O envelhecimento expõe realidades e desafios para a sociedade pensar em soluções que possam apoiar a vida da pessoa idosa e contribuir para o bem-viver1. Em destaque, alguns fatos associados à inclusão digital mostram que a infoinclusão pode contribuir para uma vida mais longa, digna e com qualidade.
O primeiro fato diz respeito ao hiato existente entre a longevidade e o avanço exponencial das tecnologias. Com a inserção das inovações tecnológicas, das interfaces e dos dispositivos digitais, ocorreram modificações na forma de realizar as atividades que fazem parte do cotidiano dos idosos e que exigem dessas pessoas e-skills para garantir a inserção no mundo digital2.
Inúmeras são as atividades mediadas pelas tecnologias, a saber: uso de caixas eletrônicos ou aplicativos para realizar o gerenciamento financeiro; reuniões virtuais em atividades de trabalho, educacionais ou para o lazer; aparelhos multifuncionais no âmbito da comunicação e informação, como os Smartphones e o fax e scanners acoplados à impressora; consultas e agendamentos de serviços pela internet; tour virtual em museus como uma alternativa cultural; e diversos recursos ou dispositivos tecnológicos que estimulam a atividade física, a promoção e o monitoramento da saúde.
Usufruir da conquista da longevidade, atualmente, significa desempenhar e engajar-se também em atividades mediadas por produtos e dispositivos tecnológicos. No entanto, as pessoas mais velhas ainda representam o grupo com maiores barreiras para a conectividade3.
O segundo fato a se considerar é a permanência das pessoas idosas por um tempo maior no mercado de trabalho, devido a reforma da previdência, para complementar o orçamento ou por ser a única renda fixa no âmbito familiar. Concomitante, há um crescimento do mercado que utiliza plataformas on-line ou aplicativos móveis para a oferta de seus serviços4 (aplicativos para transporte de pessoas, mercadorias e entrega de alimentos, são exemplos), o que representa um desafio adicional para as pessoas idosas que precisam ou querem estar inseridos nesse tipo de trabalho.
O terceiro aspecto diz respeito ao aumento das condições crônicas de saúde, sobretudo na população idosa, que nos coloca diante da necessidade de modelos longitudinais de cuidado. De forma crescente, os serviços de saúde enfatizam o protagonismo do indivíduo no gerenciamento e produção de sua saúde, o que envolve, muitas vezes, o uso dispositivos tecnológicos de monitoramento (glicosímetro ou aferidor de pressão arterial, por exemplo) e comunicação com o serviço de saúde por meio de aplicativos1,5. Esses casos denotam a necessidade de investimentos em programas de inclusão digital na educação em saúde para viabilizar o gerenciamento das doenças crônicas no âmbito domiciliar6.
No cenário que se apresenta, o idadismo direcionado à pessoa idosa configura-se como um obstáculo ao processo de inclusão digital. Pensar que a idade é incompatível com a aprendizagem leva à criação de estereótipos que não considera o envelhecimento em sua diversidade e individualidade, com o risco de criar uma representação da velhice não realista. O preconceito etário em relação às pessoas idosas gera uma ansiedade gerontecnólogica e baixa percepção da autoeficácia, levando a conflitos intergeracionais e abandono das tecnologias. Para tanto, o combate ao idadismo é essencial para que possamos promover a equidade digital6.
Os fatos aqui expostos apresentam janelas de oportunidades a serem percorridas: a da garantia do direito à aprendizagem ao longo da vida e a da importância da solidariedade intergeracional5. Por acreditar na capacidade permanente para adquirir novas habilidades e aprender novas tarefas (incluindo as competências necessárias para o uso das novas tecnologias), os programas de inclusão digital têm sido espaços privilegiados para a expansão da aprendizagem e para promover a educação continuada6.
Majoritariamente, o percurso do letramento digital é promovido por meio da solidariedade intergeracional5. Na convivência entre distintas gerações, é possível acolher e lidar com as diferenças, bem como estabelecer uma aprendizagem mútua no convívio entre os mais jovens e os mais velhos. A solidariedade aproxima o aprendiz do interlocutor que ensina, cria uma ambiência relacional benéfica, fortalece os sentimentos de autoeficácia e amplia a possibilidade de participação da pessoa idosa. Tal estratégia contribui para a aprendizagem ao longo da vida e possibilita que os indivíduos sintam-se pertencentes ao mundo globalizado5,7.
REFERÊNCIAS
- 1 Cobalchini CCB, Alves BF, Silva LL, Lima TB. Idoso e tecnologia: aprendizagem e socialização como fatores protetivos para um envelhecimento saudável. In: Grillo RM, Navarro ER. Psicologia: desafios, perspectivas e possibilidades. São Paulo: Editora Científica Digital, 2020. pp. 162-167.
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2 Alvarenga GMO, Yassuda MS, Cachioni M. Inclusão digital com tablets entre idosos: metodologia e impacto cognitivo. Psicologia, Saúde & Doenças. 2019; 20 (2): 384-401. Disponível em: https://doi.org/10.15309/19psd200209.
» https://doi.org/10.15309/19psd200209 -
3 CETIC. Centro Regional de Estudos para o desenvolvimento da Sociedade da Informação. São Paulo: Comitê Gestor da Internet do Brasil, 2022. Disponível em: https://www.cetic.br/
» https://www.cetic.br/ -
4 Raymundo TM, Santana CS. Specific ICT training of older Brazilian workers. Gerontechnology. 2019; 18(3): 168-179. Disponível em: https://doi.org/10.4017/gt.2019.18.3.004.00.
» https://doi.org/10.4017/gt.2019.18.3.004.00 -
5 Alvaro, SSO, Mello LA, Bernardo LB, Raymundo TM. Navigating in virtual waves: barriers and facilitators for the digital inclusion of the older adults. Research, Society and Development. 2022; 11(9): e19111931685. Disponível em: http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v11i9.31685.
» https://doi.org/10.33448/rsd-v11i9.31685 -
6 Raymundo TM, Gil, H, Bernardo LD. Desenvolvimento de projetos de inclusão digital para idosos. Revista de Estudos Interdisciplinares sobre o Envelhecimento. 2019; 24(3): 22-44. Disponível em: https://doi.org/10.22456/2316-2171.87420.
» https://doi.org/10.22456/2316-2171.87420 -
7 Tyng CM, Amin HU, Mohamad NM, Aamir SM. The influences of emotion on learning and memory. Frontiers in psychology, v. 8, s.n., p. 1-22, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fpsyg.2017.01454.
» https://doi.org/10.3389/fpsyg.2017.01454
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
17 Jul 2022 -
Data do Fascículo
2022
