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Influência da frequência estimulatória envolvida nos efeitos analgésicos induzidos por eletroacupuntura em cervicalgia tensional

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a influência da frequência estimulatória envolvida na analgesia induzida por eletroacupuntura em cervicalgia. MÉTODOS: Comparou-se o desempenho da analgesia produzida em 2Hz, 100Hz, 1000Hz, 2500Hz e um grupo só com acupuntura, sem estímulo elétrico, avaliado por meio de algometria de pressão, Escala Visual Analógica (EVA) e frequência cardíaca. Utilizou-se um estimulador elétrico microprocessado, com forma de pulso em padrão pulsado, monofásico, retangular, balanceado assimétrico, com fase secundária em exponencial decrescente, com período de estimulação de 4 segundos e repouso de 3 segundos. A amostra contou com 66 voluntários com cervicalgia tensional, idade média de 33,67±9,97 anos, 89,5% do gênero feminino e 10,5% do masculino. RESULTADOS: Não houve diferenças entre os grupos para as variáveis nota atribuída à dor pela EVA e frequência cardíaca, sendo que em todos os grupos houve melhoras analgésicas. No entanto, quando comparado o comportamento antes-depois, por meio da algometria de pressão, para um mesmo indivíduo, dentro de seu próprio grupo, houve vantagens analgésicas para o uso de 2500Hz (p=0,006 para a base da região occiptal; p=0,003 para o trapézio direito; e p=0,013 para o trapézio esquerdo), seguido de 100Hz (p=0,035, p=0,016 e p=0,038, para as mesmas regiões, respectivamente). CONCLUSÃO: Recomenda-se preferencialmente a aplicação de 2500Hz e 100Hz em eletroacupuntura para analgesia em cervicalgia tensional.

eletroacupuntura; estimulação elétrica; analgesia; cervicalgia


OBJECTIVE: To assess the influence of the stimulating frequency involved in analgesia induced by electroacupuncture for neck pain. METHODS: The performance of the analgesia produced by 2Hz, 100Hz, 1000Hz and 2500Hz was compared with a group with acupuncture alone (without electrical stimulation), by means of pressure algometry, a visual analog scale (VAS) and heart rate. We used an electrical stimulator with a microprocessor yielding standard, single-phase, rectangular and asymmetrical balanced pulsed waveforms with a secondary phase decreasing exponentially. Stimulation periods were 4s, and resting periods were 3s. The sample included 66 volunteers with neck pain due to muscular tension, mean age 33.67±9.97 years, 89.5% female and 10.5% male. RESULTS: There were no differences between the groups regarding the variables of degree of pain (according to the VAS) and heart rate, and all groups presented analgesic improvement. However, when comparing pressure algometry findings for the same individual before and after the treatment, within the same group, we found analgesic advantages in using 2500Hz (p=0.006 for the base of the occipital region, p=0.003 for the right trapezius and p=0.013 for the left trapezius), followed by 100Hz (p=0.035, p=0.016 and p=0.038 for the same regions, respectively). CONCLUSION: We preferentially recommend 2500Hz and 100Hz applications of electroacupuncture for analgesia of neck pain due to muscular tension.

electroacupuncture; electrical stimulation; analgesia; neck pain


ARTIGOS ORIGINAIS

Influência da frequência estimulatória envolvida nos efeitos analgésicos induzidos por eletroacupuntura em cervicalgia tensional

Nohama PI; Silvério-Lopes SMII

IPrograma de Pós-Graduação em Tecnologia em Saúde, Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba (PR), Brasil

IIInstituto Brasileiro de Therapias e Ensino (IBRATE), Curitiba (PR), Brasil

Correspondência para Correspondência para: Sandra Mara Silvério-Lopes Instituto Brasileiro de Therapias e Ensino (IBRATE) Rua Voluntários da Pátria, 215 – 2º andar, Centro CEP 80020-000, Curitiba (PR), Brasil e-mail: ibrate@netpar.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a influência da frequência estimulatória envolvida na analgesia induzida por eletroacupuntura em cervicalgia.

MÉTODOS: Comparou-se o desempenho da analgesia produzida em 2Hz, 100Hz, 1000Hz, 2500Hz e um grupo só com acupuntura, sem estímulo elétrico, avaliado por meio de algometria de pressão, Escala Visual Analógica (EVA) e frequência cardíaca. Utilizou-se um estimulador elétrico microprocessado, com forma de pulso em padrão pulsado, monofásico, retangular, balanceado assimétrico, com fase secundária em exponencial decrescente, com período de estimulação de 4 segundos e repouso de 3 segundos. A amostra contou com 66 voluntários com cervicalgia tensional, idade média de 33,67±9,97 anos, 89,5% do gênero feminino e 10,5% do masculino.

RESULTADOS: Não houve diferenças entre os grupos para as variáveis nota atribuída à dor pela EVA e frequência cardíaca, sendo que em todos os grupos houve melhoras analgésicas. No entanto, quando comparado o comportamento antes-depois, por meio da algometria de pressão, para um mesmo indivíduo, dentro de seu próprio grupo, houve vantagens analgésicas para o uso de 2500Hz (p=0,006 para a base da região occiptal; p=0,003 para o trapézio direito; e p=0,013 para o trapézio esquerdo), seguido de 100Hz (p=0,035, p=0,016 e p=0,038, para as mesmas regiões, respectivamente).

CONCLUSÃO: Recomenda-se preferencialmente a aplicação de 2500Hz e 100Hz em eletroacupuntura para analgesia em cervicalgia tensional.

Artigo registrado no Australian New Zealand Clinical Trials Registry (ANZCTR) sob o número ACTRN: ACTRN12609000480280.

Palavras-chave: eletroacupuntura; estimulação elétrica; analgesia; cervicalgia.

Introdução

A acupuntura incorporou a estimulação elétrica como mecanismo de ação, dando origem à eletroacupuntura, sendo considerada como um recurso tecnológico indispensável para o sucesso da técnica1. Devido ao grande interesse e à difusão de tal técnica no Brasil, o Ministério da Saúde incorporou a acupuntura ao Sistema Único de Saúde (SUS)2, sendo também considerada como especialidade por oito Conselhos de Classe, dentre eles, o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional3. Enquanto ferramenta de trabalho fisioterapêutico, a eletroterapia mostra sinais de organização quanto à padronização de procedimentos e normatização dos instrumentos4. A eletroacupuntura, por sua vez, carece do estabelecimento de procedimentos seguros e da definição de parâmetros físicos eficazes a serem aplicados durante a prática terapêutica5.

Os princípios terapêuticos da eletroterapia encontram sua fundamentação nas interações provocadas em níveis celular, tecidual e sistêmico; consequentemente, no âmbito fisiológico. O fluxo da corrente elétrica através de um meio condutor biológico desencadeia efeitos fisiológicos, envolvendo fenômenos eletroquímicos, eletrofísicos e eletrotérmicos4. Dentre os parâmetros físicos mais relevantes e estudados na eletroacupuntura, desponta a frequência estimulatória, em especial, suas relações com a liberação de opioides endógenos em processos analgésicos e anti-inflamatórios6.

Na primeira geração de pesquisas em eletroacupuntura, encontram-se trabalhos em ratos, com dor induzida, cujos objetivos foram relacionar as frequências estimulatórias com as substâncias bioquimicamente liberadas, entre as quais: Colecistokinina 8 (CCK 8), em 100Hz7; endorfina, em 2Hz8; encefalina e dinorfina em 2 e 100Hz6; endomorfina, em 2Hz9, e substância P, em 10Hz10. Os estudos em humanos, assim como aqueles envolvendo faixas de frequências mais altas, são escassos na literatura e com enfoques metodológicos diversos, tais como: analgesia em dor lombar com a aplicação de 50Hz1 e 80Hz11, analgesia pós-cirúrgica com 100Hz12-14, cervicalgia com 120Hz e 250Hz15 e indicações para dores de natureza aguda com frequências de 800 a 1000Hz12. A escassez de trabalhos científicos nessa área, envolvendo humanos, sugere como causas as dificuldades que cercam a avaliação da dor humana, assim como falhas metodológicas, fatores esses já criticados por outros autores16,17. Avaliar os efeitos analgésicos de procedimentos terapêuticos é importante, pois sustentam a própria eficácia ou não de uma continuidade de seu uso.

O sintoma de cervicalgia tensional foi escolhido por fazer parte do perfil da população, uma vez que acomete um grande número de indivíduos. Segundo Côté et al.18, as dores cervicais afetam 30% de homens e 43% de mulheres em algum momento de suas vidas, sendo também uma queixa que afasta um grande número de trabalhadores de suas atividades profissionais. A cervicalgia pode ter várias origens, desde alterações posturais, traumas mecânicos, retificações, compressões articulares, entre outras19. Entende-se que a cervicalgia conhecida como tensional não se trata de uma patologia em si, senão um sintoma ou uma forma de manifestação do tipo síndromes musculares dolorosas. Outro aspecto relevante para escolha dessa sintomatologia é o fato da acupuntura já vir apresentando bons resultados terapêuticos em dores cervicais15,20 e, como consequência, há extensa literatura sobre esse sintoma e os pontos de aplicação de acupuntura20-25.

No presente artigo, descreve-se um estudo de natureza clínico-experimental em humanos, cujo objetivo foi comparar o desempenho da analgesia produzida com eletroacupuntura, quando empregadas as frequências estimulatórias de 2Hz, 100Hz, 1000Hz, 2500Hz e em um grupo só com acupuntura, sem estímulo elétrico.

Materiais e métodos

Para aplicação do protocolo experimental, utilizaram-se agulhas de acupuntura descartáveis de 0,25 (diâmetro) x 40mm (comprimento), em aço inox; álcool 70%; algodão hidrófilo; cronômetro; aparelho algômetro digital, marca Wagner; e caixa para descarte perfuro-cortante. Empregou-se, ainda, um estimulador elétrico da marca NKL, modelo EL 608, (ANVISA 80191680002) com geração e controle de estímulos microprocessado, classe 1 BF, contendo 8 saídas isoladas por meio de transformadores de pulso. A corrente de saída pode atingir um valor máximo por pulso de 10mA ou intensidade média de 6mA.

A forma do pulso gerado pelo estimulador configura-se como monofásica, retangular, balanceada assimétrica, com fase secundária em exponencial decrescente, obedecendo segundo Knihs5, a um padrão pulsado, com período de estimulação de 4 segundos e repouso de 3 segundos. O aparelho foi calibrado no laboratório de Engenharia de Reabilitação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), estando em conformidade com as normas técnicas NBR IEC 60601-1 e NBR IEC 60601-226,27.

Os voluntários foram recrutados nos ambulatórios do Instituto Brasileiro de Therapias e Ensino de Curitiba. Inicialmente, dentro dos critérios de inclusão, foi triada uma população de 88 voluntários. No entanto, no momento da intervenção, alguns apresentaram inadequações tais como queda de pressão arterial, medo, intolerância à estimulação elétrica, uso de analgésicos, dentre outros. Essas pessoas receberam tratamento, porém não fizeram parte da amostra. A amostra foi composta de 66 indivíduos, com idades variando entre 18 e 53 anos, alcançando uma média de 33,67±9,97 anos, sendo 89,5% pertencente ao sexo feminino e 10,5% ao masculino. Elaborou-se e validou-se o instrumento de triagem dos voluntários por meio dos pareceres técnicos de 10 especialistas em ortopedia, com o objetivo de caracterizá-los como portadores de cervicalgia tensional e traçar o perfil da amostra, resguardando a homogeniedade dos grupos. A partir dos critérios de inclusão definidos, selecionou-se: indivíduos normotensos, com cervicalgia de origem tensional, com dores na região dos músculos trapézio e pescoço, pelo menos nas últimas 4 semanas precedentes à seleção. Os critérios de exclusão foram: fumantes, uma vez que o fumo foi apontado por Piovesan et al.28 como fator de diminuição da sensibilidade nociceptiva na avaliação da algometria; portadores de marcapasso e gestantes, por ser contraindicado o uso de eletroacupuntura29; indivíduos que haviam feito uso de fisioterapia, massagem, acupuntura nas duas últimas semanas precedentes à intervenção, ou anestésicos, analgésicos, relaxantes musculares, psicotrópicos, anti-inflamatórios nos últimos dois dias antes da intervenção. O projeto teve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da PUC-PR sob número CEP 1035/2006. Todos os voluntários assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Na intenção de cegar parcialmente o estudo, foi convidada uma fisioterapeuta para entrevista de avaliação da seleção dos voluntários, distribuição sistemática dos mesmos nos grupos e avaliação dos instrumentos de mensuração, antes e depois da intervenção terapêutica.

Inicialmente, solicitou-se ao voluntário que expressasse uma nota para a dor que ele estava sentindo, sendo a referência ZERO para "sem dor", e DEZ "pior dor", expressa na Escala Visual Analógica (EVA). Na sequência, mediu-se a frequência cardíaca do voluntário. A avaliação por meio da algometria de pressão iniciou-se com a explicação ao voluntário do que se tratava e como ele deveria verbalizar sua tolerância à pressão. Para melhor compreensão, como exemplo, aplicou-se um estímulo mecânico na região da prega de flexão do antebraço direito até que o voluntário manifestasse desconforto à pressão, quando foi orientado a dizer imediatamente "deu". Nesse momento, bloqueava-se instantaneamente a compressão, e efetuava-se a leitura no aparelho. Na medida de pressão, o instrumento empregado (contendo certificado de calibração) operou na função C (autocalibração em kgf/cm2). Padronizou-se que a tolerância seria a expressão do começo de desconforto à pressão quando a ponteira de borracha do algômetro comprimisse a pele. Os procedimentos de avaliação da EVA, frequência cardíaca e algometria de pressão foram executados no mínimo 10 minutos antes da intervenção, aproveitando o tempo de entrevista, em que o voluntário permaneceu sentado e em repouso e repetidos 10 minutos depois da retirada das agulhas de acupuntura.

Para a leitura da magnitude de pressão, foram selecionadas, na região de pescoço e trapézio, três combinações bilaterais e simétricas de pontos, constituindo seis locais de leitura, sendo medidas 1 e 2 (inserção do músculo trapézio occipital direito e esquerdo, respectivamente); medidas 3 e 4 (ponto médio da borda superior dos trapézios direito e esquerdo, respectivamente); e medidas 5 e 6 (músculo supraespinhoso acima da borda medial da espinha das escápulas direita e esquerda, respectivamente), conforme ilustra a Figura 1. A escolha desses pontos está fundamentada na literatura como pontos dolorosos nas síndromes de dores miofasciais30.


O voluntário manteve-se sentado em todos os procedimentos. Padronizou-se uma sequência de leituras da algometria de maneira que, quando realizada a primeira leitura dos seis pontos descritos, iniciava-se uma nova "rodada" de leituras na mesma sequência. Ao todo, foram coletadas três leituras em cada ponto, antes e depois da intervenção. Os valores encontrados foram agrupados para o cálculo da média, considerando as medidas 1 com a 2, 3 com a 5, e 4 com a 6. Concluídas as avaliações antes da intervenção, procedeu-se à aplicação das agulhas de acupuntura bilateralmente. Os pontos de acupuntura foram selecionados a partir de indicações bibliográficas para dores cervicais, sendo eles: B10 (tianzhu), VB21 (jianjing), TA15 (tianliao), IG4 (hegu) e ID3 (houxi)23-25. As agulhas dos pontos TA15 e VB21 (músculo trapézio, bilateralmente) foram as selecionadas para receberem estímulo elétrico, atuando como agulhas-eletrodos. A justificativa dessa escolha ocorreu pela proximidade anatômica da região dolorosa, pela função de relaxamento muscular atribuídas a esses pontos, além de ser uma região de fácil fixação das agulhas e menos incômodas ao usuário. A profundidade da agulha foi aproximadamente de 1,27cm (0,8 pol), exceto em ID3 (na mão), cerca de 0,4 cm (0,3 pol). A ordem de inserção das agulhas, bem como sua retirada, obedeceu à mesma sequência para todos os voluntários.

Por sorteio, foram codificados os grupos com letras A (2500Hz), B (2Hz), C (1000Hz), D (100Hz) e E (sem estímulo elétrico). O voluntário e o pesquisador não tiveram conhecimento da correspondência das letras com as frequências. Sendo a frequência estimulatória o parâmetro físico sob avaliação, essa foi a variável modificada durante a realização dos experimentos. O ajuste da intensidade de corrente foi individual, respeitando a tolerância ao estímulo de cada voluntário, como é preconizada pela técnica de eletroacupuntura5,29.

A separação dos voluntários nos grupos A, B, C, D e E ocorreu por uma distribuição sistemática realizada pela avaliadora convidada. O período de permanência das agulhas, incluído o tempo de estimulação elétrica, somou 20 minutos. Findo esse intervalo, retiraram-se os cabos do eletroestimulador, assim como as agulhas, evitando-se aplicar pressão próximo aos locais da leitura. Padronizou-se um período de repouso de 10 minutos até que as avaliações da EVA, frequência cardíaca e algometria fossem repetidas, constituindo a coleta de dados do DEPOIS da intervenção. Nesta pesquisa, foram incluídos 66 voluntários divididos em cinco grupos: A (2500Hz, com n=13), B (2Hz, com n=13), C (1000Hz, com n=13), D (100Hz, com n=13), E (sem estímulo elétrico, com n=14).

Resultados

A fim de realizar o tratamento estatístico, aplicou-se a análise de covariância (ANCOVA) para os dados da algometria. O teste não-paramétrico de Kruskal-Wallis foi utilizado para EVA e, para avaliações dentro do próprio grupo, aplicaram-se os testes de Wilcoxon e t de Student.

Nota atribuída à dor (EVA)

Houve redução na variação percentual da média das notas atribuídas à dor e significância estatística, expressando melhoras no efeito analgésico percebido pelos voluntários em todos os grupos, sendo: A (2500Hz) redução de 52,12% com p=0,003; B (2Hz) redução de 32,93% com p=0,028; C (1000Hz) redução de 52,41% com p=0,002; D (100Hz) redução de 41,92% com p=0,013; e E (sem estimulação elétrica) redução de 65,95% com p=0,002.

Tolerância à pressão

Efetuou-se uma avaliação por região anatômica estudada (Figura 1), verificando-se a significância estatística da variação de tolerância à pressão entre os momentos antes e depois da intervenção, tendo em vista que essa forma de avaliação do ponto de vista estatístico minimiza a variabilidade individual existente entre os voluntários, pois passa a comparar cada indivíduo com ele mesmo (amostra pareada). Observa-se, na Tabela 1, que houve significância estatística para os grupos A (2500Hz) e D (100Hz) em todas as regiões anatômicas avaliadas, denotando a eficácia da intervenção terapêutica. Os demais grupos não denotaram relevância estatística.

Frequência cardíaca

A variação percentual da frequência cardíaca (FC) nos momentos antes-depois da intervenção apresentou resultado do teste com p=0,716, indicando não existir diferença significativa entre os grupos em relação aos resultados da variação na FC. Em todos os grupos, houve voluntários em que a FC não se alterou; porém, em alguns ocorreu aumento e em outros redução da frequência, conforme ilustrado na Figura 2. Observa-se que o grupo E (sem estimulação elétrica) apresentou o maior número de casos em que a FC aumentou (43%).


Discussão

Ao interpretar os resultados e tratamentos estatísticos, constata-se que houve significância estatística em todos os grupos entre os momentos antes-depois nas variáveis nota atribuída à dor (EVA) e frequência cardíaca, em função das frequências estimulatórias testadas, indicando melhoras terapêuticas, porém sem relevância de um grupo por frequência testada. No entanto, quando avaliado o desempenho terapêutico dentro do próprio grupo para a variável tolerância à pressão, verifica-se superioridade para a 2500Hz, seguida pela frequência de 100Hz. Esse achado foi confirmado em todas as regiões avaliadas pela algometria de pressão.

Os resultados encontrados divergem de autores como Han6, Filshe e White29, que apontam vantagens para o uso de frequências estimulatórias baixas (2Hz) para fins analgésicos. Essas pesquisas sustentam essa vantagem a partir de estudos bioquímicos e imuno-histológicos em ratos e camundongos. Entende-se que, por um lado, esse tipo de pesquisa é importante, pois se fundamenta nos efeitos analgésicos da liberação de neurotransmissores, por outro, não se defronta com a realidade de variáveis emocionais, culturais e biomecânicas vivenciadas na dor humana.

Filshie e White29 fizeram um levantamento de experimentos controlados em humanos que, muito embora com pouquíssimos achados, constataram que a eletroacupuntura em frequências mais baixas mostra evidências de melhores resultados analgésicos que nas altas. Indicam também que os efeitos terapêuticos são mais duradouros em condições dolorosas crônicas. Lamentavelmente ainda são escassos os trabalhos de eletroacupuntura em humanos, muito mais os que se propõem a traçar comparações de parâmetros.

Tienyou31, Yin22 e Cui32 defendem que a eletroacupuntura tem vantagens analgésicas sobre a acupuntura. Os resultados deste trabalho ratificam parcialmente essa afirmação ao confirmar que houve significância estatística da algometria de pressão em todas as regiões avaliadas em dois dos quatro grupos tratados com eletroacupuntura (2500Hz e 100Hz), e não houve com o grupo tratado só com acupuntura. No entanto, observa-se, pelos resultados da avaliação efetuadas por meio da EVA, que o grupo E, que recebeu só acupuntura, apresentou o mais alto dos índices de redução do percentual médio das notas atribuídas à dor (65,95%), muito embora sem diferenças dos demais grupos do ponto de vista estatístico. A justificativa levantada, neste trabalho, para este achado alicerça-se no fato de que a simples possibilidade de passar corrente elétrica pelo corpo acaba gerando ansiedade no voluntário, um efeito psicológico negativo de que ele vai "levar choque", lembrando que a nota atribuída à dor pela EVA tem um componente subjetivo e emocional segundo Ferreira19.

Na algometria de pressão, por sua vez, a referência é mais quantitativa e está associada à sensibilidade nociceptiva a partir de um estímulo mecânico concreto, que é a ponteira de borracha do algômetro. Soma-se a este fator a constatação de que os pontos de leitura de algometria escolhidos para o trabalho estão próximos do local de inserção e que o estímulo provocado pela corrente elétrica presente nos grupos com eletroacupuntura têm também um efeito local "reforçado" ou favorecido, diferentemente daqueles que são excitados apenas pelas agulhas de acupuntura. Analisando as variações de FC, antes e depois da intervenção terapêutica, confirma-se também não haver diferenças entre os grupos pesquisados.

Não foram encontradas, na literatura, pesquisas associando FC com efeitos analgésicos da acupuntura ou eletroacupuntura. Apesar de estatisticamente não haver diferença entre os grupos pesquisados, há um dado que chama atenção: a maior parte dos voluntários dos grupos submetidos à eletroacupuntura apresentou redução na FC após a intervenção (Figura 2), o que não ocorreu no grupo que recebeu somente acupuntura (sem estimulação elétrica), no qual 43% dos voluntários sofreram aumento da FC após a intervenção, 50% teve redução e em 7% não houve alteração.

Melzack33 e Guyton34 escreveram sobre a influência de estresse e estímulos externos envolvidos na modulação da FC, assim como as vias anátomo-fisiológicas dessa influência. Pomeranz17 associou baixa frequência na eletroacupuntura com efeitos analgésicos e sedativos, sugerindo possíveis efeitos indiretos na FC. Os estudos de Yang et al.35 confirmam que a eletroacupuntura produz redução dos batimentos cardíacos, pressão arterial e liberação de catecolaminas com redução de estresse. Com base nessas referências, os resultados deste trabalho indicam, portanto, que a eletroacupuntura tem maior efeito na modulação do tônus autônomo e hipotolâmico que a acupuntura, tendo, então, justificada a maior proporção de voluntários com redução da FC nos grupos com estimulação elétrica.

Embora não tenham sido evidenciadas diferenças estatisticamente significantes entre os grupos, tanto para as variáveis de nota atribuídas à dor quanto para a FC, o presente trabalho recomenda a aplicação de 2500Hz e 100Hz em eletroacupuntura para analgesia em cervicalgia tensional, pelo fato de terem sido as frequências que apresentaram melhor eficiência individual na avaliação da algometria.

Recebido: 30/05/2008

Revisado: 29/08/2008

Aceito: 21/11/2008

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  • Correspondência para:

    Sandra Mara Silvério-Lopes
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    CEP 80020-000, Curitiba (PR), Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Abr 2009
    • Data do Fascículo
      Abr 2009

    Histórico

    • Aceito
      21 Nov 2008
    • Revisado
      29 Ago 2008
    • Recebido
      30 Maio 2008
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