Resumo
Este estudo estima os saldos e as taxas líquidas de migração para regiões e estados brasileiros de 1960 a 1970 e 1970 a 1980. Com base nos dados dos censos de 1960, 1970 e 1980, estimamos a migração por sexo, faixas etárias quinquenais e residência urbana/rural. Usamos as tabelas de sobrevivência de Carvalho (1978) e Carvalho e Pinheiro (1986) para ajustar a mortalidade. Aplicamos o método da taxa de sobrevivência intercensitária (ISR) para indivíduos com dez anos ou mais, que ajusta as taxas de sobrevivência nacionais para refletir os níveis de mortalidade local. Para as coortes nascidas em cada período intercensitário, utilizamos o método das razões observadas de crianças por mulheres em idade reprodutiva nos censos e distinguindo os efeitos diretos dos indiretos da migração. Compilamos nossas estimativas em um banco de dados acessível ao público, apoiando pesquisas adicionais sobre padrões históricos de migração no Brasil.
Palavras-chave: Migração; Dinâmica da população; Distribuição da população
Abstract
This study estimates net migration balances and net migration rates for Brazilian regions and states from 1960-1970 and 1970-1980. Drawing on 1960, 1970, and 1980 census data, we estimate migration by sex, five-year age groups, and urban/rural residence. We use survival tables by Carvalho (1978) and Carvalho & Pinheiro (1986) to adjust for mortality. We apply the intercensal survival ratio (ISR) method for individuals aged ten and older, which adjusts national survival ratios to reflect local mortality levels. For cohorts born within each intercensal period, we use the method of observed ratios of children to women of reproductive age in the census data and distinguishing direct and indirect migration effects. We compile our estimates into a publicly accessible database, supporting further research on historical migration patterns in Brazil.
Keywords: Migration; Population dynamics; Population distribution
Resumen
Este estudio estima los saldos y las tasas netas de migración para las regiones y estados brasileños entre 1960 y 1970 y entre 1970 y 1980. Sobre la base de datos de los censos de 1960, 1970 y 1980, estimamos la migración por sexo, por grupos de edad en franjas de cinco años y por residencia urbana o rural. Utilizamos las tablas de supervivencia de Carvalho (1978) y de Carvalho y Pinheiro (1986) para ajustar la mortalidad. Aplicamos el método de la razón de supervivencia intercensal (ISR) para individuos de diez años o más, que ajusta las tasas de supervivencia nacionales para reflejar los niveles locales de mortalidad. Para las cohortes nacidas en cada período intercensal, utilizamos el método de las proporciones observadas de niños a mujeres en edad reproductiva en los censos y distinguimos los efectos directos de la migración de los indirectos. Compilamos nuestras estimaciones en una base de datos de acceso público que respalda investigaciones adicionales sobre los patrones históricos de migración en Brasil.
Palabras clave: Migración; Dinámica de poblaciones; Distribución de la población
Introdução
Em uma população teoricamente fechada a fluxos migratórios, a variação entre as populações de dois censos demográficos consecutivos reflete exclusivamente a mortalidade e a fecundidade observadas no intervalo intercensitário. Métodos indiretos para mensurar migrações baseiam-se nesse princípio. Se as estimativas de fecundidade e mortalidade para o período intercensitário são corretas, diferenças entre a população observada no segundo censo e a esperada com migração zero são atribuídas ao saldo migratório. Diferenças iguais a zero podem indicar um efeito nulo dos saldos migratórios sobre a estrutura etária, e não necessariamente ausência de migração.
Carvalho e Fernandes (1996) estimam indiretamente saldos migratórios e taxas líquidas de migração das regiões e estados do Brasil para as décadas de 1960-1970 e 1970-1980, detalhando por sexo, grupo etário e residência urbana/rural. Posteriormente, Carvalho publicou outros trabalhos sobre estimativas de migrações (Carvalho, 1996; Carvalho; Rigotti, 1998; Carvalho et al., 2001; Carvalho; Garcia, 2002).
O trabalho de Carvalho e Fernandes (1996) é amplamente utilizado e citado, embora nunca tenha sido publicado. A presente Nota de Pesquisa tem dois objetivos principais: publicar esse trabalho que é relevante, não obstante as publicações posteriores sobre migrações interestaduais e inter-regionais no Brasil, bem como os avanços nos métodos e dados para estimativas de migrações; e inovar, disponibilizando essas estimativas detalhadas em uma base de dados. O texto a seguir é baseado em Carvalho e Fernandes (1996), com poucas mudanças de forma e conteúdo que não desviam da essência do texto original.
As estimativas apresentadas referem-se aos saldos migratórios e taxas líquidas de migração das grande regiões e unidades da federação brasileiras para os períodos intercensitários de 1960-1970 e 1970-1980. Essas estimativas estão detalhadas por sexo, grupo etário quinquenal e residência urbana/rural.
Dados
Utilizamos dados de população por sexo, grupo etário quinquenal e residência urbana/rural dos Censos Demográficos de 1960, 1970 e 1980. Para os níveis de mortalidade, empregamos as tábuas de sobrevivência de Carvalho (1978) e Carvalho e Pinheiro (1986). Devido a limitações dos dados, os estados do Mato Grosso do Sul e Mato Grosso estão englobados em Mato Grosso, e Tocantins está incluído em Goiás.
Métodos
Para estimarmos o saldo migratório da população com dez anos ou mais, isto é, da população já nascida quando da realização do primeiro censo do período intercensitário decenal, empregamos a técnica das relações intercensitárias de sobrevivência (RIS) do país (P) ajustadas ao nível de mortalidade da população da área geográfica de interesse (A) (Carvalho, 1980).
onde: é a relação intercensitária decenal de sobrevivência ajustada da área geográfica de interesse A e grupo etário x, x + 5; é a relação intercensitária de sobrevivência decenal observada do país; e L é o número de pessoas-ano vividos das respectivas tábuas de sobrevivência.
O saldo migratório (SM) é obtido pela diferença entre a população (N) observada (O) e a esperada (E) no segundo censo ao final do período intercensitário. A taxa líquida de migração é calculada pela razão entre o saldo migratório e a população observada no segundo censo.
Para estimarmos os saldos migratórios da população nascida durante o período intercensitário decenal (0 a 4 e 5 a 9 anos de idade), adotamos o método proposto por Lee et al. (1957). Os saldos migratórios de homens (H) ou mulheres (M) com 0 a 4 anos de idade ao final do período intercensitário é dado pelo produto das relações entre crianças com 0 a 4 anos e mulheres com 15 a 44 anos de idade observadas no segundo censo (RCM) e do saldo migratório de mulheres de 15 a 44 anos.
O saldo migratório de homens (H) ou mulheres (M) com 5 a 9 anos de idade ao final do período intercensitário é dado pelas mesmas equações, mas para crianças de 5 a 9 anos e mulheres de 20 a 49 anos de idade.
Os saldos migratórios para os dois primeiros grupos quinquenais seriam explicados pelos efeitos diretos e indiretos da migração. Efeitos diretos da migração são filhos de mães migrantes nascidos durante o período intercensitário na área de origem, enquanto efeitos indiretos da migração são filhos de mães migrantes nascidos durante o período intercensitário na área de destino. Segundo Lee et al. (1957), no grupo de 0 a 4 anos, 1/4 do saldo migratório é resultado dos efeitos diretos e 3/4 dos indiretos. No grupo de 5 a 9 anos, os coeficientes de separação seriam, respectivamente, 3/4 e 1/4. Esses coeficientes assumem que a migração das mães e os nascimentos dos filhos dessas mães migrantes estão distribuídos linearmente no período intercensitário.
Resultados
As Tabelas 1 e 2 apresentam os resultados de nossas estimativas totais, respectivamente, para saldos migratórios e taxas líquidas de migração, por região, unidade da federação, década e situação de residência. O Gráfico 1 detalha os saldos migratórios totais por região, década, situação de residência e grupo etário. O Gráfico 2 apresenta as taxas líquidas de migração de 1960-1970 comparadas às de 1970-1980 por situação de residência.1
Para cada unidade da federação, os saldos migratórios foram estimados independentemente para as populações urbana, rural e total. Para as grandes regiões, os saldos migratórios foram obtidos a partir da soma dos saldos migratórios das suas respectivas unidades da federação e, para o Brasil, analogamente, tomando-se a soma das grandes regiões. Os saldos migratórios para as idades de dez anos ou mais da população total de cada unidade da federação deveriam corresponder à soma dos saldos migratórios das populações rural e urbana. Isso nem sempre acontece nas nossas estimativas, mas, como as diferenças são pequenas, decidimos não fazer nenhum ajuste.
Como mencionamos, para estimarmos os saldos migratórios nos dois primeiros grupos etários quinquenais, utilizamos em cada população as relações entre crianças e mulheres observadas, as quais dependem dos níveis e estrutura de fecundidade e da mortalidade infanto-juvenil, além da distribuição etária das mulheres em idade reprodutiva, experimentados por cada população nos dez anos anteriores à data do censo. A população rural de todas as unidades da federação, assim como, de modo geral, a população total das unidades da federação mais pobres, teve saldo migratório estimado negativo entre as mulheres em idade reprodutiva, o que levou também a estimativas de saldo migratório negativo para a população abaixo de dez anos. O oposto se deu para as populações urbanas das unidades da federação e totais de várias unidades da federação, por terem saldos migratórios positivos na população feminina em idade reprodutiva.
Como as áreas rurais têm maior fecundidade do que as urbanas, assim como, de modo geral, as unidades da federação perdedoras líquidas de população vis-à-vis as ganhadoras líquidas, suas relações entre crianças e mulheres são, com raras exceções, maiores do que nas populações urbanas e nas UF ganhadoras líquidas. Consequentemente, espera-se que os saldos migratórios negativos entre as pessoas abaixo de dez anos não sejam compensados pelos saldos positivos, mesmo em uma situação de população fechada no país como um todo. Isto explica porque, para os resultados referentes ao total do Brasil, correspondentes à soma dos resultados das unidades da federação, os valores absolutos dos saldos migratórios negativos da população rural com menos de dez anos sejam significativamente maiores do que os positivos da população urbana. A explicação é a mesma para o fato observado nos resultados referentes à população total do Brasil: no período intercensitário 1960-1970, há saldo negativo para a população abaixo de dez anos, apesar do saldo levemente positivo entre as mulheres em idade reprodutiva; no período intercensitário 1970-1980, a despeito de os saldos serem negativos para mulheres e crianças, nestas últimas são desproporcionais aos saldos femininos. Na verdade, deve-se interpretar o saldo migratório negativo abaixo de dez anos de idade como o número de pessoas que se teria a mais ao final do período intercensitário, caso a população em questão tivesse permanecido fechada no mesmo período. Não necessariamente essas crianças estarão presentes nas populações receptoras, pois provavelmente parte delas não nasceu, como consequência do impacto da migração sobre a fecundidade das mulheres emigrantes.
Para a população total do Brasil, supondo-se que a metodologia adotada tenha minimizado os problemas oriundos de deficiência de cobertura censitária e que as tabelas de sobrevivência utilizadas correspondam exatamente à mortalidade ocorrida durante os períodos intercensitários de 1960-1970 e 1970-1980, os saldos migratórios apresentados, referentes à população com dez anos ou mais, podem ser interpretados como saldo migratório internacional.
A taxa líquida de migração, se positiva, deve ser interpretada como a proporção da população recenseada em consequência dos fluxos migratórios e, se negativa, como a proporção que se teria a mais na ausência de fluxos migratórios.
Saldos migratórios, por situação de residência e grupos etários, segundo grandes regiões Brasil - 1960-1980
Reconhecimentos:
Não aplicável.
Referências
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-
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Aprovação ética:
Os autores certificam que o trabalho não inclui seres humanos ou animais.
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Disponibilidade de dados e material:
Os conteúdos estão disponíveis em: https://github.com/demographyandme.
Disponibilidade de dados
Os conteúdos estão disponíveis em: https://github.com/demographyandme.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
10 Jan 2025 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
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Recebido
30 Out 2024 -
Aceito
13 Nov 2024