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Impacto do diagnóstico de diabetes e/ou hipertensão sobre indicadores de consumo alimentar saudável: estudo longitudinal com idosos

Resumo

Objetivo:

Avaliar se a prevalência de indicadores de consumo alimentar saudável entre idosos com diagnóstico autorreferido de diabetes mellitus e/ou hipertensão arterial sistêmica (DM e/ou HAS) melhorou após diagnóstico dessas doenças, e comparar se a prevalência de tais indicadores foi mais frequente entre idosos com DM e/ou HAS do que em idosos sem essas doenças.

Método:

estudo longitudinal, com 1.197 idosos de 60-104 anos, residentes em Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, considerando como desfecho o diagnóstico autorreferido de DM e/ou HAS. Foram considerados como indicadores de consumo alimentar saudável (exposições) a manutenção e/ou aquisição de um consumo alimentar: de frutas e vegetais ≥3 e ≥2 vezes/dia, respectivamente, de gordura das carnes <2 vezes/semana, e de frituras <2 vezes/semana. Os dados foram analisados em frequências absolutas e relativas e, para a obtenção das prevalências brutas e ajustadas dos indicadores de consumo alimentar, foi empregada a Regressão de Poisson. Valores de p≤0,05 foram considerados como estatisticamente significantes.

Resultados:

Ao se comparar as prevalências dos indicadores de consumo alimentar saudável entre idosos com DM e/ou HAS com aqueles sem tais doenças, foi possível observar que apenas o consumo de frituras se modificou positivamente entre as ondas de 2009-2010 e 2013-2014, contudo, esse resultado só foi estatisticamente significante para as mulheres (a manutenção/aquisição de consumo infrequente de frituras (<2 vezes/semana), foi 8,2% maior entre idosas com DM e/ou HAS; p=0,043).

Conclusão:

as prevalências de indicadores de consumo alimentar saudável foram baixas e praticamente não diferiram entre idosos com e sem DM e/ou HAS.

Palavras-chave:
Idoso; Consumo de Alimentos; Diabetes Mellitus; Hipertensão; Estudo Longitudinal.

Abstract

Objective:

to evaluate if the prevalence of healthy food consumption indicators among elderly persons with the self-reported diagnosis of diabetes mellitus and/or systemic arterial hypertension (DM and/or SAH) improved after diagnosis of these diseases, and to compare if the prevalence of such indicators was more frequent among elderly persons with DM and/or SAH than in elderly persons without these diseases.

Method:

a longitudinal study of 1,197 elderly persons aged 60-104 years, living in Florianopolis, Santa Catarina, Brazil, was performed, considering as an outcome the self-reported diagnosis of diabetes and/or hypertension. Healthy consumption indicators (exposures) were considered the maintenance and/or acquisition of the intake of fruit and vegetables ≥3 and ≥2 times/day, respectively, the consumption of fatty meat <2 times/week, and fried foods <2 times/week. Data was analyzed in terms of absolute and relative frequencies, and Poisson Regression was used to obtain the crude and adjusted prevalence of food consumption indicators. Values of p≤0.05 were considered statistically significant.

Results:

when comparing the prevalences of the indicators of healthy food consumption among elderly persons with DM and/or SAH with those without these diseases, it was observed that only the consumption of fried foods changed positively between the periods 2009-2010 and 2013-2014. This result was statistically significant only for women, with maintaining/acquiring the infrequent consumption of fried foods (<2 times/week) 8.2% higher among elderly women with DM and/or SAH, p=0.043.

Conclusion:

The prevalence of healthy food consumption indicators was low and there was almost no difference between older adults with and without DM and/or SAH.

Keywords:
Older adults; Food Consumption; Diabetes Mellitus; Hypertension; Longitudinal Study.

INTRODUÇÃO

Doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) como diabetes mellitus (DM) e hipertensão arterial sistêmica (HAS) têm sido apontadas como as principais causas de morte e incapacidades entre idosos11 World Health Organization. The World Health Statistics 2012 [Internet]. Geneva: WHO; 2012 [acesso em 12 dez. 2015]. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/news/releases/2012/world_health_statistics_20120516/en/
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. No mundo, estima-se que 25% dos idosos sejam portadores de DM e que metade tenham HAS11 World Health Organization. The World Health Statistics 2012 [Internet]. Geneva: WHO; 2012 [acesso em 12 dez. 2015]. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/news/releases/2012/world_health_statistics_20120516/en/
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,22 World Health Organization. Raised blood pressure: situation and trends. Global Health Observatory (GHO) [Internet]. Geneva: WHO ; 2014 [acesso em 12 dez. 2015]. Disponível em: http://www.who.int/gho/ncd/risk_factors/blood_pressure_prevalence_text/en/
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. No Brasil, uma pesquisa de série temporal, a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (PNAD), baseada em uma amostra representativa de cerca de 40.000 idosos do país, identificou entre os anos de 1998 e 2008, um aumento significativo nas prevalências autorreferidas de DM (de 10% para 16%) e HAS (de 44% para 53%)33 Lima-Costa MF, Matos DL, Camargos VP, Maconko J. Tendências em dez anos das condições de saúde de idosos brasileiros: evidências da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (1998, 2003, 2008). Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(9):3689-96.. Esses valores, apesar de elevados, ainda se mostram menos graves quando comparados aos de países de renda alta como os Estados Unidos, onde as prevalências de DM e HAS entre idosos são estimadas em 21,1% e 70,8%, respectivamente44 Mcdonald M, Hertz RP, Unger AN, Lustik MB. Prevalence, awareness, and management of hypertension, dyslipidemia, and diabetes among United States adults aged 65 and older. J Gerontol Ser A Biol Sci Med Sci [Internet]. 2009 [acesso em 12 dez. 2015];64A(2):256-63. Disponível em: https://academic.oup.com/biomedgerontology/article-lookup/doi/10.1093/gerona/gln016
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.

Devido à natureza crônica e à severidade das complicações, o tratamento dessas doenças não inclui apenas intervenção medicamentosa, mas sobretudo, modificação do estilo de vida55 World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: report WHO Consultation [Internet]. Geneva: WHO ; 2003 [acesso em 12 dez. 2015]. (WHO Technical Report Series, 916). Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/trs/who_trs_916.pdf
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. Além da prática regular de atividade físi ca, abandono do tabaco e do álcool e controle do peso, a Organização Mundial da Saúde (OMS)55 World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: report WHO Consultation [Internet]. Geneva: WHO ; 2003 [acesso em 12 dez. 2015]. (WHO Technical Report Series, 916). Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/trs/who_trs_916.pdf
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,66 World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2014 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2014 [acesso em 30 dez. 2016]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/148114/1/9789241564854_eng.pdf?ua=1
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enfatiza a adoção de hábitos alimentares saudáveis (maior consumo de frutas e hortaliças e menor consumo de sódio, açúcares e gorduras saturadas) como um importante meio de controlar essas DCNT e suas complicações secundárias à saúde.

Embora a literatura, principalmente internacional66 World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2014 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2014 [acesso em 30 dez. 2016]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/148114/1/9789241564854_eng.pdf?ua=1
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,77 Gillett M, Royle P, Snaith A, Scotland G, Poobalan A, Inamura M, et al. Non-pharmacological interventions to reduce the risk of diabetes in people with impaired glucose regulation: a systematic review and economic evaluation. Health Technol Assess. 2012;16(33):1-254.,88 Nelson KM, Reiber G, Boyko EJ. Diet and exercise among adults with type 2 diabetes. Diabetes Care. 2002;25(10):1722-28., ressalte a importância da adoção de hábitos alimentares saudáveis como um dos meios mais eficazes de prevenção secundária do DM e HAS, no Brasil, ainda são escassas as informações advindas de estudos populacionais sobre os hábitos alimentares de idosos com essas doenças99 Lima-Costa MFF, Peixoto SV, César CC, Malta DC, Moura EC. Comportamentos em saúde entre idosos hipertensos, Brasil, 2006. Rev Saude Pública. 2009;43(Supl 2):18-26..

Considerando que esse tipo de informação é importante para o planejamento em saúde, em especial em países de renda média como o Brasil, onde as DCNT já são responsáveis pelos principais gastos com medicamentos e internações do sistema público de saúde do país1010 Malta DC, Cezário AC, Moura L, Morais Neto OL, Silva Junior JB. Building surveillance and prevention for chronic non communicable diseases in the National Unified Health System. Epidemiol Serv Saúde 2006;15(1):47-65., o presente estudo teve como objetivo primário estimar as prevalências de indicadores de consumo alimentar saudável e não saudável entre idosos residentes no Sul do Brasil, comparando-as entre aqueles com e sem diagnóstico autorreferido de DM e/ou HAS. Como objetivos principais, buscou-se avaliar se a prevalência de indicadores de consumo alimentar saudável entre mulheres e homens idosos com diagnóstico autorreferido de DM e/ou HAS melhorou após o diagnóstico dessas doenças, e comparar se a prevalência de tais indicadores foi mais frequente entre idosos com DM e/ou HAS do que entre idosos sem essas doenças.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo de coorte prospectivo, de base populacional e domiciliar, cuja amostra da investigação foi composta por idosos com 60 anos de idade ou mais, residentes em Florianópolis, Santa Catarina, Sul do Brasil. O estudo faz parte de um inquérito longitudinal abrangente denominado EpiFloripa Idoso (http://www.epifloripa.ufsc.br).

O EpiFloripa Idoso iniciou em 2009-2010 (linha de base) com o objetivo examinar condições de vida e de saúde de uma amostra representativa de idosos de Florianópolis. O levantamento inicial incluiu idosos não institucionalizados, residentes na zona urbana do município, grupo populacional que representava aproximadamente 10,8% da população total de Florianópolis naquele ano (44.460 idosos, sendo 18.844 do sexo masculino e 25.616 do sexo feminino). Em 2013-2014, visando dar continuidade à investigação, foi realizada a segunda onda do estudo.

O tamanho da amostra do EpiFloripa Idoso na linha de base foi calculado para estimar a prevalência de cada desfecho em saúde investigado no inquérito, considerando como população de referência em 2009, 44.460 idosos de 60 anos de idade ou mais, nível de confiança de 95%, prevalência de 50% para os desfechos desconhecidos, erro amostral de 4,0 pontos percentuais, efeito de delineamento (deff) de 2,0 (devido a amostragem por conglomerados) e percentual de perdas estimado em 20%. Considerando ainda os múltiplos objetivos do estudo e a necessidade de ajuste para possíveis fatores de confusão, o tamanho da amostra foi aumentado em mais 15%, resultando em uma amostra mínima de 1.599 indivíduos.

O processo de seleção da amostra foi realizado por conglomerados em dois estágios. No primeiro estágio, todos os 420 setores censitários urbanos de Florianópolis foram colocados em ordem crescente de renda média mensal do chefe da família (R$314,76 a R$5.057,77), o que possibilitou o sorteio sistemático de 80 destes setores (oito em cada decil de renda). As unidades do segundo estágio foram os domicí lios. Para a seleção dos domicílios foi realizada incialmente uma atualização do número de domicílios particulares habitados em cada unidade, em razão de que o registro dos domicílios em cada setor datava do ano 2000 (último censo conduzido antes do estudo). Após a recontagem (amplitude 61-725 domicílios por setor), realizou-se um agrupamento dos setores com menos de 150 domicílios, enquanto aqueles com mais de 500 domicílios foram divididos em dois, respeitando-se o decil de renda. Tal procedimento resultou em 83 setores censitários e reduziu o coeficiente de variação inicial de 52,7% para 35,2%. Em seguida, foram sorteados sistematicamente 60 domicílios por setor censitário, sendo considerados elegíveis todos os idosos residentes nos domicílios sorteados (média estimada de um idoso a cada três domicílios ou 102 pessoas por setor censitário).

Em 2009-2010, todos os idosos residentes nos domicílios sorteados foram convidados para participar do estudo (n=1.911). Consideraram-se perdas os idosos que não foram localizados após quatro visitas (sendo pelo menos uma no período noturno e uma no final de semana) e recusas os casos de sujeitos que se negaram a responder o questionário, o que resultou em uma amostra final de 1.705 idosos entrevistados na linha de base.

Em 2013-2014, visando dar continuidade à investigação, foi realizada a segunda onda do EpiFloripa Idoso. Nesta etapa, todos os idosos entrevistados em 2009-2010 foram considerados elegíveis para a nova entrevista, sendo considerados perdas os idosos em internação hospitalar, os que mudaram de cidade e aqueles não localizados após quatro tentativas (pelo menos uma no período noturno e uma no final de semana). Os indivíduos que negaram responder o questionário por opção pessoal foram considerados recusas. A amostra final resultou em 1.197 idosos entrevistados na segunda onda do estudo.

Ressalta-se que em ambas as ondas do estudo foi permitido a entrevista ser respondida por cuidador e/ou familiar nos casos em que o idoso era identificado com incapacidade cognitiva. Entretanto, no presente estudo esses idosos foram excluídos na etapa de análise dos dados (n=49), buscando desse modo evitar a ocorrência de viés de informação.

Quanto à coleta de dados, em ambas as ondas do estudo, as entrevistas foram realizadas por equipe treinada em entrevistas domiciliares e os questionários utilizados foram pré-testados. Realizou-se ainda controle de consistência e de qualidade dos dados coletados semanalmente, com repetição de perguntas-chave por telefone em amostra aleatória de 10% dos respondentes em 2009-2010 e em 2013-2014. Os valores de Kappa para todas as perguntas do controle de qualidade variaram entre 0,5-0,9 em ambas as ondas do estudo.

A variável dependente foi estabelecida com base nas seguintes perguntas do questionário: "Algum médico ou profissional de saúde já disse que o (a) Sr. (a) tem diabetes?"; "Algum médico ou profissional de saúde já disse que o (a) Sr. (a) tem hipertensão (pressão alta)?", aceitando-se como resposta sim ou não. As respostas de ambas as perguntas foram agrupadas estabelecendo-se assim a variável de desfecho: diagnóstico autorreferido de DM e/ou HAS categorizado em sim ou não. Essa variável refere-se ao autorrelato de DCNT feito pelo participante na linha de base do estudo EpiFloripa Idoso em 2009-2010.

As variáveis independentes por sua vez (ou seja, os indicadores de consumo alimentar saudável e não saudável) foram coletadas pelo estudo EpiFloripa Idoso em 2009-2010 e em 2013-2014, utilizando-se o mesmo questionário sobre alimentação usado na pesquisa nacional Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL). Trata-se de um instrumento que inclui questões sobre a frequência diária e semanal de consumo de alimentos, como frutas, vegetais, gorduras das carnes/frango e frituras1111 Souza AM, Bezerra IN, Cunha DB, Sichieri R. Evaluation of food intake markers in the Brazilian surveillance system for chronic diseases - VIGITEL (2007-2009). Rev Bras Epidemiol [Internet]. 2011[acesso em 12 dez. 2015];14(Suppl. 1):44-52. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-790X2011000500005
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. Monteiro et al.1212 Monteiro CA, Moura EC, Jaime PC, Claro RM. Validity of food and beverage intake data obtained by telephone survey. Rev Saúde Pública [Internet]. 2008 [acesso em 12 dez. 2015];42(4):582-89. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-89102008000400002&lng=en&nrm=iso&tlng=en
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reportam inclusive em um estudo que os indicadores de consumo alimentar usados pela pesquisa VIGITEL são reprodutíveis (Kappa entre 0,6-0,8) e comparáveis a um número de três recordatórios de 24 horas, alcançando assim validade satisfatória para a maioria dos indicadores avaliados (sensibilidade e especificidade de aproximadamente 80% para indicadores de consumo alimentar não saudável e de 42-80% para indicadores de consumo alimentar saudável).

A partir das perguntas do questionário de frequência alimentar, variáveis politômicas indicativas de mudanças ou não no consumo alimentar entre as ondas de 2009-2010 e 2013-2014 foram determinadas. Como indicador de consumo alimentar saudável, foi considerado o consumo alimentar diário em conjunto de frutas (≥3 vezes/dia) e de vegetais (≥2 vezes/dia). O diagnóstico positivo para essa variável refere-se ao consumo de frutas e vegetais nos sete dias da semana e na frequência acima referida (≥3 vezes/dia para frutas e ≥2 vezes/dia para vegetais)55 World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: report WHO Consultation [Internet]. Geneva: WHO ; 2003 [acesso em 12 dez. 2015]. (WHO Technical Report Series, 916). Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/trs/who_trs_916.pdf
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,1313 Brasil. Ministério da Saúde,Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Guia Alimentar para a População Brasileira. 2ª. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2014 [acesso em 12 dez. 2015]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf
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. Diante disto, essa variável foi categorizada em: Manteve o consumo de <3 vezes/dia para frutas e <2 vezes/dia para vegetais entre as ondas, Diminuiu o consumo para <3 vezes/dia para frutas e <2 vezes/dia para vegetais entre as ondas, Manteve o consumo de ≥3 vezes/dia para frutas e ≥2 vezes/dia para vegetais entre as ondas, e, Aumentou o consumo para ≥3 vezes/dia para frutas e ≥2 vezes/dia para vegetais entre as ondas.

Variáveis politômicas indicativas de um consumo alimentar não saudável também foram determinadas. Considerou-se como consumo alimentar não saudável o consumo regular de gordura das carnes (tanto gordura de carne vermelha quanto gordura da carne de frango) e o consumo regular de frituras (por serem alimentos considerados fontes de gordura saturada)55 World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: report WHO Consultation [Internet]. Geneva: WHO ; 2003 [acesso em 12 dez. 2015]. (WHO Technical Report Series, 916). Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/trs/who_trs_916.pdf
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,1313 Brasil. Ministério da Saúde,Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Guia Alimentar para a População Brasileira. 2ª. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2014 [acesso em 12 dez. 2015]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf
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. O diagnóstico negativo para cada uma dessas duas variáveis foi determinado como o consumo ≥2 vezes/semana. Diante disto, ambas as variáveis foram categorizadas em: Manteve o consumo em ≥ 2 vezes/semana entre as ondas, Aumentou o consumo para ≥2 vezes/semana entre as ondas, Manteve o consumo em <2 vezes/semana entre as ondas, Diminuiu o consumo para <2 vezes/semana entre as ondas.

Por fim, foi criada uma escala de indicadores de consumo alimentar saudável baseada nas três variáveis acima estabelecidas. Nessa escala, foi atribuído um ponto para a manutenção e/ou aquisição de um consumo alimentar diário de frutas e vegetais (≥3 e ≥2 vezes/dia, respectivamente), um ponto para a manutenção e/ou aquisição de um consumo alimentar infrequente de gordura das carnes (<2 vezes/semana) e um ponto para a manutenção e/ou aquisição de um consumo alimentar infrequente de frituras (<2 vezes/semana). Assim, foi estabelecida uma escala de zero a três pontos, onde zero indica nenhum indicador de consumo alimentar saudável e três todos indicadores de consumo alimentar saudável. A escala foi estabelecida considerando na construção das variáveis as mudanças positivas nos indicadores de consumo alimentar entre a linha de base e a segunda onda do estudo (consumo alimentar saudável associado a menor risco de DCNT ou complicações à saúde decorrentes destas)55 World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: report WHO Consultation [Internet]. Geneva: WHO ; 2003 [acesso em 12 dez. 2015]. (WHO Technical Report Series, 916). Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/trs/who_trs_916.pdf
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,1313 Brasil. Ministério da Saúde,Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Guia Alimentar para a População Brasileira. 2ª. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2014 [acesso em 12 dez. 2015]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf
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.

Variáveis demográficas e socioeconômicas como idade (60-69; 70-79; ≥80 anos), cor da pele autorreferida (branca; parda; preta, amarela e indígena), escolaridade (0-8, 9-11, ≥12 anos) e renda familiar mensal per capita (em 2013-2014; tercil superior: >R$2000.00; tercil intermediário: ≤R$2000,00 a >R$774,00; tercil inferior: ≤R$774,00), foram utilizadas no presente estudo como variáveis de confusão.

Para a descrição das características da amostra foram realizadas análises descritivas, apresentando-se os resultados em frequências absolutas e relativas com seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%). O Teste qui-quadrado com correção de Rao-Scott foi usado nessas análises.

Para obter as prevalências brutas e ajustadas dos indicadores de consumo alimentar entre idosos com e sem diagnóstico autorreferido de DM e/ou HAS, utilizou-se a Regressão de Poisson. As variáveis demográficas e socioeconômicas que apresentaram valor-p<0,20 na análise de associação bivariada foram incluídas na análise ajustada como possíveis fatores de confusão. As análises foram ainda estratificadas segundo o sexo, assumindo que essa variável pode exercer importante efeito modificador nas associações entre o status de DCNT e o consumo alimentar1414 Leblanc V, Bégin C, Corneau L, Dodin S, Lemieux, S. Gender differences in dietary intakes: what is the contribution of motivational variables? J Hum Nutr Diet [Internet]. 2015 [acesso em 16 dez. 2016];28(1):37-46. Disponível em: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/jhn.12213/abstract;jsessionid=1E9489989C49C8FAAB6446845C9FF6BC.f04t02
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,1515 Kent JA, Patel V, Varela NA. Gender Disparities in Health Care. Mount Sinai J Med [Internet]. 2012 [acesso em 12 dez. 2015];79(5):555-9. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22976361
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2297...
. O nível de significância estatística adotado em todas as análises foi de valor-p≤0,05.

O estudo EpiFloripa Idoso foi aprovado pelo comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (protocolo nº 352/2008 na linha de base e CAAE nº 16731313.0.0000.0121 na segunda onda) e todos participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Nenhum conflito de interesse a declarar.

RESULTADOS

Na linha de base do estudo EpiFloripa Idoso em 2009-2010 foram entrevistados 1.705 idosos. Destes, foram localizados e entrevistados novamente 1.197 idosos em 2013-2014 (70,2% dos entrevistados na linha de base). Entre a primeira e segunda ondas do estudo (Tabela 1), verificou-se que não houve perda seletiva de seguimento, exceto para variável idade, fato explicável pelo envelhecimento da população avaliada e o número elevado de óbitos na amostra (n=217) (dado não apresentado na tabela).

Tabela 1
Descrição das características da amostra do Estudo EpiFloripa Idoso, comparando entrevistados na linha de base em 2009-2010 e na segunda onda do estudo em 2013-2014. Florianópolis, Santa Catarina, 2014.

No que se refere às características dos participantes do estudo, a Tabela 2 mostra que, em ambas as ondas, as mulheres apresentaram um percentual maior de diagnóstico autorreferido de DM e/ou HAS quando comparadas aos homens (p<0,001). Além disto, dados presentes nessa tabela ainda permitiram observar que em termos de consumo alimentar a maioria dos entrevistados não alcançou a frequência recomendada de consumo diário de frutas e vegetais (≥3 e ≥2 vezes/dia, respectivamente), além de se mostrar elevado o percentual de homens e mulheres que consomem ou passaram a consumir gordura das carnes e frituras com frequência ≥2 vezes/semana entre 2009-2010 e 2013-2014 (p=0,031 e p<0,001, respectivamente).

Tabela 2
Descrição das características da amostra relativas ao status de doenças crônicas (diabetes mellitus e/ou hipertensão arterial sistêmica) e a mudanças nos indicadores de consumo alimentar entre 2009-2010 e 2013-2014, estratificada segundo sexo (Estudo EpiFloripa Idoso 2009-2010 e 2013-2014). Florianópolis, Santa Catarina, 2014.

A Tabela 3 por sua vez, apresenta as mudanças ocorridas nos indicadores de consumo alimentar da amostra, comparando participantes com e sem diagnóstico autorreferido de DM e/ou HAS. Em relação ao consumo de frutas e vegetais, os resultados mostram que independente do diagnóstico de DM e/ou HAS, a maior parte da amostra não consome frutas e vegetais na frequência diária recomendada, assim como é elevado o percentual de idosos que consomem ou passaram a consumir gorduras das carnes duas ou mais vezes na semana. Apesar da relevância, ressalta-se que esses resultados não foram estatisticamente significantes. Por outro lado, o percentual de idosos com DM e/ou HAS que deixou de consumir frituras regularmente (≥2 vezes/semana) foi de 21,9% (IC95% 17,8-26,1), enquanto 6,2% (IC95% 4,1-8,3) adquiriram tal hábito (p=0,018).

Tabela 3
Descrição das mudanças nos indicadores de consumo alimentar da amostra entre 2009-2010 e 2013-2014, estratificada segundo status de doenças crônicas (diabetes mellitus e/ou hipertensão arterial sistêmica) (Estudo EpiFloripa Idoso 2009-2010 e 2013-2014). Florianópolis, Santa Catarina, 2014.

A Tabela 4 apresenta os resultados da associação bruta e ajustada entre os indicadores de consumo alimentar saudável e o status de doenças crônicas. Nos homens, tanto na análise bruta quanto na análise ajustada, a manutenção e/ou aquisição de um consumo alimentar saudável de frutas e vegetais, de gordura das carnes e de frituras apresentou maior prevalência entre idosos com DM e/ou HAS do que entre os idosos sem estas doenças, contudo, essa diferença entre os grupos não foi estatisticamente significante. Por outro lado, entre as mulheres na análise ajustada, a manutenção e/ou aquisição de um consumo alimentar infrequente de frituras (<2 vezes/semana) foi 8,2% maior entre aquelas com DM e/ou HAS do que entre as idosas sem tais doenças (p=0,043). Contudo, para as demais variáveis, não foi encontrada qualquer associação estatisticamente significante.

Tabela 4
Prevalência bruta e ajustada dos indicadores de consumo alimentar saudável entre idosos com e sem diagnóstico autorreferido de diabetes mellitus e/ou hipertensão arterial sistêmica, estratificada segundo sexo (Estudo EpiFloripa Idoso 2009-2010 e 2013-2014). Florianópolis, Santa Catarina, 2014.

Por fim, a Figura 1 mostra a escala de indicadores de consumo alimentar saudável. Independente do sexo e do diagnóstico autorreferido DM e/ou HAS, somente um baixo percentual de idosos relatou todos os indicadores de consumo alimentar saudável avaliados em ambas as ondas do estudo (8,6% da amostra; IC95% 6,5-10,7; p=0,037; dado não apresentado na figura). A maioria dos idosos referiu apenas um e dois indicadores de consumo alimentar saudável. Entre os homens, aqueles sem DM e/ou HAS apresentaram um percentual maior de manutenção e/ou aquisição de um consumo alimentar saudável (5,7%) quando comparados com aqueles com essas doenças (5,1%). Entre as mulheres, por sua vez, foram as idosas com diagnóstico de DM e/ou HAS que apresentaram um percentual maior de manutenção e/ou aquisição de um consumo alimentar saudável entre ambas as ondas do estudo (11,2%).

Figura 1
Escala de indicadores de consumo alimentar saudável entre idosos com e sem diagnóstico autorreferido de diabetes mellitus e/ou hipertensão arterial sistêmica (DM e/ou HAS), estratificada segundo sexo (Estudo EpiFloripa Idoso 2009-2010 e 2013-2014. Florianópolis, Santa Catarina, 2014.

DISCUSSÃO

O presente estudo representa o primeiro trabalho brasileiro de delineamento longitudinal a investigar indicadores de consumo alimentar saudável entre idosos residentes na comunidade com e sem diagnóstico de DM e/ou HAS. Por meio dos resultados encontrados, foi possível evidenciar que após três anos de seguimento homens e mulheres idosos com DM e/ou HAS, de modo geral, não modificaram seu consumo alimentar como forma de auxiliar no tratamento secundário dessas doenças. Além disso, os resultados do estudo ainda mostraram que não houve diferenças estatisticamente significantes nas prevalências dos indicadores de consumo alimentar entre idosos com e sem DM e/ou HAS, com exceção do consumo de frituras entre as mulheres, corroborando assim resultados prévios na literatura88 Nelson KM, Reiber G, Boyko EJ. Diet and exercise among adults with type 2 diabetes. Diabetes Care. 2002;25(10):1722-28.,99 Lima-Costa MFF, Peixoto SV, César CC, Malta DC, Moura EC. Comportamentos em saúde entre idosos hipertensos, Brasil, 2006. Rev Saude Pública. 2009;43(Supl 2):18-26.,1616 King DE, Mainous AG, Carnemolla M, Everett CJ. Adherence to healthy lifestyle habits in US adults, 1988-2006. Am J Med [Internet]. 2009 [acesso em 12 dez. 2015];122(6):528-34. Disponível em: http://www.amjmed.com/article/S0002-9343(08)01207-2/pdf
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No Brasil, inquérito transversal com dados representativos de idosos das 26 capitais brasileiras (n=5007) mostrou que, entre participantes com diagnóstico de hipertensão, os hábitos alimentares prejudiciais à saúde como baixo consumo de frutas e vegetais e consumo elevado de gorduras saturadas e sódio, permaneceram mesmo após o diagnóstico dessa doença99 Lima-Costa MFF, Peixoto SV, César CC, Malta DC, Moura EC. Comportamentos em saúde entre idosos hipertensos, Brasil, 2006. Rev Saude Pública. 2009;43(Supl 2):18-26.. Resultado semelhante também foi encontrado em um estudo longitudinal nos Estados Unidos, onde idosos também não referiram nenhuma mudança em sua alimentação quanto ao consumo de gorduras saturadas, frutas e vegetais após o diagnóstico de diabetes88 Nelson KM, Reiber G, Boyko EJ. Diet and exercise among adults with type 2 diabetes. Diabetes Care. 2002;25(10):1722-28.. Outro estudo longitudinal também nos Estados Unidos, com dados do National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES 2001-2006), identificou que 74,0% dos participantes com DM e/ou HAS reportaram um consumo alimentar regular inadequado de frutas e vegetais, e sem quaisquer diferenças entre participantes com e sem essas DCNT na adesão a um estilo de vida saudável1616 King DE, Mainous AG, Carnemolla M, Everett CJ. Adherence to healthy lifestyle habits in US adults, 1988-2006. Am J Med [Internet]. 2009 [acesso em 12 dez. 2015];122(6):528-34. Disponível em: http://www.amjmed.com/article/S0002-9343(08)01207-2/pdf
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Tais resultados se revelam preocupantes, tendo em vista que estudos mostram que um consumo alimentar regular de frutas e vegetais e infrequente em alimentos fontes de gordura saturada, é capaz de reduzir tanto os níveis de pressão arterial quanto os níveis de glicemia1616 King DE, Mainous AG, Carnemolla M, Everett CJ. Adherence to healthy lifestyle habits in US adults, 1988-2006. Am J Med [Internet]. 2009 [acesso em 12 dez. 2015];122(6):528-34. Disponível em: http://www.amjmed.com/article/S0002-9343(08)01207-2/pdf
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,1717 Boeing H, Bechthold A, Bub A, Ellinger S, Haller D, Kroke A, et al. Critical review: vegetables and fruit in the prevention of chronic diseases. Eur J Nutr [Internet]. 2012 [acesso em 12 dez. 2015];51(6):637-63. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3419346/
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,1818 Williams DEM, Prevost AT, Whichelow MJ, Cox BD, Day NE, Wareham N J. A Cross-sectional study of dietary patterns with glucose intolerance and others features of the metabolic syndrome. Br J Nutr [Internet]. 2000 [acesso em 12 dez. 2015];83(3):257-66. Disponível em: Disponível em: acrescentar a URL do documento consultado.,1919 Eckel RH, Jakicic JM, Ard JD, Jesus JM, Lee I, Lichtenstein AH, et al. AHA/ACC Guideline on Lifestyle Management to Reduce Cardiovascular Risk: a Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. Circulation. 2013.,2020 American Diabetes Association. Standarts of medical care in diabetes-2013. Diabetes Care. 2013;36 Suppl:11-66.. Exemplo disso são os achados das Associações Americanas de Cardiologia1919 Eckel RH, Jakicic JM, Ard JD, Jesus JM, Lee I, Lichtenstein AH, et al. AHA/ACC Guideline on Lifestyle Management to Reduce Cardiovascular Risk: a Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. Circulation. 2013. e de Diabetes2020 American Diabetes Association. Standarts of medical care in diabetes-2013. Diabetes Care. 2013;36 Suppl:11-66. que mostram uma possibilidade de redução de até 3 a 6 mmHg na pressão arterial, além de importante redução na resistência à insulina (mais de 40% em 20 anos) a partir da adoção de um consumo alimentar saudável.

Apesar dessas evidências, no Brasil, dados das Pesquisas de Orçamentos Familiares mostram que entre a população urbana do país houve nas últimas três décadas um aumento excessivo na aquisição de alimentos para consumo fontes de gordura saturada e de açúcar refinado (300-400%), enquanto o consumo de frutas e vegetais se manteve aquém do recomendado (representando apenas 3,0% do total de calorias da dieta)2121 Martins APB, Levy RB, Claro RM, Moubarac JC, Monteiro CA. Increased contribution of ultra-processed food products in the Brazilian diet (1987-2009). Rev Saúde Pública. 2013;47(4):656-65..

Diante disto, e considerando que estudos na literatura1010 Malta DC, Cezário AC, Moura L, Morais Neto OL, Silva Junior JB. Building surveillance and prevention for chronic non communicable diseases in the National Unified Health System. Epidemiol Serv Saúde 2006;15(1):47-65.,2222 Monteiro CA, Levy RB, Claro RM, Castro IRR, Cannon G. Increasing consumption of ultra-processed foods and likely impact on human health: evidence from Brazil. Public Health Nutr [Internet] 2011 [acesso em 12 dez. 2015];14(1):5-13. Disponível em: http://www.wphna.org/htdocs/downloadsdec2012/2011_PHN_Monteiro_et_al.pdf
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têm associado essas mudanças negativas nos padrões de consumo alimentar com o aumento na prevalência também de outras DCNT no país, nas últimas décadas os comportamentos de saúde da população têm sido alvo cada vez mais crescente de atenção. Em 2011, visando o controle e a redução na ocorrência de doenças crônicas, o Ministério da Saúde brasileiro lançou o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis no Brasil, 2011-20222323 Malta DC, Silva Jr JBD. O plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis no Brasil e a definição das metas globais para o enfrentamento dessas doenças até 2025: uma revisão. Epidemiol Serv Saúde. 2013;22(1):151-64.. Três anos mais tarde (em 2014), em nova iniciativa do Ministério da Saúde, foi publicada uma nova edição do Guia Alimentar para a População Brasileira1313 Brasil. Ministério da Saúde,Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Guia Alimentar para a População Brasileira. 2ª. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2014 [acesso em 12 dez. 2015]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf
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visando promover hábitos alimentares mais saudáveis entre a população e, consequentemente, a prevenção primária e secundária das DCNT. Isso porque as DCNT não acarretam seus efeitos danosos apenas sobre a saúde dos indivíduos, mas causam importante impacto também sobre o sistema público de saúde do país. Estima-se que no Brasil, as DNCT representem anualmente para o sistema público de saúde um gasto aproximado de R$3,8 bilhões com atendimentos ambulatoriais e de R$ 3,7 bilhões com internações1010 Malta DC, Cezário AC, Moura L, Morais Neto OL, Silva Junior JB. Building surveillance and prevention for chronic non communicable diseases in the National Unified Health System. Epidemiol Serv Saúde 2006;15(1):47-65..

Em função disto, mudanças no estilo de vida mostram-se fundamentais. Contudo, é preciso considerar que, mesmo diante da gravidade do tema DCNT, promover mudanças nos hábitos alimentares nem sempre é tarefa fácil. Segundo Viebig et al.2424 Viebig RF, Pastor-Valero M, Scazufca M, Menezes PR. Consumo de frutas e hortaliças por idosos de baixa renda na cidade de São Paulo. Rev Saúde Pública. 2009;43(5):806-13., no Brasil, diferenças de gênero, renda e escolaridade são fatores determinantes para a adoção de uma alimentação equilibrada. E esses achados, possivelmente possam ajudar a explicar em grande parte os resultados do presente estudo, que mostraram para os indicadores de consumo alimentar saudável avaliados prevalências mais altas entre as mulheres quando comparadas aos homens, além de modificações no indicador relativo ao consumo de frituras após ajuste para renda e escolaridade. Outro estudo realizado na cidade de Florianópolis, também identificou hábitos alimentares mais saudáveis entre as mulheres quando comparadas aos homens2525 Ozcariz SG, Bernardo CO, Cembranel F, Peres MA, González-Chica DA. Dietary practices among individuals with diabetes and hypertension are similar to those of healthy people: a population-based study. BMC Public Health [Internet]. 2015 [acesso em 12 dez. 2015];15(1):479. Disponível em: http://bmcpublichealth.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12889-015-1801-7
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. Apesar de os achados do referido estudo não serem diretamente comparáreis aos da presente investigação em virtude de a amostra ter incluído apenas adultos, não podemos deixar de ressaltar que juntos, os resultados de ambos os estudos, parecem indicar a existência de um comportamento alimentar mais saudável entre as mulheres (inclusive aquelas com DM e/ou HAS), o qual provavelmente se inicia ainda quando jovens e tende a permanecer até as idades mais avançadas.

Apesar dos pontos fortes do presente estudo, como o desenho longitudinal que permitiu identificar mudanças nos indicadores de consumo alimentar de idosos após diagnóstico de DM e/ou HAS e a amostra representativa da população idosa de Florianópolis, que garante a validade interna dos resultados, este estudo não se apresenta livre de limitações. Destacamos, neste sentido, o curto tempo de acompanhamento da amostra em estudo, apenas três anos, além do questionário usado para a obtenção dos dados de consumo alimentar1111 Souza AM, Bezerra IN, Cunha DB, Sichieri R. Evaluation of food intake markers in the Brazilian surveillance system for chronic diseases - VIGITEL (2007-2009). Rev Bras Epidemiol [Internet]. 2011[acesso em 12 dez. 2015];14(Suppl. 1):44-52. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-790X2011000500005
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,1212 Monteiro CA, Moura EC, Jaime PC, Claro RM. Validity of food and beverage intake data obtained by telephone survey. Rev Saúde Pública [Internet]. 2008 [acesso em 12 dez. 2015];42(4):582-89. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-89102008000400002&lng=en&nrm=iso&tlng=en
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. Por se tratar de uma população idosa e considerando que o questionário de frequência alimentar depende da memória do entrevistado, não é possível desconsiderar a possiblidade de viés de memória no estudo. Todavia, visando minimizar tal limitação, a coleta de dados foi realizada por entrevistadores capacitados para a aplicação do instrumento. Outra limitação do estudo relacionada aos dados de consumo alimentar, refere-se a falta de análises para outros alimentos considerados prejudiciais à prevenção secundária das doenças investigadas, como os produtos ultraprocessados por exemplo (alimentos com alto teor de açúcar refinado, sódio e gordura saturada). Destacamos, por fim, como mais uma limitação do estudo, o diagnóstico positivo do consumo de frutas e vegetais como consumo desses alimentos na frequência de ≥3 vezes/dia para frutas e ≥2 vezes/dia para vegetais, como um próxi das recomendações de órgãos oficiais (≥3 porções/dia para frutas e ≥2 porções/dia para vegetais)55 World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: report WHO Consultation [Internet]. Geneva: WHO ; 2003 [acesso em 12 dez. 2015]. (WHO Technical Report Series, 916). Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/trs/who_trs_916.pdf
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,1313 Brasil. Ministério da Saúde,Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Guia Alimentar para a População Brasileira. 2ª. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2014 [acesso em 12 dez. 2015]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf
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CONCLUSÃO

Em conclusão, os resultados deste estudo mostraram que a prevalência de indicadores de consumo alimentar saudável entre idosos de Florianópolis com e sem diagnóstico de diabetes mellitus e/ou hipertensão arterial sistêmica foi baixa, além de que a investigação longitudinal permitiu identificar que não houve mudanças significativas no consumo alimentar entre a linha de base e a segunda onda do estudo. Considerando que mudanças no estilo de vida, especialmente em relação aos hábitos alimentares, são parte fundamental no tratamento secundário de doenças como diabetes e hipertensão, recomendamos que as ações em saúde pública voltadas para indivíduos com doenças crônicas sejam melhor elaboradas. E ainda, que estas envolvam desde os responsáveis pelas políticas públicas até os profissionais de diferentes áreas da saúde, visando alcançar de fato essa população, a fim de melhorar o prognóstico dessas doenças e a qualidade de vida.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2017

Histórico

  • Recebido
    03 Maio 2016
  • Revisado
    27 Dez 2016
  • Aceito
    02 Fev 2017
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