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O uso do portfólio reflexivo no curso de medicina: percepção dos estudantes

Students' perception of the reflective portfolio in medical school

Resumos

Os métodos ativos de aprendizagem necessitam de processos avaliativos igualmente coerentes com o novo perfil profissional. A Faculdade de Medicina de Marília (Famema) vem utilizando o portfólio reflexivo como instrumento de avaliação formativa no curso médico. Este trabalho propõe-se a analisar a percepção dos estudantes quanto ao seu uso. Trata-se de um estudo qualitativo cujos dados foram coletados pela técnica de grupo focal, à qual se seguiram os passos da técnica de análise de conteúdo na modalidade temática. Definiram-se, então, as categorias temáticas: "O portfólio enquanto espaço que oportuniza reflexão sobre a prática e a aprendizagem ativa"; "Um instrumento de avaliação pro cessual e dialógica"; "O imaginário biomédico e a resistência às mudanças permeando a construção do novo modelo" e "O reconhecimento da necessidade de mudanças". Pode-se considerar que o portfólio reflexivo constitui um instrumento que contribui para a formação profissional, embora sua utilização requeira constantes aproximações e ajustes.

Ensino; Avaliação; Educação Médica


New learning methods require special assessment methods, including the reflective portfolio. The Marilia School of Medicine (FAMEMA) uses the reflective portfolio as a formative assessment tool in undergraduate medical training. The current study analyzes how students perceive the portfolio in use. In this qualitative study, data were collected through focus groups and submitted to content analysis. The following themes were identified: "portfolio as a reflective area for active learning and practice;" "a tool for process and dialogical assessment;" "the biomedical imaginary and resistance to the development of a new model;" and "recognizing the need for changes." Based on the findings, the reflective portfolio contributes to medical education, but its use requires periodic adjustments.

Teaching; Assessment; Medical Education


PESQUISA

O uso do portfólio reflexivo no curso de medicina: percepção dos estudantes

Students' perception of the reflective portfolio in medical school

Maria José Sanches MarinI; Thiago Barbosa MorenoI; Maria Yvette MoravcikI; Elza de Fátima Ribeiro HigaI; Suelaine DruzianII; Ieda FrancischettiI; Mércia IliasI

IFaculdade de Medicina de Marília, Marília, SP, Brasil

IIEstratégia de Saúde da Família do Município de Marília, Marília, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Maria José Sanches Marin Av. Brigadeiro Eduardo Gomes, 1886 Jd. Itamaraty – Marília CEP 17514-000 – SP E-mail: marnadia@terra.com.br

RESUMO

Os métodos ativos de aprendizagem necessitam de processos avaliativos igualmente coerentes com o novo perfil profissional. A Faculdade de Medicina de Marília (Famema) vem utilizando o portfólio reflexivo como instrumento de avaliação formativa no curso médico. Este trabalho propõe-se a analisar a percepção dos estudantes quanto ao seu uso. Trata-se de um estudo qualitativo cujos dados foram coletados pela técnica de grupo focal, à qual se seguiram os passos da técnica de análise de conteúdo na modalidade temática. Definiram-se, então, as categorias temáticas: "O portfólio enquanto espaço que oportuniza reflexão sobre a prática e a aprendizagem ativa"; "Um instrumento de avaliação pro cessual e dialógica"; "O imaginário biomédico e a resistência às mudanças permeando a construção do novo modelo" e "O reconhecimento da necessidade de mudanças". Pode-se considerar que o portfólio reflexivo constitui um instrumento que contribui para a formação profissional, embora sua utilização requeira constantes aproximações e ajustes.

Palavras-chave: Ensino. Avaliação. Educação Médica.

ABSTRACT

New learning methods require special assessment methods, including the reflective portfolio. The Marilia School of Medicine (FAMEMA) uses the reflective portfolio as a formative assessment tool in undergraduate medical training. The current study analyzes how students perceive the portfolio in use. In this qualitative study, data were collected through focus groups and submitted to content analysis. The following themes were identified: "portfolio as a reflective area for active learning and practice;" "a tool for process and dialogical assessment;" "the biomedical imaginary and resistance to the development of a new model;" and "recognizing the need for changes." Based on the findings, the reflective portfolio contributes to medical education, but its use requires periodic adjustments.

Key-words: Teaching. Assessment. Medical Education.

INTRODUÇÃO

As profundas mudanças sociais, políticas, econômicas, culturais e tecnológicas da atualidade têm desencadeado mudanças paradigmáticas cuja consequência é a necessidade de reorganização no modo de agir do ser humano, que deve se abrir para a complexidade e a contradição, pois a condição de certeza e racionalidade técnica preconizadas na modernidade vem sendo substituída pela incerteza e indeterminação da pós-modernidade.

Para Gomes e Casagrande1, estamos vivenciando um momento de crise, uma vez que valores antigos já não resolvem os problemas existentes, e os valores novos não estão ainda firmes e com resultados que atendam às expectativas dos indivíduos. No seu enfrentamento é preciso abrir-se à incerteza, ao risco, ao campo da ação, à diversidade, à diferença e conviver com o dissenso e com a comunicação dialógica.

Para atender a tais necessidades, a educação precisa voltar-se para a formação de pessoas/profissionais capazes de participar do processo de transformação da sociedade de forma crítica e flexível. Assim, surge no cenário educacional a "cultura reflexiva", que representa uma nova postura frente às situações educativas e tem como marco a Teoria da Indagação de John Dewey (1859-1952), centrada nas experiências práticas e conhecida como "fazendo e aprendendo"2.

O processo de reflexão defendido por Dewey tem início no enfrentamento de situações de difícil superação, em que a instabilidade gerada leva o indivíduo a analisar as experiências anteriores, com ponderações cuidadosas, persistentes e ativas, revendo suas crenças e práticas. Nessa reflexão estão envolvidas a intuição, a emoção e a paixão, além da lógica da razão, as quais, de forma articulada, caracterizam-se pela visão ampla de se perceberem os problemas1.

Na concepção de Schön (filósofo e pedagogo norte-americano), cujos pressupostos estão apoiados no pensamento de Dewey, o desenvolvimento de uma prática reflexiva envolve duas ideias centrais: o "conhecimento na ação" e a "reflexão sobre a reflexão na ação". Esses processos se complementam e constituem o "pensamento prático" do profissional, com o qual ele enfrenta situações "divergentes" da prática2.

Significativas contribuições também foram dadas à "cultura reflexiva" por meio da educação defendida por Paulo Freire, fundada na ética, no respeito à dignidade e em favor da autonomia do ser dos educandos3.

Nessa ótica, o conhecimento é construído pelo movimento de agir sobre a realidade, uma vez que no plano do pensamento esta é refeita pela reflexão, a qual orienta o sujeito na sua transformação por meio da práxis4. Para tanto, essa lógica propõe gerar desequilíbrios cognitivos, conflitos, dúvidas ou problemas em relação ao objeto de conhecimento, cuja resolução seja percebida pelo sujeito como essencial à continuidade de suas atividades5, o que culmina na utilização dos pressupostos da aprendizagem significativa.

As necessidades emergentes no contexto atual representam um grande desafio na formação de profissionais na área da saúde, pois demandam mudanças conceituais, de posturas, de lugares e de relações institucionais, enfrentamento de conhecimentos e valores cristalizados, hegemônicos, além de incluírem a construção de alternativas ainda desconhecidas6.

Visando adequar a formação dos profissionais, o Ministério da Educação e Cultura define as Diretrizes Curriculares dos cursos de graduação em Medicina, nas quais se recomenda o desenvolvimento de competências a partir de vivências reais e contextualizadas da prática, utilizando estratégias metodológicas que possibilitem construir novos conceitos e novas formas de agir e interagir com a realidade.

Nessa perspectiva, um desenho curricular que favoreça a implementação de princípios adequados às necessidades atuais não poderia existir sem um processo de avaliação condizente com os mesmos. A avaliação deve se caracterizar como um processo abrangente, permanente e dinâmico, que implique reflexão crítica sobre a prática, no sentido de visualizar os avanços, as resistências, as dificuldades, facilitar a tomada de decisão e superar os obstáculos, ampliando o espaço da avaliação formativa7.

Ao se considerar que os fenômenos caracterizadores da relação formativa envolvem uma multiplicidade de fatores determinantes e uma diversidade de contingências, o portfólio reflexivo revela-se um instrumento capaz de capturar essa complexidade devido a seu dinamismo e abertura para o mundo real7.

O portfólio consiste em uma modalidade de avaliação iniciada no campo das artes com o objetivo de criar novas formas de avaliação para o desenvolvimento das inteligências artísticas, possibilitando a comprovação dos resultados de trabalhos individuais e a exploração das capacidades criadoras8.

No portfólio reflexivo, que se diferencia do portfólio do campo das artes, o estudante documenta, registra e estrutura as ações, as tarefas e a própria aprendizagem por meio de um discurso narrativo elaborado de forma contínua e reflexiva sobre as atividades educacionais vivenciadas. A narrativa provoca mudança na forma como as pessoas compreendem a si próprias e aos outros e, ao ler seu escrito, é possível ao futuro profissional, inclusive, ir teorizando a própria experiência9.

A Faculdade de Medicina de Marília (Famema), em conformidade com as diretrizes curriculares, tem seu currículo fundamentado por competência profissional e vem trabalhando na integração dos conteúdos e na implicação de seus estudantes diretamente nas práticas vivenciadas no SUS. Ao confrontarem/ vivenciarem a realidade, são estimulados a refletir e a levantar questões que se transformam em motivo de busca por fundamentação teórica e garantem um novo retorno à realidade, possibilitando um contínuo processo de ação-reflexão-ação10.

Desde 2003, o portfólio reflexivo foi adotado para os estudantes dos cursos de Medicina e Enfermagem da Famema, como forma de avaliação dinâmica e como elemento de apoio para a construção da aprendizagem significativa a partir da prática nas Unidades de Prática Profissional (UPP).

Como o portfólio representa uma inovação, em especial para o curso de Medicina, o presente estudo propõe-se a analisar a percepção de estudantes da Famema quanto ao uso deste instrumento na formação profissional.

PERCURSO METODOLÓGICO

A metodologia qualitativa foi considerada apropriada ao estudo por permitir a apreensão da essência dos significados, motivos e aspirações, atitudes, crenças e valores que são fundamentais para a descrição e a compreensão dos fenômenos que envolvem o ser humano11.

O estudo foi realizado com estudantes da quarta, quinta e sexta séries do curso de Medicina da Famema, considerando que utilizam o portfólio como instrumento que auxilia seu processo de formação profissional desde a primeira série do curso.

A Famema é uma instituição estadualizada como autarquia vinculada à Secretaria de Ensino Superior do Estado de São Paulo. Integram a unidade acadêmica do complexo da Famema o curso de Enfermagem, que oferece 40 vagas, e o curso de Medicina, com 80 vagas, ambos anuais; cinco unidades de atenção à saúde, das quais duas são hospitais de ensino com serviços de referência em urgência e emergência, além de recursos diagnósticos e terapêuticos de alta complexidade. As outras três unidades são o Instituto de Olhos de Marília, Ambulatório de Especialidades e Hemocentro.

Para o desenvolvimento do atual currículo, a Famema mantém estreita parceria com a Secretaria Municipal de Saúde de Marília, na qual compartilha não só a estrutura, mas também o processo de trabalho por meio da inserção dos profissionais do serviço na construção e desenvolvimento curricular e no acompanhamento dos estudantes. Docentes e estudantes participam do processo de trabalho das unidades de saúde, de forma a favorecer as discussões e reflexões para a construção de um novo modelo de atenção. Tal construção contou inicialmente com o incentivo do Projeto UNI (Uma Nova Iniciativa), financiado pela Fundação Kellogs, em seguida do Promed e atualmente do Pró-Saúde, sendo os dois últimos subsidiados pelo Ministério da Saúde.

A grade curricular dos cursos conta com a Unidade de Prática Profissional (UPP) e a Unidade Educacional Sistematizada (UES), cujo propósito é promover o desenvolvimento de recursos cognitivos, afetivos e psicomotores que possam ser mobilizados e integrados para a realização de ações em saúde que visam à identificação de necessidades de saúde do indivíduo, da família e do coletivo, e à definição e encaminhamento de um plano de cuidado.

A UES segue a metodologia da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) e busca oportunizar maior resgate e elaboração de processos cognitivos relacionados com as situações-problema apresentadas nos diferentes cenários de aprendizagem. No cenário real (UPP), problematizam-se as necessidades de saúde da pessoa/família, formula-se o problema de saúde e elabora-se um plano de cuidado. Com estas práticas alternam-se momentos de discussão com o grupo todo, nos quais cada dupla de estudantes elege uma ou mais situações a serem apresentadas. A partir da leitura e esclarecimento, problematizam-se as situações. Definidas as lacunas de conhecimento, elaboram-se as questões de estudo. Em seguida, os estudantes buscam teorização para responderem às questões formuladas. Em grupo, é realizada a socialização das informações encontradas, elaborando-se uma nova síntese. Finalizando o ciclo pedagógico, procede-se à avaliação oral (autoavaliação, do grupo, dos professores e da atividade).

O portfólio reflexivo é utilizado pelo estudante para registrar as ações, tarefas e a própria aprendizagem, através de um discurso narrativo elaborado de forma contínua e reflexiva. O uso do portfólio na UPP é considerado uma forma de potencializar a reflexão sistematizada sobre as práticas desenvolvidas, assegurando a construção do conhecimento e do desenvolvimento pessoal e profissional dos envolvidos (docentes e discentes). O portfólio ainda constitui um instrumento que facilita os processos avaliativos, tanto a autoavaliação, como a avaliação formativa realizada pelo professor, permitindo, em tempo hábil, equacionar conflitos cognitivos, afetivos e psicomotores dos estudantes e garantindo condições de desenvolvimento progressivo da autonomia e da identidade destes.

O universo desta investigação envolve 240 estudantes, sendo 80, respectivamente, de cada série em estudo. Foram selecionados, mediante sorteio, oito estudantes de cada série, constituindo-se uma amostragem de 24 estudantes.

Para a coleta de dados optou-se pela técnica do grupo focal, considerada técnica de entrevista por apresentar a possibilidade de expressar a subjetividade dos sujeitos da pesquisa, manifestando suas vivências e experiências no campo em estudo pelo relato verbal e discussões em grupo. No grupo focal, discute-se o tema desejado a partir de questões provocadoras. Os dados são coletados a partir desta discussão, o que proporciona um volume de material com profundidade de conteúdo12.

A técnica possibilita a participação, em média, de seis a dez integrantes, podendo chegar ao total de 15. As atividades de coleta dos dados são gravadas em fita cassete e acompanhadas por um observador que realiza os registros do comportamento dos integrantes em um diário de campo13.

Cada sessão deve ter um coordenador/facilitador, que conduz as atividades do grupo e propõe as questões para as discussões, mantendo o foco no objetivo da pesquisa, chamando o grupo para a questão em foco quando houver dispersão do assunto abordado, articulando o que já havia sido discutido e retomando o tema/questão em foco no momento. O coordenador necessita ter conhecimentos sobre o processo grupal, para que seja o moderador e não um participante das discussões, envolvendo-se com o debate12.

Nesta investigação foram realizados três grupos focais, um para cada oito estudantes de cada série. Para coordenar os momentos de grupo focal, foi convidada uma psicopedagoga que atua como facilitadora de grupos de Educação Permanente e com experiência na técnica. Um dos pesquisadores que atua como professor na Unidade de Prática Profissional e vivencia a utilização do portfólio assumiu o papel de observador, considerando que ele não teve contato prévio com os estudantes que participaram do grupo focal.

O estudo contou com as seguintes questões norteadoras: Qual a sua opinião a respeito do portfólio reflexivo? Em que o portfólio reflexivo contribui para o processo de aprendizagem? Em que o portfólio reflexivo contribui para o processo de avaliação? O que você mudaria na forma ou na construção do portfólio proposto na Famema? Justifique.

Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa com Seres Humanos da Faculdade de Medicina de Marília. Os participantes foram esclarecidos a respeito do propósito desta investigação e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Os dados foram submetidos à técnica de análise de conteúdo, que Bardin conceitua como

[...] um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando à obtenção, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, de indicadores que permitam inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/ recepção destas mensagens14.(p.31)

Entre as técnicas de análise de conteúdo optou-se pela modalidade temática por ser mais adequada à investigação qualitativa.

A técnica de análise de conteúdo, modalidade temática, é desenvolvida em três etapas, compreendendo a pré-análise, que pode ser decomposta em leitura flutuante do conjunto das comunicações; organização do material de forma a responder a algumas normas de validade, como exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência; formulação de hipótese e objetivos em relação ao material qualitativo; definição das unidades de registro. Na segunda etapa, realiza-se a codificação dos dados brutos, para alcançar o núcleo de compreensão do texto. Na sequência, propõe-se o tratamento dos resultados obtidos e a interpretação a partir de inferências previstas no seu quadro teórico ou abertura de outras pistas em torno de dimensões teóricas sugeridas na leitura do material11.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Ao analisar os resultados, tomando como parâmetro a fala dos estudantes que participaram dos grupos focais, foi possível construir quatro categorias temáticas, descritas a seguir.

O portfólio reflexivo enquanto espaço que oportuniza a reflexão sobre a prática e a aprendizagem ativa

Nos processos de aprendizagem atuais, ao se propor o desenvolvimento de uma aprendizagem ativa, consistente, apoiada em um fazer reflexivo diante das necessidades encontradas na realidade, o portfólio reflexivo revela-se um instrumento que contribui para direcionar tal processo, assim como temos observado no desenvolvimento desta prática e na fala dos estudantes, conforme segue: "[...] o portfólio é importante porque é um momento que você tem para colocar aquela vivência que teve no papel. Isso faz refletir, porque você nem para pra pensar [...]" (G1A1).

[...] é um excelente instrumento porque ele permite ao aluno [...] que tenha uma visão reflexiva do cenário real, em que ele está inserido. Também é utilizado como um instrumento de questionamento de situações que ele vive [...] e tem a oportunidade de, usando as dúvidas da prática, construir seu aprendizado teórico [...]. (G2A6)

Pode-se considerar, ainda, nas falas dos sujeitos (G1A1 e G2A6), que o portfólio, ao possibilitar a construção e reconstrução do conhecimento, torna-se um facilitador da aprendizagem, uma vez que o relato, a narrativa, o feito, o realizado, o vivido veiculam significados que auxiliam no próprio aprendizado7.

O significado positivo do portfólio na construção ativa do conhecimento encontra-se também expresso nas falas seguintes:

Você está na prática vendo um caso e, a partir daquele caso que você vivenciou, você vai estudar [...] correlacionar com a prática: o que deveria ser o certo, o que devia ser o errado e mudar a sua prática e vivenciar essa prática de maneira diferente. (G2A2)

Torna a aprendizagem mais significativa. Faz sentido estudar aquilo [...] Ali dentro você estava usando aquilo, você teve um paciente, você teve um estímulo, ou as dúvidas e questões, e você procurou e utilizou as informações que você estudou. (G2A3)

Evidencia-se, portanto, que, ao refletirem sobre a realidade, os estudantes identificam situações-problema concretas, que possibilitam a construção de novos sentidos e implicam compromisso com o seu meio. Desse modo, produzem respostas com seus estudos, visando aplicar os conhecimentos à solução dos problemas vivenciados15.

Essa reflexão crítica sobre a prática, para captar seus avanços, suas resistências e dificuldades, possibilita a tomada de decisão sobre o que fazer para superar obstáculos8.

Esta perspectiva vem ao encontro das idéias de Paulo Freire, quando este afirma que o conhecimento só pode ser desenvolvido na própria ação do indivíduo. Isso faz com que a aprendizagem se torne significativa e duradoura, que o estudante adquira o desejo de aprender e se sinta estimulado a produzir o próprio conhecimento3.

Um instrumento de avaliação processual e dialógica

O portfólio reflexivo pode ser considerado um instrumento de avaliação inovador, uma vez que busca deslocar a atenção para o processo vivenciado e a ampliação individual e coletiva do conhecimento. Em vista disso, aspectos como subjetividade, integração e inclusão passam a ser os norteadores do processo avaliativo. A avaliação, então, é processual e vai sendo tecida pelas relações dialógicas entre docentes, estudantes e as práticas cotidianas, sendo a aprendizagem potencializada por essas interações.

Diferentemente desta proposta, na concepção tradicional de ensino, a avaliação é entendida como uma tarefa docente em que instrumentos podem ser utilizados de modo a garantir a distância epistemológica necessária para medir o objeto e classificá-lo, criando a possibilidade de inseri-lo numa hierarquia. Trata-se de uma dinâmica que isola os sujeitos, dificulta o diálogo, reduz os espaços de solidariedade e cooperação, além de estimular a competição16.

Nos processos inovadores de avaliação, que buscam a formação de um profissional crítico-reflexivo, a intenção não é controlar e classificar, mas melhor compreender e interagir. A dimensão intersubjetiva da relação pedagógica rompe com a concepção de neutralidade do avaliador e a soberania da verdade. Isto favorece a subjetividade e a necessidade de nos reconhecermos com limites, incompletudes e não saberes16.

O portfólio, baseado em tais princípios, é um instrumento que propicia dar voz e visibilidade ao que é silencioso e apagado, como é possível perceber nas falas seguintes:

O que acho legal também é que o portfólio gera uma autoavaliação muito boa [...] você consegue avaliar você mesmo, o que você estudou, o que você não estudou, se aquilo que estudou foi proveitoso para você ou não foi [...] (G3A7)

[...] o professor tem a oportunidade de avaliar o desempenho do aluno, sua melhora na busca teórica, seu conhecimento, seu interesse nos estudos. (G2A5)

Salienta-se, ainda, na fala do estudante G2A5, a importância do olhar do docente, solicitando, desta forma, uma visão compartilhada sobre a realidade. A atividade docente, neste contexto, é marcada por uma postura participativa ao mediar as relações vivenciadas e acompanhar o processo de construção do portfólio. Faz isso concretamente – não os avalia, conceitua; compara de forma esporádica, mas se coloca nas relações, interage, lê de si, do outro e da vida, ressignifica, distancia-se de suas representações. Compreender esta relação eu-outro na construção do conhecimento fortalece a exigência de que o processo avaliativo incorpore a multiplicidade dos olhares constituintes da dinâmica pedagógica16.

O explicitado e o oculto são aspectos importantes, não só pela presença, mas também, pela ausência, já que o processo reflexivo oscila entre aceitar e negar. Não se rejeita tudo, só se acolhe aquilo que suscita sentido. O negado poderá se tornar parte da construção do conhecimento.

O portfólio reflexivo também se revela em permanente construção pelo estudante, continuamente visitado pelo olhar e pela narrativa do docente. É particular, individual e compartilhado de forma consentida e previamente acordada, com um interesse: a construção de sujeitos sociais transformadores, conforme se observa na fala seguinte:

[...] eu fiquei olhando as avaliações antigas e as de agora. Eu consigo ver a diferença e eu acho que isso é o objetivo do portfólio e as avaliações que os professores faziam de mim, porque eles estavam lá todos os dias comigo [...]. (G1A7)

Ao utilizar o portfólio, percebe-se o caráter formativo permear todo o processo e que o diálogo estreito e reflexivo possibilita o desenvolvimento de valores humanos e a compreensão interdisciplinar dos conhecimentos. Ele se torna um facilitador da concepção integrada da vida, das interações humanas que envolvem a formação dos coletivos17.

Dentro desta proposta formativa, o instrumento responde a outros princípios que se interligam numa compreensão da relação entre aprender e ensinar: o reconhecimento da pessoa do estudante, a indispensabilidade de sua autoimplicação na aprendizagem, o efeito multiplicador do diverso, o inacabamento dos processos de formação e a necessidade importante de continuidade da reflexão18.

O imaginário biomédico e a resistência às mudanças permeando a construção do novo modelo

O exercício de um novo papel profissional, necessário para implementar as mudanças no setor saúde, demanda a construção de novos sentidos, em situações em que os conceitos e princípios anteriores ainda não foram abandonados, mesmo se tendo constatado racional e conscientemente essa necessidade. Esse fato é discutido por Ceccim et al.19, que consideram que ainda não aconteceu, "no imaginário das profissões de saúde, um movimento de progressão em direção à cidadania e à democratização" (p.1569).

Observa-se nas falas a coexistência das práticas tradicionais dentro de um novo modelo, o que demonstra claramente a grande resistência em se romper o ideário tradicional internalizado pelos estudantes. "A gente não tem esse costume de fazer todo dia, de estudar todo dia e aqui o método é assim [...]" (G1A5). "Na teoria ele é bonito, mas na prática eu vejo bem diferente, porque é o seguinte: a gente acumula, acumula e em vez de reflexão, vira obrigação" (G1A3).

Revela-se, portanto, que o estudante está acostumado a um modelo de ensino em que se apropria dos conteúdos teóricos para obter a necessária aprovação para níveis subsequentes, sem que haja identidade nesta aprendizagem.

A dificuldade de lidar com a relação com o outro, de romper com suas defesas, leva o estudante a se recolher à zona de proteção, junto ao modelo biologicista:

Acho que no primeiro e segundo ano quando está começando a formação de ver o paciente como um todo [...] é uma experiência muito legal [...] chega num quarto ano, nós já temos uma base biológica, a gente já quer mais o biológico mesmo [...] que nós estamos a um passo do internato [...]. (G1A4)

A valorização do aspecto objetivo/técnico/descritivo é evidenciada na fala do estudante G3A5. No tocante à reflexão sobre o confronto com a prática de forma a visualizar as próprias fortalezas e fragilidades e desenvolver a consciência das lacunas de aprendizagem em suas dimensões cognitiva, afetiva e psicomotora, esse parece um exercício difícil de ser incorporado:

Eu acho que no primeiro e segundo ano não contribuiu mesmo [...] mas no terceiro ano eu acho que contribuiu sim, pelo formato diferente dele, de não ser tão o que você sentiu [...] o fato mais importante era passar a história, o professor via como eu estava estruturando a anamnese. (G3A5).

As falas seguintes revelam resistência docente com o referencial de avaliação formativa e dialógica, e a sustentação da concepção tradicional de ensino:

A gente percebe que o portfólio muda. No primeiro ano você conta a sua experiência, suas atividades, agrega sua anamnese; no segundo ano também; assim, ele é muito mais reflexivo do que médico; no terceiro ano ele é um tratado de anamnese de tão grande. (G2A4)

[...] a avaliação do docente é muito subjetiva, tem muitos que levam o processo a sério [...] e muitos que realmente fazem isso de qualquer forma... você consegue diferenciar, eu tenho certeza absoluta. (G2A2)

Neste processo de mudanças, embora todos compartilhem a importância das novas práticas, as histórias de vida e os modelos tradicionais incorporados ainda funcionam como espaços de resistência no inconsciente, que nos espaços de fragilidades ganham maior expressão.

Desta forma, parece claramente delimitada a urgência de investimentos para promover mudanças capazes de atenderem às necessidades do atual modelo de atenção, especialmente por se tratar de uma mudança paradigmática, com dificuldades explícitas de incorporação de novas tecnologias que contemplem a integralidade, a diversidade, a globalização e a incerteza no cuidado à saúde.

O uso do portfólio, numa proposta mais reflexiva e aberta, pode desencadear apreensão, insegurança e até mesmo rejeição, principalmente no início de seu uso, tanto pelos docentes como pelos discentes20. No entanto, o portfólio reflexivo, diferentemente do que se conhece como avaliação no modelo tradicional, permite a avaliação numa lógica formativa e possibilita processos de autorreflexão, de reorientação e autodesenvolvimento para o estudante21. Salienta-se, ainda, que ele pode ser utilizado como instrumento de estimulação e como fator de ativação do pensamento reflexivo, sendo um método que tem como proposta maior liberdade de criação num contexto de aprendizagem mais amplo22.

O reconhecimento da necessidade de mudança

Embora delimitado que o imaginário biomédico tradicional funciona como resistência à construção de uma proposta inovadora que atenda à formação de profissionais críticos e reflexivos para atuarem em conformidade com os princípios da atual política de saúde, entende-se que esta é uma dificuldade inerente às mudanças e que pode passar de elemento de confronto a elemento de impulsão quando superado.

Nas falas seguintes, pode-se depreender que os estudantes compreendem a relevância do portfólio, propondo que seja desenvolvido de forma dialógica com ênfase no aspecto qualitativo. Além disso, consideram a necessidade de preparo tanto do docente como do discente para sua utilização. Indicam, assim, que não há uma negação desse instrumento, porém são necessários avanços para que os seus princípios sejam incorporados no cotidiano do ensino. "[...] é o melhor instrumento de avaliação. Só que tem que ter um feedback [...] para aquele portfólio ter razão, no máximo em uma semana ele tem que estar voltando a sua mão [...]" (G2A1). "[...] e priorizar mais a qualidade do que a quantidade" (G1A7). "[...] eles colocam tanto que tem que ser reflexivo, e não explicam o que é ser reflexivo" (G1A1). "Na minha opinião, a mudança fundamental é a capacitação dos docentes" (G3A1).

Assim como proposto pelos estudantes, é preciso compreender o que se quer valorizar e evidenciar a melhor maneira de fazê-lo. De outro modo, o portfólio se converterá em um álbum que acarretará mais trabalho do que o necessário22. Também se devem criar oportunidades para que o docente agilize a devolução do portfólio avaliado ao estudante, o que facilitará a reflexão para a construção de seu conhecimento.

CONCLUSÃO

A proposta de implementar o portfólio reflexivo como um instrumento de aprendizagem e de avaliação processual e dialógica vem ao encontro da nova proposta política de formação de profissionais da saúde, mas ainda representa um grande desafio.

Tal desafio está presente nas falas dos estudantes que participaram dos grupos focais. Conforme revelado nas categorias temáticas, eles apontam que o portfólio é um importante instrumento de aprendizagem ativa e de avaliação processual ao permitir a reflexão e diálogo entre professor e estudante. Tais categorias parecem ainda evidenciar o momento de transição em que se encontra o atual modelo de ensino-aprendizagem, em que conceitos e práticas tradicionais dificultam as iniciativas que visam a uma formação integral. Observa-se a valorização do técnico e dos conteúdos biológicos, assim como uma dificuldade em viver a proposta de reflexão.

Neste processo avaliativo, os atores envolvidos (docentes e estudantes) assumem um papel que preconiza o diálogo e a reflexão como aspectos importantes na formação de sujeitos ativos e agentes de mudanças frente à diversidade da prática profissional

A construção de novos modelos de ensino parece-nos, ainda hoje, um movimento que demanda "sucessivas aproximações", constante capacitação e reflexão sobre as práticas vigentes e investimento em um contínuo processo de desenvolvimento, no qual as fragilidades possam ser identificadas, analisadas e superadas.

Por fim, pode-se considerar que o portfólio reflexivo constitui um instrumento que contribui para a desejada formação profissional. Sua utilização, contudo, requer um processo avaliativo diagnóstico contínuo, que indique definições claras do que se espera, além de constantes aproximações e ajustes.

Recebido em: 01/08/2008

Reencaminhado em: 18/02/2009

Reencaminhado em: 01/05/2009

Reencaminhado em: 14/07/2009

Aprovado em: 03/08/2009

Apoio:

Projeto de Iniciação Científica financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Maria José Sanches Marin orientou o projeto, contribuiu na construção da introdução, objetivos, metodologia, análise dos dados e considerações finais. Thiago Barbosa Moreno participou da construção do projeto incluindo coleta de dados, introdução, metodologia, análise dos dados e considerações finais. Maria Yvette Moravcik, Elza de Fátima Ribeiro Higa, Suelaine Druzian, Ieda Francischetti e Mércia Ilias contribuiram igualmente na elaboração do projeto, discussão, categorização, análise dos dados e considerações.

CONFLITO DE INTERESSES

Declarou não haver.

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  • Endereço para correspondência:
    Maria José Sanches Marin
    Av. Brigadeiro Eduardo Gomes, 1886
    Jd. Itamaraty – Marília
    CEP 17514-000 – SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Jul 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Revisado
      14 Jul 2009
    • Recebido
      01 Ago 2008
    • Aceito
      03 Ago 2009
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