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Sobre potenciais periódicos no reticulado cúbico simples

On periodic potentials on simple cubic lattice

Resumo

O presente texto trata-se de uma adaptação simples da caracterização via séries de Fourier de uma classe de potenciais periódicos para o reticulado cúbico simples, desenvolvida originalmente no reticulado colméia, tratando com rigor tanto as propriedades do tipo de potencial quanto as propriedades da natureza do espaço reticulado.

Palavras-chave:
Potencial periódico; reticulado colméia; reticulado cúbico simples

Abstract

This text is a simple adaptation of the characterization via Fourier series of a class of periodic potentials to the simple cubic lattice, originally developed in the honeycomb lattice, rigorously treating both the potential type properties and the nature properties of the lattice space.

Keywords:
Periodic potential; honeycomb lattice; simple cubic lattice

1. Introdução

A física da matéria condensada de um elétron é uma simplificação que tem tido um sucesso notável na descrição de certas propriedades dos cristais. As noções básicas de materiais isolantes, condutores e semi-condutores podem ser explicadas pelo espectro de energia de um único elétron que se move sob a influência de um arranjo periódico de átomos e do princípio de exclusão de Pauli [1][1] M. Massimi, Pauli's Exclus ion Principle: The Origin and Validation of a Scientific Principle (Cambridge University Press, Cambridge, 2005).. O último determina a ocupação dos estados por elétrons não interagentes. No modelo de um elétron, a interação entre os elétrons é negligenciada e as propriedades espectrais e de transporte do material são descritas pelo modelo de uma partícula do operador Hamiltoniano de Schrödinger.

De fato, em condutores e semi-condutores, elétrons livres têm que partilhar o espaço total disponível no interior do material - e por isso seus níveis de energia se empilham criando uma estrutura de bandas a partir de cada nível de energia atômico. Em bons condutores (metais) os elétrons estão tão fortemente degenerados que eles acabam por não contribuir de forma significativa para a capacidade térmica do metal. Muitas propriedades mecânicas, elétricas, magnéticas, ópticas e químicas dos sólidos são consequências diretas da repulsão de Pauli entre elétrons livres ou semi-livres. Para mais detalhes, veja [1][1] M. Massimi, Pauli's Exclus ion Principle: The Origin and Validation of a Scientific Principle (Cambridge University Press, Cambridge, 2005). e [2][2] J.J. Sakurai, Modern Quantum Mechanics (Cambridge University Press, Cambridge, 1994)..

Descrevendo a evolução temporal do elétron, a equação de Erwin Schrödinger dependente do tempo é dada por

(1) i t Ψ ( t , x ) = 2 2 m Δ Ψ ( t , x ) + V ( x ) Ψ ( t , x ) ,

onde t é a variável temporal, x é a variável espacial e =h2π=1,05457×1034Js é a constante de Planck dividida por 2π. O operador Hamiltoniano H será, por simplicidade tomando um sistema de unidades adequado para o qual m=12 e =1, escrito como

(2) H Ψ ( t , x ) = ( Δ + V ( x ) ) Ψ ( t , x ) .

Ainda, é possível reescrever a equação (1) usando o operador H como sendo HΨ=itΨ para o qual o problema de existência e unicidade das soluções da equação (1) com o estado inicial Ψ0=Ψ(0,) dado podem ser reduzidos ao problema do estabelecimento da auto-adjunticidade para o operador linear H, ou seja, se o operador for auto-adjunto está garantida a existência e unicidade de soluções com estado inicial Ψ0.

Em [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012). Fefferman e Weinstein desenvolvem, a partir da teoria de Floquet-Bloch, uma caracterização para o espectro dos operadores de Schrödinger cujo potencial é definido no reticulado colméia. Entre outras coisas, Fefferman e Weinstein constroem uma classe de potenciais periódicos nesse reticulado utilizando algumas ferramentas de mecânica quântica e séries de Fourier. Temos por objetivo adaptar tal construção, enunciada na Proposição 3.2, para um potencial no reticulado cúbico simples (Proposição 4.2). Em outros termos, para xR3, o potencial pode ser escrito como

(3) V ( x ) = V ^ ( 0 ) + j = 0 3 m W ~ V m cos ( ( S j ~ m ) k x ) ,

onde Vm é real, S~ é uma ação de Z3 dada a partir de uma matriz de rotação em R3 e W~ é um conjunto de classes de equivalência. Tal resultado é relevante pois ele garante que qualquer potencial assumindo condições necessárias de simetria no reticulado pode ser reescrito de forma muito mais simples como somas de cossenos.

2. Operadores de Schrödinger Periódicos

Uma vez que íons em um cristal perfeito são ordenados em uma rede periódica regular, podemos considerar o problema de um elétron em um potencial V(x) com a periodicidade de um reticulado de Bravais fundamental, ou seja, V(x+v)=V(x) para todo vetor v do reticulado de Bravais. Um reticulado de Bravais consiste nas configurações básicas que resultam da combinação dos sistemas de cristalização com a disposição das partículas em cada uma das células unitárias de uma estrutura cristalina, sendo estas células entendidas como os paralelepípedos (no caso tridimensional) que constituem a menor subdivisão de uma rede cristalina que conserva as características gerais de todo o reticulado, permitindo que por simples replicação da mesma se possa reconstruir o sólido cristalino completo. Cabe salientar que a periodicidade perfeita é uma idealização e as imperfeições são realmente não desprezíveis, uma vez que, por exemplo, a condutibilidade elétrica dos metais não é infinita. Todavia, modelos são essenciais para a compreensão da natureza e podem, via perturbações refinadas, se aproximar muito das condições físicas reais.

Estamos interessados em examinar propriedades gerais da Equação de Schrödinger, dada por

(4) ( Δ + V ( x ) ) ψ ( x ) = ε ψ ( x )

para um elétron cujo potencial V é periódico. Elétrons que satisfazem a Equação de Schrödinger com potencial periódico são conhecidos como elétrons de Bloch e, conforme [4][4] N.W. Ashcroft e N. D. Mermin, Solid States Physics (Cengage Learning, Inc, Califórnia, 1976)., estados estacionários de elétrons de Bloch tem a seguinte propriedade como uma consequência geral da periodicidade do potencial V:

Teorema 2.1 (de Bloch) [5][5] F. Bloch, Zeitschrift für Physik 52, 555 (1929). Os autoestados ψ do Hamiltoniano (2) podem ser escolhidos de tal forma que, associado a cada ψ, exista um vetor de onda k tal que

(5) ψ ( x + v ) = e i k v ψ ( x )

para todo v no reticulado de Bravais.

Demonstração. Para cada vetor v do reticulado de Bravais, definimos o operador de translação Tv o qual, quando operando em qualquer função f(x) desloca o argumento por v, ou seja,

T v f ( x ) = f ( x + v ) .

Uma vez que o Hamiltoniano é periódico, temos

(6) T v H ψ = H ( x + v ) ψ ( x + v ) = H ( x ) ψ ( x + v ) = H T v ψ .

Como (6) vale identicamente para qualquer função ψ, então TvH=HTv. Além disso, o resultado de aplicarmos duas translações sucessivas não depende da ordem em que elas foram aplicadas, pois para qualquer ψ(x) temos

(7) T v T v ψ ( x ) = T v T v ψ ( x ) = ψ ( x + v + v ) ,

de onde vem

(8) T v T v = T v T v = T v + v .

As equações (6) e (8) nos mostram que os operadores Tv, para qualquer v na rede de Bravais, e o Hamiltoniano H são comutativos, isto é, [H,Tv]=0 para todo v na rede de Bravais. Dada ψ tal que Hψ=εψ, temos

(9) H T v ψ = T v H ψ = ε T v ψ ,

logo Tvψ é uma autofunção de H com autovalor ε. Uma vez que H não tem autovalores degenerados, conforme [6][6] D. Park, Introduction to the Quantum Theory (MacGraw-Hill, New York, 1974), 2ª ed., exite uma única autofunção ψ associada ao autovalor ε, logo Tvψ é um múltiplo escalar de ψ, ou seja, existe μ(v)R tal que

(10) T v ψ = μ ( v ) ψ

e ψ é simultaneamente uma autofunção de H e Tv. Os autovalores μ(v) dos operadores de translação estão relacionados pela condição (8) que, por um lado nos dá

(11) T v T v ψ = μ ( v ) T v ψ = μ ( v ) μ ( v ) ψ ,

e por outro lado,

(12) T v T v ψ = T v + v ψ = μ ( v + v ) ψ .

De onde vem que os autovalores devem satisfazer

(13) μ ( v + v ) = μ ( v ) μ ( v ) .

Sejam ai os d vetores primitivos do reticulado de Bravais, onde d é a dimensão do reticulado. Podemos escrever μ(ai) na forma μ(ai)=e2iπβi fazendo uma escolha adequada dos βi's. Note que o operador Tv não é necessariamente auto-adjunto, logo seus autovalores não precisam ser reais. Segue por sucessivas aplicações de (13) que se v é um vetor qualquer do reticulado de Bravais dado por

(14) v = α 1 a 1 + + α d a d ,

então

(15) μ ( v ) = μ ( a 1 ) α 1 μ ( a d ) α d ,

o que é precisamente

(16) μ ( v ) = e i k v ,

onde k=β1b1++βkbd e os bd's são os vetores do reticulado recíproco satisfazendo aibi=2πδij. Portanto, conforme [4][4] N.W. Ashcroft e N. D. Mermin, Solid States Physics (Cengage Learning, Inc, Califórnia, 1976)., mostramos que podemos escolher os autoestados ψ de H tais que para todo vetor v do reticulado de Bravais, vale

(17) ψ ( x + v ) = T v ψ = μ ( v ) ψ = e i k v ψ ( x ) ,

precisamente o que queriamos demonstrar.

Outras boas referências são [7][7] S. Fujita e K. Ito, Quantum Theory of Conducting Matter (Springer, New York, 2007). e [8][8] C. Kittel, Introduction to Solid State Physics (John Wiley and Sons, Nova Iorque, 1996) 7ª ed..

3. Reticulado Colméia

Nos cristais, os átomos ou os núcleos são distribuídos em uma rede periódica (digamos a rede Zd por simplicidade) de uma maneira completamente regular. Conforme [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)., vamos assumir que uma partícula (elétron) no ponto xRd é estimulada por um potencial da forma qf(xi) devido a um átomo (ou íon, ou núcleo) localizado no ponto iZd. Aqui, a constante q (carga ou constante de acoplamento, em termos físicos) poderia ser absorvida na função f. No entanto, uma vez que vamos variar essa quantidade de átomo para átomo mais tarde, é útil escrever o potencial da forma acima. Então, em um cristal regular, nossa partícula está exposta a um potencial total

(18) V ( x ) = i Z d q f ( x i ) .

A função f é chamada de potencial de um único sítio para distinguir do potencial total V. O potencial V em (18) é periódico com respeito ao reticulado Zd, ou seja, V(xi)=V(x) para todo xRd e iZd. A teoria matemática dos operadores de Schrödinger com potenciais periódicos está bem desenvolvida e baseia-se em uma análise minuciosa das propriedades de simetria dos operadores periódicos. Por exemplo, sabe-se que tais operadores apresentam, em geral, um espectro com estrutura de banda, isto é, para an<bn<an+1,

(19) σ ( H ) = n = 0 [ a n , b n ] .

Este espectro também é conhecido como sendo espectro absolutamente contínuo, todavia, a maioria dos sólidos não constitui cristais ideais [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)..

Considere o reticulado colméia, ilustrado na Figura 1(a), onde os vértices são representados como pontos pretos e brancos e as arestas como segmentos entre dois vértices.

Figura 1
[9][9] K. Ando, Annales Henry Poincaré 14, 347 (2013). O reticulado colméia visto como um grafo.

O reticulado hexagonal pode ser visto como um modelo discreto do grafeno, que é uma chapa de carbono de camada única, bidimensional e com estrutura de colméia. Assim, operadores de Schrödinger discretos no reticulado hexagonal podem ser considerados como Hamiltonianos discretos sobre o grafeno. Em física, o grafeno é um dos mais interessantes objetos devido ao comportamento peculiar dos elétrons, e operadores de Schrödinger discretos são largamente utilizados para investigar o grafeno. Outra abordagem é no estudo de grafos quânticos. Ando, em [9][9] K. Ando, Annales Henry Poincaré 14, 347 (2013)., considera o reticulado colméia como um grafo, cuja redistribuição dos sítios torna o reticulado uma “parede de tijolos” como na Figura 1b, o que facilita bastante a construção da matriz truncada do operador e, por consequência, o cálculo dos autovalores de tal matriz. A abordagem que utilizaremos para construção do potencial, de Fefferman e Weinstein [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)., não abre mão da geometria do reticulado original. Note que a complexidade do reticulado estará embutida no potencial, então construir a matriz levando em conta um grafo mais simples do reticulado não eliminará a influência do reticulado original.

3.1. Teoria de Floquet-Bloch

Considerando-se {v1,v2} uma base em R2 e o reticulado

(20) Λ = { m 1 v 1 + m 2 v 2 : m 1 , m 2 Z } = Z v 1 Z v 2 ,

a célula do período fundamental é denotada por

(21) Γ = { θ 1 v 1 + θ 2 v 2 : 0 θ j 1 , j = 1 , 2 } .

O espaço das funções que são periódicas com respeito ao reticulado Λ é denotado por Lper,Λ2=L2(R2/Λ). Considerando-se um período κ, então fLκ,Λ2 se, e somente se, para xR2 e vΛ,

(22) f ( x + v ) = f ( x ) e i κ v .

Como no produto escalar usual, temos xy onde x está no reticulado direto e y está no reticulado recíproco, ou dual. Ainda, dada uma matriz M, que age sobre x no reticulado direto, satisfaz M(x)y=xM(y) onde M é a matriz transposta de M. Por conta disso, precisamos também da noção do reticulado dual, Λ, definido como

(23) Λ = { m 1 k 1 + m 2 k 2 : m 1 , m 2 Z } = Z k 1 Z k 2 ,

onde k1 e k2 são os vetores do reticulado dual, satisfazendo as relações kivj=2πδij. Se fLper,Λ2 então f pode ser expandida em séries de Fourier

(24) f ( x ) = m Z 2 f m e i m k x = ( m 1 , m 2 ) Z 2 f ( m 1 , m 2 ) e i ( m 1 k 1 + m 2 k 2 ) x ,

com coeficientes f^={fm}mZ2 dados por

(25) f m = 1 | Γ | Γ e i m k y f ( y ) d y = 1 | Γ | Γ e i ( m 1 k 1 + m 2 k 2 ) y f ( y ) d y ,

onde |Γ| representa a área da célula de período fundamental Γ.

Seja V(x) o potencial real periódico com relação a Λ, ou seja, para xR2 e vΛ,

(26) V ( x + v ) = V ( x ) .

Para cada kR2, o problema do autovalor de Floquet-Bloch é dado por

(27) H V ϕ ( x , k ) = μ ( k ) ϕ ( x , k ) ,
(28) ϕ ( x + v , k ) = e i k v ϕ ( x , k ) ,

onde xR2, vΛ e HVΔ+V(x), cujas soluções, em Lk,Λ2, são chamados de estados de Floquet-Bloch[3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)..

Como a solução do problema do autovalor ((27) e (28)) é invariante por mudança de variáveis kk+k~, onde k~Λ, o reticulado periódico dual, os autovalores e autofunções de (27) e (28) podem ser considerados como funções Λ-periódica de k, o que é suficiente para restringir a atenção para k variando sobre um célula primitiva, o que é feito para utilizar-se a primeira zona de Brillouin, B, definida como o fecho do conjunto dos pontos kR2, que está mais próximo da origem do que de qualquer outro ponto do reticulado dual. Para kB, defina

(29) ϕ ( x , k ) = e i k x p ( x , k ) ,

satisfazendo, para xR2 e vΛ,

(30) H V ( k ) p ( x , k ) = μ ( k ) p ( x , k ) ,
(31) p ( x + v , k ) = p ( x , k ) ,

onde

(32) H V ( k ) ( + i k ) 2 + V ( x ) Δ k + V ( x ) .

O problema do autovalor (30) e (31) tem um espectro discreto dado por

(33) μ 1 ( k ) μ 2 ( k ) μ 3 ( k )

com autopares (μb(k),pb(x,k)), para b=1,2,3,. O conjunto {pb(x,k)}b1 pode ser tomado como um conjunto ortonormal completo em Lper2(R2/Λ) (conforme Teorema Espectral, veja [10][10] M.M. Skriganov, Geometric and Arithmetic Methods in the Spectral Theory of Multidimensional Periodic Operators (American Mathematical Society, Providence, 1987).). A funções μb(k) são chamadas funções de dispersão de bandas. Como k varia sobre B, μb(k) varre um intervalo fechado da reta real. O espectro de Δ+V(x) em L2(R2) é a união desses intervalos fechados

(34) σ ( H V ) = k B σ ( H V ( k ) ) .

Para mais detalhes, veja [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)..

3.2. O reticulado periódico e seu dual

Seja Λh=Zv2Zv2 o reticulado gerado pelos vetores da base

(35) v 1 = a ( 3 2 1 2 ) , v 2 = a ( 3 2 1 2 ) , a > 0 ,

e o reticulado dual Λh=Zk1Zk2 é gerado pelos vetores da base dual

(36) k 1 = q ( 1 2 3 2 ) , k 2 = q ( 1 2 3 2 ) , q 4 π a 3 ,

onde kivj=2πδij, |v1|=|v2|=a e |k1|=|k2|=q, de onde vem v1v2=a22 e k1k2=q22.

Por [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)., a primeira zona de Brillouin, Bh, é um hexágono em R2 representado na Figura 2.

Figura 2
[3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012). Zona de Brillouin, Bh, e a base dual {k1,k2}. Os outros vértices de Bh são obtidos via aplicação de R.

Denotando por K e K os vértices de Bh, estes são dados por K13(k1k2) e KK=13(k2k1). Todos os seis vértices podem ser gerados pela aplicação de uma matriz de rotação, R, que roda um vetor em R2 em um ângulo de 2π3 no sentido horário, levando um vértice preto K em outro vértice preto (R(K)), que por sua vez é levado por R no último vértice preto do hexágono, R2(K)=RR(K), pois se rodarmos mais uma vez 2π3 no sentido horário (o que significa aplicar R mais uma vez), fechamos o ciclo e voltamos ao vértice preto K, já que R3(K)=K. O mesmo acontece com os vértices azuis K.

A matrix R é dada por

(37) R = ( 1 2 3 2 3 2 1 2 ) .

Os vértices de Bh caem em dois grupos, gerados pela ação de R sobre K e K: os ponto de tipo K, satisfazendo

(38) R ( K ) = ( 1 2 3 2 3 2 1 2 ) [ q 3 ( ( 1 2 3 2 ) ( 1 2 3 2 ) ) ] = q 3 ( 3 2 3 2 ) = q [ ( 0 3 3 ) + ( 1 2 3 2 ) ] = K + k 2 ,

ou seja,

(39) R ( K ) = K + k 2 ,

e da mesma forma,

(40) R 2 ( K ) = ( 1 2 3 2 3 2 1 2 ) [ q 3 ( ( 1 2 3 2 ) ( 1 2 3 2 ) ) ] = q 3 ( 3 2 3 2 ) = q [ ( 0 3 3 ) ( 1 2 3 2 ) ] = K k 1 ,

então,

(41) R 2 ( K ) = K k 1 ,

e os pontos de tipo K, da mesma forma satisfazem

(42) R ( K ) = K k 2 e R 2 ( K ) = K + k 1 .

Além disso, a matriz

(43) R = ( 1 2 3 2 3 2 1 2 )

aplica o reticulado periódico Λh nele mesmo. Em particular, Rv1=v2, e Rv2=v1v2. Para mais detalhes, veja [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)..

3.3. Potencial Colméia

Para qualquer função f definida em R2, por [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)., defina

(44) R [ f ] ( x ) = f ( R x ) ,

onde R é a matriz de rotação dada em (37). Um potencial real V é um potencial colméia se existe x0R2 tal que

(45) V ~ ( x ) = V ( x x 0 )

tem as seguintes propriedades:

  1. 1.

    Para todo xR2 e vΛh, V~(x+v)=V~(x);

  2. 2.

    V~(x)=V~(x);

  3. 3.

    V~ é R-invariante, ou seja,

(46) R [ V ~ ] ( x ) = V ~ ( R x ) = V ~ ( x ) ,

onde R é a matriz de rotação que gira um vetor 2π3 no sentido anti-horário, isto é,

(47) R = R 1 .

Dados os pontos A=(0,0) e B=a(13,0), os quais pertencem a uma célula unitária periódica de Λh. Definindo os reticulados triangulares de tipo A e de tipo B, ΛA=A+Λh e ΛB=B+Λh, respectivamente, a estrutura de colméia, C, é definida como a união desses dois reticulados triangulares

(48) C = Λ A Λ B

e representada na Figura 3.

Figura 3
[3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012). Parte da estrutura de colméia C=ΛAΛB.

Seja V0 uma função radial, suave e com decrescimento rápido, a qual é vista como um “potencial atômico”. Então

(49) V ( x ) = a C V 0 ( x a )

é um potencial associado com “átomos” em cada sítio da estrutura de colméia C. Pondo x0=B na equação (45), V(x) satisfaz as condições do potencial reticulado de colméia.

Outro potencial interessante é o potencial ótico no reticulado de colméia [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012).. O invólucro do campo elétrico de um feixe de luz quase monocromático propagando-se através de um meio dielétrico com perfil de índice de refração bidimensional satisfaz a equação de Schrödinger linear

(50) i z ψ = Δ x , y ψ + V ( x , y ) ψ = 0 ,

onde z denota a direção de propagação do feixe e (x,y) a direção transversa. As variações do índice de refração são dados por um potencial de forma aproximada a

(51) V ( x , y ) V 0 [ cos ( k 1 ( x , y ) ) + cos ( k 2 ( x , y ) ) ] + V 0 [ cos ( ( k 1 + k 2 ) ( x , y ) ) ] .

Proposição 3.1[3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012). Seja V um potencial do reticulado colméia e assuma que K é um ponto do tipo K ou K. Se ϕ(x,k) é uma solução do problema do autovalor de Floquet-Bloch ((27) e (28)) com k=K, então R[ϕ(,k)](x) é também uma solução de (27) e (28) com k=K.

Demonstração. Definindo

(52) ϕ R ( x ) = R [ ϕ ( , K ) ] ( x ) = ϕ ( R x , K )

e assumindo, sem perda de generalidade, que K=K, se vΛh então RvΛh. Assim

(53) ϕ R ( x + v ) = ϕ ( R x + R v , K ) = e i K R v ϕ ( R x , K ) = e i R K v ϕ ( R x , K ) = e i ( K + k 2 ) v ϕ ( R x , K ) = e i K v ϕ ( R x , K ) = e i K v ϕ R ( x ) ,

de onde R aplica

(54) C K = { f C : f ( x + v ) = e i K v f ( x ) , x R 2 , v Λ h }

nele próprio. Além disso, ϕR(x)=ϕ(Rx,K)=ϕ(y,K) para y=Rx, logo

(55) Δ x ϕ R ( x ) = Δ y ϕ ( y , K ) | y = R x

pela invariância do Laplaciano por rotações. Denotando y=Rx e ϕ(,K)=ϕ(), temos

(56) [ H V R ] ϕ ( x ) = [ Δ + V ( ) ] R ϕ ( x ) = [ Δ + V ( ) ] ϕ ( R x ) = Δ R x ϕ ( R x ) + V ( R x ) ϕ ( R x ) = Δ y ϕ ( y ) + V ( y ) ϕ ( y ) = Δ R x ϕ ( R x ) + V ( R x ) ϕ ( R x ) = R [ Δ x ϕ ( x ) + V ( x ) ϕ ( x ) ] = [ R H V ] ϕ ( x ) ,

de onde [HV,R]=HVRRHV=0 em CK. Em particular, HVϕ(x,K)=μϕ(x,K), logo HVϕR(x)=μϕR(x), então R[ϕ(,K)](x) é também uma solução de (27) e (28).

Considere o potencial V(x) cuja série de Fourier é dada por

(57) V ( x ) = m Z 2 V m e i m k x = ( m 1 , m 2 ) Z 2 V ( m 1 , m 2 ) e i ( m 1 k 1 + m 2 k 2 ) x .

Como V(x)=R[V](x) [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012)., temos

(58) V ( R x ) = ( m 1 , m 2 ) Z 2 V ( m 1 , m 2 ) e [ i ( m 1 R k 1 + m 2 R k 2 ) x ] = ( m 1 , m 2 ) Z 2 V ( m 1 , m 2 ) e [ i ( m 2 k 1 + ( m 1 m 2 ) R k 2 ) x ]

pois R(k1)=q(1232) e R(k2)=q(10), logo

(59) m 1 R k 1 + m 2 R k 2 = m 1 q ( 1 2 3 2 ) + m 2 q ( 1 0 ) = q ( m 1 2 m 2 3 2 m 1 ) = q ( m 2 2 + m 1 2 m 2 2 3 2 m 2 3 2 m 1 + 3 2 m 2 ) = m 2 q ( 1 2 3 2 ) + ( m 1 m 2 ) q ( 1 2 3 2 ) = m 2 k 1 + ( m 1 m 2 ) k 2 .

Assim, V(m1,m2)=V(m2,m1m2). Da mesma forma, V(x)=R2[V](x) implica V(m1,m2)=V(m2m1,m1). Introduzindo a aplicação R~:Z2Z2 agindo nos índices dos coeficientes de Fourier de V,

(60) R ~ ( m 1 , m 2 ) = ( m 2 , m 1 m 2 ) ,
(61) R ~ 2 ( m 1 , m 2 ) = R ~ ( m 2 , m 1 m 2 ) = ( m 2 m 1 , m 1 ) ,
(62) R ~ 3 ( m 1 , m 2 ) = R ~ ( m 2 m 1 , m 1 ) = ( m 1 , m 2 ) ,

temos

(63) V m = V R ~ m = V R ~ 2 m

Ainda, R~(0)=0 e ker(R~)={0}. Além disso, qualquer m0 pertence a uma órbita de R~ de comprimento três. De fato, se m=R~m, então (m1,m2)=(m2,m1m2), ou seja m1=m2=0. Se m=R~2m, então (m1,m2)=(m1+m2,m1), logo m1=m2=0.

Suponha que m e n são não nulos. Dizemos que mn se m e n pertencem ao mesmo 3-ciclo. A relação é uma relação de equivalência, que particiona Z2{0} em classes de equivalência, (Z2{0})/. Denote por S~ o conjunto consistindo de exatamente um representante de cada classe de equivalência. Temos, portanto, a seguinte caracterização em séries de Fourier para potenciais do tipo reticulado colméia:

Proposição 3.2 [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012). Seja V(x) um potencial reticulado colméia, com xR2. Então,

(64) V ( x ) = V ^ ( 0 ) + m S ~ V m [ cos ( m k x ) ] + m S ~ V m [ cos ( ( R ~ m ) k x ) ] + m S ~ V m [ cos ( ( R ~ 2 m ) k x ) ] ,

onde Vm é real e R~ é definida na equação (60).

Demonstração. De fato, como Vm=VR~m=VR~2m, então

(65) V ( x ) = V ^ ( 0 ) + m S ~ V m ( e i m k x + e i ( R ~ m ) k x + e i ( R ~ 2 m ) k x ) .

Como V(x)=12(V(x)+V(x)), temos

(66) V ( x ) = V ( x ) + V ( x ) 2 = V ^ ( 0 ) + m S ~ V m ( e i m k x + e i m k x 2 ) + m S ~ V m ( e i ( R ~ m ) k x + e i ( R ~ m ) k x 2 ) + m S ~ V m ( e i ( R ~ 2 m ) k x + e i ( R ~ 2 m ) k x 2 ) .

Como cos(w)=eiw+eiw2 para wR, segue

(67) V ( x ) = V ^ ( 0 ) + m S ~ V m [ cos ( m k x ) ] + m S ~ V m [ cos ( ( R ~ m ) k x ) ] + m S ~ V m [ cos ( ( R ~ 2 m ) k x ) ] .

4. Reticulado cúbico simples

Entre os reticulados espaciais mais simples encontramos o reticulado cúbico, o qual tem sua célula do período fundamental formada por um cubo regular, ou seja, oito vértices igualmente espaçados e seis faces idênticas. A este, o qual será tratado aqui, denomina-se reticulado cúbico simples. Se adicionarmos um ponto no centro do cubo de período fundamental, o modelo muda substancialmente, tornando-se um reticulado cúbico centrado no corpo, em tradução livre (em inglês, BCC). Se, ao invés disso, adicionarmos um ponto em cada face, teremos um reticulado cúbico centrado na face (FCC). Estes dois modelos são duais entre si, ou seja, o reticulado dual (ou recíproco) do reticulado BCC é um FCC, e vice-versa. Para mais detalhes, consulte [4][4] N.W. Ashcroft e N. D. Mermin, Solid States Physics (Cengage Learning, Inc, Califórnia, 1976).. No caso do reticulado cúbico simples, seu dual é ele próprio e sua primeira zona de Brillouin é muito mais simples que nos reticulados BCC e FCC, retratadas graficamente na Figura 4. Faremos uma abordagem parecida com a abordagem de [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012). no reticulado colméia no plano, dividindo os vértices do cubo em dois conjuntos de quatro vértices e, em cada conjunto, obtendo a partir de um vértice do conjunto os outros três através de uma matriz de rotação tridimensional. Esta matriz será a mesma para os dois conjuntos. Por fim, descreveremos um potencial periódico cujo argumento dependa da órbita de tal matriz.

Figura 4
[4][4] N.W. Ashcroft e N. D. Mermin, Solid States Physics (Cengage Learning, Inc, Califórnia, 1976). Primeira zona de Brillouin para os reticulados a)BCC e b)FCC.

Sejam {u1,u2,u3} uma base ortonormal (vetores primitivos) em R3, o reticulado

(68) Λ 3 = { m 1 u 1 + m 2 u 2 + m 3 u 3 : m 1 , m 2 , m 3 Z } = Z u 1 Z u 2 Z u 3 ,

a célula do período fundamental

(69) Γ 3 = { θ 1 u 1 + θ 2 u 2 + θ 3 u 3 : 0 θ j 1 , j = 1 , 2 , 3 } ,

o parâmetro a=1 relativo ao comprimento de cada aresta da célula de período fundamental e o espaço das funções periódicas com respeito ao reticulado Λ3, denotado por Lper,Λ32=L2(R3/Λ3). Considerando-se um período κ, temos fLκ,Λ32 se, e somente se, para xR3 e uΛ3,

(70) f ( x + u ) = f ( x ) e i κ u .

O reticulado dual, Λ3, também será um reticulado cúbico simples, cujo comprimento de cada aresta é 2π, e é dado por

(71) Λ 3 = { m 1 t 1 + m 2 t 2 + m 3 t 3 : m 1 , m 2 , m 3 Z } = Z t 1 Z t 2 Z t 3 ,

onde t1, t2 e t3 satisfazem as relações tiuj=2πδij para i,j=1,2,3. Se fLper,Λ32 então f pode ser expandida em séries de Fourier

(72) f ( x ) = m Z 3 f m e i m k x = ( m 1 , m 2 , m 3 ) Z 3 f ( m 1 , m 2 ) e i ( m 1 t 1 + m 2 t 2 + m 3 t 3 ) x ,

com coeficientes f^={fm}mZ3 dados por

(73) f m = 1 | Γ 3 | Γ 3 e i m t y f ( y ) d y = 1 | Γ 3 | Γ 3 e i ( m 1 t 1 + m 2 t 2 + m 3 t 3 ) y f ( y ) d y ,

onde |Γ3| representa o volume da célula de período fundamental Γ3.

Um potencial V(x) é um potencial real periódico com relação a Λ3 se, para xR3 e uΛ3, vale

(74) V ( x + u ) = V ( x ) .

4.1. O reticulado e seu dual

Considere uma base ortonormal, logo cada vetor tem comprimento um, de Λ3, por exemplo,

(75) u 1 = 1 2 ( 1 1 0 ) , u 2 = 1 6 ( 1 1 2 ) , u 3 = 1 3 ( 1 1 1 ) ,

e uma base dual de Λ3 (vetores primitivos do espaço recíproco) de comprimento 2π dados por

(76) t 1 = ( 2 π 2 2 π 6 2 π 3 ) , t 2 = ( 2 π 2 2 π 6 2 π 3 ) , t 3 = ( 0 4 π 6 2 π 3 ) ,

onde uitj=2πδij, i,j=1,2,3. Por [4][4] N.W. Ashcroft e N. D. Mermin, Solid States Physics (Cengage Learning, Inc, Califórnia, 1976)., a primeira zona de Brillouin, B, é também um reticulado cúbico simples, e é representada na Figura 5.

Figura 5
[4][4] N.W. Ashcroft e N. D. Mermin, Solid States Physics (Cengage Learning, Inc, Califórnia, 1976). Primeira zona de Brillouin B com relação ponto C no reticulado dual. Os planos de Bragg são as faces do cubo de vértices A e intersectam ortogonalmente as faces do cubo de vértices B de modo que a distância entre cada plano de Bragg o ponto C seja idêntica a distância entre o plano de Bragg e o vértice B mais próximo.

Denotando por K e K dois vértices adjacentes de B, escolhidos como K12(t1t2t3) e K12(t1t2t3). Todos os oito vértices podem ser gerados pela aplicação de uma matriz S dada por

(77) S = ( 0 1 3 2 6 1 3 2 3 2 3 2 6 2 3 1 3 )

tal que S4(K)=K e S4(K)=K. Os demais iterados de S em K e K geram os outros seis vértices do cubo, retratados na Figura 6. Além disso, temos S(t1)=t2, S(t2)=t1 e S(t3)=t3. Tais vértices caem em dois grupos, gerados pela ação de S sobre K e K: os ponto de tipo K, satisfazendo

Figura 6
A matriz S transforma pontos brancos em pontos brancos. Da mesma forma, leva pontos pretos em pontos pretos.
(78) S ( K ) = 1 2 S ( t 1 t 2 t 3 ) = 1 2 ( S ( t 1 ) S ( t 2 ) S ( t 3 ) ) = 1 2 ( t 2 t 1 + t 3 ) ,

logo

(79) S ( K ) = 1 2 ( t 1 t 2 + t 3 ) ,

ou seja,

(80) S ( K ) = K t 1 + t 3 ,

da mesma forma,

(81) S 2 ( K ) = 1 2 S ( t 1 t 2 + t 3 ) = 1 2 ( S ( t 1 ) S ( t 2 ) + S ( t 3 ) ) = 1 2 ( t 2 t 1 t 3 ) ,

então,

(82) S 2 ( K ) = 1 2 ( t 1 + t 2 t 3 ) ,

ainda,

(83) S 3 ( K ) = 1 2 S ( t 1 + t 2 t 3 ) = 1 2 ( S ( t 1 ) + S ( t 2 ) S ( t 3 ) ) = 1 2 ( t 2 + t 1 + t 3 ) ,

logo,

(84) S 3 ( K ) = 1 2 ( t 1 + t 2 + t 3 ) .

Já os pontos de tipo K, da mesma forma satisfazem

(85) S ( K ) = 1 2 ( t 1 + t 2 + t 3 ) ,
(86) S 2 ( K ) = 1 2 ( t 1 + t 2 t 3 ) ,
(87) S 3 ( K ) = 1 2 ( t 1 t 2 + t 3 ) .

Além disso, a matriz

(88) S = ( 0 1 3 2 6 1 3 2 3 2 3 2 6 2 3 1 3 )

aplica o reticulado periódico Λ3 nele mesmo. Em particular,

S u 1 = 1 3 u 1 + ( 1 2 3 3 + 6 9 ) u 2 ( 1 + 2 3 + 3 6 9 ) u 3 ,
S u 2 = 6 2 2 2 6 3 u 1 ( 1 3 3 + 6 + 8 2 6 18 ) u 2 + ( 2 3 6 + 6 + 4 3 9 ) u 3 ,
S u 3 = ( 1 + 2 3 + 2 1 3 3 ) u 1 + 1 3 3 9 u 2 + 2 2 3 9 u 3 .

4.2. Potencial cúbico simples

A partir da construção do potencial do tipo colméia, construiremos um potencial periódico tridimensional nos mesmos moldes. Para qualquer função f definida em R3 defina

(89) S [ f ] ( x ) = f ( S x ) ,

onde S é a matriz (88). Um potencial real V será uma adaptação do potencial colméia se existe x0R3 tal que

(90) V ~ ( x ) = V ( x x 0 )

tem as seguintes propriedades:

  1. 1.

    Para todo xR3 e uΛ3, V~(x+u)=V~(x);

  2. 2.

    V~(x)=V~(x);

  3. 3.

    V~ é S-invariante, ou seja,

(91) S [ V ~ ] ( x ) = V ~ ( S x ) = V ~ ( x ) ,

onde S é a matriz (88), e por ser ortogonal,

(92) S = S 1 .

Proposição 4.1 Seja V um potencial do reticulado cúbico simples e assuma que K é um ponto do tipo K ou K. Se ϕ(x,k) é uma solução do problema do autovalor de Floquet-Bloch (tridimensional, adaptando (27) e (28)) com k=K, então S[ϕ(,k)](x) é também uma solução com k=K.

Demonstração. Definindo

(93) ϕ S ( x ) = S [ ϕ ( , K ) ] ( x ) = ϕ ( S x , K )

e assumindo, sem perda de generalidade, que K=K, se uΛ3 então SuΛ3. Assim

(94) ϕ S ( x + u ) = ϕ ( S x + S u , K ) = e i K S u ϕ ( S x , K ) = e i S ( K ) u ϕ ( S x , K ) = ( 80 ) e i ( K t 1 + t 3 ) u ϕ ( S x , K ) = e i K u ϕ ( S x , K ) = e i K u ϕ S ( x ) ,

uma vez que, para r=1,3 e cjZ, j=1,2,3,

(95) t r u = t r j = 1 3 c j u j = 2 π c r

e e2πi=1, de onde S aplica

(96) C K = { f C : f ( x + u ) = e i K u f ( x ) , x R 3 , u Λ 3 }

nele próprio. Além disso,

(97) ϕ S ( x ) = ϕ ( S x , K ) = ϕ ( y , K )

para y=Sx, logo

(98) Δ x ϕ S ( x ) = Δ y ϕ ( y , K ) | y = S x

pela invariância do Laplaciano por rotações. Denotando y=Sx e ϕ(,K)=ϕ(), temos

(99) [ H V S ] ϕ ( x ) = [ Δ + V ( ) ] S ϕ ( x ) = [ Δ + V ( ) ] ϕ ( S x ) = Δ S x ϕ ( S x ) + V ( S x ) ϕ ( S x ) = Δ y ϕ ( y ) + V ( y ) ϕ ( y ) = Δ S x ϕ ( S x ) + V ( S x ) ϕ ( S x ) = S [ Δ x ϕ ( x ) + V ( x ) ϕ ( x ) ] = [ S H V ] ϕ ( x ) ,

de onde [HV,S]=HVSSHV=0 em CK. Em particular, HVϕ(x,K)=μϕ(x,K), logo HVϕS(x)=μϕS(x), então S[ϕ(,K)](x) é também uma solução das equações adaptadas (27) e (28).

Considere o potencial V(x) cuja série de Fourier é dada, para m=(m1,m2,m3), por

(100) V ( x ) = m Z 3 V m e i m k x = m Z 3 V m e i ( m 1 t 1 + m 2 t 2 + m 3 t 3 ) x .

Como V(x)=S[V](x), adaptando [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012). e aplicando ao nosso caso, temos

(101) V ( S x ) = m Z 3 V m e i ( m 1 t 1 + m 2 t 2 + m 3 t 3 ) S x = m Z 3 V m e i ( m 1 S ( t 1 ) + m 2 S ( t 2 ) + m 3 S ( t 3 ) ) x = m Z 3 V m e i ( m 1 t 2 + m 2 t 1 m 3 t 3 ) x = m Z 3 V m e i ( m 2 t 1 m 1 t 2 m 3 t 3 ) x

pois S(t1)=t2, S(t2)=t1 e S(t3)=t3. Assim, V(m1,m2,m3)=V(m2,m1,m3). Da mesma forma, V(x)=S2[V](x) implica

(102) V ( S 2 x ) = m Z 3 V m e i ( m 2 t 1 m 1 t 2 m 3 t 3 ) S x = m Z 3 V m e i ( m 2 S ( t 1 ) m 1 S ( t 2 ) m 3 S ( t 3 ) ) x = m Z 3 V m e i ( m 2 t 2 m 1 t 1 + m 3 t 3 ) x = m Z 3 V m e i ( m 1 t 1 m 2 t 2 + m 3 t 3 ) x

logo V(m1,m2,m3)=V(m2,m1,m3)=V(m1,m2,m3). Ainda, V(x)=S3[V](x) implica

(103) V ( S 3 x ) = m Z 3 V m e i ( m 1 t 1 m 2 t 2 + m 3 t 3 ) S x = m Z 3 V m e i ( m 1 S ( t 1 ) m 2 S ( t 2 ) + m 3 S ( t 3 ) ) x = m Z 3 V m e i ( m 1 t 2 m 2 t 1 m 3 t 3 ) x = m Z 3 V m e i ( m 2 t 1 + m 1 t 2 m 3 t 3 ) x ,

Vm=V(m2,m1,m3)=V(m1,m2,m3)=V(m2,m1,m3). É esperado que V(x)=S4[V](x) nos faça retornar aos índices iniciais. De fato,

(104) V ( S 4 x ) = m Z 3 V m e i ( m 2 t 1 + m 1 t 2 m 3 t 3 ) S x = m Z 3 V m e i ( m 2 S ( t 1 ) + m 1 S ( t 2 ) m 3 S ( t 3 ) ) x = m Z 3 V m e i ( m 2 t 2 + m 1 t 1 + m 3 t 3 ) x = m Z 3 V m e i ( m 1 t 1 + m 2 t 2 + m 3 t 3 ) x .

Introduzindo a aplicação S~:Z3Z3 agindo nos índices dos coeficientes de Fourier de V,

(105) S ~ ( m 1 , m 2 , m 3 ) = ( m 2 , m 1 , m 3 ) ,
(106) S 2 ~ ( m 1 , m 2 , m 3 ) = ( m 1 , m 2 , m 3 ) ,
(107) S 3 ~ ( m 1 , m 2 , m 3 ) = ( m 2 , m 1 , m 3 ) ,
(108) S 4 ~ ( m 1 , m 2 , m 3 ) = ( m 1 , m 2 , m 3 ) ,

temos

(109) V m = V S ~ m = V S ~ 2 m = V S ~ 3 m .

Ainda, S~(0)=0 e ker(S~)={0}. Além disso, qualquer m0 pertence a uma órbita de S~ de comprimento quatro. De fato, se m=S~m, então (m1,m2,m3)=(m2,m1,m3), ou seja m1=m2=m3=0. Se m=S~2m, então (m1,m2,m3)=(m1,m2,m3), logo m1=m2=0, mas o vetor (0,0,m3) pertence a uma órbita de comprimento dois, e como dois é divisor de quatro, este também pertence a uma órbita de comprimento quatro. Se m=S~3m, então (m1,m2,m3)=(m2,m1,m3), logo m1=m2=m3=0.

Suponha que m e n são não nulos. Dizemos que mn se m e n pertencem ao mesmo 4-ciclo. A relação é uma relação de equivalência, que particiona Z3{0} em classes de equivalência, (Z3{0})/. Denote por W~ o conjunto consistindo de exatamente um representante de cada classe de equivalência. Temos, portanto, a seguinte caracterização em séries de Fourier para potenciais cúbicos simples:

Proposição 4.2 Seja V(x) um potencial cúbico simples com xR3. Então,

(110) V ( x ) = V ^ ( 0 ) + m W ~ V m [ cos ( m k x ) ] + m W ~ V m cos ( ( S ~ m ) k x ) + m W ~ V m cos ( ( S ~ 2 m ) k x ) + m W ~ V m cos ( ( S ~ 3 m ) k x ) ,

onde V m é real e S ~ é definida na equação (105).

Demonstração. De fato, como Vm=VS~m=VS~2m=VS~3m, então

(111) V ( x ) = V ^ ( 0 ) + m W ~ V m ( e i m k x + e i ( S ~ m ) k x ) + m W ~ V m ( e i ( S 2 ~ m ) k x + e i ( S ~ 3 m ) k x ) .

Como V(x)=12(V(x)+V(x)), temos

(112) V ( x ) = V ( x ) + V ( x ) 2 = V ^ ( 0 ) + m W ~ V m ( e i m k x + e i m k x 2 ) + m W ~ V m ( e i ( S ~ m ) k x + e i ( S ~ m ) k x 2 ) + m W ~ V m ( e i ( S ~ 2 m ) k x + e i ( S ~ 2 m ) k x 2 ) + m W ~ V m ( e i ( S ~ 3 m ) k x + e i ( S ~ 3 m ) k x 2 ) .

Como cos(w)=eiw+eiw2 para wR, segue

(113) V ( x ) = V ^ ( 0 ) + m W ~ V m [ cos ( m k x ) ] + m W ~ V m [ cos ( ( S ~ m ) k x ) ] + m W ~ V m [ cos ( ( S ~ 2 m ) k x ) ] + m W ~ V m [ cos ( ( S ~ 3 m ) k x ) ] .

5. Considerações Finais

Baseados nos resultados de [3][3] C.L. Fefferman e M.I. Weinstein, R.J. Amer. Math. Soc. 25, 1169 (2012). obtidos sobre uma rede bidimensional do tipo colméia, adaptamos para um rede cúbica simples uma caracterização via séries de Fourier para potenciais periódicos dos operadores de Schrödinger. Tal resultado é relevante pois ele garante que qualquer potencial assumindo condições necessárias de simetria no reticulado pode ser reescrito de forma muito mais simples como somas de cossenos.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao professor Leonardo de Lima pela revisão minuciosa de parte deste trabalho, ao professor Tobias Heimfarth pelas conversas e ao referee anônimo pelas contribuições sem as quais este trabalho não seria viabilizado.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    25 Maio 2020
  • Revisado
    30 Jun 2020
  • Aceito
    09 Jul 2020
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