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Fatores associados à densidade mamográfica de mulheres na pós-menopausa

Factors associated with mammographic density in postmenopausal women

Resumos

OBJETIVO: avaliar a associação de fatores epidemiológicos, antropométricos, reprodutivos e hormonais com a densidade mamográfica de mulheres na pós-menopausa. MÉTODOS: estudo retrospectivo, tipo corte transversal, incluindo 144 mulheres com idade igual ou superior a 45 anos, com no mínimo 12 meses de amenorréia e não usuárias de terapia de reposição hormonal nos últimos seis meses. Foram revisados os prontuários médicos, avaliando-se: idade, peso, altura, índice de massa corpórea (IMC), paridade, idade à menarca, idade à menopausa e os níveis dos hormônios estradiol, folículo-estimulante (FSH) e luteinizante. As mamografias foram analisadas nas incidências crânio-caudal e médio-lateral oblíqua por dois examinadores, de forma cega, sendo classificadas em densas e não densas, segundo os critérios de Wolfe. Na análise estatística, utilizou-se a freqüência, mediana, valores mínimo e máximo, teste de Wilcoxon e odds ratio. Foi realizada análise de regressão logística múltipla, utilizando o processo de seleção passo a passo, com nível de significância de 5%. RESULTADOS: a freqüência de mamas densas foi de 45%. As mulheres com mamas consideradas densas apresentaram menor peso (60,5 vs 71,9 kg - p<0,01), menor IMC (25,9 vs 31,0 kg/m² - p<0,01), menor tempo de pós-menopausa (6,0 vs 10,0 anos - p<0,01) e maiores níveis de FSH (75,2 vs 60,3 mU/mL - p<0,01). A probabilidade de apresentar mamas densas diminuiu em mulheres com peso superior a 67 kg (OR = 4,0; IC 95%: 1,50-10,66), IMC superior a 30 kg/m² (OR = 6,69; IC 95%: 2,54-17,65), com mais de dois partos (OR = 7,84; IC 95%: 1,67-36,81), tempo de pós-menopausa maior ou igual a sete anos (OR = 2,05; IC 95%: 1,05-3,99) e níveis de FSH inferiores a 134,8 mU/mL. CONCLUSÃO: o peso, IMC, paridade, o tempo de menopausa e níveis de FSH associaram-se significativamente aos padrões de densidade mamográfica.

Densidade mamária; Menopausa; Índice de massa corpórea; Mamografia; Mama


PURPOSE: to evaluate the relationship between epidemiologic, anthropometric, reproductive and hormonal factors and mammographic density in postmenopausal women. METHODS: this is a retrospective, cross-sectional study, including 144 women aged 45 years or more, with at least 12 months of amenorrhea and who were non users of hormone replacement therapy during the last six months. Medical charts were reviewed to evaluate age, weight, body mass index (BMI), parity, age at menarche, age at menopause and levels of estradiol, follicle stimulating (FSH) and luteinizing hormones. Mammograms were analyzed by two blinded investigators. The films were taken in the craniocaudal and mediolateral views and mammography was classified as dense and nondense, according to the Wolfe criteria. For statistical analysis, the frequency, median, minimum and maximum values, the Wilcoxon test and the odds ratio were used. Multiple logistic regression was performed, using the stepwise selection, with a 5% significance level. RESULTS: the frequency of dense breasts was 45%. Women with dense breasts were of lower weight (60.5 vs. 71.9 kg - p<0.01), had a lower BMI (25.9 vs 31.0 kg/m² - p<0.01), a shorter time since onset of menopause (6.0 vs 10 years - p<0.01) and higher levels of FSH (75.2 vs 60.3 mU/mL - p<0.01). The probability of having dense breasts decreased in women whose weight was 67 kg or more (OR = 4.0, CI 95% = 1.50-10.66), BMI was higher than 30 kg/m² (OR = 6.69, CI 95% = 1.67-36.81), time since onset of menopause was superior or equal to seven years (OR = 2.05, CI 95% = 1.05-3.99) and FSH levels were lower than 134.8 mU/mL. CONCLUSION: weight, BMI, parity, time since menopause and FSH levels were significantly associated with mammographic density patterns.

Mammographic density; Menopause; Body mass index; Mammography; Breast cancer


TRABALHOS ORIGINAIS

Fatores associados à densidade mamográfica de mulheres na pós-menopausa

Factors associated with mammographic density in postmenopausal women

Renata Ferreira Cleto Bittencourt Siqueira; Danielle Santos Bezerra Sá; Aarão Mendes Pinto Neto; César Cabello; Délio Marques Conde; Lúcia Helena Simões da Costa Paiva; Gislaine Aparecida Fonsechi-Carvasan

Departamento de Tocoginecologia, Faculdade de Ciências Médicas - Universidade Estadual de Campinas

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Aarão Mendes Pinto Neto Departamento de Tocoginecologia/CAISM/UNICAMP Rua Alexander Fleming, 101 - Cidade Universitária "Zeferino Vaz" 13083-970 - Campinas - SP Tel: (19) 3788-9354 - FAX: (19) 3788-9354 e-mail: aarão@obelix.unicamp.br

RESUMO

OBJETIVO: avaliar a associação de fatores epidemiológicos, antropométricos, reprodutivos e hormonais com a densidade mamográfica de mulheres na pós-menopausa.

MÉTODOS: estudo retrospectivo, tipo corte transversal, incluindo 144 mulheres com idade igual ou superior a 45 anos, com no mínimo 12 meses de amenorréia e não usuárias de terapia de reposição hormonal nos últimos seis meses. Foram revisados os prontuários médicos, avaliando-se: idade, peso, altura, índice de massa corpórea (IMC), paridade, idade à menarca, idade à menopausa e os níveis dos hormônios estradiol, folículo-estimulante (FSH) e luteinizante. As mamografias foram analisadas nas incidências crânio-caudal e médio-lateral oblíqua por dois examinadores, de forma cega, sendo classificadas em densas e não densas, segundo os critérios de Wolfe. Na análise estatística, utilizou-se a freqüência, mediana, valores mínimo e máximo, teste de Wilcoxon e odds ratio. Foi realizada análise de regressão logística múltipla, utilizando o processo de seleção passo a passo, com nível de significância de 5%.

RESULTADOS: a freqüência de mamas densas foi de 45%. As mulheres com mamas consideradas densas apresentaram menor peso (60,5 vs 71,9 kg – p<0,01), menor IMC (25,9 vs 31,0 kg/m2 – p<0,01), menor tempo de pós-menopausa (6,0 vs 10,0 anos – p<0,01) e maiores níveis de FSH (75,2 vs 60,3 mU/mL – p<0,01). A probabilidade de apresentar mamas densas diminuiu em mulheres com peso superior a 67 kg (OR = 4,0; IC 95%: 1,50–10,66), IMC superior a 30 kg/m2 (OR = 6,69; IC 95%: 2,54–17,65), com mais de dois partos (OR = 7,84; IC 95%: 1,67–36,81), tempo de pós-menopausa maior ou igual a sete anos (OR = 2,05; IC 95%: 1,05–3,99) e níveis de FSH inferiores a 134,8 mU/mL.

CONCLUSÃO: o peso, IMC, paridade, o tempo de menopausa e níveis de FSH associaram-se significativamente aos padrões de densidade mamográfica.

Palavras-Chave: Densidade mamária. Menopausa. Índice de massa corpórea. Mamografia. Mama: câncer.

ABSTRACT

PURPOSE: to evaluate the relationship between epidemiologic, anthropometric, reproductive and hormonal factors and mammographic density in postmenopausal women.

METHODS: this is a retrospective, cross-sectional study, including 144 women aged 45 years or more, with at least 12 months of amenorrhea and who were non users of hormone replacement therapy during the last six months. Medical charts were reviewed to evaluate age, weight, body mass index (BMI), parity, age at menarche, age at menopause and levels of estradiol, follicle stimulating (FSH) and luteinizing hormones. Mammograms were analyzed by two blinded investigators. The films were taken in the craniocaudal and mediolateral views and mammography was classified as dense and nondense, according to the Wolfe criteria. For statistical analysis, the frequency, median, minimum and maximum values, the Wilcoxon test and the odds ratio were used. Multiple logistic regression was performed, using the stepwise selection, with a 5% significance level.

RESULTS: the frequency of dense breasts was 45%. Women with dense breasts were of lower weight (60.5 vs. 71.9 kg - p<0.01), had a lower BMI (25.9 vs 31.0 kg/m2 – p<0.01), a shorter time since onset of menopause (6.0 vs 10 years - p<0.01) and higher levels of FSH (75.2 vs 60.3 mU/mL – p<0.01). The probability of having dense breasts decreased in women whose weight was 67 kg or more (OR = 4.0, CI 95% = 1.50-10.66), BMI was higher than 30 kg/m2 (OR = 6.69, CI 95% = 1.67-36.81), time since onset of menopause was superior or equal to seven years (OR = 2.05, CI 95% = 1.05-3.99) and FSH levels were lower than 134.8 mU/mL.

CONCLUSION: weight, BMI, parity, time since menopause and FSH levels were significantly associated with mammographic density patterns.

Keywords: Mammographic density. Menopause. Body mass index. Mammography. Breast cancer.

Introdução

A mama é composta por quantidade variável de tecidos adiposo, conjuntivo e epitelial, que vão compor a sua densidade radiológica1,2. Como resultado da composição histológica da mama, observam-se duas densidades na mamografia: densidade de gordura, que reflete a quantidade de tecido adiposo e densidade de água, que reflete o conteúdo de tecidos conjuntivo e glandular da mama. A densidade de gordura é evidenciada à mamografia pela hipertransparência e radiolucência, enquanto a densidade de água é evidenciada pela hipotransparência1. A formação da imagem radiológica da mama resulta da superposição destes tecidos, visualizados à mamografia pelas diferentes densidades. Quanto maior o conteúdo de gordura da mama, menor a densidade mamográfica, ao passo que a maior proporção de tecidos conjuntivo e epitelial aumenta a densidade radiológica da mama3.

Baseado na proporção dos tecidos que compõem a mama, Wolfe4 classificou os padrões mamográficos em quatro categorias: N1, P1, P2 e DY. Os padrões P2 e DY são os que apresentam maior densidade mamográfica e são considerados de alto risco para o desenvolvimento de câncer de mama5,6. A densidade mamária sofre modificações em função da idade, estado menopausal, paridade, altura, peso corpóreo e uso de terapia de reposição hormonal (TRH). Possíveis associações com o estado nutricional, prática de exercícios, alcoolismo e história familiar de câncer de mama foram relatadas7. Stomper et al.8 observaram mudanças na densidade mamária em função da idade, havendo substituição gradual do tecido fibroglandular por tecido adiposo. Estes autores verificaram que mulheres com menos de duas gestações apresentavam tendência a ter mamas densas. A importância do estudo da densidade mamária baseia-se em dois aspectos: no aumento do risco para câncer de mama e na diminuição da sensibilidade e especificidade da mamografia9,10.

As evidências de que as características mamográficas do parênquima mamário forneçam informações sobre o risco de desenvolvimento de câncer de mama aumentaram nos dias atuais. Estudo recente no qual se avaliou a influência da TRH estroprogestativa na incidência do câncer de mama e sobre as mamografias de mulheres na pós-menopausa verificou que os casos de câncer de mama em usuárias de TRH foram diagnosticados em estádios mais avançados, quando comparados com os do grupo placebo. A hipótese dos autores deste estudo foi que a TRH, além de estimular o crescimento tumoral, esteve associada ao atraso no diagnóstico, possivelmente por dificuldades na interpretação das mamografias, decorrentes do aumento na densidade mamária11. Estudos prévios também observaram a associação entre o aumento da densidade mamária e o atraso na detecção do câncer de mama6,10,12.

A mamografia tem sido recomendada às mulheres que procuram atendimento especializado por questões relacionadas à menopausa, não só pela idade, mas também por serem potenciais candidatas ao uso da TRH. Considerando-se as modificações que podem ocorrer na densidade mamográfica em função da idade, peso, paridade, estado menopausal e do uso da TRH, torna-se importante conhecer os fatores associados à densidade radiológica da mama, buscando-se medidas que possam minimizar as conseqüências dessas modificações.

O objetivo desse estudo foi avaliar a associação de fatores epidemiológicos, antropométricos, reprodutivos e hormonais com a densidade mamográfica de mulheres na pós-menopausa. Apesar de existirem estudos na literatura sobre o tema, esse, até onde sabemos, é o primeiro estudo nacional que avalia tal associação com fatores hormonais.

Pacientes e Métodos

Realizou-se estudo retrospectivo, tipo corte transversal, revisando-se os prontuários médicos e as mamografias de mulheres atendidas no Ambulatório de Menopausa do Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (CAISM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Os critérios de inclusão utilizados foram: mulheres com idade de 45 anos ou mais, com tempo mínimo de 12 meses de amenorréia e não usuárias de TRH nos últimos seis meses. Foram excluídas as mulheres com antecedente de cirurgia mamária, antecedente pessoal de câncer de mama, achado mamográfico de lesão suspeita ou aquelas que não apresentassem mamografia de boa qualidade. Na avaliação da qualidade da mamografia, consideraram-se o grau de definição e contraste da imagem e a presença ou não de artefatos que impedissem a avaliação da mamografia. As mamografias foram realizadas em diferentes serviços. Foram avaliados 144 prontuários com as respectivas mamografias realizadas quando da admissão no serviço.

Para o cálculo do tamanho amostral considerou-se a proporção de mulheres com mais de 50 anos e com mamas densas (P2/DY) de 40%13. O tamanho amostral de 144 mulheres permitiu gerar intervalos de confiança de 95% (a = 5%) com semi-amplitude de 8%.

A variável dependente considerada foi a densidade mamográfica do parênquima mamário classificada segundo Wolfe4: N1 (menor radiopacidade), padrão predominantemente adiposo com mama composta quase inteiramente por gordura; P1, padrão fibroductoglandular com ductos proeminentes ocupando até um quarto do volume da mama; P2, padrão fibroductoglandular com ductos proeminentes ocupando mais que um quarto do volume da mama; DY (maior radiopacidade), padrão fibroglandular ocupando quase toda a mama. Estes padrões foram agrupados, e a densidade mamográfica foi categorizada como não densa (N1/P1) e densa (P2/DY).

As variáveis independentes consideradas foram: idade, peso, altura, índice de massa corpórea (IMC), paridade, idade à menarca, idade à menopausa, tempo de menopausa e concentração plasmática de estradiol, hormônio luteinizante (LH) e hormônio folículo-estimulante (FSH). Para verificação dos fatores associados à densidade mamográfica, o peso foi categorizado de acordo com o quartil e a paridade em nulíparas, um parto e dois ou mais partos. O IMC foi expresso em kg/m2 e categorizado em normal (18,5-24,9), sobrepeso (25,0-29,9), obesidade classe I (30,0-34,9) e obesidade classe II (³35,0)14. Os níveis hormonais foram considerados de acordo com as concentrações para a menopausa: FSH entre 25 e 134,8 mUI/ml, LH entre 7,7 e 58,5 mUI/mL e estradiol inferior a 30 pg/mL. As demais variáveis foram categorizadas de acordo com a mediana da população total do estudo (144 mulheres). As dosagens hormonais foram realizadas quando da admissão no serviço, pela técnica de eletroquimioluminescência.

As mamografias de ambas as mamas foram avaliadas nas incidências médio-lateral oblíqua e crânio-caudal, de forma cega, por dois examinadores. Foram então classificadas segundo os padrões de Wolfe4. Quando houve assimetria no padrão de densidade entre as mamas de uma mesma paciente, prevaleceu a classificação de maior densidade. Os laudos não concordantes entre os dois primeiros examinadores foram avaliados por um terceiro examinador, também de forma cega.

Inicialmente realizou-se análise descritiva dos dados com cálculos da freqüência, mediana, valores mínimo e máximo e, para verificação das diferenças das características das mulheres segundo o padrão de densidade mamográfica, utilizou-se o teste não paramétrico de Wilcoxon. A partir das variáveis independentes foi feita a análise de regressão logística univariada (odds ratio bruto com seus respectivos intervalos de confiança de 95%). Esta análise consistiu em correlacionar separadamente cada uma das variáveis independentes com a variável dependente (mama densa ou não densa), para identificar o quanto cada variável independente estava associada à densidade mamográfica. Em uma segunda etapa, foi realizada a análise de regressão logística múltipla, a fim de identificar quais variáveis estariam, conjuntamente, associadas ao padrão mamográfico15. Para isto utilizou-se o processo de seleção stepwise, que consiste em, a cada passo, eleger uma variável independente com maior evidência de explanar a dependente, verificando-se, posteriormente, se com a sua inclusão no modelo aquelas previamente escolhidas continuavam sendo significantes.

Esse estudo foi aprovado pela Comissão de Pesquisa do Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher e Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.

Resultados

Das 144 mulheres avaliadas, 65 (45%) apresentaram mamas com padrão mamográfico denso (Tabela 1). As mulheres com mamas densas apresentaram mediana de peso de 60,5 kg e as com mamas não densas de 71,9 kg (p<0,01). As medianas do IMC de mulheres com mamas densas e não densas foram de 25,9 kg/m2 e 31,0 kg/m2 (p<0,01), respectivamente. Em relação ao tempo de menopausa, verificou-se que a mediana foi de 6,0 anos para as mulheres com mamas densas e de 10,0 anos para as com mamas não densas (p<0,01). As medianas da idade, altura, paridade, idade à menarca e idade à menopausa não apresentaram diferenças estatisticamente significativas (Tabela 2).

Em relação aos níveis hormonais, observou-se em mulheres com mamas densas mediana de FSH de 75,2 mUI/mL e, em mulheres com mamas não densas, de 60,3 mUI/mL (p<0,01); as medianas de LH foram de 28,5 mUI/mL e 22,3 mUI/mL em mulheres com mamas densas e não densas (p<0,01), respectivamente. Não houve diferença estatisticamente significativa nos níveis séricos de estradiol (Tabela 3).

Nas mulheres cujo peso variou entre 66,6 kg e 80,3 kg, 30,4% apresentaram padrão mamográfico denso e 18,5% padrão não denso (OR: 4,00; IC 95%: 1,50-10,66). Nas mulheres com peso igual ou superior a 80,4 kg, verificaram-se mamas não densas em 31,6% e mamas densas em 16,9% (OR: 4,54; IC 95%: 1,69-12,25). Quanto ao IMC, observou-se que entre os valores de 30,0 kg/m2 e 34,9 kg/m2, 38% das mulheres apresentaram mamas densas e 15,4% mamas não densas (OR: 6,69; IC 95%: 2,54-17,65). O cálculo do odds ratio ajustado por todas as variáveis mostrou diferença estatisticamente significativa com o IMC igual ou superior a 30 kg/m2. Entre as mulheres com dois ou mais partos, observou-se que 97,5% apresentaram mamas não densas e 83,1% mamas densas (OR: 7,84; IC 95%: 1,67-36,81). O tempo de menopausa associou-se significativamente ao padrão de densidade mamográfica, sendo que entre as mulheres com sete anos ou mais de menopausa, 60,8% apresentaram mamas não densas e 43,1% mamas densas (OR: 2,05; IC 95%: 1,05-3,99). Dentre as mulheres com níveis séricos de FSH igual ou superior a 134,8 mUI/ml, 2,5% apresentaram mamas não densas e 12,3% mamas densas (OR: 0,19; IC 95%: 0,04-0,91) (Tabela 4). O cálculo do odds ratio ajustado por todas as variáveis mostrou que o IMC e a paridade associaram-se de forma significativa com o padrão de densidade mamográfica (Tabelas 4 e 5).

Discussão

O objetivo desse estudo foi avaliar os fatores clínicos e hormonais associados à densidade mamográfica de mulheres na pós-menopausa. Verificou-se que número significativo de mulheres no início do acompanhamento médico apresentava padrão mamográfico denso. Deve-se estar atento para este resultado, uma vez que mulheres com maior densidade mamária não só apresentam um aumento no risco para câncer de mama9, mas também podem apresentar atraso no diagnóstico mamográfico do câncer9.

A freqüência de mamas densas observada na presente casuística foi de 45%, maior que a relatada para esta faixa etária por Bergkvist et al.16. Porém, os resultados nesse estudo foram observados em população que procurou atendimento especializado por questões relativas à menopausa, ao passo que Bergkvist et al.16 realizaram estudo populacional com mulheres suecas com mais de 40 anos convidadas a participar de um programa de rastreamento mamográfico, no qual também foram avaliados os fatores epidemiológicos associados ao padrão mamográfico denso.

A idade nas faixas estudadas não está associada com os padrões de densidade mamográfica. Cabe ressaltar, no entanto, que a variável tempo de menopausa (colinear com a idade cronológica) associou-se ao padrão de densidade mamográfica. Nas mulheres com mamas densas, a mediana do tempo de menopausa foi significativamente menor que o das com mamas não densas. Mamografias com padrão denso são comumente observadas em mulheres jovens, mas sua freqüência diminui com o aumento da idade cronológica, especialmente após a menopausa17.

Bergkvist et al.16 observaram que 65% das mulheres de 35 anos apresentam mamas com padrão denso (definido como mais de 25% da área mamária contendo parênquima denso), ao passo que a proporção de mulheres por volta de 50 anos com padrão denso à mamografia é de aproximadamente 35%, e em mulheres em torno dos 55 anos é de 15 a 20%. Considerando que o tempo de pós-menopausa é colinear com a idade cronológica da mulher, não se deve concluir que a idade não influenciou o padrão de densidade do parênquima mamário. A associação do tempo de pós-menopausa com os padrões de densidade mamográfica foi confirmada quando se calculou o odds ratio bruto, porém não persistiu quando o odds ratio foi ajustado por todas variáveis, ou seja, apesar de ser um importante fator, não foi influenciado por outras variáveis.

Uma explicação para o fato de o padrão mamográfico denso associar-se a maior tempo de menopausa, relaciona-se à diminuição dos níveis circulantes dos esteróides sexuais, especialmente dos estrogênios, que se verifica no período do climatério. Na presente casuística, apesar de os níveis plasmáticos de estradiol não terem apresentado associação com o padrão mamográfico, observamos que as mulheres com mamas densas apresentaram concentrações plasmáticas significativamente maiores dos hormônios folículo-estimulante e luteinizante, quando comparadas às mulheres com mamas não densas. Até onde sabemos, este foi o primeiro estudo nacional que verificou esta associação.

Os fatores antropométricos são amplamente relacionados com o padrão mamográfico: mulheres com maior peso corpóreo geralmente apresentam mamas não densas18. Ao contrário, mulheres com menor peso corpóreo freqüentemente apresentam mamas com padrão denso19. Nesse estudo, a probabilidade de uma mulher apresentar mamas densas variou de acordo com o peso corpóreo, sendo menor naquelas com peso superior a 66,6 kg. O IMC associou-se ao padrão de densidade mamográfica. Valores de IMC inferiores a 30 kg/m2 aumentaram a probabilidade de a mulher apresentar padrão mamográfico denso (sete a oito vezes). Esse resultado está de acordo com a literatura, que é quase unânime quanto a este aspecto2,19,20. Estes estudos apontam a altura e o peso como elementos preditivos da densidade mamográfica20. Não houve diferenças significativas nas medianas da paridade de mulheres com mamas densas e não densas, porém quando se estratificou a paridade, confirmou-se que a multiparidade (dois filhos ou mais) estava associada a uma menor probabilidade de a mulher apresentar mamas densas. Este resultado foi concordante com os relatos de outros autores18,21.

Entre as limitações desse estudo, uma das principais foi o caráter retrospectivo da observação, o que não permitiu a inclusão da idade ao primeiro parto, o tempo de amamentação e a distribuição da gordura corporal, que são fatores sabidamente associados ao padrão de densidade mamográfica. Nem todas as mamografias foram realizadas no mesmo serviço, dificultando o controle de qualidade adequado das mesmas. Isso pode ter sido minimizado, quando se adotaram critérios para a avaliação da qualidade das mamografias. Porém, acreditamos que esse estudo poderá trazer alguma contribuição ao mostrar a alta freqüência de mamas densas já à primeira consulta, em serviço que atende mulheres na pós-menopausa e, portanto, candidatas ao uso de TRH. Embora não tenha sido o objetivo do presente estudo, a TRH pode estar associada ao aumento do risco de câncer de mama; soma-se a isto o fato de as mulheres com mamas densas poderem apresentar atraso no diagnóstico do câncer de mama, relacionado à diminuição da sensibilidade e especificidade da mamografia21.

Apesar de não haver programas de rastreamento para câncer de mama no Brasil, pode-se observar que mulheres na pós-menopausa submetidas a mamografias são, geralmente, freqüentadoras de consultórios ou serviços públicos especializados no atendimento de mulheres climatéricas. Portanto, deve-se chamar a atenção dos profissionais que as assistem para os fatores associados ao padrão de densidade mamográfica. O conhecimento desses fatores poderá contribuir para a melhoria da qualidade da assistência.

Nesse sentido, o que pode ser feito para minimizar os efeitos do padrão mamográfico denso? Segundo Van Gils9, muito pouco. Recomenda-se atenção na realização e interpretação da mamografia, o uso de métodos complementares (ultra-sonografia, ressonância magnética), principalmente se houver achado suspeito durante o exame clínico das mamas, mas não visualizado na mamografia22. A mamografia deve ser interpretada por profissionais qualificados e com experiência em imaginologia mamária.

Orienta-se atenção quanto à técnica na realização da mamografia. Os serviços especializados em mamografia devem ter a qualidade do exame monitorada durante toda a seqüência de produção da imagem, incluindo o mamógrafo, processadora dedicada e a câmara escura. O posicionamento adequado é outro fator que merece atenção, uma vez que deve incluir a maior quantidade possível de tecido mamário, diminuindo a possibilidade de exame falso-negativo. Outra recomendação refere-se à suspensão da TRH por período de no mínimo 3 semanas23, previamente à realização da mamografia. Quando possível, a utilização de outras modalidades terapêuticas24, que não a TRH, para a prevenção e tratamento de doenças associadas ao climatério, deve ser considerada. Não existe, até o momento, consenso da necessidade de se diminuir o intervalo de rastreamento do câncer de mama em mulheres com mamas densas.

Finalmente, consideramos que são necessários estudos prospectivos nacionais que avaliem a associação de cada fator estudado com a densidade do parênquima mamário ao longo do tempo. A associação entre padrão mamográfico denso e câncer de mama, bem como o atraso no diagnóstico do câncer de mama em mulheres com mamas densas, também deverão ser explorados em estudos prospectivos.

Recebido em: 30/10/2003

Aceito com modificações em: 7/1/2004

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  • Endereço para correspondência
    Aarão Mendes Pinto Neto
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Abr 2004
    • Data do Fascículo
      Fev 2004

    Histórico

    • Aceito
      07 Jan 2004
    • Recebido
      30 Out 2003
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