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Causalidade, (in)determinismo e (im)previsibilidade: por que o conceito de causa é tão importante?

Causality, (in)determinism and (un)predictability: why is the concept of cause so important?

Resumos

Causalidade, determinismo e previsibilidade, bem como seus respectivos antitéticos não-causalidade, indeterminismo e imprevisibilidade constituem-se em conceitos bastante referidos tanto no âmbito dos cientistas e filósofos quanto no âmbito de outras comunidades. Nem sempre é fácil distinguir causalidade de determinismo e muitas vezes se reduz essas categorias conceituais à capacidade de prever. Argumentamos que várias dessas formulações são insuficientes e inadequadas e, não raro, claramente insustentáveis. Argumentamos também que o conceito de causa é o mais importante dentre eles.

causalidade; (in)determinismo; (im)previsibilidade


Causality, determinism and predictability, as well as their respective antipodean non-causality, indeterminism and unpredictability constitute recurrent concepts for both scientific and philosophical communities. The distinction between causality and determinism is not a simple matter. Frequently these conceptual categories give rise to misunderstandings. In fact, these categories are not simply reduced to mere capacity to predict. We argue that several of these formulations are not suitable in order to understand these concepts. Finally we argue that the concept of cause is the most important.

causality; (in)determinism; (un)predictability


ARTIGOS GERAIS

Causalidade, (in)determinismo e (im)previsibilidade. Por que o conceito de causa é tão importante?

Causality, (in)determinism and (un)predictability. Why is the concept of cause so important?

Jenner Barretto Bastos Filho1 1 E-mail: jennerbastos@gmail.com. Também Professor do Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente do Instituto de Geografia, Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Alagoas.

Instituto de Física, Universidade Federal de Alagoas, Campus da Cidade Universitária, Maceió, AL, Brasil

RESUMO

Causalidade, determinismo e previsibilidade, bem como seus respectivos antitéticos não-causalidade, indeterminismo e imprevisibilidade constituem-se em conceitos bastante referidos tanto no âmbito dos cientistas e filósofos quanto no âmbito de outras comunidades. Nem sempre é fácil distinguir causalidade de determinismo e muitas vezes se reduz essas categorias conceituais à capacidade de prever. Argumentamos que várias dessas formulações são insuficientes e inadequadas e, não raro, claramente insustentáveis. Argumentamos também que o conceito de causa é o mais importante dentre eles.

Palavras-chave: causalidade, (in)determinismo, (im)previsibilidade.

ABSTRACT

Causality, determinism and predictability, as well as their respective antipodean non-causality, indeterminism and unpredictability constitute recurrent concepts for both scientific and philosophical communities. The distinction between causality and determinism is not a simple matter. Frequently these conceptual categories give rise to misunderstandings. In fact, these categories are not simply reduced to mere capacity to predict. We argue that several of these formulations are not suitable in order to understand these concepts. Finally we argue that the concept of cause is the most important.

Keywords: causality, (in)determinism, (un)predictability.

1. Introdução

Argumentamos que as diferenças entre os conceitos de causalidade e de determinismo são importantes e que, além disso, um mundo indeterminista não pressupõe necessariamente um mundo não-causal. Ademais, o conceito de causalidade é abrangente e não pode ficar refém de algo como a capacidade de prever. Este tema tem sido tratado recorrentemente por diversos autores entre os quais Bunge [1, 2]; Cassirer [3]; Nagel [4]; Margenau [5], Popper [6-8]; Russell [9]. Sem dúvida, trata-se de uma questão difícil e sutil, pois está sujeita às armadilhas semânticas e lingüísticas inclusive aquelas que podem resultar das diversas acepções que esses termos podem assumir, além da mistura dessas acepções em um mesmo discurso, fato que o torna ambíguo.

Tentemos responder à pergunta:

- Qual é a diferença entre Causalidade e Determinismo?

Consideramos que o problema seja compreendido de maneira mais adequada quando discutimos em conjunto os conceitos de causalidade, de determinismo, de previsibilidade e, evidentemente, de seus correspondentes antitéticos não-causalidade, indeterminismo e imprevisibilidade.

No segundo volume de seu Pós-Escrito à Lógica da Investigação Científica dedicado à defesa do indeterminismo, Popper assim define a doutrina do determinismo "científico" a qual tem a intenção de combater:

O meu problema central é o de examinar a validade dos argumentos a favor daquilo a que chamo determinismo "científico"; quer dizer, a doutrina de que a estrutura do mundo é tal que qualquer acontecimento pode ser racionalmente previsto, com qualquer grau de precisão que se deseje, se nos for dada uma descrição suficientemente precisa de acontecimentos passados, juntamente com todas as leis da natureza. [7, p. 23]

Popper argumenta que até pelo menos o ano de 1927 praticamente todos os físicos, quase sem exceção, eram deterministas.2 2 Este argumento é reiterado na Ref. [8, p. 7]. Ele abre uma honrosa exceção possivelmente para o físico/filósofo estadunidense Charles Sanders Peirce [10]. Entre os filósofos eram deterministas figuras de proa tais como Espinosa, Hobbes, Hume, Kant, Schopenhauer, J.S. Mill e M. Schilick até mais ou menos 1927. Mas Schilick estava seriamente indeciso em 1930 quando escreveu:

Uma vez que esta suposição de que todos os acontecimentos estão sujeitos a leis universais é habitualmente referida como sendo o princípio da causalidade universal, posso apresentar [a minha tese] deste modo: qualquer ciência pressupõe o princípio da causalidade universal (...). Toda a experiência apóia a crença de que esta pressuposição é satisfeita, pelo menos tanto quanto ela é necessária para todas as finalidades da vida prática, em todos os contactos com os outros homens e a natureza, e até mesmo para a extrema precisão que a tecnologia requer. Mas se o princípio da causalidade é ou não válido de modo absoluto e em toda parte, sem a mínima exceção sequer - quer dizer, se o determinismo está ou não correto-, isso nós não sabemos. O que sabemos, porém é isto: que é impossível decidir a questão entre determinismo e indeterminismo simplesmente através do pensamento ou da especulação, ponderando o número de argumentos a favor e contra (todos os quais seriam, de algum modo, pseudo-argumentos). Tal empreendimento está condenado a criar uma impressão ridícula, sobretudo se pensarmos no esmagador arsenal de artefatos experimentais e lógicos com que a física contemporânea está hoje cautelosamente a aproximar-se do ataque ao problema de saber se o princípio da causalidade é ou não válido mesmo para os acontecimentos hiperfinos no interior dos átomos. (Schilick apud Ref. [7, p. 24-25]); as ênfases conjuntamente em itálicos e em negrito são de Schlick, enquanto aquelas apenas em itálicos foram introduzidas por nós)

O texto acima é bastante enfático da concepção segundo a qual mesmo que se assuma, sem qualquer restrição, a validade do princípio da causalidade universal, isto, por si só, não constitui prova alguma que nos permita dirimir entre determinismo e indeterminismo.

No entanto, a adoção determinista contém um grande mal estar. Uma das coisas mais deprimentes da adoção determinista é a que comporta descrever um mundo insuportavelmente indutivo,3 3 Popper conectou inducão, determinismo e mera repeticão, em contraposicão à não-inducão, ao indeterminismo e à bifurcacão que gera a criatividade e a novidade. Ele assim se manifestou: "Que é, então, indutivo? No essencial, a inducão diz que não há nada de novo. Se eu vi um milhão de cisnes brancos, posso estar certo de que todos os cisnes são brancos. Segundo a inducão, tudo é repeticão. (...) O cerne da não-inducão [é a bifurcacão]. Bifurcacão quer dizer que as coisas não continuam indefinidamente do mesmo modo. Ocorre algo de diferente, algo de novo. A inducão tenta dizer: Sempre foi e assim vai continuar a ser. O princípio da inducão de John Stuart Mill significa "The uniformity of nature", a uniformidade da natureza. O futuro será idêntico ao passado. Em contrapartida o princípio criativo diz: O futuro não será igual ao passado. (...) Claro que muitas vezes as mutacões não são nada de novo. Muitas vezes não fazem mais que repetir-se continuamente. Mas, em princípio, o novo resulta por mutacão. Há propensões, tendências para a realizacão. É isto que o determinismo não quer admitir. Segundo o determinismo, não há nada de novo debaixo do Sol. Ora eu digo: Há coisas novas debaixo do Sol. A inducão nega que exista algo de realmente novo. Segundo ela, o futuro será igual ao passado. O princípio da deducão, ou se quiser o princípio da criatividade é o princípio do não-determinismo que possibilita o aparecimento de coisas novas" [6, p. 60-61]. ,4 4 Em continuidade à nota anterior transparece com clareza uma diferenca importante entre as adocões respectivamente de Popper e de Charles Sanders Peirce. Na frase final de Popper disposta na nota de rodapé anterior há uma explícita associacão da deducão ao princípio criativo. No entanto, Peirce atribui este princípio criativo muito mais à abducão e aos insights criativos do que propriamente à deducão. A seguinte passagem é clara ao mostrar esta diferenca. Peirce escreveu: "Abducão é o processo para formar hipóteses explicativas. É a única operacão lógica a introduzir idéias novas; pois que a inducão não faz mais que determinar um valor, e a deducão envolve apenas as conseqüências necessárias de uma pura hipótese" [10, p. 14]. Logo, para Peirce, o processo criativo requer que se vá além da deducão, pois a criatividade exige que se vá além das conseqüências necessárias. no qual o passado é igual ao futuro e no qual nada há de novo e criativo sob a luz do Sol. Ainda mais grave seria a terrível conseqüência que um determinismo exacerbado acarretaria sobre a liberdade humana e a autonomia do pensamento. Se tudo já fosse determinado de tal maneira que qualquer coisa que viéssemos a fazer e a pensar fosse de antemão previsível, então a nossa própria dignidade e com esta os valores precípuos de liberdade, de autonomia e de livre arbítrio ou seriam uma ilusão ou estariam seriamente comprometidos.

Alguns filósofos sentiram a contradição que existia entre um mundo rigorosamente determinista e a liberdade humana e, deste modo, envidaram esforços para superá-la. Propuseram eles, soluções conciliatórias que, em suma, compreendessem tanto uma coexistência quanto uma radical descontinuidade entre, por um lado, o pressuposto determinismo do mundo e, por outro, a nossa liberdade que necessariamente pressupõe o livre arbítrio. Foi, por exemplo, o caso de Epicuro que por razões éticas, teve que introduzir a hipótese ad hoc do clinamen (inclinação) para os movimentos dos seus átomos.

Também foi o caso de Kant [11]. Provavelmente a famosa passagem do início das conclusões da Crítica da Razão Prática na qual Kant5 5 "Duas coisas me enchem o ânimo de crescente admiracão e respeito, veneracão sempre renovada quanto com mais freqüência e aplicacão delas se ocupa a reflexão: por sobre mim o céu estrelado; em mim a lei moral. Ambas essas coisas não tenho necessidade de buscá-las e simplesmente supô-las como se fossem envoltas de obscuridade ou se encontrassem no domínio do transcendente, fora do meu horizonte, vejo-as diante de mim, coadunando-as de imediato com a consciência de minha existência" [11, p. 253]. se refere ao Céu sobre a minha cabeça e à Moral dentro de mim, pode muito razoavelmente ser interpretada como o dilema entre a inexorabilidade das leis que permitiam previsões estupendas e a Moral interior que depende da autonomia e do livre arbítrio do indivíduo.

Neste trabalho, elegemos como nosso objetivo a discussão do argumento segundo o qual causalidade, determinismo e previsibilidade são coisas distintas e que essa distinção pode ser racionalmente mostrada de maneira objetiva e independente de meros jogos verbais que significam muito mais "pegadinhas" do que discussão genuína de problemas.

Se alguém vier a insistir na formulação acima de determinismo "científico" devida a Popper a qual conecta determinismo à capacidade de prever, então podemos argumentar e concluir que causalidade definitivamente não se reduz à capacidade de prever e por esta razão, não é a mesma coisa que determinismo.6 6 É importante ressaltar que não se deve dar excessiva importância à expressão "capacidade de prever" no sentido de imputar à mesma algo como uma propriedade precípua do "sujeito" e ainda com maior razão como algo subjetivo. Trata-se de uma forma de expressão. O mais importante da tese de Popper é que todos os acontecimentos passados juntamente com todas as leis da natureza não acarretam, por impossibilidade mesmo de princípio, o futuro. O passado já é dado e o futuro é essencialmente aberto. Por isso não se pode prever tudo. Mesmo porque há situações concretas na própria teoria do caos onde vige a alta sensibilidade às condições iniciais e onde, em que pese não se possa prever, independentemente do grau de precisão dessas condições iniciais, pode-se claramente identificar as causas dessa imprevisibilidade.

O nosso artigo se encontra organizado da seguinte maneira: na seção 2 discutiremos a abrangência do conceito de causa em Aristóteles [12]; na seção 3 discutiremos o conceito de causalidade contido no princípio da razão suficiente de Leibniz [13] enquanto causa necessária e, portanto, não contingente; na seção 4 centraremos a nossa atenção nas críticas de Hume [14, 15] e de Bertrand Russell [9] à causalidade; na seção 5 traremos à baila a concepção de Laplace que constitui uma extensão exacerbada e hiperbólica das pretensões deterministas; na seção 6 alguns exemplos elucidativos nos ajudam a fixar algumas idéias anteriormente discutidas; na seção 7 aspectos da teoria do caos são enfocados com o fito de ressaltar as importantes propriedades da alta sensibilidade às condições iniciais e da não-linearidade envolvida; na seção 8 discutiremos os conceitos de estabilidade e de instabilidade e aí faremos menção ao caráter central que eles representam no contexto da presente discussão; na seção 9 apresentaremos uma discussão complementar contextualizada com alguns argumentos adicionais e conectada aos objetivos do artigo e após isso, na seção 10 fecharemos a nossa discussão ressaltando as nossas conclusões.

2. A causa em Aristóteles e como podemos interpretá-la à luz de desenvolvimentos recentes

A Causalidade é um tema recorrente em toda a História da Ciência e da Filosofia. Aristóteles7 7 Veja a Ref. [12], Metafísica, Livro I, cap. 3, p. 915-917; também na Ref. [12], Lógica-Analítica Posterior, Livro 2, cap. 11, p. 404-405. dividiu asCausas em quatro: Causa Final, Causa Eficiente, Causa Material eCausa Formal.

Causa Final é a que implica em um fim ou finalidade. Por exemplo 'Existimos para sermos felizes'. A felicidade seria, portanto, a causa final (finalidade) de nossa Existência. A causa material diz respeito à substância geradora (causadora) das coisas. Assim, o mármore é a causa material da estátua de Moisés de Michelangelo. Perguntado sobre como ele havia feito o Moisés, Michelangelo respondeu: "Somente tirei do mármore aquilo que não era Moisés, pois ele já se encontrava lá no mármore." No entanto, a concepção do Moisés por parte de Michelangelo (o projeto e a finalidade) seria a causa final; o substrato material para alcançar a finalidade circunscrever-se-ia então à causa material.

Talvez, em linguagem hodierna a causa final (o projeto, a finalidade, o programa) pudesse ser aproximada do que hoje chamamos de software enquanto a causa material (a substância, o estofo) em cima da qual o projeto tem necessidade a fim de que venha a se viabilizar, pudesse ser associada ao hardware.

Freeman Dyson [16] associou os genes (unidades genéticas que determinam certas características inatas dos seres vivos e são transmitidos de geração para geração) ao hardware, enquanto os memes (unidades básicas das idéias, paradigmas e princípios das culturas humanas) foram associados ao software. No entanto, embora os próprios genes, sejam hardware, eles também envolvem um programa e, que, portanto, também existe um software nos genes. Em linguagem aristotélica, diríamos que o programa, ou seja, a finalidade contida nos genes e nas correlações entre eles constituem-se em causa final. Em outras palavras, poderíamos dizer que os genes estão impregnados de causa final. A citosina, a guanina, a timina e a adenina, que são os tijolos básicos de quaisquer genes, constituem-se na sua causa material a fim de que a finalidade possa ser viabilizada.

A causa eficiente diz respeito, por exemplo, àquela concepção de Aristóteles: "para que algo se mova precisa ser movido por 'alguma coisa' e essa 'alguma coisa' constituir-se-ia na causa eficiente do movimento da coisa que se move". Na concepção aristotélica, se essa 'alguma coisa' (que é a causa eficiente do movimento) cessar, então cessará o movimento, de acordo com a bem conhecida expressão cessante causa cessat effectus.

Na concepção moderna (Galileu, Descartes, Newton) da lei da persistência do movimento ou lei da inércia, o movimento em linha reta com velocidade constante (abstraídas todas as possíveis dissipações) não requer força (força newtoniana que, diga-se de passagem, nada tem a ver com a "força" aristotélica). Interpretando a força newtoniana como causa eficiente, diríamos que a lei de inércia assevera, embora idealmente, a existência de um movimento persistente 'ad aeternum' e 'ad infinitum' sem necessidade de causa eficiente.

No entanto, a questão pode ser vista de outro modo: a causa do movimento persistente é atribuída à linha reta. Um ente da geometria euclidiana (a linha reta) é a causa formal do movimento persistente.

Este ponto é da mais alta importância. Descartes8 8 Ver Parte II, cap. 39 do Principes de la Philosophie. mostrou, nos seus Principia Philosophiae, [17] que o movimento que persiste é aquele em linha reta e não aquele em movimento circular uniforme.

Reconstruindo racionalmente os argumentos de Descartes com base em termos não cartesianos como vetor e força centrípeta (força central) diríamos que embora a velocidade linear de uma pedra que gira segundo um movimento circular uniforme seja, em módulo, constante, a variação contínua de sua direção ao longo do tempo implica que a velocidade vetorial seja variável no tempo, e que, portanto, isso implica numa aceleração e, por conseguinte numa força (central ou, equivalentemente, centrípeta). Essa força é a causa eficiente que faz com que a pedra se desvie continuamente de sua tendência (ou propensão) de persistir em linha reta. Se o cordão que liga a pedra ao centro da circunferência correspondente for queimado (por uma chama, por exemplo), remover-se-á a causa eficiente do movimento circular uniforme e, conseqüentemente, a pedra escapará segundo alguma tangente à circunferência correspondente à trajetória circular de antes, em movimento persistente em linha reta. Aí a força newtoniana é, idealmente, nula e não há mais causa eficiente do movimento, segundo essa nossa interpretação. Haverá, no entanto, uma causa formal. Um ente matemático, pertencente à geometria euclidiana - a linha reta - é a causa formal do movimento persistente.

A complexidade crescente da física ensejou, e cada vez enseja mais, uma grande importância atribuída à causa formal. Trata-se aqui, a bem da verdade, de um uso pessoal nosso do termo aristotélico o qual não é utilizado habitualmente pelos físicos. Por exemplo, a homogeneidade do espaço é causa formal da lei de conservação do momento linear, a uniformidade do tempo é causa formal da conservação da energia e a isotropia do espaço é a causa formal da conservação do momento angular. Em suma, as propriedades geométricas do espaço e do tempo são causas formais das leis de conservação.

Em física de partículas as causas formais são muito requeridas como princípios explicativos: por exemplo, quebras espontâneas de simetria são causas formais de propriedades emergentes das partículas/ campos e de suas interações.

Deste modo, o conceito de causa em Aristóteles, dá margem a inúmeras interpretações, inclusive no que concerne à física contemporânea.

Outro exemplo que pode ser aduzido é no campo do eletromagnetismo. Se no conjunto das quatro equações de Maxwell estiver faltando o termo da corrente de deslocamento, então não obteremos as ondas eletromagnéticas que se propagam no vácuo com a velocidade da luz c = (ε0µ0)-1/2 onde ε0 e µ0 são, respectivamente, a permissividade elétrica e a suceptibilidade magnética no vácuo. Como a corrente de deslocamento decorre da conservação da carga, expressa pela bem conhecida equação da continuidade, então podemos dizer que a conservação da carga é causa formal da geração das ondas eletromagnéticas mesmo que no vácuo eletromagnético não haja nem cargas nem correntes, existindo apenas campos/ondas. Isso, no entanto, não significa dizer que essa seja a causa formal única. A lei de Faraday também pode ser aduzida como uma causa formal que junto com a lei de Ampère-Maxwell são imprescindíveis para que obtenhamos as ondas eletromagnéticas. Convém lembrar que, no quadro das equações de Maxwell, as leis de Faraday e de Ampère-Maxwell são as duas que contém explicitamente variações temporais. Evidentemente, os cálculos ainda requerem as outras duas equações de Maxwell que são respectivamente, a lei de Gauss para o campo elétrico e a lei de Gauss para o campo magnético.

O que foi exposto até então nos permite fazer uma inferência (pelo menos provisória) de que o conceito de Causalidade em Aristóteles, é mais abrangente que o conceito de Determinismo. Mas de determinismo falaremos um pouco mais adiante.

3. O princípio da causalidade em Leibniz

Agora vejamos outro autor importante: Leibniz.9 9 "O grande fundamento dos matemáticos é o princípio da contradicão ou da identidade, isto é que, que um enunciado não poderia ser falso e verdadeiro ao mesmo tempo e que assim A é A, e não poderia ser não-A. E esse único princípio basta para demonstrar toda aritmética e toda a geometria, ou seja, todos os princípios matemáticos. Mas, se desejamos passar da matemática à física, precisamos de um outro princípio ainda, como observei na minha Teodicéia, quer dizer o princípio da razão suficiente: que nada acontece sem que haja uma razão por que isso seja assim antes do que de outro modo" [13, p. 237]. O princípio da razão suficiente de Leibniz segundo o qual nada existe sem que haja uma razão suficiente pela qual isso deva ser assim e não de qualquer outro modo é no fundo um princípio de causalidade. Razão aí, neste contexto, significa Causa.

Acreditamos que o princípio da razão suficiente de Leibniz englobe as quatro causas de Aristóteles em alguns sentidos, mas possivelmente, não em todos. É importante, no entanto, ressaltar que em Leibniz tratamos de causas necessárias e não de causas contingentes. Assim o mármore não pode ser uma causa material necessária de uma estátua simplesmente porque ela poderia ser concebida a partir de outro material como, por exemplo, a pedra-sabão, substância, aliás, com a qual as estátuas de Aleijadinho foram esculpidas.

Leibniz [18] contrapôs-se à tese da indução elegendo as verdades necessárias que não dependem das experiências nem das observações dos sentidos as quais, podemos também interpretar como causas necessárias. Ele escreveu nos seus Novos Ensaios sobre o Entendimento:

A demonstração originária das verdades necessárias vem exclusivamente do entendimento, ao passo em que as demais verdades procedem das experiências ou das observações dos sentidos. O nosso espírito é capaz de conhecer umas e outras, mas é a fonte das primeiras; e qualquer que seja o número de experiências particulares que possamos ter de uma verdade universal, não podemos ter certeza delas pela indução, sem conhecer pela razão a sua necessidade. [18, p. 32]

Leibniz deu ao princípio da causalidade uma importância decisiva quando propôs o conceito de vis viva, em contraposição ao conceito cartesiano de quantidade de movimento, como a verdadeira "força" que causa os efeitos. No seu Essay de Dynamique ele asseverou [19] que "o efeito inteiro é igual à sua causa total" ("l'effet entier est ègal à sa cause totale").

4. As críticas de Hume e de Russell à causalidade

Embora inserido numa tradição empirista, David Hume debruçou-se sobre uma penetrante análise crítica em relação às conseqüências da tese empirista. Isto o levou ao ceticismo. Como a crítica da causalidade constitui-se em elemento central dessa análise, traremos à tona aqui e de maneira breve o raciocínio de Hume. Trata-se de um episódio importante da história da filosofia.

Hume argumentou que se alguém dotado das mais poderosas faculdades racionais tiver observado uma contínua sucessão de objetos, e um evento seguindo o outro, mas que não seja capaz de descobrir nada além disso, então essa pessoa não poderá por raciocínio concluir que um seja a causa e o outro seja o efeito.10 10 Ver, a propósito, a seguinte citacão original: "Suppose a person, though endowed with strongest faculties of reason and reflection, to be brought on a sudden into this world; he would, indeed, immediately observe a continual succession of objects, and one event following another; but he would not be able to discover anything farther. He would not, at first, by any reasoning, be able to reach the idea of cause and effect;... " [15, p. 370]. ,11 11 A traducão para o português da citacão disposta na nota precedente é: "Suponhamos que um homem, dotado das mais poderosas faculdades racionais seja repentinamente transportado para este mundo; certamente, notaria de imediato a existência de uma contínua sucessão de objetos e um evento acompanhado por outro, mas seria incapaz de descobrir algo a mais. De início, não seria capaz, mediante nenhum raciocínio, de chegar à idéia de causa e efeito,..." [14, p. 86].

Como o próprio Hume assevera "esta conjunção pode ser arbitrária e acidental. Não há base racional para inferir a existência de um pelo aparecimento do outro" [14, p. 86].

Mais adiante ele conclui que "este princípio é o costume ou o hábito [...] portanto todas as inferências tiradas da experiência são efeitos do costume e não do raciocínio" [14, p. 86].

Como bem observou Russell [20], "o ceticismo de Hume se baseia inteiramente sobre a recusa do princípio da indução".12 12 "Lo scetticismo di Hume si basa interamente sul rifiuto del principio di induzione" [20, p. 646]. O impasse emerge quando o princípio da indução é aplicado à causalidade. Em termos lógicos, tão ao gosto de Bertrand Russell, o problema epistemológico de Hume pode ser colocado como veremos a seguir.

Se o princípio da indução for verdadeiro, então as inferências causais são verdadeiras, diferentemente do que considerava Hume que as atribuía meramente ao costume, ou seja, ao hábito. Por outro lado, se o princípio da indução não for verdadeiro, então quaisquer inferências no sentido de se obter leis científicas gerais a partir de observações particulares é simplesmente ilusória. Donde se conclui que qualquer insistência em manter que essas inferências sejam devidas apenas ao hábito e ao costume, mas não à causa, também destrói o próprio princípio da indução que é a base da filosofia empirista.

Russell assevera que "o surgimento da irracionalidade no século XIX e em boa parte do século XX são conseqüência da destruição do empirismo por Hume".13 13 "Il sorgere dell'irrazionalismo nel corso del XIX secolo, e quel tanto che ne è passato nel XX, sono uma naturale conseguenza della distruzione dell'empirismo effettuata da Hume" [20, p. 645].

É de grande valia mencionar que o próprio Russell [9] argumentou em 1913 que o conceito de causa não desempenha qualquer papel importante no contexto das ciências maduras como a física do século XX, justificando-se apenas no contexto da infância da ciência e na vida cotidiana. Há quem acate a posição de Russell apenas parcialmente. Por exemplo, Gillies [21] mantém a mesma posição de Russell no que diz respeito à física, mas discorda veementemente dele no que diz respeito à totalidade das ciências maduras. No caso da medicina, por exemplo, Gillies argumenta que as leis causais são de decisiva importância.

Ressaltamos aqui que não acompanhamos Russell quanto à causalidade. Não apenas achamos que a causalidade é fundamental na medicina e na vida cotidiana, como também na própria física moderna. Para tal, é suficiente analisar o conceito de causa na sua abrangência. Como argumentaremos no curso do presente trabalho, na teoria do caos o conceito de causa desempenha papel central que não se confunde nem com determinismo nem com capacidade de fazer previsões. Ademais no próprio curso do desenvolvimento da teoria quântica, o conceito de causa embora enormemente controverso, como demonstra o complexo e sempre recorrente debate Einstein-Bohr, revelou seus pontos altos como nos experimentos de Böthe-Geiger que revelaram correlações causais rigorosas entre eventos quânticos singulares.

5. O determinismo de Laplace

O conceito de determinismo mais conhecido é aquele de Laplace. Mas, antes de falar no determinismo laplaciano tomemos um exemplo mais modesto. Se conhecermos a equação diferencial que rege o movimento do sistema examinado e obtivermos a solução geral exata dessa equação, então conheceremos a família de todas as infinitas curvas que compõem o universo de possibilidades. Se, além disso, conhecermos as condições iniciais (para um tempo t = 0) que caracteriza o sistema no instante t = 0, então a família de infinitas curvas dará lugar a apenas uma única curva onde tudo é conhecido. Desta maneira, tanto a evolução ulterior (para t > 0), além de determinada, é previsível com uma precisão, em princípio, tão grande quanto se queira, quanto o é também a evolução pregressa (para t < 0).

A generalização hiperbólica disso é que se conhecermos todas as interações de tudo o que compõe o universo, as equações, suas soluções e todas as condições iniciais, então teríamos condições de determinar e prever, com uma precisão, em princípio tão grande quanto queiramos toda a evolução do mundo para qualquer valor do tempo. Bela quimera!

Reparemos que o determinismo laplaciano assim concebido requer o conceito de previsibilidade. Num enunciado mais compacto seria dizer que o determinismo assevera grosso modo que o conhecimento total do presente (incluindo suas leis e as condições iniciais) implica no conhecimento do futuro. Aí temos um determinismo gnosiológico ou epistemológico, ou ainda, um determinismo cognitivo posto que, aí há uma referência explícita ao conhecimento, se bem que o sujeito, e ainda com maior razão a subjetividade, não entre nas equações e em nada que seja fundamental desta concepção. Trata-se apenas de algo circunstancial e meramente lingüístico. Trata-se também, por assim dizermos, de um "sujeito objetivo".

Reparemos que esse mesmo determinismo laplaciano pode, por meio de um jogo lingüístico, ser deslocado de determinismo gnosiológico (ou epistemológico) para determinismo ontológico (ou seja, um determinismo cuja natureza é o próprio ser, e não o conhecimento de algum "sujeito objetivo").

Isso tem lugar se enunciarmos o determinismo laplaciano da maneira a seguir.

Vejamos o enunciado ontológico do determinismo laplaciano:

Enunciado ontológico do determinismo laplaciano:Seja um sistema S cuja solução que descreve objetivamente seu movimento é a família de infinitas curvas {C}. A postulação de números que especifiquem as condições iniciais do sistema S, para t = 0, implica na redução das infinitas curvas a apenas uma delas. Essa curva descreve a evolução do sistema de maneira unívoca tanto para t > 0 quanto para t < 0.

Nesse enunciado não se fala de conhecimento disso ou daquilo e assim temos um determinismo laplaciano interpretado como determinismo ontológico, isto é, um determinismo decorrente da própria natureza do ser.

A título de comparação, vejamos o enunciado epistemológico (ou gnosiológico) do determinismo laplaciano:

Enunciado epistemológico (ou gnosiológico ou cognitivo) do determinismo laplaciano:Seja um sistema S cuja solução que descreve objetivamente seu movimento é a família de infinitas curvas {C}. Se conhecermos as condições iniciais do sistema S, para t = 0, então isso implica na redução das infinitas curvas a apenas uma delas. Essa curva nos possibilita conhecer a evolução do sistema de maneira unívoca tanto para t > 0 quanto t < 0.

Como podemos constatar a primeira frase em ambos os enunciados acima é exatamente a mesma. No que concerne à segunda frase, enquanto no enunciado ontológico faz-se referência à "postulação de números que especifiquem as condições iniciais do sistema S, para t = 0", no enunciado epistemológico (ou gnosiológico) faz-se referência à possibilidade de conhecimento: "se conhecermos as condições iniciais do sistema S, para t = 0, então..." Em outras palavras, enquanto no enunciado ontológico a responsabilidade é imputada objetivamente ao sistema e à sua evolução e, portanto, à própria natureza do ser examinado, e sem contaminações espúrias de um eventual "sujeito" que "observa", no enunciado epistemológico, por outro lado, essa responsabilidade é imputada à possibilidade de conhecimento do sujeito. Bem entendido, essa possibilidade de conhecimento do sujeito é mais um jogo lingüístico pela simples razão do sujeito não interferir em coisa alguma acerca da objetividade: nem do sistema nem de sua evolução.

Poder-se-ia argumentar que essa diferença entre determinismo epistemológico (ou gnosiológico) por um lado, e determinismo ontológico, por outro, não seria importante, pois se trata de algo decorrente de um mero jogo lingüístico e, portanto, de algo meramente incidental. No entanto, não consideramos que este ponto seja completamente desprezível, pois temos que ficar atentos para não cairmos em armadilhas verbais. E para estar atentos a isto repararemos que no enunciado epistemológico falaremos da capacidade de prever e da capacidade de se conhecer enquanto no enunciado ontológico nada disso é requerido. Fala-se, simplesmente, que dado S implica {C} e que números adicionais especificando as condições iniciais em t = 0 fazem reduzir a família de infinitas curvas possíveis para apenas uma delas onde a descrição é completa para qualquer t > 0 ou t < 0.

6. Interlúdio: alguns exemplos elucidativos

Seja o seguinte exemplo: um sistema de massa M que não está sujeito a qualquer força. A equação diferencial correspondente em uma dimensão é dada por

A solução geral desta equação diferencial, obtida por duas integrações sucessivas em relação ao tempo, é dada por

A e B são duas constantes arbitrárias. Para cada par (A, B) corresponde uma dada solução (2) no plano x versus t. Essas soluções (2) correspondem às infinitas retas possíveis de serem traçadas no plano cartesiano x versus t. A constante A é o espaço inicial também chamado de x0 e a constante B é a velocidade v. Deste modo podemos optar por esta notação e escrever a solução geral (2) na forma

Quando se escolhe um dado par (A, B) ou, alternativamente (x0, v) dentre a infinidade de retas possíveis, então aí se escolhe de maneira unívoca uma solução, ou seja, uma única trajetória para a qual toda a evolução é dada para qualquer que seja o t (seja t > 0, seja t < 0). É neste sentido que se interpreta o determinismo laplaciano: dada a lei que constitui a solução (2) ou (3) da equação diferencial de movimento (1) e dadas as condições iniciais para t = 0, então tudo está determinado.

Seja outro exemplo também, por simplicidade, unidimensional: um sistema de massa M sujeito a uma força restauradora do tipo F = -kx. A equação diferencial correspondente será

Se nos ativermos ao fato de que a força restauradora é de natureza central (centrípeta), isto é, que

e se, além disso, nos ativermos à definição

então das Eqs. (5) e (6) obtemos

Deste modo, a Eq. (4) pode ser reescrita como

A solução da equação diferencial (8) (ou (4)) é dada por

A solução dada pela Eq. (9) expressa, através dos infinitos pares (C, δ) de constantes arbitrárias, as infinitas senóides que podem ser traçadas no plano x versus t. No entanto, a escolha de um desses pares, o que corresponde à escolha das condições iniciais da evolução do sistema, implica na determinação unívoca da evolução do sistema para qualquer tempo, seja para t > 0, seja para t < 0.

Mas se a distinção entre determinismo ontológico e determinismo gnosiológico for meramente um jogo lingüístico, então as armadilhas para as falácias já estariam presentes e assim precisamos ir mais adiante, pois o campo é um verdadeiro pântano de sutilezas. Pode aparecer alguém que contra-argumente e diga que a idéia da 'descrição completa' que se encontra implícita no enunciado ontológico seria equivalente à idéia de 'conhecimento de toda a evolução para t > 0 e para t < 0' e assim, passa-se da interpretação ontológica para a gnosiológica (ou epistemológica) por um mero jogo de palavras, ou seja, um jogo verbal.

Para superar esse impasse pensamos que a questão central seja a seguinte:

- Até que ponto determinismo requer previsibilidade?

Ou, em outras palavras,

- Determinismo independe ou não de previsibilidade?

A questão reside no fato de que o termo previsibilidade remete necessariamente para a capacidade de prever, ou seja, para uma questão da capacidade de conhecer, logo uma questão gnosiológica (ou epistemológica).

Com o fito de esclarecer algumas dificuldades, analisemos agora um problema um pouco mais complexo. Vamos nos ater à teoria do caos.

7. Sobre a teoria do caos

Seja a equação logística (ver Ref. [22]),

Aqui, λ é um parâmetro, t assume valores tais que t = 0, 1, 2, 3,..., e a quantidade Xt + 1 da geração (t + 1)-ésima é obtida a partir da quantidade Xt da geração t-ésima. Assim se o t inicial enumerado por t = 0 for dado desde o início, podemos determinar o valor de Xt para qualquer geração (ou iteração) enumerada por t, onde λ é um parâmetro também dado desde o início. Os valores Xt aqui considerados são aqueles que possam assumir valores ente 0 e 1 e λ é um parâmetro compreendido ente os valores 0 e 4.

Assim, a partir da geração 0-ésima obteremos para a primeira geração

Para a segunda geração teremos X2 = λ X1 (1 - X1). Se substituirmos a Eq. (11) nesta última, teremos

Repare que potências maiores de λ passam a aparecer. Para a terceira geração, X3 = λX2 (1 - X2) a substituição da Eq. (12) nesta última nos levará a potências de λ ainda maiores e assim sucessivamente temos um problema crescentemente não-linear e tanto mais não-linear em λ quanto maior for a geração (ou iteração) calculada. Em poucas gerações a expressão fica tão grande que não é exeqüível mais escrevê-la e para coisas do gênero é que os computadores funcionam maravilhosamente bem.

Agora coloquemos tudo isso em um computador e deixemos os cálculos se processarem.

Três regimes são possíveis a depender do valor que se atribua ao parâmetro λ. Eles são, respectivamente, ponto fixo, bifurcação e caos.

Para valores de λ pequenos, e numa certa faixa, teremos o domínio de ponto fixo, isto é, o valor de Xt tenderá para um limite fixo e assim permanecerá para quaisquer iterações ulteriores. É o regime de ponto fixo.

Para valores de λ maiores e situados num certo domínio haverá, em iterações sucessivas, uma oscilação entre dois dados valores de X. Para valores de λ gradativamente maiores, os valores obtidos para os Xt subseqüentes oscilarão entre 4 valores; para valores de λ ainda maiores haverá um oscilação entre 8, 16, 32,... valores e assim sucessivamente. É o regime das sucessivas bifurcações e duplicações de período.

Para valores de λ ainda maiores haverá o regime de caos, ou seja, a total incapacidade de previsibilidade. Isso pode ser facilmente compreendido do seguinte modo.

Tomemos a equação logística (10) e escolhamos um valor X0 com uma dada precisão bastante grande. Trabalhemos em regime de caos isso é com um valor de λ suficiente alto e deixemos o computador calcular até nos fornecer um valor Xt para uma geração de ordem muito alta, isto é para t >> 1. Escolhamos também outro valor inicial (X0)' com uma precisão igualmente grande e somente diferindo do outro valor inicial X0 na última casa decimal. Trabalharemos também em regime de caos e com o mesmo valor do parâmetro λ. Procedendo desta maneira, a partir do valor inicial (X0)' obteremos para a geração de ordem muito alta t, o correspondente valor (Xt)'.

Para fixar as idéias os dois valores iniciais podem ser

X0 = 0,0000000001 (X0)' = 0,0000000002

Uma vez introduzido tudo isso no computador obteremos um (Xt) correspondente se começarmos com o valor X0 e um (Xt)' correspondente se começarmos com (X0)'. Agora comparemos (Xt) com o valor (Xt)'. Tudo isso calculado com esse valor alto de λ chegamos à conclusão de que é impossível qualquer inferência de (Xt)' a partir de (Xt) e vice-versa, pois a precisão foi totalmente contaminada pela alta não-linearidade em λ.

Um exemplo pictórico nos ajuda a entender isso mais intuitivamente. Suponhamos que coloquemos duas minúsculas bolinhas de isopor no turbilhão das quedas das cataratas de Iguaçú. Para tempos pequenos podemos até prever a posição de uma bolinha a partir dos valores da outra. No entanto, a posição de qualquer uma delas a partir da outra será impossível, mesmo em princípio, pois a precisão inicial, que era grande, foi totalmente contaminada. Logo, no regime de caos, a imprevisibilidade é um dado de princípio para qualquer que seja o grau finito de precisão das condições iniciais. É por isso que muitas pessoas caracterizam o caos pela altíssima sensibilidade em relação às condições iniciais.

Logo, em regime de caos o determinismo laplaciano é uma quimera. Poincaré, no começo do século XX (ele morreu em 1912) já havia notado algo semelhante no contexto do problema de 3 corpos. A altíssima sensibilidade das condições iniciais, condições iniciais essas que quando infinitesimalmente diferentes entre si, davam lugar a soluções e cenários enormemente distintos. Hadamard também chegou a resultados semelhantes.

Mas agora vejamos se o caos é determinista ou indeterminista.

Ora, se definirmos determinismo como capacidade de prever e já que é impossível prever, em regime de caos, o valor (Xt)' a partir de um valor ligeiramente modificado da condição inicial (X0)' que é dada por (X0), então o caos seria caracterizado por um indeterminismo gnosiológico ou, alternativamente, por um indeterminismo epistemológico, posto que indeterminismo é aí identificado como incapacidade, por princípio, de prever. Logo se trata, caso nos ativermos a essa interpretação, de uma incapacidade cognitiva, ou ainda, de uma incapacidade epistemológica.

No entanto, os autores que trabalham com o caos o chamam de caos determinista e deste modo vêem o problema sob outro ângulo. Esse caos seria chamado de determinista porque o valor de X0determina o valor de Xt em qualquer ordem de iteração. Deste modo, o caos determinista seria determinista em um sentido ontológico. Como o assim chamado caos determinista envolve imprevisibilidade, então aí os conceitos de determinismo e de previsibilidade são claramente diferenciados.

Logo, concluímos que um determinismo ontológico, que distingue determinismo de previsibilidade, também pode ser considerado como indeterminismo gnosiológico se optarmos por definir determinismo como capacidade de fazer previsões.

Aí perguntamos: - Seria tudo isso resultante de um mero jogo lingüístico, ou de uma falácia, ou de um sofisma ou é, realmente, algo mais profundo e substancial?

Vemos, portanto, que podemos passar de indeterminismo gnosiológico para um determinismo ontológico caso definamos ou não, determinismo como capacidade de fazer previsões.

Agora vamos trazer à baila o conceito de Causalidade que, como veremos, é mais profundo que os conceitos de determinismo e de previsibilidade.

Ora, em quaisquer dos três regimes (ponto fixo, bifurcação e caos) a Causa é perfeitamente definida: o valor de λ é Causa dos três regimes e isso sem qualquer ambigüidade. Num intervalo de valores, λ é Causa do ponto fixo; em outro intervalo de valores, λ é Causa do regime de bifurcação e duplicação dos períodos; em outro intervalo de valores λ é Causa do Caos e Causa da Imprevisibilidade.

Isso nos parece muito importante porque Causa, neste contexto, não é refém da 'capacidade de fazer previsões' pois mesmo em um regime no qual é impossível fazê-las (o Caos), a Causa, sem qualquer ambigüidade, é dada pelo alto valor de λ e pela alta não-linearidade gerada por ele.

Além disso, Causa, neste contexto, paira acima tanto do determinismo ontológico quanto do indeterminismo gnosiológico ou epistemológico, se quisermos.

Além disso, o princípio da razão suficiente de Leibniz nos parece integralmente preservado. Ainda que, por princípio, não sejamos capazes de prever algo, não significa que não haja uma causa dessa imprevisibilidade. Encontramos um exemplo bastante claro onde a causa da imprevisibilidade é o alto valor de λ associado a sua alta não-linearidade. Logo, mesmo que não sejamos capazes de prever alguma coisa, a imprevisibilidade dessa alguma coisa está sujeita a uma causa necessária no sentido em que `nada existe sem que haja uma razão (causa) para que isso seja assim e não de qualquer outro modo'.

Cremos que aqui chegamos a uma importante diferença entre Causalidade e Determinismo, em um contexto clássico, isto é, não quântico. De fato no contexto quântico, as armadilhas são ainda maiores.

A figura do "crítico obsessivo" se preferirmos assim denotar, pode não se dar por satisfeita e contra-argumentar que se o alto valor do parâmetro λ ao qual atribuímos como sendo a causa da imprevisibilidade for chamado de fator determinante da imprevisibilidade, então distinguir causalidade de determinismo seria inútil e supérfluo. Podemos responder que as palavras podem assumir vários significados e acepções e trocá-los ao bel prazer e ao sabor das circunstâncias não significa aprofundar problemas reais. Assim procedendo, a discussão além de supérflua torna-se inócua e eternamente recorrente, não pela sua real complexidade, e sim pelos seus múltiplos mal-entendidos. O que queremos é discutir problemas reais e não cair em jogos verbais que não levam a nada.

A nossa argumentação segundo a qual o conceito de causalidade é mais abrangente do que o de determinismo não deve estar sujeita a jogos verbais.

8. Dois conceitos importantes: estabilidade e instabilidade

Retomemos a discussão realizada nas seções 5, 6 e 7. Como vimos, no caso da solução geral da equação diferencial de movimento da partícula livre, temos uma família de infinitas retas no plano (x, t); quando se define as condições iniciais para um tempo t = 0, então teremos um único par (x0, v) que define, por sua vez, uma reta que é a solução específica do problema e que acarreta uma evolução determinista para quaisquer tempos, tanto aqueles para os quais t < 0 quanto aqueles para os quais t > 0.

Da mesma forma, para o oscilador harmônico simples a solução geral correspondente constitui-se numa família de infinitas curvas senoidais no plano (x, t); quando se define as condições iniciais para um tempo t = 0, então teremos um único par (C, δ) que define a senoide que é a solução específica do problema e que acarreta, tal como no exemplo anterior, uma evolução determinista para quaisquer valores de tempo, tanto t < 0 tanto t > 0.

Ademais, podemos asseverar que as soluções são estáveis, para ambos os casos acima. Mas aqui é importante definir o significado dessa estabilidade. Essa estabilidade tem o seguinte significado: se for definido um par (img01, v*), cujo valor img01 é muito próximo do valor de x0,em um dado grau de precisão suficientemente alto, e o valor v* é muito próximo do valor v, também em um grau de precisão suficientemente alto, então podemos dizer que as duas retas correspondentes serão suficientemente próximas de tal modo a permitir, dentro dessa precisão, prever a evolução de uma delas a partir da evolução da outra para quaisquer tempos t < 0 e t > 0.

Evidentemente, o mesmo acontece para o caso do oscilador harmônico simples: se for definido um par (C*, δ*), cujo valor de C* é muito próximo do valor de C, em um dado grau de precisão suficientemente alto, e o valor de δ* é muito próximo do valor de δ, também em um grau de precisão suficientemente alto, então podemos asseverar que as duas senoides serão suficientemente próximas de tal maneira a permitir, dentro dessa aproximação, prever a evolução de uma delas a partir da evolução da outra para quaisquer que sejam os tempos t < 0 e t > 0.

Podemos ainda dizer isso em outras palavras. Sejam, por exemplo, as duas retas bem próximas do caso da partícula livre. Se uma delas for considerada o "erro" da outra naquela precisão, então é sempre possível prever qualquer uma delas a partir da outra dentro dessa precisão. Alternativamente dito, o "erro" não se amplia nem contamina a precisão inicial. O mesmo tem lugar no caso do oscilador harmônico simples onde temos duas senoides suficientemente próximas em um dado grau de precisão.

No caso de soluções estáveis não há uma sensibilidade às condições iniciais que nos preocupe, pois o "erro" pequeno do início permanece pequeno e, deste modo as previsões são possíveis dentro desse "erro".

No caso das soluções instáveis a situação muda radicalmente de figura. É justamente a altíssima sensibilidade às condições iniciais que faz como que esse "erro" se amplie. Vejamos no caso da equação logística da teoria do caos. As sucessivas iterações vão acarretar cada vez mais um aumento da não-linearidade de λ, fato esse que acarreta a total contaminação da precisão inicial, independentemente de tão grande tenha sido a precisão dessas condições iniciais. Essa alta sensibilidade às condições iniciais já tinha sido estudada por Poincaré no caso do problema de três corpos. Mais recentemente, este importantíssimo resultado vem sendo realçado em vários contextos e também as suas conseqüências epistemológicas vem sendo enfatizadas.

9. Discussão complementar

Como podemos ver, nem mesmo a física clássica respalda a tese do determinismo como tantos cientistas em tempos pregressos, mas nem tão distantes, pensavam que ela respaldaria. De fato houve quem pensasse de outro modo como nos revelam as teorias não quânticas estudadas por Poincaré, por Hadamard e pelos físicos e matemáticos da Escola Russa. De fato, eles mostraram há bastante tempo como a alta sensibilidade às condições iniciais implica diretamente numa inerente incapacidade de prever, independentemente mesmo do grau de precisão das mesmas. Mais recentemente, com a teoria do caos, muita coisa a mais foi esclarecida a este respeito.

Se a tese do determinismo já não encontra conforto no próprio contexto clássico, diríamos então que, com o advento da teoria quântica, elementos novos e mais complexos colocaram em dificuldade ainda maior a tese determinista. É bem verdade que as idéias causais conectadas às leis de conservação constituem sólido patrimônio, mas o próprio determinismo se vê em séria dificuldade ao se eleger a probabilidade como princípio explicativo irredutível, enquanto propensões reais e objetivas e que constituem em interpretação objetiva da probabilidade, e não como algo meramente presente na mente de alguém ou expressando uma suposta ignorância do sujeito.

Einstein, [23] que era um realista e um racionalista, recusou uma interpretação subjetiva da probabilidade e, deste modo pensando em preservar a boa tradição realista e racionalista evitou incorporar as probabilidades subjetivas. Assim, - estranhamente para alguns-, preferiu ele apostar numa adoção determinista. A sua famosa frase14 14 "We become Antipodean in our scientific expectations. You believe in the God who plays dice, and I in complete law in order in a world which objectively exists, and which I, in a wildly speculative way, am trying to capture" (Einstein). (Disponível no endereco http://www.encyclopedia.com/doc/1G1-158156466.html; ver também a Ref. [23]). escrita numa carta a Max Born segundo a qual Deus não joga dados era a expressão deste ponto de vista.

No entanto, Popper que também era um realista e racionalista, mas não um determinista, considerou que é possível uma interpretação não-subjetiva da probabilidade enquanto propensões. Numa certa ocasião em que Popper e Einstein se encontraram, Popper tentou demover seu ilustre interlocutor de suas amarras deterministas chegando mesmo a chamar Einstein de 'meu caro Parmênides' pela insistência de Einstein em uma concepção de mundo baseado num bloco tetradimensional já dado de antemão e incompatível com um universo em evolução, ou ainda, incompatível com um mundo aberto e pleno de propensões. Mas Popper não conseguiu convencer Einstein de que a adoção indeterminista é compatível com as adoções realista e racionalista.

No contexto da mecânica quântica, o problema do indeterminismo é sobremaneira complexo. Há diversos aspectos dessa complexidade. Um desses aspectos constitui-se na estranha combinação entre a evolução determinista das soluções da equação de Schrödinger e a irreversibilidade e indeterminismo introduzidos pelo colapso da função de onda. Há ainda muitos outros que não serão aqui considerados.

Outro assunto importante, mas que não será objeto de abordagem do presente trabalho é o debate Einstein-Bohr sobre o problema da causalidade. Para uma discussão didática remetemos o leitor a [24].

Passemos agora a tecer algumas considerações sobre o papel das instabilidades no contexto das novas tendências para o desenvolvimento da ciência. Neste contexto Ilya Prigogine desempenhou um papel muito importante. Ao reconhecer o grande sucesso de extraordinários desenvolvimentos como a mecânica clássica e a mecânica quântica ele deu ênfase ao fato dessas ilustres disciplinas terem sido engendradas no contexto de uma física do ser (physics of being). Argumenta ele que outra maneira de ver a natureza deveria ser explorada quanto às suas imensas possibilidades. Trata-se de uma física do devir (physics of becoming).

Para Prigogine [25-28], as tradições em que estão inseridas tanto a física clássica quanto a física quântica são tais que podem ser chamadas de física do ser (physics of being). Isso porque esses enormemente bem sucedidos produtos do espírito humano privilegiam situações de estados de movimento, estados estacionários de energia, situações de equilíbrio, ou seja, longe de turbilhões, instabilidades, etc. Mesmo a termodinâmica habitual que contém explicitamente um elemento de devir que é a irreversibilidade e com essa o conceito de entropia, ainda assim privilegia situações de equilíbrio e de processos que são tratados como uma evolução adiabática de cada estado quase estacionário para o seguinte.

Para Prigogine é necessário procurar situações mais reais do que essas idealizadas e aproximar a física dos processos reais fora do equilíbrio, pois nas situações distantes do equilíbrio os sistemas físicos adquirem qualidades emergentes e evoluem para cenários novos que seriam impossíveis de serem estudados se nos ativéssemos apenas à física do Ser. Trata-se, portanto, de uma física do devir (physics of becoming), aquela dos fenômenos complexos. Prigogine dá ênfase toda especial às instabilidades, às bifurcações, às ressonâncias de Poincaré, aos efeitos cooperativos dos sistemas complexos e que tudo isso tem conseqüências tanto para sistemas clássicos quantos para sistemas quânticos reais.

Ressaltamos que causalidade, determinismo, previsibilidade e seus antitéticos correspondentes, não-causalidade, indeterminismo e imprevisibilidade devem ser vistos também neste contexto.

É perfeitamente compatível com o realismo e o racionalismo admitir um mundo indeterminista, aberto a vários cenários de possibilidades que constituem propensões reais.

Acreditamos, portanto, que seja possível conceber um mundo quântico causal e indeterminista no qual vigem as propensões de Popper [29, 30].

Aqui encerramos esta breve discussão complementar.

10. Discussão final e conclusões

O que podemos concluir desta discussão? Em primeiro lugar, podemos asseverar que o conceito de causalidade é muito mais abrangente que o conceito de determinismo. Lembremos que a alta sensibilidade às condições iniciais é causa de imprevisibilidade para valores grandes de λ a partir de um dado valor, mas essa alta sensibilidade às condições iniciais não se manifesta no caso em que o valor de λ for pequeno. Logo é o alto valor de λ que implica em que a alta não-linearidade acarrete a impossibilidade de previsão. Logo o alto valor de λ é, sem qualquer ambigüidade, causa da imprevisibilidade. No caso de pequenos valores de λ essa não-linearidade não acarreta em qualquer impossibilidade de previsão.

Se aceitarmos, em conformidade com o que foi consagrado na literatura do campo, que este seja chamado de caos determinista, no sentido estrito em que a geração t determina univocamente a geração t + 1, então fica claro que neste contexto determinismo e previsibilidade são coisas distintas. Ademais, causa não implica necessariamente em capacidade de prever. A teoria do caos nos instrui de maneira espetacular que podemos identificar qual seja a causa de nossa incapacidade de prever, ou dito em outras palavras, podemos identificar qual seja a causa da imprevisibilidade.

Se, por outro lado, aceitarmos, em conformidade com a formulação popperiana de determinismo "científico", reproduzida na introdução deste artigo, segundo a qual determinismo e capacidade de prever estejam de alguma maneira, conectadas, então fica claro que nem causalidade se reduz à capacidade de prever e nem causalidade se reduz a determinismo.

Agradecimentos

Queremos manifestar nossos agradecimentos ao Prof. Dr. José Maria Filardo Bassalo do Departamento de Física da Universidade Federal do Pará pelas interlocuções que foram essenciais para que este trabalho fosse escrito. Agradecemos também aos árbitros pelas críticas e sugestões.

Recebido em 31/10/2007; Revisado em 14/2/2008; Aceito em 12/6/2008; Publicado em 2/8/2008

  • [1] M. Bunge, Causality (Harvard University Press, Cambridge, 1959).
  • [2] M. Bunge, Epistemologia (T.A. Queiroz Editor, São Paulo, 1980), ver em especial o cap. 6, p. 73-83.
  • [3] E. Cassirer, Determinism and Indeterminism in Modern Physics (Yale UP, New Haven, 1956).
  • [4] E. Nagel, The Structure of Science (Problems in Logic and Scientific Explanation) (Hackett Publishing Company, Cambridge, 1979), ver em especial o cap. 10, p. 277-335.
  • [5] H. Margenau, La Naturaleza de la Realidad Física (Una Filosofía de la Física Moderna) (Editorial Tecnos, Madrid, 1970).
  • [6] K.R. Popper, Sociedade Aberta, Universo Aberto (Entrevista conduzida por Franz Kreuzer) (Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1987).
  • [7] K.R. Popper, O Universo Aberto (Argumentos a Favor do Indeterminismo), 2ş v. do Pós-Escrito à Lógica da Descoberta Científica (Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1988).
  • [8] K.R. Popper, A World of Propensities (Thoemmes, Bristol, 1990).
  • [9] B. Russell, On the Notion of Cause (reproduzido no livro Mysticism and Logic) (Routledge, Londres e Nova York, 1994), p. 173-199.
  • [10] C.S. Peirce, Conferências sobre Pragmatismo, Coleção Os Pensadores (Nova Cultural, São Paulo, 1989), v. Peirce/Frege.
  • [11] I. Kant, Crítica da Razão Prática (Edições de Ouro, Rio de Janeiro, 1970).
  • [12] Aristóteles, Obras (Aguilar, Madrid, 1964), Tradução do grego, estudo preliminar, preâmbulos e notas por Francisco de P. Samaranch.
  • [13] G.W. Leibniz, in Leibniz, Coleção Os Pensadores, (Nova Cultural, São Paulo, 1988), v. II.
  • [14] D. Hume, Investigação acerca do Entendimento Humano, Coleção Os Pensadores (Nova Cultural, São Paulo, 1989), v. Berkeley/Hume, p. 55-145.
  • [15] D. Hume, in The Speculative Philosophers, edited by Saxe Commins and Robert N. Linscott (Pocket Books, Inc., Nova York, 1954), p. 337-419.
  • [16] F. Dyson, Infinito em Todas as Direções (Do Gene à Conquista do Universo) (Editora Best Seller, São Paulo, 1988).
  • [17] R. Descartes, in Descartes; Oeuvres et Lettres, editado A. Bridoux (Bibliothèque de la Plêiade, Paris, 1952), p. 549-670.
  • [18] G.W. Leibniz, in: Leibniz, Coleção Os Pensadores (Nova Cultural, São Paulo, 1988), v. I.
  • [19] G.W. Leibniz, in Leibniz and Dynamics (The Texts of 1692), editado por Pierre Costabel (Hermann, Paris; Methuen, Londres; Cornell University Press, Ithaca), o texto completo de Essay de Dynamique está disponível, tanto em francês quanto em inglês, no Apêndice I deste livro.
  • [20] B. Russell, Storia della Filosofia Occidentale (Tea Due, Milão, 1993), 3Ş ed.
  • [21] D. Gillies, British Journal for the Philosophy of Science 56, 823 (2005).
  • [22] J. Gleick, Caos (A Criação de uma Nova Ciência) (Editora Campus, Rio de Janeiro, 1990).
  • [23] M. Born and A. Einstein, Born-Einstein Letters (1916-1955): Friendship, Politics and Physics in Uncertain Times (Macmillan, Nova York, 2005).
  • [24] J.B. Bastos Filho, Revista Brasileira de Ensino de Física 25, 125 (2003).
  • [25] I. Prigogine, From Being to Becoming (W.F. Freeman and Company, São Francisco 1980).
  • [26] I. Prigogine e I. Stengers, A Nova Aliança (A Metamorfose da Ciência), Editora da Universidade de Brasília, Brasília, 1984.
  • [27] I. Prigogine, O Nascimento do Tempo (Edições 70, Lisboa, 1990).
  • [28] I. Prigogine, O Fim das Certezas (Tempo, Caos e as Leis da Natureza) (Editora da Universidade Estadual Paulista, São Paulo, 1996).
  • [29] J.B. Bastos Filho e F. Selleri, Foundations of Physics 25, 701 (1995).
  • [30] J.B. Bastos Filho e F. Selleri, in Proceedings of the Conference Karl Popper Philosopher of Science, Cesena, 1994, editado por M. Alai e G. Tarozzi (Rubbettino Editore, Soveria Mannelli, 2006), p. 277-295.
  • 1
    E-mail:
    jennerbastos@gmail.com. Também Professor do Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente do Instituto de Geografia, Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Alagoas.
  • 2
    Este argumento é reiterado na Ref. [8, p. 7].
  • 3
    Popper conectou inducão, determinismo e mera repeticão, em contraposicão à não-inducão, ao indeterminismo e à bifurcacão que gera a criatividade e a novidade. Ele assim se manifestou: "Que é, então, indutivo? No essencial, a inducão diz que não há nada de novo. Se eu vi um milhão de cisnes brancos, posso estar certo de que todos os cisnes são brancos. Segundo a inducão, tudo é repeticão. (...) O cerne da não-inducão [é a bifurcacão]. Bifurcacão quer dizer que as coisas não continuam indefinidamente do mesmo modo. Ocorre algo de diferente, algo de novo. A inducão tenta dizer: Sempre foi e assim vai continuar a ser. O princípio da inducão de John Stuart Mill significa "The uniformity of nature", a uniformidade da natureza. O futuro será idêntico ao passado. Em contrapartida o princípio criativo diz: O futuro
    não será igual ao passado. (...) Claro que muitas vezes as mutacões não são nada de novo. Muitas vezes não fazem mais que repetir-se continuamente. Mas, em princípio, o novo resulta por mutacão. Há propensões, tendências para a realizacão. É isto que o determinismo não quer admitir. Segundo o determinismo, não há nada de novo debaixo do Sol. Ora eu digo:
    Há coisas novas debaixo do Sol. A inducão nega que exista algo de realmente novo. Segundo ela, o futuro será igual ao passado. O princípio da deducão, ou se quiser o princípio da criatividade é o princípio do não-determinismo que possibilita o aparecimento de coisas novas" [6, p. 60-61].
  • 4
    Em continuidade à nota anterior transparece com clareza uma diferenca importante entre as adocões respectivamente de Popper e de Charles Sanders Peirce. Na frase final de Popper disposta na nota de rodapé anterior há uma explícita associacão da deducão ao princípio criativo. No entanto, Peirce atribui este princípio criativo muito mais à abducão e aos insights criativos do que propriamente à deducão. A seguinte passagem é clara ao mostrar esta diferenca. Peirce escreveu: "Abducão é o processo para formar hipóteses explicativas. É a única operacão lógica a introduzir idéias novas; pois que a inducão não faz mais que determinar um valor, e a deducão envolve apenas as conseqüências necessárias de uma pura hipótese" [10, p. 14]. Logo, para Peirce, o processo criativo requer que se vá além da deducão, pois a criatividade exige que se vá além das conseqüências necessárias.
  • 5
    "Duas coisas me enchem o ânimo de crescente admiracão e respeito, veneracão sempre renovada quanto com mais freqüência e aplicacão delas se ocupa a reflexão:
    por sobre mim o céu estrelado; em mim a lei moral. Ambas essas coisas não tenho necessidade de buscá-las e simplesmente supô-las como se fossem envoltas de obscuridade ou se encontrassem no domínio do transcendente, fora do meu horizonte, vejo-as diante de mim, coadunando-as de imediato com a consciência de minha existência" [11, p. 253].
  • 6
    É importante ressaltar que não se deve dar excessiva importância à expressão "capacidade de prever" no sentido de imputar à mesma algo como uma propriedade precípua do "sujeito" e ainda com maior razão como algo subjetivo. Trata-se de uma forma de expressão. O mais importante da tese de Popper é que todos os acontecimentos passados juntamente com todas as leis da natureza não acarretam, por impossibilidade mesmo de princípio, o futuro. O passado já é dado e o futuro é essencialmente aberto. Por isso não se pode prever tudo.
  • 7
    Veja a Ref. [12],
    Metafísica, Livro I, cap. 3, p. 915-917; também na Ref. [12],
    Lógica-Analítica Posterior, Livro 2, cap. 11, p. 404-405.
  • 8
    Ver Parte II, cap. 39 do
    Principes de la Philosophie.
  • 9
    "O grande fundamento dos matemáticos é o princípio da contradicão ou da identidade, isto é que, que um enunciado não poderia ser falso e verdadeiro ao mesmo tempo e que assim A é A, e não poderia ser não-A. E esse único princípio basta para demonstrar toda aritmética e toda a geometria, ou seja, todos os princípios matemáticos. Mas, se desejamos passar da matemática à física, precisamos de um outro princípio ainda, como observei na minha
    Teodicéia, quer dizer o princípio da razão suficiente: que nada acontece sem que haja uma razão por que isso seja assim antes do que de outro modo" [13, p. 237].
  • 10
    Ver, a propósito, a seguinte citacão original: "Suppose a person, though endowed with strongest faculties of reason and reflection, to be brought on a sudden into this world; he would, indeed, immediately observe a continual succession of objects, and one event following another; but he would not be able to discover anything farther. He would not, at first, by any reasoning, be able to reach the idea of cause and effect;... " [15, p. 370].
  • 11
    A traducão para o português da citacão disposta na nota precedente é: "Suponhamos que um homem, dotado das mais poderosas faculdades racionais seja repentinamente transportado para este mundo; certamente, notaria de imediato a existência de uma contínua sucessão de objetos e um evento acompanhado por outro, mas seria incapaz de descobrir algo a mais. De início, não seria capaz, mediante nenhum raciocínio, de chegar à idéia de causa e efeito,..." [14, p. 86].
  • 12
    "Lo scetticismo di Hume si basa interamente sul rifiuto del principio di induzione" [20, p. 646].
  • 13
    "Il sorgere dell'irrazionalismo nel corso del XIX secolo, e quel tanto che ne è passato nel XX, sono uma naturale conseguenza della distruzione dell'empirismo effettuata da Hume" [20, p. 645].
  • 14
    "We become Antipodean in our scientific expectations. You believe in the God who plays dice, and I in complete law in order in a world which objectively exists, and which I, in a wildly speculative way, am trying to capture" (Einstein). (Disponível no endereco
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2008

    Histórico

    • Aceito
      12 Jun 2008
    • Revisado
      14 Fev 2008
    • Recebido
      31 Out 2007
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