Open-access Nível de atividade física no lazer em adultos paulistanos: uma análise de tendência de 2006 a 2016

RESUMO:

Objetivo:   Investigar a tendência temporal da prática de exercícios físicos e esportes no lazer de adultos em São Paulo entre 2006 e 2016.

Métodos:   Estudo de análise de série temporal que utilizou a base de dados do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL). Somando-se todos os anos, foram estudadas 21.357 pessoas. Foram realizadas análises das práticas de exercícios físicos ou esportes no lazer (sim ou não) estratificadas por sexo, idade e escolaridade. Calcularam-se as prevalências e as diferenças para todos os anos por meio da regressão de Prains-Winster.

Resultados:   A prática de exercícios físicos ou esportes aumentou em 7,9 pontos percentuais no período (p = 0,003) (foi de 39,9% [intervalo de confiança de 95% - IC95% 37,4 ‒ 42,4] para 47,8% [IC95% 45,2 ‒ 50,4]). Houve aumento significativo para as mulheres (p = 0,011), para as pessoas entre 18 e 24 anos (p = 0,001), entre 25 e 34 anos (p = 0,003), entre 45 e 54 anos (p = 0,003) e para pessoas com até oito anos de escolaridade (p = 0,010). Houve queda na prática de caminhada e futebol e aumento na prática das ginásticas.

Conclusão:   Verificou-se aumento na prática de exercícios físicos ou esportes no lazer em adultos de São Paulo. Esse crescimento foi observado principalmente em mulheres, nos jovens entre 18 e 34 anos, em indivíduos entre 45 e 54 anos e em pessoas com até oito anos de estudo. Esses resultados são importantes, pois mostraram aumento em geral e em grupos mais vulneráveis e podem estar relacionados com mudanças ambientais e intervenções ocorridas na cidade nos últimos 15 anos.

Palavras-chave:
Atividade física; Atividades de lazer; Adultos; Estudos de séries temporais

ABSTRACT:

Objective:   To investigate the temporal trend of practicing physical exercise and sports during leisure time in adults in São Paulo between 2006 to 2016.

Methods:   Time series analysis study using the VIGITEL System. Adding up the number of people who participated each year, a total 21,357 people were studied. Analyzes of the physical exercises and sports practiced during leisure time (yes or no) stratified by sex, age and education were performed. The prevalences and the differences for all of the years were calculated using the Prains-Winster regression.

Results:   Practice of physical exercises or sports increased by 7.9 percentage points in the period (p = 0.003) (from 39.9% 95%CI 37.4 - 42.4 to 47.8% 95%CI 45.2 - 50.4). There was a significant increase for women (p = 0.011), for people between 18-24 years old (p = 0.001), 25-34 years old (p = 0.003), 45-54 years old (p = 0.003), and for people with up to eight years of schooling (p = 0.010). There was a decrease in walking and playing soccer and there was an increase in doing gymnastics.

Conclusion:   There was an increase in the practice of physical exercise and sports during leisure time in adults from São Paulo. These increases were observed mainly in women, in people between 18 and 34 years old, between 45 and 54 years old, and in people with up to eight years of schooling. These results are important, as they have shown an increase in general and in more vulnerable groups, and may be related to environmental changes and interventions that have occurred in the city in the last 15 years.

INTRODUÇÃO

As doenças crônicas não transmissíveis constituem os problemas de saúde global de maior magnitude1. A doença cardiovascular, todos os tipos de cânceres e o diabetes são responsáveis por quase dois terços das mortes no mundo e por 72% dos óbitos no Brasil, gerando incapacidades e anos de vida perdidos, com prejuízos de US$ 4 bilhões2. A maior parte dessas doenças é prevenível a um custo menor do que o das intervenções curativo-assistenciais3. Ressalta-se que os quatro principais fatores de risco para as doenças crônicas não transmissíveis são o tabagismo, a alimentação inadequada, o uso abusivo de álcool e a inatividade física1.

Como estratégia de proteção para as doenças crônicas não transmissíveis, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou que os indivíduos adultos praticassem, pelo menos, 150 minutos de atividades físicas aeróbicas de intensidade moderada por semana ou 75 minutos de atividades físicas aeróbicas de intensidade vigorosa semanal, ou ainda uma combinação entre as duas, somando-se o tempo de lazer, os deslocamentos e as atividades domésticas e ocupacionais4. A recomendação também inclui atividades de força muscular por, pelo menos, duas vezes por semana. Partindo dessa recomendação, no ano de 2012 foi constatado que 31,1% da população adulta mundial não atingia o mínimo de atividades físicas aeróbicas recomendado5.

Apesar de todos os seus domínios serem importantes para a prevenção de doenças, a atividade física, quando feita nas horas de lazer, pode ser modificada como maior facilidade por meio de intervenções. Além disso, estudos mostram que a prática no lazer pode trazer grandes ganhos tanto na diminuição de anos de vida perdidos6 quanto na melhora da qualidade de vida das pessoas7. Nesse sentido, tornar as pessoas ativas fisicamente no lazer é uma importante tarefa que tem sido o foco das políticas de saúde pública no Brasil8.

Nesse contínuo de ações institucionais que busca inserir a atividade física no cotidiano das pessoas, algumas estratégias governamentais ocorridas em São Paulo nos últimos 15 anos devem ser destacadas9,10. Houve a construção de mais de 400 km de ciclovias entre 2014 e 2016, a criação de parques lineares principalmente a partir dos anos 2000 e a implementação de ruas de lazer, que são espaços fechados aos finais de semana para os veículos automotores e abertos para a população. Além disso, houve ampliação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família que atuam nas unidades básicas de saúde11.

Nesse sentido, são necessários estudos de tendência temporal para verificar possíveis mudanças populacionais da atividade física no lazer em adultos paulistanos. Ressalta-se que alguns estudos de análises temporais de tendência de atividade física têm sido publicados no Brasil nos últimos anos, principalmente utilizando a base de dados do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL), do Ministério da Saúde12,13,14, porém nenhum deles teve análises temporais maiores do que 10 anos incluindo as diferentes modalidades de práticas de exercícios físicos ou esportes.

Sendo assim, é importante verificar se ocorreram mudanças nas práticas de exercícios físicos e esportes no lazer durante o período de 11 anos, se houve diferenças segundo algumas características sociodemográficas, como sexo, idade e escolaridade, e se houve mudanças nos tipos de atividades praticadas na cidade de São Paulo, uma megalópole com diversas inequidades ambientais, mas que vem implementando diversas ações que podem contribuir para melhorar a saúde pública. Portanto, o objetivo do presente estudo foi investigar a tendência temporal da prática de exercícios físicos e esportes no de lazer em adultos residentes em São Paulo entre 2006 e 2016.

MÉTODOS

TIPO DE ESTUDO

Estudo de séries temporais a partir de levantamentos transversais anuais realizados pelo VIGITEL entre 2006 e 2016.

SISTEMA DE VIGILÂNCIA DE FATORES DE RISCO E PROTEÇÃO PARA DOENÇAS CRÔNICAS POR INQUÉRITO TELEFÔNICO

Com o intuito de aferir a prevalência de atividade física e outros fatores de proteção e risco para a saúde, como tabagismo, consumo de álcool, indicadores de alimentação e estado nutricional nas 26 capitais brasileiras e no Distrito Federal, o Ministério da Saúde implantou, em 2006, o VIGITEL, um sistema de vigilância por telefone que realiza, a cada ano, um número mínimo de duas mil entrevistas com adultos em cada uma das cidades e no Distrito Federal15.

A metodologia do VIGITEL, referente ao sorteio de linhas telefônicas contatadas para a realização das entrevistas, composição da amostra e características dos questionários, está descrita em detalhes por Moura et al.15. Descrevendo-se resumidamente, inicialmente, sorteiam-se de forma sistemática cinco mil linhas telefônicas fixas, que são fornecidas pelas empresas de telefonia que atendem as cidades. As linhas são sorteadas novamente e divididas em réplicas de 200 linhas cada uma. Após identificação de todas as linhas telefônicas elegíveis e os moradores terem concordado em participar da pesquisa, realiza-se a enumeração dos indivíduos com mais de 18 anos residentes em cada domicílio e sorteia-se quem responderá à entrevista telefônica.

O questionário contém perguntas objetivas realizadas por um entrevistador treinado com o uso de computador15. O bloco de atividade física envolve questões referentes às práticas no lazer (se praticou algum tipo de exercício físico ou esporte nos últimos três meses; caso a resposta seja positiva, qual foi a frequência semanal e a duração diária), na forma de deslocamento ou transporte para ir e voltar do trabalho ou escola/universidade, no trabalho (se carrega peso ou anda bastante a pé) e nas atividades do lar (se faz a limpeza pesada/faxina sozinho(a) em casa). O questionário de atividade física foi validado por Monteiro et al.16. Para o bloco que investiga as atividades físicas no lazer, nas medidas repetidas com intervalo de 15 dias foram obtidos valores de kappa = 0,80. Na comparação com recordatórios de 24 horas de atividade física, as pessoas classificadas como fisicamente ativas no lazer nas entrevistas telefônicas (que praticavam 30 minutos ou mais de atividade física por, pelo menos, cinco vezes por semana) tiveram maior média de minutos de práticas de exercícios físicos e esportes obtidas pelos recordatórios em comparação com as que não eram fisicamente ativas (p < 0,001). O questionário do VIGITEL é publicado anualmente no relatório feito pelo Ministério da Saúde17.

PARTICIPANTES

Para este estudo de tendência temporal foram utilizados dados secundários de 21.357 indivíduos entrevistados pelo VIGITEL, de 2006 a 2016, na cidade de São Paulo.

ANÁLISES DE DADOS

O tratamento dos bancos de dados para as análises foi realizado em três fases:

  • Download dos dados que permanecem em sistema aberto pelo site oficial do Ministério da Saúde (http://svs.aids.gov.br/bases_vigitel_viva/vigitel.php), em formato CSV;

  • Transformação dos bancos de dados de formato CSV para XLS, para criar arquivos com extensão DTA (Stata versão 12.1, StataCorp LP, College Station, Estados Unidos);

  • Consulta aos bancos de dados, tendo como referência o questionário e o dicionário de variáveis, para identificação das questões de interesse (atividade física de lazer, sexo, faixa etária e escolaridade).

A atividade física no lazer foi analisada de forma dicotômica (prática algum tipo de exercício físico ou esporte no lazer: sim ou não). Para isso, utilizou-se a seguinte pergunta do questionário VIGITEL: “Nos últimos três meses, o(a) Sr.(a) praticou algum tipo de exercício físico ou esporte?” (sim ou não). Posteriormente, foram realizadas as análises dos tipos de exercícios físicos e esportes para as pessoas que responderam que praticaram (questão: “Caso sim, qual o tipo principal de exercício físico ou esporte que o(a) Sr.(a) praticou?”). Para as respostas a essa questão, entre 2006 e 2012, houve uma lista com 15 diferentes tipos de exercícios físicos ou esportes para serem escolhidos pelos entrevistados (caminhada; caminhada em esteira; corrida; corrida em esteira; musculação; futebol ou futsal; bicicleta (incluindo bicicleta ergométrica); voleibol ou futevôlei; basquetebol; tênis; ginástica aeróbica (spinning, step, jump); ginásticas em geral (incluindo alongamentos, pilates, ioga); hidroginástica; natação; artes marciais/lutas (incluindo jiu-jitsu, caratê, judô, boxe, muay thai, capoeira). A partir de 2013, foi acrescentada a categoria dança (incluindo balé, dança de salão, dança do ventre). É importante ressaltar que cada entrevistado pode escolher somente uma modalidade.

A variável prática de exercícios físicos ou esportes no lazer foi analisada de forma geral e estratificada por sexo, faixa etária (18 a 24 anos; 25 a 34 anos; 35 a 44 anos; 45 a 54 anos; 55 a 64 anos; 65 anos ou mais) e níveis de escolaridade (0 a 4 anos; 5 a 8 anos; 9 a 11 anos; 12 anos ou mais), entre 2006 e 2016. Essas variáveis foram escolhidas com base nos resultados de estudos de tendência temporal12,13 e no relatório do VIGITEL17, que apontaram diferenças nos níveis de atividade física no lazer segundo sexo, idade e escolaridade.

No caso das modalidades, para este estudo agruparam-se as ginásticas (aeróbica e geral), as atividades aquáticas (natação e hidroginástica) e os esportes (voleibol/futevôlei e basquetebol), e a musculação foi denominada como treinamento de força, sendo analisados os 12 tipos mais prevalentes entre 2006 e 2016.

A análise descritiva dos dados sociodemográficos foi representada por meio do cálculo de frequências, médias e desvios padrão18. Para as práticas de exercícios físicos ou esportes no lazer geral foram calculadas as prevalências (%) e os intervalos de confiança de 95% (IC95%) para todos os anos.

Modelos de regressão linear de Prais-Winsten apropriados para utilização em análises de série temporal foram empregados na análise da magnitude e da significância estatística das variações temporais19. Desse modo, o coeficiente de regressão do modelo indica a taxa média anual, expressa na unidade do desfecho, de aumento ou diminuição do indicador no período. Foram consideradas significativas as variações temporais correspondentes a um coeficiente de regressão estatisticamente diferente de 0 (p ≤ 0,05). Essas análises foram realizadas para os seguintes desfechos:

  • Prática de exercícios físicos ou esportes no lazer geral;

  • Prática de exercícios físicos ou esportes de acordo com o sexo, de acordo com as faixas etárias e de acordo com os níveis de escolaridade;

  • Prática das diferentes modalidades.

A variável explanatória foi sempre o ano do levantamento expresso como variável contínua.

Foram utilizados fatores de ponderação do VIGITEL que visavam a correção do víes de seleção da amostra. Esses fatores também permitiram a equiparação da distribuição da população estudada pelo VIGITEL - segundo sexo, idade e escolaridade - àquela identificada para a população adulta da cidade de São Paulo a partir de projeções intercensitárias, utilizando-se procedimento de pós-estratificação18.

Todas as análises foram ponderadas utilizando-se a variável peso rake e foram realizadas com o comando svy do software Stata versão 12.1 (StataCorp LP, College Station, TX, Estados Unidos).

QUESTÕES ÉTICAS

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (processo número 00351018.6.00005390). A coleta de dados do Sistema VIGITEL foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa para Seres Humanos do Ministério da Saúde17.

RESULTADOS

As quantidades de entrevistas realizadas em cada ano de observação e as características descritivas são apresentadas na Tabela 1. As mulheres representaram a maioria da amostra em todos os anos, a média de idade aumentou de 40,8 anos, em 2006, para 42,9 anos, em 2016, e a maior parte dos indivíduos tinha nove anos ou mais de estudo.

Tabela 1.
Quantidade de entrevistas e composição da amostra de acordo com o sexo, idade e escolaridade na cidade de São Paulo, VIGITEL 2006‒2016*.

Houve aumento de 7,9 pontos percentuais na prática de exercícios físicos ou esportes no lazer ao longo dos 11 anos de observação (Figura 1).

Figura 1.
Prevalência e intervalos de confiança de 95% da prática de exercícios físicos ou esportes no lazer em adultos de São Paulo, SP, VIGITEL 2006‒2016.

Os aumentos foram significativos para mulheres, para pessoas nas faixas etárias entre 18 e 24 anos, entre 25 e 34 anos e entre 45 e 54 anos, e para pessoas com até oito anos de estudo (Tabela 2).

Tabela 2.
Evolução anual da prevalência de prática de exercícios físicos ou esportes no lazer em adultos residentes na cidade de São Paulo segundo sexo, faixa etária e escolaridade, VIGITEL 2006‒2016.

Houve diminuição significativa na prática de caminhada e de futebol e aumento significativo nas práticas de ginásticas ao longo dos 11 anos (Tabela 3).

Tabela 3.
Evolução anual das prevalências das práticas de diferentes modalidades de exercícios físicos ou esportes no lazer em adultos residentes na cidade de São Paulo, segundo sexo, faixas etárias e níveis de escolaridade, VIGITEL 2006‒2016.

DISCUSSÃO

O principal resultado do presente estudo mostrou que houve aumento de 7,9 pontos percentuais na prática de exercícios físicos ou esportes no lazer em adultos paulistanos entre 2006 e 2016. Esse aumento foi significativo nas mulheres, nas faixas etárias entre 18 e 24 anos, 25 e 34 anos e 45 e 54 anos, e em pessoas com até oito anos de escolaridade. Houve diminuição significativa na prática de caminhada e futebol e aumento significativo na prática de ginásticas.

Assim como no presente estudo, outras pesquisas também encontraram mudanças nas práticas de atividade física no lazer ao longo do tempo12,13. O trabalho publicado por Mielke et al.12 analisou a prática de atividade física no lazer com dados do VIGITEL entre 2006 e 2012. Foram estudados 371.271 indivíduos adultos brasileiros de todas as capitais mais o Distrito Federal. Foi observado que a frequência de pessoas que não praticavam nenhum tipo de exercícios físicos ou esportes no lazer caiu de 59,1 para 55,6%. O trabalho desenvolvido por Cruz et al.13 analisou a prática de atividade física no lazer nos últimos três meses utilizando dados do VIGITEL entre 2006 e 2016, incluindo 572.437 pessoas em todas as capitais brasileiras mais o Distrito Federal. Os autores mostraram que as prevalências aumentaram de 44%, em 2006, para 53,6%, em 2016. Esses estudos indicam que a população adulta brasileira adulta vem aumentando seus níveis de atividade física no lazer.

Ressalta-se que aumentos na prática de atividade física no lazer têm sido observados também em outros estudos internacionais de tendência temporal realizados com adultos em países de renda alta, como Inglaterra e Canadá20,21.

Os aumentos das práticas de exercícios físicos ou esportes no lazer em adultos paulistanos podem ter relação com diversas ações implementadas ao longo dos últimos 15 anos na cidade. Apesar de ser uma das capitais com maior prevalência de adultos fisicamente inativos no lazer quando comparada a outras capitais22, a cidade de São Paulo foi eleita como primeira em ranking de estruturas e considerada a mais amigável para a prática de atividade física no Brasil23.

Com relação aos programas implementados, o Ruas de Lazer foi uma iniciativa da Secretaria Municipal de Esportes, Lazer e Recreação de São Paulo e tem como objetivo ampliar os espaços para as pessoas, com uma dinâmica de fechamento de ruas e avenidas para a circulação dos veículos automotores entre 10 e 16 h aos domingos24. Outro programa importante, Coordenado pela Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes de São Paulo, é o Ciclofaixas de Lazer, que desde 2009 também é implementado aos domingos, dia em que são disponibilizados mais de 117 km de ciclofaixas em ruas e avenidas da cidade25.

Os parques lineares têm como função específica a proteção de margens de rios e córregos, são permanentemente abertos e começaram a ser implementados em São Paulo a partir de 200626. Destacam-se também os 22 Centros de Educação Unificados e os 17 Centros Esportivos Municipais27. Essas estruturas oferecem programas estruturados e gratuitos, dos quais muitos contam com a supervisão de profissionais de educação física. Além disso, a partir de 2014, foram implementados 96% dos mais de 400 km de ciclovias que servem não somente para o uso da bicicleta, mas também para a prática de caminhada e corrida27.

Com relação às diferenças de acordo com as variáveis sociodemográficas, Cruz et. al.13 identificaram aumentos significativos em ambos os sexos, com os homens indo de 54,5%, em 2006, para 62,0%, em 2016, e mulheres indo de 35,0%, em 2006, para 46,4%, em 2016. O presente estudo realizado em São Paulo identificou aumentos significativos somente em mulheres e, assim como no estudo de Cruz et al.13, as mulheres tiveram maiores aumentos em comparação com os homens.

Esse resultado de aumento encontrado para mulheres em ambas as pesquisas é importante, pois estudo desenvolvido por Uvinha et al.28, realizado com 2.400 pessoas nos 26 Estados brasileiros mais o Distrito Federal, mostrou que 64% dos homens entrevistados optavam por atividades físico-esportivas como preferidas no lazer, ao passo que 70,9% das mulheres destacaram sua preferência por atividades sociais.

Com relação às faixas etárias, excluindo as idades entre 55 e 64 anos, Cruz et al.13 mostraram aumentos significativos para todas as outras faixas, com maiores aumentos para a de 18 a 24 anos e a de 25 a 34 anos. O presente estudo com adultos de São Paulo identificou mudanças significativas ao longo dos anos nas faixas etárias de 18 a 24 anos, de 25 a 34 anos e de 45 a 54 anos. Maiores aumentos também foram identificados em pessoas com até 34 anos, mostrando que a tendência é mais forte nos mais jovens.

Quanto aos diferentes níveis de escolaridade, Cruz et al.13 identificaram que houve mudanças em todas as faixas. No caso do presente estudo com adultos paulistanos, foi encontrado aumento significativo somente para as pessoas com até oito anos de escolaridade. Considera-se esse resultado também bastante relevante, pois estudo realizado com a base de dados do VIGITEL de 2006 mostrou maior prevalência de atividade física no lazer em pessoas com 12 anos ou mais de estudo em comparação com pessoas com até oito anos de escolaridade22.

Com relação às diferentes modalidades praticadas, Sa et al.14 mostraram tendência de manutenção da caminhada, redução da prática do futebol em 1,9 ponto percentual e aumento do treinamento de força/ginásticas (em 3,3 pontos percentuais) e da prática de corrida (em 1,6 ponto percentual). O presente estudo mostrou que nos paulistanos houve diminuição significativa na prática de futebol e de caminhada e aumento significativo na prática das ginásticas. Além disso, práticas como a corrida e as artes marciais/lutas ficaram no limite da significância estatística para mostrarem aumentos no período analisado.

A diminuição da prática do futebol ao longo dos anos de observação pode ser explicada pela menor disponibilidade de espaços abertos em função do crescimento das cidades e da especulação imobiliária29. Florindo et al.30 mostraram que 76% dos futebolistas utilizavam espaços públicos para a sua prática no ano de 2006. Os espaços abertos são importantes não somente para o futebol, mas também para a prática da caminhada, que é o tipo de exercício físico mais praticado no lazer pelos adultos paulistanos. Em estudo feito com amostra de adultos de São Paulo, identificou-se que as pessoas que tiveram disponibilidade de, pelo menos, dois espaços públicos abertos, como praças, parques e ciclovias a até 500 m das suas residências, tiveram mais chances de praticar caminhada no tempo de lazer10.

As quedas na prática de caminhada podem ser explicadas porque pessoas mais jovens e mulheres em São Paulo têm optado por outras práticas de exercícios físicos, como a corrida, as artes marciais/lutas e as ginásticas.

O aumento significativo da prática das ginásticas pode ser explicado por ser o Brasil um dos maiores mercados do segmento de academias de exercícios físicos na América Latina, e houve um grande crescimento dessas estruturas em São Paulo entre 2006 e 201631. Além disso, ressalta-se que alguns tipos de programas de ginásticas são oferecidos em unidades básicas de saúde, principalmente as que têm Núcleos de Apoio à Saúde da Família, locais que também tiveram expansão no número de equipes em São Paulo entre 2006 e 201611.

Uma limitação deste estudo foi o autorrelato ser a principal fonte dos dados de avaliação da atividade física. Acrescenta-se que as questões do VIGITEL são direcionadas para perguntar sobre exercícios físicos ou esportes praticados nos últimos três meses. Portanto, o principal desfecho estudado no presente estudo é passível de viés de memória dos entrevistados. Por outro lado, a única forma factível de averiguar os diferentes domínios de atividades físicas em estudos epidemiológicos é por meio de questionários32. Outra limitação deve-se à amostra do VIGITEL ser composta de indivíduos que têm uma linha telefônica fixa em sua residência, fato que poderia excluir pessoas de menor status socioeconômico. Essas pessoas praticam menos atividade física no tempo de lazer, o que também pode ter afetado os resultados. Porém, os fatores de ponderação obtidos com o uso do peso pós-estratificação, que leva em conta a composição sociodemográfica na cidade de São Paulo, têm como objetivo corrigir a sub e a superestimação de fatores de risco ou de proteção obtidos pelo VIGITEL14,17. Ressalta-se que no município de São Paulo a cobertura de telefonia fixa é de mais de 70%.

A força deste estudo está em demonstrar uma análise temporal de 11 anos realizada com mais de 21 mil pessoas em São Paulo entre 2006 e 2016, por meio da qual identificou-se que houve aumento significativo na prática de exercícios físicos ou esportes no lazer e quais foram os tipos de atividades que aumentaram e que diminuíram. Ressalta-se que o aumento de estruturas e de ações no município nesse período pode ter contribuído para o crescimento da prática, visto que houve oferecimento de mais oportunidades de escolha para as pessoas serem fisicamente ativas.

AGRADECIMENTOS

Alex Antonio Florindo agradece ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) a bolsa de produtividade em pesquisa (processo número 306635/2016-0).

REFERÊNCIAS

  • Fonte de financiamento: nenhuma

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    21 Jan 2020
  • Revisado
    25 Maio 2020
  • Aceito
    10 Jun 2020
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