com os resultados oficiais do PIB desde o primeiro trimestre de 2004 até o primeiro trimestre de 2018. A Figura 7 exibe a taxa de crescimento trimestral do IBC-Br, as previsões fora da amostra do backcast do PIB mensal construído neste trabalho e a taxa de crescimento trimestral do PIB. Nota-se que as previsões do nosso PIB mensal se aproximam mais do resultado efetivamente registrado pelo PIB. Enquanto a raíz do erro quadrático médio de previsão (REQM) do nosso indicador é de 0,6%, no caso do IBC-Br chega a 1,3%,como mostra a Tabela 14.

Figura 7
Previsão fora da Amostra do PIB Mensal, IBC-Br e PIB do IBGE (Variação Trimestral).

Tabela 14
Análise Comparativa dos Erros de Previsão. Amostra: 2004T1 a 2018T1.

A Fundação Getulio Vargas (FGV) também desenvolveu o chamado Indicador de Atividade Econômica (IAE),2 um indicador que visa reproduzir o desempenho da atividade brasileira em bases mensais. Assim como o IBC-Br, esse indicador também é divulgado com defasagem de cerca de dois meses, correspondendo a um backcast da atividade econômica. A Figura 8 ilustra as previsões fora da amostra do backcast do nosso PIB mensal, o IAE e o PIB oficial, todos em variação trimestral.Como mostra a Tabela 14, nosso indicador coincidente também registrou um REQM de previsão menor que o IAE.

Figura 8
Previsão fora da Amostra do PIB Mensal, IAE (FGV) e PIB do IBGE (Variação Trimestral).

Concluímos, portanto, que o PIB mensal aqui elaborado representou uma performance de backcast que superou tanto o IBC-Br quanto o IAE usando-se o REQM - a raiz quadrada do erro quadrático médio de previsão. Contudo, gostaríamos de ir além e comparar os erros do nowcast do nosso modelo com o erros do backcast da atividade feito pelo IAE e pelo IBC-Br, isto é, iremos contrapor os erros de previsão de dois trimestres à frente do nosso PIB mensal com os erros de previsão de um trimestre à frente dos indicadores do Banco Central e da Fundação Getulio Vargas, considerando o período do primeiro trimestre de 2010 até o primeiro trimestre de 2018, período que inclui a nossa maior recessão.

Vale notar que essa compração nos é desfavorável, dado que tanto o IBC-Br quanto o IAE-FGV usam informações mais recentes do que a nossa proxy de PIB mensal. Os resultados desse exercício encontram-se na Tabela 15 e mostram que, mesmo em um exercício onde nosso indicador foi colocado em desvantagem, o resultado da compração ainda nos foi favorável. De fato, nosso modelo tem uma REQM 11,8% menor do que a do IBC-Br no nowcast do PIB e uma REQM 5,8% menor do que a do IAE-FGV.

Tabela 15
Análise Comparativa dos Erros de Previsão. Amostra: 2010T1 a 2018T1.

7. Conclusão

Neste trabalho, desenvolvemos um PIB mensal para a economia brasileira para o período de 2002 a 2018. Nosso indicador foi baseado em um modelo na forma espaço de estados, cuja estimação envolveu a utilização da técnica do filtro de Kalman. O modelo impõe uma disciplina de que a soma da taxa de crescimento instantânea do nosso PIB mensal nos meses correspondentes ao trimestre deve se igualar à taxa de crescimento instantânea trimestral do PIB observado, divulgado pelo IBGE. Essa disciplina imposta pelo modelo e a escolha minuciosa de variáveis altamente correlacionadas com o PIB para compor o modelo de interpolação, permitiu obter resultados satisfatórios nas análises dentro e fora da amostra.

Uma importante variável auxiliar do modelo para realizar o nowcast da atividade econômica é o spread do retornos, cuja escolha se justificou por meio do modelo estrutural desenvolvido neste trabalho, que se fundamenta na Equação de Apreçamento dos Ativos. O modelo teórico mostrou que a diferença atual dos retornos de ativos com maturidades distintas é útil para prever a atividade econômica futura e esta tese foi confirmada empi-ricamente. As outras variáveis auxiliares utilizadas foram escolhidas por meio do critério estatístico de alta correlação com o PIB, porém os pesos de cada uma delas foi estimado via máxima verossilhança por meio da aplicação do filtro de Kalman.

Realizamos alguns exercícios para avaliar a acurácia das previsões fora da amostra do modelo e também comparamos com outros indicadores da atividade econômica existentes no Brasil. Os resultados mostraram que o PIB mensal construído neste trabalho registrou erros de previsão, tanto de backcast quanto de nowcast, menores do que o indicador de atividade econômica do Banco Central, o IBC-Br, e também se mostrou superior ao IAE, indicador mensal da atividade elaborado pela Fundação Getulio Vargas. Portanto, o PIB mensal aqui construído representa uma evolução em relação a outros indicadores de atividade existentes no país.

  • 1
    Neste caso, não utilizamos o spread entre a taxa CDI e a taxa Swap DI pré-fixada com pazo de 270 dias pela indisponibilidade da última no site do Banco Central do Brasil.
  • 2
    O Indicador de Atividade Econômica (IAE) é uma série econômica de uso interno da FGV/IBRE.
  • João Victor Issler agradece ao apoio financeiro do CNPq, da FAPERJ e do INCT. Este estudo foi parcialmente financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal a Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código 001.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2019

Histórico

  • Recebido
    26 Out 2018
  • Aceito
    05 Nov 2018
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