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"O Ensino Médico no Brasil Está Mudando?" Transpondo Desafios para Concretizar Mudanças

Is Medical education Changing in Brazil? Overcoming Challenges in Order to Achieve Changes

Resumo:

As exigências crescentes da sociedade em relação ao profissional da saúde levaram à necessidade de mudanças na educação médica. Formar um profissional capaz de tratar o indivíduo doente como um todo, sem esquecer o ambiente onde ele vive e suas dificuldades emocionais e financeiras, é hoje fundamental. A aprendizagem baseada em problemas surgiu como uma boa alternativa, pois consegue unir conhecimentos e induzir o raciocínio do aluno de forma a observar todos os aspectos relevantes para a saúde.

Concretizar mudanças exige muito dinamismo e trabalho, uma vez que o processo precisa ser constantemente avaliado para se adequar às dificuldades e problemas surgidos durante a mudança curricular.

Palavra chave:
Educação Médica-Tendências

Abstract:

Greater demands by society on the health profession have caused changes in medical education. Today's challenge is to train the physician to treat the patient as a whole individual, without overlooking his or her emotional and financial problems. Problem based learning has emerged as a viable alternative, since it combines different forms of knowledge and stimulates the student's reasoning so as to observe all aspects relevant to health. To achieve change demands energy and work , since the process needs to be continually evaluated in order to adapt to difficulties and problems arising during alterations in the curriculum.

Key-words:
Medical Education-Trends.

INTRODUÇÃO

Muitos fatores contribuíram para que o ensino médico no Brasil fosse amplamente discutido por acadêmicos, docentes e pela sociedade em geral. A necessidade de profissionais médicos capazes de atender aos anseios de uma população cada vez mais exigente e a defasagem dos currículos tradicionais quanto à abordagem de assuntos importantes, como bioética e relação médico-paciente, são apenas alguns exemplos que levaram ao surgimento de muitos focos concretos de mudança na educação médica brasileiro.

Assim a Universidade Estadual de Londrina (UEL) adotou desde 1998 a Aprendizagem Baseada em Problemas (Problem Based Learning - PBL.) no currículo do curso de Medicina. Desde então um trabalho sério vem sendo desenvolvido para concretizar as mudanças planejadas O processo de mudança é dinâmico e precisa ser flexível para transpor as dificuldades que vão surgindo. Porém os objetivos a atingir na formação médica precisam estar bem definidos e caracterizados, de forma que naosej.om distorcidos pelas adaptações que ocorrem durante a implantação de uma nova metodologia de ensino11. Campos JJB. et al. Seminário de Avaliação do Curso de Medicina da Universidade Estadual de Londrina (regime seriado). Rev. Bras. Educ. Med. 1997; 21: (2/3), 32-35..

Antes de tudo, preciso lembrar que a mudança está afetando as vidas de alunos que confiaram na instituição de ensino, entregando-lhe a responsabilidade de sua formação profissional. Geralmente, acadêmicos de Medicina são exigentes e, muitas vezes, cobram decisões e atitudes rápidas por parte dos docentes responsáveis pela implantação curricular.

Neste contexto, faz-se a pergunta: como vem transcorrendo a mudança do ensino médico em Londrina?

A RENOVAÇÃO NO MÉTODO DE TRANSMISSÃO DO CONHECIMENTO

O abandono das extensas e cansativas aulas teóricas e a adoção das tutorias tendo como base a discussão de problemas são um dos pontos mais fortes da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP). A dinâmica das reuniões tutoriais vem evoluindo à medida que os alunos avançam no curso, e hoje a metodologia já está praticamente dominada na escola. É espetacular a capacidade de discussão dos acadêmicos que abrange os objetivos de estudo delimitados. Os estudantes assumem um papel num processo de aprendizagem ativo, baseado na construção de novos conhecimentos a partir dos conhecimentos de que já dispõem interativo, centrado no aluno e auto direcionado22. Mamede S., Penaforte J. Aprendizagem baseada em problemas: anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza, CE: Hucitec,2001..

Uma contradição frente ao que prega o modelo original da ABP, observada entre os estudantes, é a nítida preferência por tutores médicos, principalmente nos módulos que compõem o terceiro e quarto anos do curso. Teorias sobre o método sustentam que o tutor tem papéis e características bem específicas. Sua principal função não é transmitir informações e, sim, servir de suporte para que o estudante construa seu próprio conhecimento. Mesmo não sendo um especialista no tema em estudo, um bom conhecimento do assunto é um importante critério na escolha de um tutor. Para que um tutor não médico exerça adequadamente sua função é fundamental que os objetivos de aprendizagem estejam claros, é preciso que estejam à disposição dos tutores todos os recursos de aprendizagem utilizados pelos alunos, é necessária uma boa orientação do coordenador do módulo para com os tutores enfim, fácil acesso a especialistas das diversas áreas com os quais possam sanar dúvidas e trocar ideias em relação aos problemas22. Mamede S., Penaforte J. Aprendizagem baseada em problemas: anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza, CE: Hucitec,2001..

Um dos problemas que a universidade enfrenta é conseguir recrutar e capacitar docentes suficientes para todos os grupos tutoriais. Isto porque cada módulo necessita de dez tutores e no mínimo cinco condutores para se desenvolver, sem considerar os docentes envolvidos na elaboração do módulo que não estão atuando nas tutorias. Considerando-se que são quatro turmas em atividades alternadas nos cinco dias da semana, são precisos cerca de 60 docentes diretamente ligados ao andamento dos módulos na ABP. É claro que o curso de Medicina da UEL conta com um número muito superior de docentes controlados, porém muitos professores sempre estiveram mais ligados aos alunos do internato médico (quinto e sexto anos) trabalhando diretamente com o ciclo clínico.

Colocar estes docentes para atuar com alunos do ciclo básico não tarefa das mais fáceis por vários motivos: em primeiro lugar, porque entre os docentes ciclo clínico está um dos principais focos de oposição à mudança curricular33. Campos JJB. Como abrir caminhos para a transformação de ensino médico no Brasil. Rev. Bras. Educ. Med . 1999; 23: (2/3), 11-20., em segundo, porque a ABP tem como característica uma forte aproximação entre professor e aluno durante as reuniões tutoriais, por meio da troca de informações. Muitas vezes, existem confrontos entre a literatura trazida pelo aluno e a prática do professor. Obviamente é preciso maleabilidade para não ser mais o dono do conhecimento e, sim, um facilitador para separar informações equivocadas do aprendizado correto. É o desaparecimento do professor como grande possuidor do conhecimento33. Campos JJB. Como abrir caminhos para a transformação de ensino médico no Brasil. Rev. Bras. Educ. Med . 1999; 23: (2/3), 11-20.. E em terceiro, porque o grupo tutorial afasta o médico da prática de sua profissão e o aproxima mais do papel de educador e, é claro, a prática profissional pode ser mais agradável que a teorização.

Transformar a educação médica implica mudar relações de poder estabelecidas na escola médica. Por isso a condução de um processo de mudança não pode ser ingênua: tem que levar em conta a necessidade de ativamente acumular poder a favor e diminuir a capacidade de ação das forças contrárias. Processos de mudança não são estatísticos, ao contrário. Quem está de um lado hoje pode estar do outro amanhã44. Feuerwerker LCM. Como Caminhos para não abrir espaço à transformação do ensino médico. Rev. Bras. Educ. Med .1999; 23: (2/3), 21-27..

O NOVO MODELO PARA O ENSINO DE HABILIDADES E ATITUDES

A consolidação das mudanças no ensino da semiologia foi um desafio particular na ABP. O método considera que as habilidades profissionais vão além das técnicas tradicionais da semiologia, para incorporar a capacidade de boa comunicação com diferentes indivíduos e suas famílias, inclusive sobre temas delicados e difíceis55. Arruda BKG. A educação profissional em saúde e a realidade social Recife, PE: Instituto Materno Infantil de Pernambuco (MIP). 2001. 318p (Publicações Científicas do Instituto Materno infantil de Pernambuco, 1). Como o ensino acontece em pequenos grupos, no início da mudança curricular os alunos recebiam o conteúdo da forma que o docente responsável acreditava ser a ideal. Foram necessárias muitas reuniões entre a comissão de habilidades e atitudes e os alunos para caracterizar os pontos fracos e apontar soluções.

Após muita discussão, atualmente as habilidades vivem seu melhor momento desde o início da implantação do currículo. O conteúdo de semiologia a ser trabalhado com os estudantes foi definido em reuniões dos professores envolvidos, e um cronograma anual foi montado. Os alunos foram divididos em grupos de dez, e cada grupo possui um instrutor que segue o cronograma base. Periodicamente, há um rodízio entre grupos e instrutores. A presença do aluno é obrigatória nas atividades. O papel do orientador, uma espécie de professor consultor para sanar as dúvidas dos estudantes, se fortaleceu e este passou a ser uma figura estratégica no método.

A avaliação do conteúdo passou a ser sistemática e homogênea, ocorrendo semestralmente por meio de gincanas, seguindo o modelo OSCE (Objective, Structured Clinical Examination). Este modelo superou as duas técnicas mais antigas, tradicionais e comuns nas escolas médicas: a observação “em serviço”- em que o supervisor detecta pontos positivos e negativos no desempenho do estudante, enquanto o observa na execução de atividades clínicas rotineiras - e o exame prático com “caso-longo” - no qual o avaliador solicita ao examinado que faça uma anamnese e o exame físico de um paciente pré-selecionado, tarefas seguidas pela arguição. Tais modelos não permitem a padronização da avaliação, pois variam de acordo com o avaliador. Já o modelo OSCE garante que todos os alunos sejam avaliados nas mesmas condições, valendo-se de pessoas que simulam pacientes padronizados e de protocolos de observação utilizados pelos avaliadores22. Mamede S., Penaforte J. Aprendizagem baseada em problemas: anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza, CE: Hucitec,2001.),(66. Troncon LE. A Avaliação de habilidades clínicas: os métodos tradicionais e o modelo “OSCE”. Olho mágico. 2001, 8: (1), 8-12..

O ensino de comunicação merece destaque na ABP. Vários tópicos são abordados desde o primeiro ano do curso: como receber o paciente, como estabelecer um bom relacionamento com crianças, jovens e idosos, e até mesmo como transmitir más notícias ao paciente. É importante no desenvolvimento de tais atividades a presença de profissionais da psiquiatria, enfermagem e psicologia, entre outros. Geralmente, outros profissionais da saúde passam muito mais tempo com o doente do que o médico e acabam por desenvolver uma capacidade humana de atendimento mais eficaz. É exatamente esta vivência que vem sendo transmitida aos acadêmicos de forma a moldar médicos mais sensíveis às necessidades e carências do indivíduo enfermo. No caso das habilidades de comunicação, mais do que enfatizar o que dizer, é enfatizada a aprendizagem de como dizer (55. Arruda BKG. A educação profissional em saúde e a realidade social Recife, PE: Instituto Materno Infantil de Pernambuco (MIP). 2001. 318p (Publicações Científicas do Instituto Materno infantil de Pernambuco, 1).

COMUNIDADE, INTERDISCIPLINARIDADE E INDIVIDUALIZAÇÃO CURRICULAR

Um dos pontos mais criticados no ensino médico tradicional é a falta de possibilidade de individualização curricular, uma vez que todos os espaços são ocupados ou obstruídos. O estudante não passa de um espectador e só terá a oportunidade de sentir-se médico realmente durante o internato, nos dois últimos anos do curso77. Koifman LA. Teoria de currículo e a discussão do currículo médico. Rev. Bras. Educ. Med. 1998: 22: (2/3). 37-47.. Além disso, o método tradicional é acusado de negligenciar os aspectos interpessoais do cuidado à saúde e subestimar a importância do trabalho em equipe55. Arruda BKG. A educação profissional em saúde e a realidade social Recife, PE: Instituto Materno Infantil de Pernambuco (MIP). 2001. 318p (Publicações Científicas do Instituto Materno infantil de Pernambuco, 1).

Procura-se mudar tal aspecto na Aprendizagem Baseada em Problemas por intermédio das eletivas (período em que o aluno acompanha atividades de um serviço a sua escolha) e do PIN (Práticas interdisciplinares de Interação Ensino, Serviço e Comunidade).

As eletivas atingem seus objetivos facilmente, uma vez que os alunos têm a chance de se aproximar da realidade médica nas áreas mais variadas. Como a profissão médica é extremamente versátil - o indivíduo pode inclinar se tanto para a prática clínica, cirúrgica, diagnóstica, como para a pesquisa científica, medicina preventiva e comunitária, entre outras -, a diversidade de possibilidades oferecida pelas eletivas permite ao acadêmico conhecer melhor suas inclinações e talentos de forma que futuramente será mais fácil optar por uma residência médica ou mesmo permanecer como médico generalista88. Yazbeck DCM. et al. Novos rumos para a Educação Médica. Rev. Bras. Educ. Med. 2000; 24:(2). 26-30..

O PIN, no entanto, merece discussão e análise pelos responsáveis do novo currículo da UEL A proposta educacional de aproximar o estudante dos demais profissionais de saúde e também da comunidade é de grande valor33. Campos JJB. Como abrir caminhos para a transformação de ensino médico no Brasil. Rev. Bras. Educ. Med . 1999; 23: (2/3), 11-20.. O programa propõe ainda a parceria entre a universidade, serviços de saúde e comunidade99. Feuerwerker LCM, Tancred FB. Impulsionando o movimento de mudanças na formação dos profissionais de saúde. Olho mágico . 2001; 8: (2), 11-14.. O acadêmico entraria desde cedo na atenção em nível primário, ascenderá ao nível secundário e posteriormente ao nível terciário. Nesse processo, tomaria contato com a realidade concreta de saúde do país, aprenderia a identificar o normal, o saudável e a preservar o saudável, ao mesmo tempo em que se tornaria capaz de diagnosticar e tratar as doenças mais frequentes e de interagir com os demais profissionais da saúde1010. Negri Filho A. La transformación de la enseñanza médica: concepciones estratégicas. Divulgação em Saúde para Debate em Saúde. 1991:5: 37-40.. Contudo, as atividades ofertadas durante os quatro anos em que o PIN é obrigatório parecem deixar a desejar, uma vez que se percebe o desinteresse dos acadêmicos pelo programa.

Refletindo sobre os motivos desse desinteresse, conclui-se que as atividades propostas não são atraentes o suficiente para engajar os alunos no PIN. No início, os objetivos são baseados em ações de prevenção de saúde. Particularmente no primeiro ano do curso, quando as atividades são desenvolvidas em conjunto com outros cursos da área da saúde (enfermagem, farmácia, fisioterapia e odontologia) em caráter obrigatório para a Medicina e opcional para os demais, os futuros médicos sentem-se sobrecarregados e, de maneira geral, consideram desigual a divisão de obrigações e tarefas. Nos outros anos, a proposta torna-se repetitiva e existe uma lacuna em relação à integração entre escola e comunidade. Os profissionais dos serviços que recebem os acadêmicos (Unidades Básicas de Saúde, Programas de Saúde da Família, hospitais não escola. etc.) não sabem ao certo qual a função do futuro médico no serviço, e geralmente o que ocorre é uma tentativa de repassar a própria obrigação para o acadêmico ou a simples indiferença em relação ao “intruso”.

Eis aí um grande desafio, tornar a interação entre escola médica e comunidade uma realidade estimulante para o estudante, de modo que este se sinta tocado paro atuar em serviços como Unidades Básicas de Saúde e Programas de Saúde da Família e superar experiências anteriores - em que a academia tendia a fazer prevalecer seus pontos de vista, ignorando necessidades e opiniões de parceiros - e realizar a construção curricular com base em relações muito mais democráticas entre serviços, academia e comunidade1111. Campos JJB, Komatsu R. Novos currículos de medicina na FAMEMA e no UEL: uma construção permanente rumo à realidade presente e futura. Olho Mágico. 2001:8: (2), 8-10..

Para superar esse desafio, atualmente estão sendo produzidas mudanças nas relações e papéis. Exemplo disso é a definição dos conteúdos da graduação por meio de um processo coletivo e coordenado, que não está sob o controle das disciplinas ou de departamentos isolados. Há abertura de espaços para o desenvolvimento de investigações sobre temas relevantes identificados pela comunidade e pelos serviços. Desta forma, os profissionais dos serviços e a comunidade participam ativamente do processo de formação99. Feuerwerker LCM, Tancred FB. Impulsionando o movimento de mudanças na formação dos profissionais de saúde. Olho mágico . 2001; 8: (2), 11-14..

AVALIAÇÃO CONSTANTE E FORMATIVA

A avaliação é um instrumento importante na transformação curricular, pois é preciso identificar as estratégias incorretas e reformulá-las rapidamente sem prejuízo para o aprendizado33. Campos JJB. Como abrir caminhos para a transformação de ensino médico no Brasil. Rev. Bras. Educ. Med . 1999; 23: (2/3), 11-20.. Na ABP isto acontece por meio dos instrumentos preenchidos pelos alunos, que avaliam os módulos, as conferências e os tutores.

A avaliação dos conhecimentos faz-se através da avaliação do aluno pelo tutor e das avaliações cognitivas e práticas. As avaliações cognitivas merecem comentário especial. Mesmo contando com reuniões semanais de tutores, nas quais se discute se os objetivos propostos pelos problemas foram ou não atingidos, torna-se difícil formular avaliações que abranjam com exatidão e com a mesma profundidade o que foi estudado separadamente por todos os grupos. Como as questões das avaliações são formuladas por especialistas de cada área, muitas vezes o assunto é abordado de forma mais complexa do que realmente se espera na formação de um médico generalista.

Argumenta-se que métodos inovadores corno a ABP deveriam prescindir de métodos tradicionais de avaliação. Porém, o papel de métodos tradicionais é considerado importante no ABP em relação ao domínio cognitivo da aprendizagem. Têm-se utilizado estratégias para aumentar o “realismo” dos testes, como o emprego de casos clínicos, que “simulam” problemas a serem analisados e resolvidos pelo estudante22. Mamede S., Penaforte J. Aprendizagem baseada em problemas: anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza, CE: Hucitec,2001..

Atingir um equilíbrio na complexidade das avaliações cognitivas torna-se um constante desafio no Aprendizagem Baseada em Problemas, uma vez que cabe ao estudante um papel expressivo na definição do que ele precisa aprender na seleção dos meios que vai usar para isso e na identificação do grau de aprendizado necessário22. Mamede S., Penaforte J. Aprendizagem baseada em problemas: anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza, CE: Hucitec,2001..

O ENSINO DAS DISCIPLINAS BÁSICAS

Tanto quanto nos currículos tradicionais, o ensino das disciplinas básicas no ciclo pré- clínico permanece um desafio. O currículo adotado na Universidade Estadual de Londrina é capaz de aproximar disciplinas básicas e clínicas, porém, precisa frear o impulso natural do alunado em dar mais importância à dinâmica principalmente durante os dois primeiros anos do curso. Propõe-se abordar as disciplinas básicas aos poucos durante os quatro anos do ciclo pré-clínico ao contrário do modelo tradicional, no qual havia uma clara divisão entre o ensino das ciências básicas, desenvolvido nos dois primeiros anos da formação, e o conhecimento clínico introduzido a partir do terceiro ano22. Mamede S., Penaforte J. Aprendizagem baseada em problemas: anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza, CE: Hucitec,2001..

Contudo, com o avançar do curso, não se pode deixar de lado a observação corrente do esquecimento, pelos alunos de conceitos básicos. O novo círculo atinge um importante objetivo do ensino médico, a responsabilidade de encorajar o aluno para, uma atitude científica para fazer julgamentos claros e perceber a importância dos assuntos para a formação médica1212. Amorim DS. Necessidades básicas da transição paradigmática o ciclo pré-clínico. Rev. Bras. Educ. Med . 1997; 21: (1), 17-24.. Quando se depara com o estudo completo de algumas clínicas o estudante sente a real necessidade do conhecimento total das disciplinas básicas, de forma que é questionável a proposta de fragmentar o conteúdo básico em quatro anos.

Outro fator importante em relação ao ensino das disciplinas básicas refere-se ao outro foco de resistência docente ao novo currículo33. Campos JJB. Como abrir caminhos para a transformação de ensino médico no Brasil. Rev. Bras. Educ. Med . 1999; 23: (2/3), 11-20.. No currículo tradicional os docentes das áreas básicas ocupam um espaço importante no curso de Medicina. Tal espaço serve tanto para transmitir conhecimentos como para expor os resultados das pesquisas destes docentes. A privação sofrida por estes professores torna-se importante quando se relembra o objetivo total da instituição de ensino superior, que engloba não apenas o ensino de uma profissão, mas também o incentivo à pesquisa científica.

A pesquisa científica é de extrema importância na educação médica. Considerando-se a necessidade de atualização constante em relação às inúmeras mudanças que ocorrem na área médica e a permanente necessidade de atualização terapêutica do médico11. Campos JJB. et al. Seminário de Avaliação do Curso de Medicina da Universidade Estadual de Londrina (regime seriado). Rev. Bras. Educ. Med. 1997; 21: (2/3), 32-35..

ANALISANDO GLOBALMENTE

O progresso científico e tecnológico e as transformações sociais vão exigir cada vez mais dos futuros médicos uma visão de mundo e de futuro que lhes permita atuar como profissionais num mundo economicamente globalizado, politicamente conturbado e ecologicamente ameaçado1313. Chaves MM. Avaliação da Educação Médica. Rev. Bras. Educ. Med . 1997; 21: (1) 3-8.

Ressalta-se também o surgimento de novas tendências para a profissão, com o resgate do médico de família e generalista, de forma a atender as carências da população que sofre com atendimentos precários à custa de horas de espera nas filas dos hospitais e postos de saúde.

É importante também a existência de uma boa relação médico-pacientes, principalmente para enfrentar a crescente prevalência de doenças crônicas ainda não curáveis, como o câncer e a aids.

Dentro desta realidade, o novo currículo adotado pela Universidade Estadual de Londrina vem realmente transformando o ensino médico, pois mostra preocupação com as tendências atuais da educação médica.

À medida que os problemas vêm surgindo, soluções vêm sendo apresentadas, e - o que é mais importante - os responsáveis pela implantação estão abertos a sugestões e dispostos a realizar as adaptações necessárias para construir um curso de Medicina moderno e condizente com o médico do futuro. A transformação vem acontecendo exatamente como precisa ser: de forma dinâmica.

Mais do que uma ciência, a medicina é uma arte. A escola médica deve ser capaz de ensinar a técnica, as habilidades, as atitudes e a teoria, porém alguns atributos não se ensinam, pois são intrínsecos do indivíduo que nasceu com o dom da medicina. A lapidação desse dom pela educação médica, os valores e a concepção de vida de cada acadêmico é que formam um bom médico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • 1
    1Este artigo foi o vencedor do III Prêmio Abem de Educação Médica na categoria “Estudante”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2002

Histórico

  • Recebido
    Set 2000
  • Aceito
    Set 2000
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