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Inserção do Conteúdo Fitoterapia em Cursos da Área de Saúde

Inclusion of Phytotherapy Content in Health Training Courses

RESUMO

Este trabalho verificou a opinião de acadêmicos da Saúde sobre a inserção do conteúdo fitoterapia nos cursos de graduação. Trata-se de estudo transversal e analítico, realizado com aplicação de questionário a alunos de Enfermagem, Medicina e Odontologia em 2011. Participaram 248 acadêmicos, a maioria do sexo feminino (69,8%), com idade entre 17 e45 anos. Os estudantes (70,8%) mostraram interesse pela inclusão da fitoterapia, sem diferença entre os sexos (p= 0,757), sendo 83,1% da Enfermagem, 68,2% da Medicina e 63,0% da Odontologia (p=0,019). Entre as motivações destacam-se: ampliação do conhecimento (35,7%) e constatação da evidência científica (16,5%). O desconhecimento da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares foi de 84,7% na Enfermagem, 84,6% na Medicina e 74,7% na Odontologia (p=0,166), sem diferença significativa entre os sexos (p= 0,333). Conclui-se que os estudantes são favoráveis à inserção do conteúdo fitoterápico no currículo, embora desconheçam a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, regulamentada para o sistema de saúde brasileiro.

Estudantes; Saúde; Plantas Medicinais; Fitoterapia; Educação Médica

ABSTRACT

This study examined the views of health academics about the inclusion of herbal medicine content in undergraduate courses. It is cross-sectional analytical study, with a questionnaire applied tonursing, medical and dentistry students in 2011. The study involved248 students, mostly women (69.8%), aged 17-45 years. The students (70.8%) showedinterest in the inclusion of herbal medicine, with no difference between genders (p = 0.757) and 83.1% of nursing, 68.2% and 63.0% of medical and dentistry students (p = 0.019), respectively. The reasons given for this include: expansion of knowledge (35.7%) and finding scientific evidence (16.5%). 84.7% of the nursing students, 84.6% ofthe medical students and 74.7% of the dentistry students (p = 0.166) did not know about the National Policy on Integrative and Complementary Practices, with no significant difference between genders (p = 0.333). In conclusion, students favor the inclusion of herbal medicine content in the curriculum, despite being unaware of the National Policy on Integrative and Complementary Practices, regulated forthe Brazilian health system.

Students; Health; Medicinal Plants; Phytotherapy; Medical Education

INTRODUÇÃO

A humanidade, para curar seus males, sempre utilizou elementos medicamentosos encontrados na natureza. As plantas medicinais serviram como base na confecção de medicamentos. Esses conhecimentos foram sendo aprimorados e enriquecidos através das gerações, sendo transmitidos nos ambientes domésticos e difundidos em maior grau posteriormente.

Com o advento da revolução científica e da revolução industrial, práticas terapêuticas que não apresentassem evidências científicas com base em métodos experimentais e em fenômenos matemáticos quantificáveis foram marginalizadas. Novas maneiras de tratar e curar as doenças foram surgindo com o uso dos medicamentos industrializados, que ganharam notoriedade com o desenvolvimento do modelo científico experimental em detrimento do uso de plantas medicinais.

Os medicamentos alopáticos foram introduzidos no cotidiano das pessoas, não somente pelos profissionais de saúde como também por campanhas publicitárias dos laboratórios, que produziam medicamentos com a promessa de curar as mais diversas doenças11. Alvim NAT, Ferreira MA, Cabral IE, Almeida Filho AJ. O uso de plantas medicinais como recurso terapêutico: das influências da formação profissional às implicações éticas e legais de sua aplicabilidade como extensão da prática de cuidar realizada pela enfermeira. Rev Lat Am Enfermagem 2006;14(3):316-23.-22. Badke MR, Budó MLD, Alvim NAT, Zanetti GD, Heisler EV. Saberes e práticas populares de cuidado em saúde com o uso de plantas medicinais. Texto contexto-enferm 2012;21(2):363-70..No Brasil, na década de 1980, após vasta experiência com os medicamentos alopáticos,houve uma insatisfação da população em face dos efeitos adversos que provocavam, além do alto custo, que impedia o acesso a eles33. Batista LM, Valença AMG. A fitoterapia no âmbito da atenção básica do SUS: realidade e perspectivas. Pesq Bras Odontoped Clin Integr 2012;12(2):293-6..

Desse modo, resgatou-se o uso dos fitoterápicos no meio científico, para se juntarem aos medicamentos convencionais, apoiado pelas políticas públicas e regulamentado pelos respectivos Conselhos Federais quanto ao direito de exercer tais práticas. Essas medidas tinham o propósito de ampliar o acesso a outras opções de tratamento, com produtos seguros, eficazes e de qualidade, de forma integrativa. Entretanto, não se pensou em substituir o modelo convencional, mas em ter na fitoterapia uma prática complementar, principalmente no âmbito da Atenção Básica à saúde33. Batista LM, Valença AMG. A fitoterapia no âmbito da atenção básica do SUS: realidade e perspectivas. Pesq Bras Odontoped Clin Integr 2012;12(2):293-6.. Outros fatores têm contribuído para o aumento da utilização das plantas como recurso medicinal, entre eles o difícil acesso da população à assistência médica, bem como a tendência ao uso de produtos de origem natural. Acredita-se que o cuidado realizado por meio das plantas medicinais seja favorável à saúde humana, desde que o usuário tenha conhecimento prévio de sua finalidade, riscos e benefícios22. Badke MR, Budó MLD, Alvim NAT, Zanetti GD, Heisler EV. Saberes e práticas populares de cuidado em saúde com o uso de plantas medicinais. Texto contexto-enferm 2012;21(2):363-70..

Em 2006, o Ministério da Saúde aprovou a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares(PNPIC) no Sistema Único de Saúde(SUS). Essa política legitimou o uso de plantas medicinais voltado a uma medicina humanizada, holística, e estabeleceu um crescimento do uso dessas práticas terapêuticas. Ela contribui para a validação científica das espécies de fitoterápicos com o pensamento emergente da abordagem integral do indivíduo segundo sua natureza biopsicossocial e reconhece os saberes tradicionais, valorizando mecanismos naturais de manutenção e recuperação da saúde44. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971. Aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, 2006. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pnpic.pdf
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. Em 2010, foram atualizados os requisitos para comprovação da segurança e eficácia desses medicamentos e sugeridas alternativas ao controle de qualidade de cada etapa de produção55. Carvalho ACB, Perfeito JPS, Silva LVC, Ramalho LS, Marques RFO, Silveira D. Regulation of herbal medicines in Brazil: advances and perspectives. Brazilian Journal of Pharmaceutical Sciences 2011;47(3): 467-73. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1984-82502011000300004&lng=en. Acesso em: 22 maio 2014.
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Ainda em 2010, o Ministério da Saúde criou a Farmácia Viva, no âmbito do SUS, que tem como atribuições realizar etapas como cultivo, coleta, processamento, armazenamento e manipulação de plantas medicinais66. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n°886 de 20/05/2010. Institui a Farmácia Viva no âmbito do SUS. Brasília, 2010. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2010/prt0886_20_04_2010.html
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. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que, em países ricos, a maioria das pessoas busca tratamento com produtos naturais por julgarem que estes são mais seguros77. Organização Mundial da Saúde. Estratégia de la OMS sobre medicina tradicional 2002-2005. Disponível em:http://whqlibdoc.who.int/hq/2002/WHO_EDM_TRM_2002.1_spa.pdf
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. Nas duas últimas décadas, alguns estados e municípios brasileiros implantaram Programas de Fitoterapia com o intuito de suprir carências medicamentosas das comunidades88. Santos RL, Guimarães GP, Nobre MSC, Portela AS. Análise sobre a fitoterapia como prática integrativa no Sistema Único de Saude. Rev Bras Plantas Med 2011;13(4):486-91.. E a escola, por ter uma missão educativa, possibilita a articulação entre o saber familiar/popular e escolar/científico99. Born MC, Ceolin S, Badke MR, Vargas NSC, Ribeiro MZ, Ceolin T, Heck RM. Saberesdo Corpo e da Natureza:Despertando talento nos escolares sobre o uso de plantasmedicinais. Rev Lat Am Enfermagem 2011;14(3):1-4. Disponível em: http://formularios.extension.edu.uy/ExtensoExpositor2013/archivos/877_resumen1099.pdf .
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Diante dos avanços percorridos e concretizados através de decretos e portarias, o Ministério da Saúde estimula e incentiva a pesquisa na área da fitoterapia e inclui o tema como prioridade na rede de pesquisas em Atenção Primária a saúde44. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971. Aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, 2006. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pnpic.pdf
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. Assim, tornam-se importantes os ensinamentos e conhecimentos didáticos que forneçam embasamento científico no aprimoramento do profissional da saúde, viabilizando a estratégia de oferta de ações e serviços nesta área enquanto prática integrativa e complementar. A introdução da fitoterapia no currículo acadêmico pode oferecer maior segurança ao profissional para atuar junto ao SUS, preservando o direito dos usuários de escolherem alternativas de tratamento.

Este estudo foi realizado na Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), localizada em cidade ao norte de Minas Gerais, polo industrial regional, tendo a indústria e o comércio como importantes atividades econômicas. Os biomas cerrado e caatinga constituem a vegetação dominante. Sua população é de aproximadamente 362 mil habitantes, com uma vasta extensão rural, o que caracteriza uma população de campesinos em que predomina a cultura de subsistência familiar. Nesse contexto, o interesse dos universitários em adquirir conhecimento científico sobre plantas medicinais pode ser despertado e melhorar a produção social da saúde. Também há o fato de essas técnicas alternativas serem reconhecidas pelos Conselhos Federais de Enfermagem, Medicina e Odontologia e oferecidas no SUS. O objetivo do trabalho foi conhecer a opinião dos acadêmicos de Enfermagem, Medicina e Odontologia sobre a inserção do conteúdo plantas medicinais e fitoterápicos nos cursos de graduação.

METODOLOGIA

Trata-se de estudo transversal e analítico, realizado com graduandos em Saúde no ano de 2011. Acadêmicos do primeiro ano (iniciantes) e do último ano (concluintes) dos cursos de Enfermagem, Medicina e Odontologia participaram do estudo, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Cada período se refere a um semestre de graduação. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unimontes, parecer nº 2.906/11, segundo as diretrizes que normalizam a pesquisa que envolve seres humanos, do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde1010. Brasil. Ministério da Saúde. Resolução nº 466/12. Sobre pesquisa envolvendo seres humanos. Brasília, 2012. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
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. Utilizou-se um questionário semiestruturado e autoaplicado, após um estudo piloto.

O questionário foi composto pelas seguintes questões: sexo (feminino, masculino); religião, naturalidade (questão aberta); ano da graduação (primeiro, último); interesse na inclusão de conteúdo sobre plantas medicinais e fitoterapia na graduação (sim, não); motivo para o interesse (questão aberta) e conhecimento do conteúdo da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares(PNPIC) (sim, não). A variável religião foi agrupada em católica, evangélica e outras. A naturalidade foi agrupada em Montes Claros e outras, uma vez que os alunos avaliados são de universidade localizada nessa cidade. Os motivos relatados pelos alunos acerca de interesse na inserção do conteúdo plantas medicinais e fitoterapia no curso foram analisados, para elaboração de categorias. Posteriormente, quantificaram-se as respostas em valores percentuais, com base em cada categoria.

O tratamento estatístico foi no Programa IBM SPSS, versão 22.0. Para a análise descritiva foi utilizado o cálculo de proporções. Para a associação entre as variáveis adotou-se o teste Qui-Quadrado de Pearson, com nível de significância p<0,051111. Hosmer W, Lemeshow S. Applied Logistic Regression. 2.ed. New York: Wiley-Interscience Publication. 2000. 280p..

RESULTADOS

Foram entrevistados 248 acadêmicos, sendo 36,7% do curso de Medicina. Entre os acadêmicos, 54,4% eram iniciantes, ou seja, estavam no primeiro ano do curso. A maioria era do sexo feminino, com idade entre 17 e 45 anos, e média de 22,2 anos. Quanto à religião, predominou a católica, em seguida a evangélica, e poucos alunos relataram pertencer a outras religiões. A maioria dos estudantes é natural da cidade de Montes Claros (62,5%)(Tabela 1).

TABELA 1
Distribuição dos estudantes conforme o perfil

Quanto à inserção do conteúdo de plantas medicinais e fitoterapia na graduação, 70,8% dos estudantes se mostraram favoráveis, sem diferença estatística significativa entre os sexos, 71,4% das mulheres e 69,4% dos homens (p=0,757). Quanto aos cursos, verificou-se que na Enfermagem o percentual de alunos interessados foi maior, correspondendo a 83,1%, quando comparado aos dos alunos de Medicina (68,2%) e Odontologia (63,0%) (p=0,019) (Gráfico 1).

GRÁFICO 1
Distribuição dos estudantes quanto ao interesse na inclusão de plantas medicinais e fitoterapia na graduação em Saúde

Entre os anos de graduação, o interesse pelo conteúdo de plantas medicinais e fitoterapia foi maior entre os acadêmicos concluintes (82,0%) em relação aos iniciantes (61,2%), com diferença significativa, p<0,001. A religião não se associou ao interesse pela inserção desse conteúdo na graduação, havendo entre os evangélicos manifestação de interesse de 74,4% dos estudantes,de 71,6% dos católicos e de58,8% das outras religiões. A naturalidade também não foi associada ao interesse pelo conteúdo na graduação, relatado por 70,4% dos que nasceram em Montes Claros e por 71,6% para os nascidos em outras localidades.

Para analisar os motivos de interesse dos alunos sobre a INTRODUÇÃO do conteúdo plantas medicinais e fitoterapia como disciplina nos cursos de graduação, as respostas foram agrupadas em categorias: ampliar o conhecimento (35,67%), conhecer a evidência científica acerca das plantas medicinais (16,56%), eficácia no tratamento e cura (11,46%), acesso fácil e econômico (7,00%) e outros (29,29%). Na categoria outros, os acadêmicos relataram justificativas tais como toxicidade, interesse profissional, medicina alternativa, ser muito utilizada e também não ser a inserção importante.

Quando perguntados sobre a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), a grande maioria (81,3%) dos estudantes afirmou não conhecer o assunto, ou seja, apenas 18,7% a conhecem. A frequência do desconhecimento da PNPIC atingiu84,7% dos estudantes na Enfermagem, 84,6%na Medicina e 74,7% na Odontologia (p=0,166) (Gráfico 2).

GRÁFICO 2
Distribuição dos estudantes conforme o conhecimento da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) entre os cursos da Saúde

Em relação ao conhecimento da PNPIC conforme a naturalidade, constatou-se que 81,3% dos nascidos em Montes Claros afirmaram desconhecer a prática, sem diferença significativa para os procedentes de outros municípios (81,3%) (p =0,996). A religião também não se associou ao fato de conhecer ou não a política: entre os católicos, o desconhecimento foi de 80,3%, entre os evangélicos, 79,1%, e entre outras religiões, 88,9%. Entre os sexos, o desconhecimento foi de 79,7% no feminino e de 84,9% no masculino (p=0,333). E entre os acadêmicos iniciantes, na graduação, a maioria (85,0%) desconhece a PNPIC, sem diferença estatística quando comparados aos concluintes (77,0%) (p= 0,110) (Gráfico 3).

GRÁFICO 3
Distribuição dos estudantes, iniciantes e concluintes conforme o desconhecimento da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC)

DISCUSSÃO

A maioria dos participantes é do sexo feminino. A entrada das mulheres nas universidades brasileiras, na década de 1970, representou um marco das mudanças na sociedade, que considerava as instituições de ensino superior um espaço masculino1212. Guedes MC. O contingente feminino de nível universitário nos últimos trinta anos do século XX: a reversão de um quadro desigual. In: XIV Encontro Nacional de Estudo Populacional, ABEP; 2004, Caxambu, MG. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/site_eventos_abep/PDF/ABEP2004_369.pdf
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. A superação do contingente feminino no curso de Odontologia da Unimontes foi constatada desde a implantação desse curso, na década de 19901313. Costa SM, Durães SJA, Abreu MHNG. Feminização do curso de odontologia da Universidade Estadual de Montes Claros.Ciênc. saúde coletiva [online]. 2010;15, suppl.1: 1865-73. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-81232010000700100&script=sci_arttext
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. A predominância da religião católica indica um aspecto cultural, característico da região, pois a cidade de Montes Claros se desenvolveu sobre uma matriz social eminentemente católica. Sua população residente é composta por 68%de católicos1414. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010 [online]. Disponível em: http://cidades.ibge.gov.br/xtras/temas.php?lang=&codmun=314330&idtema=16&search=minas-gerais|montes-claros|sintese-das-informacoes .
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Quanto ao interesse dos estudantes em incluir o conteúdo fitoterapia em seus cursos de graduação, um grande percentual manifestou-se favorável, apesar de não conhecer a eficácia e as indicações dessas práticas alternativas. Esses resultados enfatizam a importância da inserção do conteúdo na graduação, pois se considera que os profissionais de saúde com embasamento científico se tornarão aptos e preparados para lidar com o uso e avaliar os teores dos princípios ativos, possibilitando a aplicação da medicina alternativa na assistência em saúde.

Nesse contexto, pode-se afirmar que os conhecimentos científicos e familiares levam ao processo dinâmico de estímulo ao pensamento crítico e consciente, gerando mudanças na vida dos indivíduos. Esse encontro facilita o desenvolvimento da autonomia do sujeito e abre possibilidade para a liberdade, permitindo realizar escolhas de modo consciente1515. Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 34. ed. São Paulo: Paz e Terra; 2011. 165p..

Na avaliação entre cursos, houve associação entre o interesse da inserção e os cursos de graduação, com maior aceitação no curso de Enfermagem. Destaca-se a importância de os profissionais de saúde, independentemente da formação profissional, exercerem um papel fundamental no cuidado com o paciente, na recuperação e na promoção da saúde.

Em estudo com alunos de Enfermagem, foi observado que algumas terapias alternativas já estão sendo inseridas no curso, seja de forma optativa ou obrigatória, e que o interesse por tais terapias vem crescendo nos últimos anos. Verificou-se também que a fitoterapia foi uma das técnicas mais utilizadas, e o principal motivo para o uso foi a crença dos estudantes na sua eficácia1616. Trovo MM, Silva MJP, Leão ER. Terapias alternativas/complementares no ensino público e privado: análise do conhecimento dos acadêmicos de enfermagem. Rev Lat Am Enfermagem 2003;11(4): 483-9.. Outro estudo demonstrou a aceitação de acadêmicos de Medicina do tema práticas não convencionais em saúde. Mais da metade dos entrevistados indicaria ou apoiaria o uso de práticas alternativas para seus pacientes, evidenciando a necessidade de inclusão de disciplinas curriculares que abordem essas práticas na graduação1717. Külkamp IC, Burin GD, Souza MHM, Silva P, Piovezan AP. Aceitação de Práticas Não-Convencionais em Saude por Estudantes de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina. Rev. bras. educ. méd. 2007;31(3): 229-35..

Na atual pesquisa, entre os motivos de inserção do conteúdo fitoterápico na graduação, a ampliação do conhecimento foi o mais citado pelos acadêmicos. Neste sentido, os estudantes pesquisados reconhecem a importância das plantas medicinais e aceitam se aprimorar nessa área de conhecimento para uma atuação segura como futuros profissionais. Brandão et al.1818. Brandão MGL, Moreira RA, Acúrcio FA. Interesse dos estudantes de Farmácia e Biologia por plantas medicinais e Fitoterapia. Revista Brasileira de Farmacognosia 2001;11(2): 71-6., em estudo com alunos dos cursos de Farmácia e Biologia, observaram que o motivo de interesse por plantas medicinais e fitoterapia mais citado foi o interesse profissional, ficando em segundo lugar a aquisição de conhecimento.

O ambiente acadêmico é o local apropriado para novas discussões. O conhecimento didático da fitoterapia favorece o encontro de futuros profissionais com o que há de novo e os condiciona a formar opiniões e a filtrar informações adquiridas em meio leigo. Existe também um interesse crescente da população por tais tratamentos.

Em 2002, a Organização Mundial da Saúde registrou um aumento do uso dessas práticas, principalmente em países desenvolvidos, e vem incentivando seu emprego com base em evidências de segurança e qualidade77. Organização Mundial da Saúde. Estratégia de la OMS sobre medicina tradicional 2002-2005. Disponível em:http://whqlibdoc.who.int/hq/2002/WHO_EDM_TRM_2002.1_spa.pdf
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.Essa inclusão irá colaborar para auxiliar o aluno a explorar as potencialidades das terapias ainda consideradas não usuais, mas que estão ganhando espaço entre os indivíduos. A capacitação profissional sobre plantas medicinais pode contribuir para a garantia do direito de escolha dos usuários ao tratamento fitoterápico, resguardando, assim, o princípio da autonomia e se contrapondo ao paternalismo profissional, que adota medicamentos alopáticos como único recurso terapêutico.

Um trabalho conduzido com professores sobre a inserção da Medicina Tradicional Chinesa (acupuntura) na graduação dos cursos da Saúde observou que a maioria reconhece a importância dessa temática para o exercício da docência, contudo negligencia sua abordagem enquanto profissional médico e professor, demonstrando dificuldades para articular o objeto das aulas com outra visão mais ampliada sobre o corpo e o adoecer. Os professores demonstram interesse na inserção das práticas não convencionais nos currículos dos cursos de Medicina, diluída em alguma disciplina ou como disciplina optativa1919. Machado MMT, Oliveira JC, Fechine ADL. Acupuntura: conhecimento e percepção de professores universitários Rev. bras. educ. med. 2012; 36(1): 41-9..

Um trabalho de revisão sobre medicinas alternativas e complementares no ensino médico observou que o aumento da utilização dessas práticas requer que os profissionais de Saúde estejam aptos a informar e atender seus pacientes, reconhecer efeitos colaterais e interações medicamentosas, e praticar com segurança as medicinas complementares, isoladas ou associadas às práticas convencionais.

Há diferentes formas de inserção dessas técnicas no ensino, e o ensino dessas técnicas tem como fundamento adicionar à prática médica ferramentas diagnósticas e terapêuticas para a atenção, prevenção e promoção nos diversos níveis de complexidade do sistema de saúde. Destacam-se os seguintes tipos de inserção: incluir tópicos ao longo de todo o currículo, além de desenvolvê-los nas residências médicas e educação continuada. A inserção deve utilizar recursos locais e respeitar os costumes, leis, valores e símbolos culturais do ensino-aprendizagem continuada2020. Christensen MC, Barros NF. Medicinas alternativas e complementares no ensino médico: revisão sistemática. Rev.Brás.Educ.méd. 2010; 34(1)97-105.. Ainda quanto à inserção do conteúdo plantas medicinais, considera-se que a fitoterapia é uma especialidade oferecida no sistema de saúde de nosso país, fato suficiente para incluir tal disciplina no currículo acadêmico, sem esquecer que ela também está inserida nas políticas do Ministério da Saúde.

A grande maioria dos estudantes desta pesquisa afirmou não conhecer a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), implantada no SUS em 2006. Embora esse desconhecimento apresente um percentual maior entre os acadêmicos iniciantes comparado aos dos concluintes da graduação, a diferença não foi significativa. Acredita-se que os resultados sejam decorrentes da falta de discussão sobre o tema na universidade, tanto no início como no final dos cursos.

A PNPIC recomenda a implementação de ações e serviços no SUS com o objetivo de garantir a prevenção de agravos, a promoção e a recuperação da saúde44. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971. Aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, 2006. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pnpic.pdf
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. O impacto da publicação dessa política alcança os campos econômico, técnico e sociopolítico, pois tira da sombra e promove a inclusão de práticas de cuidado subsumidas no discurso e na ação dominadora do complexo mercado de produtos e serviços da racionalidade biomédica2121. Barros NF. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS: uma ação de inclusão. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2006; 11(3):850-50 . Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-81232006000300034&script=sci_arttext
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O Ministério da Saúde vem investindo no uso da fitoterapia como complemento para o SUS, mas, para que isso ocorra de forma correta e segura, é necessário formar profissionais capacitados e que compreendam a química, toxicologia e farmacologia das plantas, sem desconsiderar o conhecimento popular. Programas de fitoterapia já foram implantados em diversas regiões brasileiras. Isto se deve à busca das Secretarias Municipais de Saúde em facilitar o acesso da população aos fitoterápicos, visando ao uso correto dos mesmos88. Santos RL, Guimarães GP, Nobre MSC, Portela AS. Análise sobre a fitoterapia como prática integrativa no Sistema Único de Saude. Rev Bras Plantas Med 2011;13(4):486-91.. A PNPIC contempla a biodiversidade brasileira, aliada ao compromisso de seguir ou propor legislações específicas para o setor. A política entrelaça ações e responsabilidades entre os órgãos federais, estaduais e municipais na sua implantação e implementação44. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971. Aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, 2006. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pnpic.pdf
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. Neste sentido, existe uma preocupação governamental em colocar novas técnicas alternativas à disposição dos profissionais a fim de minimizar gastos e diminuir o tempo dos tratamentos.

Quanto às limitações do atual estudo, por se tratarde uma amostra de conveniência, estudantes iniciantes e concluintes da graduação em Saúde, há possibilidade de haver menor variabilidade quando comparada a toda a população de acadêmicos, limitando os resultados, com associações decorrentes do viés de seleção. Tratando-se de estudo transversal, não se permite estudar a causalidade das associações. Consideram-se também possíveis vieses de informação, inerentes ao levantamento de dados tendo por base um questionário.

CONCLUSÃO

Conclui-se que os estudantes são favoráveis à inserção do conteúdo fitoterápico no currículo da graduação, embora desconheçam a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares regulamentada para o contexto do sistema de saúde brasileiro. Os resultados refletem a necessidade de inclusão do conteúdo de plantas medicinais e fitoterapia na formação em Saúde, para efetivação da Política Nacional, e da promoção do uso dessa prática integrativa e complementar na assistência à saúde.

REFERÊNCIAS

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    Alvim NAT, Ferreira MA, Cabral IE, Almeida Filho AJ. O uso de plantas medicinais como recurso terapêutico: das influências da formação profissional às implicações éticas e legais de sua aplicabilidade como extensão da prática de cuidar realizada pela enfermeira. Rev Lat Am Enfermagem 2006;14(3):316-23.
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    Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971. Aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, 2006. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pnpic.pdf
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    22 Dez 2014
  • Aceito
    18 Abr 2015
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