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Investigações sobre a ocorrência de ondas anormais em Arraial do Cabo, RJ

Resumos

A ocorrência de ondas anormais (freak/rogue waves) é investigada através da análise dos dados coletados por um ondógrafo direcional tipo boia fundeado em Arraial do Cabo, Rio de Janeiro. Após o exame de mais de 17.000 registros (cerca de 3 milhões de ondas) foram identificadas apenas duas que satisfizeram todos os critérios apresentados na literatura, como índice de anormalidade, índice de amplificação de crista e altura significativa mínima. Essas ondas, com alturas individuais de 4,3 e 8,54 m, ocorreram durante as primaveras de 1998 e 2001, a despeito das maiores tempestades terem sido registradas no outono, em situações bastante diversas, tanto na composição espectral, quanto na direção principal de propagação.

ondas anormais; ondas; análise de dados


The occurrence of freak waves is investigated through the analysis of data collected by a wave buoy anchored near Arraial do Cabo, Rio de Janeiro. After examining more than 17,000 records (about 3 millions waves) only two waves could be classified as abnormal, according to the criteria found in the literature, like abnormality index, crest amplification index, and minimum significant wave height. Both waves, with individual heights of 4.3 and 8.54 m, occurred in the spring of 1998 and 2001, despite the main storms had been registered in autumn, with different spectral composition and main direction of propagation.

freak waves; wind waves; data analysis


Investigações sobre a ocorrência de ondas anormais em Arraial do Cabo, RJ

Rogério Neder CandellaI; Mariana Viviani CandellaII

IInstituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira, Rua Kioto, 253, 28930 Arraial do Cabo, RJ, Brasil. Tel.: (22) 2622-9011; Fax: (22) 2622-9093- E-mail: rcandella@gmail.com

IIUniversidade Federal do Rio de Janeiro, Centro de Tecnologia, Bloco C, sala 203, Cidade Universitária, Ilha do Fundão, 21945-970 Rio de Janeiro, RJ, Brasil- E-mail: m.candella@poli.ufrj.br

RESUMO

A ocorrência de ondas anormais (freak/rogue waves) é investigada através da análise dos dados coletados por um ondógrafo direcional tipo boia fundeado em Arraial do Cabo, Rio de Janeiro. Após o exame de mais de 17.000 registros (cerca de 3 milhões de ondas) foram identificadas apenas duas que satisfizeram todos os critérios apresentados na literatura, como índice de anormalidade, índice de amplificação de crista e altura significativa mínima. Essas ondas, com alturas individuais de 4,3 e 8,54 m, ocorreram durante as primaveras de 1998 e 2001, a despeito das maiores tempestades terem sido registradas no outono, em situações bastante diversas, tanto na composição espectral, quanto na direção principal de propagação.

Palavras-chave: ondas anormais, ondas, análise de dados.

ABSTRACT

The occurrence of freak waves is investigated through the analysis of data collected by a wave buoy anchored near Arraial do Cabo, Rio de Janeiro. After examining more than 17,000 records (about 3 millions waves) only two waves could be classified as abnormal, according to the criteria found in the literature, like abnormality index, crest amplification index, and minimum significant wave height. Both waves, with individual heights of 4.3 and 8.54 m, occurred in the spring of 1998 and 2001, despite the main storms had been registered in autumn, with different spectral composition and main direction of propagation.

Keywords: freak waves, wind waves, data analysis.

INTRODUÇÃO

Ondas anormais ou transientes, conhecidas na literatura internacional como freak ou rogue waves, são as que excedem a altura máxima prevista estatisticamente para um determinado conjunto de medições. São, em geral, ondas com grande esbeltez, com surgimento inesperado, sendo, por esse motivo referidas como "ondas que vêm do nada", uma tradução livre para waves from nowhere, em locais de profundidade arbitrária (águas profundas, intermediárias ou rasas), na presença ou não de correntes fortes (Kharif & Pelinovsky, 2003).

A ocorrência desse fenômeno foi, por bastante tempo, considerada como parte do folclore marítimo, até que pudesse ser confirmada por medições, de campo ou por satélites, e fotografias. O registro mais citado foi obtido em 1º de janeiro de 1995, no Mar do Norte, por um sensor instalado na plataforma de petróleo Draupner, sendo referida como a "Onda Draupner" ou "Onda de Ano Novo" (ver, p.e., Guedes Soares et al., 2004 e Rosenthal, 2005).

Ondas são um parâmetro importante em engenharia costeira ou naval, já que os projetos de estruturas se baseiam nas condições extremas que serão enfrentadas, sendo o estado de severidade do mar, geralmente, caracterizado pela altura significativa (Hs), um parâmetro estatístico que traduz a altura das ondas do ponto de vista de um operador experiente. No entanto, em determinadas situações, uma única onda extrema pode levar ao colapso ou causar severos danos a essas estruturas, ocorrendo casos em que a esbeltez da onda é ainda mais importante que sua altura (Guedes Soares et al., 2004). Daí a importância da inclusão do conhecimento das ondas anormais nessas áreas.

Diversos acidentes com navios foram relacionados às ondas anormais. Kharif & Pelinovsky (2003) relatam 22 naufrágios de cargueiros entre 1969-1994, com um total de 525 perdas de vida, sendo dois destes no Oceano Atlântico Sul, em 1985 e 1991. Os mesmos autores enfatizam que, pelo menos, 20 choques de navios com ondas anormais foram registrados no Oceano Índico, na área da Corrente das Agulhas, ao largo da costa da África do Sul. Rosenthal (2005) cita que o número de perdas de navios cargueiros por esse motivo supera os 200 entre 1985 e 2005. Outros exemplos são também citados por Dahle et al. (1988).

Embora existam várias teorias sobre a formação das ondas anormais, como amplificação por correntes, focalização temporal e espacial, instabilidade de Benjamin-Feir e instabilidade não linear, nenhum desses mecanismos está totalmente identificado e compreendido (Guedes Soares et al., 2003). Uma revisão dos mecanismos físicos possivelmente geradores dessas ondas pode ser encontrada em Kharif & Pelinovsky (2003).

Pelas condições características de mar na costa brasileira, muito menos severas que as encontradas no Mar do Norte ou no Oceano Pacífico, aliadas a indisponibilidade de séries temporais longas, muito poucos trabalhos foram realizados sob esse tema, sendo as únicas referências encontradas os trabalhos de Pinho (2003) e Pinho et al. (2004).

O objetivo principal deste trabalho é analisar os dados coletados durante as campanhas de medição de ondas realizadas em Arraial do Cabo, RJ, classificando-os segundo os diversos critérios presentes na literatura, para verificar a presença e as características desse tipo de onda.

METODOLOGIA

Descrição dos dados

Arraial do Cabo está localizada no litoral leste do estado do Rio de Janeiro, sendo geograficamente marcada por ser o ponto de alteração da orientação da linha de costa, que passa de nordeste-sudoeste em, praticamente, todo o litoral brasileiro, para leste-oeste, entre Arraial do Cabo e, aproximadamente, a divisa do estado com São Paulo. Essa localização tem consequências oceanográficas importantes, como a ocorrência da ressurgência costeira, e permite que essa região fique exposta a ondulações de todas as direções possíveis no litoral brasileiro, entre norte e sudoeste.

Os registros foram obtidos entre os anos de 1998 e 2005, com um ondógrafo direcional tipo boia Wave Rider operado pelo Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira. Durante o período, o equipamento esteve fundeado em dois pontos (Fig. 1). No primeiro (23º01'S; 42º03'W), a interferência do continente impedia que ondas vindas entre norte e nordeste pudessem ser registradas. Já no segundo (23º04'S; 42º00'W), foi possível registrar ondulações de todas as direções viáveis.A profundidade local, em ambos os casos, foi de 80 m.


A periodicidade de armazenamento dos dados foi variável, passando de 3 horas para meia hora, caso a altura significativa ultrapassasse um valor padrão ajustável, aqui definido com 2,5 m. A frequência de medição da boia é 0,78125 s, ou seja, 1,28 medições/s, por períodos de 20 min.

As análises foram baseadas nos dados brutos, que são armazenados em arquivos contendo 4 colunas: um indicador da qualidade do dado e as excursões vertical (positivo para cima), norte-sul (positivo para norte) e oeste-leste (positivo para oeste).

Os registros que apresentaram problemas, indicado por um dígito diferente de zero na primeira coluna dos dados, foram descartados e não foi realizado nenhum procedimento para cobertura dessas falhas. Tais defeitos e os diversos rompimentos do sistema de fundeio, muitas vezes devido à depredação, resultaram em várias lacunas na série, algumas bastante longas. Após a depuração inicial, 17.422 registros foram considerados válidos, o que representa 348.440 minutos (~5.807 horas), totalizando cerca de 3.060.000 ondas.

Tratamento dos dados

Para análise de registro de ondas no domínio do tempo, o primeiro passo é a determinação das ondas individualmente. Em geral, utiliza-se o critério do cruzamento com o nível médio, nesse caso zero, sendo uma onda definida por 2 cruzamentos sucessivos da linha de registro com esse nível, tanto de forma ascendente, quanto descendente. É comum utilizar-se as denominações zero ascendente e zero descendente para esses critérios e, embora a primeira definição seja a mais comumente empregada, a zero descendente é que melhor expressa a forma como navios ou plataformas vêem as ondas (Guedes Soares et al., 2004).

Ondas ideais, com forma senoidal, são simétricas horizontal e verticalmente, de forma que períodos e comprimentos são iguais nos dois modos. No entanto, observa-se que, comumente, as ondas reais possuem cristas maiores que cavados, tendo aqueles, comprimento menor. Seguindo a metodologia apresentada por Guedes Soares et al. (2004), pode-se dividir cada onda nos segmentos apresentados na Figura 2. Para definição dos pontos exatos de cruzamento (1, 2, 3 e 4) foram utilizadas interpolações lineares entre aqueles mais próximos do nível zero. No presente trabalho, será dado maior enfoque à altura das cristas (cr) e das ondas (tr + cr), além do período total (T = T1 + T2 + T3 + T4).


A altura significativa, nesse tipo de análise, é tomada com a média do primeiro terço das ondas do registro dispostas em ordem decrescente. De acordo com o critério adotado, serão obtidas, então, Hsa, quando as ondas são definidas pelo cruzamento ascendente e, analogamente, Hsd, quando definida pelo cruzamento descendente.

Na análise no domínio da frequência, a altura significativa é definida como

onde m0 é a variância do processo ou o momento de ordem zero do espectro de potência do registro.

Critérios para determinação de ondas anormais

Dean (1990) definiu como onda anormal aquelas que são maiores que as esperadas dentro da distribuição de alturas de Rayleigh, que é de duas vezes a altura significativa, o que pode ser expresso por

onde H é a altura da maior onda. De acordo com as definições anteriores, I A pode ter as seguintes formas

onde os índices subscritos denotam a comparação com as alturas significativas obtidas no domínio do tempo (Hsa e Hsd) e os sobrescritos são relacionados com aquela determinada no domínio da frequência (Hs).

Stansell (2005) afirma que a distribuição de Rayleigh subestima severamente a probabilidade de ocorrência de ondas anormais e Haver (2004), utilizando aproximações das equações de onda em segunda ordem, define o índice em função da duração do registro, sendo I A > 2 para uma medição de 20 min, 2,45 para 3 horas e 2,55 se for considerada toda a duração da tempestade.

Vários autores, como, por exemplo, Olagnon & van Iseghem (2000), Guedes Soares et al. (2004) e Petrova et al. (2006), levam em consideração, ainda, um outro fator,

ou, considerando-se as variações utilizadas anteriormente,

determinando como ondas anormais àquelas em que, além de I A > 2, I C > 1,3.

Nesse trabalho serão empregados os mesmos critérios, verificando, também, a ocorrência simultânea de I Aa e I Ad maiores que 2.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Em média, as alturas significativas obtidas por zero ascendente e descendente são próximas, existindo, porém, situações em que os valores são bastante distintos (Guedes Soares et al., 2003). Nos dados analisados, foram obtidos os valores

sa = 1,87 m e sd = 1,85 m, o que concorda, na média, com o descrito. Já s teve o valor de 1,97 m.

Petrova et al. (2006) citam que, em geral, as alturas significativas calculadas no domínio do tempo (Hsae Hsd) são 5% menores que aquelas calculadas no domínio da frequência (Hs). Nos dados analisados, a média de Hsa/Hs foi de 0,95 e de Hsd/Hs, 0,94, concordando com a citação.

As distribuições de ocorrência são, como esperado, bastante semelhantes para os resultados derivados dos três critérios, sendo, por esse motivo, apresentada somente aquela referente à Hs (Fig. 3). Boa parte das ondas da região é de pequena altura, sendo que cerca de 90% dos registros possuem Hs < 2,5 m. Para efeito de comparação, Guedes Soares et al. (2004) definiram para seu estudo um valor de Hs mínimo de 4,0 m e utilizaram 267 registros.


A maior altura significativa (Hs) encontrada, dentro dos dados analisados, foi de 6,76 m, no dia 31 de março de 1999, durante a maior tempestade registrada pelo ondógrafo. Os maiores valores de Hsa e Hsd também foram registrados nesse evento, sendo, respectivamente, 6,46 e 6,63 m, assim como as maiores ondas individuais, Hmaxa = 10,45 m e Hmaxd = 10,31 m.No entanto, percebe-se que tais ondas não podem ser classificadas como anormais, uma vez que

Na Tabela 1, estão representados os números de ondas consideradas anormais levando-se em consideração somente I A, incluindo todas as combinações de zero descendente, zero ascendente e Hs. Nota-se que as ocorrências determinadas com zero ascendente são maiores nos dois casos. Comparando-se àquelas calculadas no domínio do tempo, há menos eventos quando é utilizada Hs, o que é esperado, pois, como mostrado anteriormente, os valores de Hs são, em média, 5% maiores que Hsa e Hsd. Em qualquer dos casos, há uma quantidade considerável de ocorrências, o que está de acordo com Pinho et al. (2004), que concluíram que tais eventos ocorrem de maneira abundante na Bacia de Campos, RJ, cerca de 250 km a nordeste de Arraial do Cabo.

Tomita & Kawamura (2000) classificam como ondas "verdadeiramente anormais" aquelas em que não só I A > 2 mas, também, I C > 1,3, sendo esse critério adicional adotado por outros autores, como Petrova et al. (2006). Considerando-se essa combinação, a ocorrência torna-se bastante mais rara nos dados analisados. Do total, apenas 14 ondas, 6 zero ascendentes, 3 zero descendentes e 5 de ambos os casos (Tab. 2) atendem às condições impostas.

Não parece haver uma relação direta entre I C e Hmax (Fig. 4), onde pode-se observar que os indicadores de anormalidade (I C > 1,3) estão concentrados em alturas significativas entre 3 e 5 m, aproximadamente. Nas maiores tempestades,acima de 6 m, o índice de amplificação de crista é baixo, mal chegando a 1,2. Analogamente, a distribuição de Hs com I A (não mostrada) também não apresenta relação direta, não indicando relação entre a severidade do mar e os índices que denotam anormalidade da onda.


Grande parte das ondas que satisfazem às duas condições, no entanto, tem pequena altura. Alguns autores utilizam um limite mínimo para relacionar seus resultados às maiores tempestades. Olagnon & van Iseghem (2000), por exemplo, limitaram suas análises a registros com Hs > 2,0 m. Candella et al. (2008), em estudo numérico das características médias das ondas no litoral brasileiro, utilizaram Hs > 2,0 m como limite inferior de condição de tempestade. Utilizando-se esse parâmetro como filtro adicional, apenas 2 ondas foram selecionadas, as ocorridas em outubro de 1998 (A1) e setembro de 2001 (A2), estando as mesmas destacadas na Tabela 2. Os registros completos e os perfis individuais de cada uma estão na Figura 5.


Forristall (2005) ressalta que erros de medição podem induzir à determinação de ondas anormais. Cita, por exemplo, que, na Onda Draupner, o ponto de maior altura está cerca de 2,5 m acima dos outros mais próximos e que sua simples retirada aumentaria a probabilidade de ocorrência daquela onda em, praticamente, 3 ordens de grandeza. Os perfis individuais mostrados na Figura 5 não indicam pontos espúrios que pudessem ser considerados como erros de medição, o que leva a crer que as medições estão corretas.

A assimetria vertical é representada por

e as duas ondas selecionadas apresentam Av < 2, indicando que a crista é maior que o cavado, sendo AvA1≈ 1,64 e AvA2≈ 1,79.

A esbeltez é dada por

e, para as duas ondas consideradas anormais, obteve-se os valores de SA1≈ 0,0058 e SA2≈ 0,0075. A média de esbeltez () das ondas máximas com I A > 2 é de 0,0041 e o desvio padrão (σ) 0,0018. Comparando-se estes resultados (Figs. 6a, b, c), percebe-se que, embora A1 e A2, indicadas por um triângulo e um quadrado respectivamente, não sejam as que possuem maior esbeltez, possuem um valor bastante superior ao da média, sendo A2 maior que + 2σ, ou seja, sua esbeltez está entre as 2,5% maiores do conjunto.


Gemmrich (2005) ressalta que ondas superpostas podem alterar a análise pelo método do cruzamento do nível zero, tendendo a alongar o período estimado. De fato, alguns resultados, especialmente, para ocasiões em que o mar estava mais calmo, indicam períodos das maiores ondas acima de 20 s, levando a supor que essa interferência possa ter ocorrido. No entanto, os registros relativos aos valores extremos foram conferidos e não apresentaram sinais de influência de superposição de ondas.

Seixas (1997) sugere que as análises espectrais de registros de ondas sejam realizadas com 32 graus de liberdade, suficiente para dar consistência ao estimador, sem mascarar picos secundários, sendo esse o critério aqui empregado. Nas Figuras 7a, b, estão representados os espectros unidimensionais e a direção dominante por frequência dos registros que contém as ondas anormais, indicando situações bastante distintas entre si. O primeiro caso é tipicamente de banda larga, com grande parte da energia distribuída no intervalo entre aproximadamente, 7 e 10 s, os dois picos principais, além de um pico secundário,centrado em 4,5 s, e direção principal entre S-SW. No segundo, a direção dominante é SE e a energia é relativamente concentrada em torno de 10 s, embora haja um pico de energia secundário em ~ 6 s.


As informações obtidas a partir dos espectros são plenamente compatíveis com as situações atmosféricas observadas. Nas Figuras 8 e 9, pode-se observar a evolução dos campos de pressão atmosférica ao nível do mar e vento, na véspera e no dia dos registros, conforme as reanálises do NCEP. Em outubro de 1998 (Fig. 8), a formação de um centro de baixa pressão, próximo ao litoral, é o responsável pela pista e consequente propagação das ondas de S-SW. Embora o ciclone não seja extremamente intenso, sua gênese e desenvolvimento são bastante próximos do ponto de medição, gerando condições para desenvolvimento das vagas registradas. Em setembro de 2001 (Fig. 9), as ondas são originadas pela intensificação de um anticiclone com centro próximo a 40ºS, formando uma pista adequada para geração de ondas de SE, que chegaram a Arraial do Cabo praticamente como marulho.



CONCLUSÕES

Ondas anormais podem representar perigo para embarcações e estruturas navais, especialmente quando possuem alturas extremas. Como as condições características do mar na costa sudeste brasileira são notadamente menos severas que as do Atlântico Norte, para onde grande parte dos trabalhos encontrados na literatura foram desenvolvidos, era de se esperar que as ondas anormais daqui, caso encontradas nos registros, fossem, também, menos severas.

A análise de 17.422 registros não contínuos, obtidos com um ondógrafo tipo boia, no litoral de Arraial do Cabo, RJ, indicou a ocorrência de diversos eventos onde Hmax > 2 Hs, critério inicial para determinação de uma onda anormal, o que concorda com o descrito por Pinho et al. (2004). No entanto, a aplicação de condições suplementares, como índice de amplificação da crista (I C) e altura significativa mínima, reduz o número de ocorrências a apenas duas.

Embora com altura bem menor que as encontradas nos demais trabalhos citados, essas ondas tinham características semelhantes, como os valores encontrados para a esbeltez, constituindo, portanto, uma fonte extra de esforço para estruturas de engenharia e perigo para embarcações menores.

As ondas anormais encontradas ocorreram em situações diferentes, tanto em direção de propagação, quanto em composição do espectro, não permitindo, assim, nenhuma inferência a respeito de sua relação com o estado do mar.

Ainda que as maiores tempestades registradas tenham ocorrido no outono, o que concorda com o estudo de Candella et al. (2008), as duas ondas anormais ocorreram durante a primavera, estação na qual as tempestades têm menor frequência.

O pequeno número de observações contínuas com certeza influenciou o resultado final, podendo-se esperar a ocorrência de mais casos com o aumento e continuidade dos registros.

Recebido em 13 abril, 2010 / Aceito em 3 setembro, 2010

Received on April 13, 2010 / Accepted on September 3, 2010

NOTAS SOBRE OS AUTORES

Rogério Neder Candella. Graduado em Oceanografia pela UERJ, com mestrado e doutorado em Engenharia Oceânica pela COPPE/UFRJ, trabalha como pesquisador do Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira desde 1986, com interesses em medição, tratamento de dados e modelagem numérica de ondas geradas pelo vento, variações do nível do mar em diversas escalas temporais e circulação costeira e oceânica.

Mariana Viviani Candella. Graduanda em Engenharia Naval e Oceânica - Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Maio 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 2010

Histórico

  • Recebido
    13 Abr 2010
  • Aceito
    03 Set 2010
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