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Mastalgias cíclicas: tratamento não-medicamentoso (orientação verbal)

Cyclical mastalgias: a nonpharmacological treatment (reassurance)

Resumos

Objetivos: avaliar o tratamento não-medicamentoso (orientação verbal) como primeira opção terapêutica para mulheres com mastalgia cíclica e observar se o tempo de existência da sintomatologia dolorosa altera os resultados. Métodos: conduzimos um estudo do tipo experimental não-controlado com uma amostra de 128 mulheres com história clara de mastalgia cíclica, tratadas com orientação verbal. Uma escala analógica visual da dor foi usada antes e após o tratamento, a fim de avaliar a severidade, e classificamos as mastalgias em graus I (leve), II (moderado) e III (severo), de acordo com a intensidade da dor. Usamos também o "Cardiff Breast Score" (CBS) modificado para avaliar a resposta clínica ao tratamento. A análise dos dados foi feita com o teste do chi² (Epi-Info 6.04). Resultados: verificou-se um índice de sucesso de 59,4% com a orientação verbal, mas não houve resposta com diferença estatisticamente significante entre os grupos (p = 0,16) com diferentes graus de mastalgia. A resposta menos satisfatória ao tratamento não-medicamentoso nas pacientes que apresentavam um período de tempo mais longo de sintomatologia foi apenas aparente, pois não houve diferença estatisticamente significante (p = 0.14). Conclusão: a orientação verbal deve ser tentada sempre como a primeira escolha terapêutica para mulheres com mastalgia cíclica, independentemente do grau de intensidade da dor. O curso prolongado da dor não interferiu nos resultados.

Mama; Mastalgia, orientação verbal


Purpose: to evaluate the nonpharmacologic treatment (reassurance) as a first line therapy for women with cyclical mastalgia, and to observe if a prolonged course of pain alters the outcome. Methods: we conducted a noncontrolled experimental study with a sample of 128 eligible women with a clear history of cyclical mastalgia treated with reassurance. A visual linear analogical scale of the pain was used before and after treatment in order to assess its severity and the mastalgias were classified into degrees I (mild), II (moderate) and III (severe) according to the intensity of pain. We also used a modified Cardiff Breast Score (CBS) to assess the clinical response. The data analysis was performed using the chi² test (Epi-Info 6.04 software). Results: we verified a success rate of 59.4% with reassurance, but there was no significant statistical difference between the groups (p = 0.16) with different degrees of mastalgia. The less satisfactory response to the nonpharmacologic treatment in those pacients with a prolonged course of pain was only apparent, since there was no significant statistical difference (p = 0.14). Conclusion: reassurance should be always tried as the first choice treatment for women with cyclical mastalgia, independently of pain intensity. Prolonged course of pain did not alter the outcome.

Breast; Mastalgia, reassurance


Trabalhos Originais

Mastalgias Cíclicas: Tratamento Não-Medicamentoso (Orientação Verbal)

Cyclical Mastalgias: A Nonpharmacological Treatment (Reassurance)

Flávio Nunes Sivini1 1 Departamento Materno-Infantil da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. 2 Instituto de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. Correspondência: Flávio Nunes Sivini Av. Boa Viagem, 5600 ap. 302 51030-000 ¾ Recife ¾ Pernambuco , Aurélio Molina1 1 Departamento Materno-Infantil da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. 2 Instituto de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. Correspondência: Flávio Nunes Sivini Av. Boa Viagem, 5600 ap. 302 51030-000 ¾ Recife ¾ Pernambuco , Cícero Ferreira Fernandes Costa1 1 Departamento Materno-Infantil da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. 2 Instituto de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. Correspondência: Flávio Nunes Sivini Av. Boa Viagem, 5600 ap. 302 51030-000 ¾ Recife ¾ Pernambuco , Flávio Murilo Pinto Sivini2 1 Departamento Materno-Infantil da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. 2 Instituto de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. Correspondência: Flávio Nunes Sivini Av. Boa Viagem, 5600 ap. 302 51030-000 ¾ Recife ¾ Pernambuco

RESUMO

Objetivos: avaliar o tratamento não-medicamentoso (orientação verbal) como primeira opção terapêutica para mulheres com mastalgia cíclica e observar se o tempo de existência da sintomatologia dolorosa altera os resultados.

Métodos: conduzimos um estudo do tipo experimental não-controlado com uma amostra de 128 mulheres com história clara de mastalgia cíclica, tratadas com orientação verbal. Uma escala analógica visual da dor foi usada antes e após o tratamento, a fim de avaliar a severidade, e classificamos as mastalgias em graus I (leve), II (moderado) e III (severo), de acordo com a intensidade da dor. Usamos também o "Cardiff Breast Score" (CBS) modificado para avaliar a resposta clínica ao tratamento. A análise dos dados foi feita com o teste do c2 (Epi-Info 6.04).

Resultados: verificou-se um índice de sucesso de 59,4% com a orientação verbal, mas não houve resposta com diferença estatisticamente significante entre os grupos (p = 0,16) com diferentes graus de mastalgia. A resposta menos satisfatória ao tratamento não-medicamentoso nas pacientes que apresentavam um período de tempo mais longo de sintomatologia foi apenas aparente, pois não houve diferença estatisticamente significante (p = 0.14).

Conclusão: a orientação verbal deve ser tentada sempre como a primeira escolha terapêutica para mulheres com mastalgia cíclica, independentemente do grau de intensidade da dor. O curso prolongado da dor não interferiu nos resultados.

PALAVRAS CHAVE: Mama: doenças benignas. Mastalgia, orientação verbal

Introdução

Mastalgia é o termo empregado para definir a dor localizada na mama e deve ser considerada como um sintoma mais do que uma doença1. É, sem dúvida, a queixa mais freqüente das pacientes em relação às suas glândulas mamárias, e também a causa mais comum de consultas aos ambulatórios de patologia mamária2.

Pode ser classificada em cíclica, não-cíclica e não-mamária. A mastalgia cíclica por definição, é aquela que ocorre no menacme. A dor tem uma relação clara com o ciclo menstrual, geralmente ocorrendo na fase pré-menstrual e acabando com a menstruação3.

A mastalgia, para a maioria das pacientes, é um problema autolimitado e suave, mas para outras, em menor proporção, a dor afeta seu trabalho, sua vida sexual e familiar4. Depressão, perda de auto-estima, desamparo e desesperança podem acompanhar essas pacientes se a dor persiste cronicamente5.

Apesar de ser muito freqüente, o fato de não se conhecer bem a fisiopatologia das mastalgias, na qual interagem fatores hormonais, alimentares, metabólicos e emocionais6, tem gerado indefinição quanto ao tipo de conduta assistencial preferencial a ser oferecido a essas mulheres. Existe grande número de opções terapêuticas7, das quais o próprio placebo tem uma resposta de 19% nos ensaios clínicos8. Obviamente, os aspectos éticos de se prescrever um placebo fora de ensaios clínicos devem ser questionados8.

Ao longo dos anos, têm sido usados os mais diferentes recursos e drogas com a finalidade de tratar a dor mamária: ácidos graxos essenciais3, dieta com restrições de metilxantinas9, vitaminas6, tamoxifeno4, danazol10, gestrinona11 e excepcionalmente os análogos do LHRH12.

Há diversos aspectos implicados no uso dessas drogas, como: custo elevado, eficácia nem sempre comprovada, efeitos colaterais às vezes significativos, além da recorrência da dor em metade das pacientes tratadas num período curto de tempo, após terem experimentado melhora e suspendido o tratamento13. Por este motivo, resolvemos avaliar a eficiência do tratamento não-medicamentoso (orientação verbal) especificamente nas mastalgias cíclicas e a influência que o tempo de existência da sintomatologia pudesse de alguma forma exercer nesses resultados. A conduta proposta é simples, não acarreta maiores gastos e é totalmente desprovida de efeitos colaterais inerentes a algumas drogas.

Pacientes e Métodos

Foi realizado um trabalho prospectivo do tipo experimental não-controlado, com 128 mulheres com queixa inequívoca de mastalgia cíclica que procuraram ou foram encaminhadas ao ambulatório de Patologia Mamária, do Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (CISAM) da Faculdade de Ciências Médicas/UPE. Estas foram atendidas no período de 23 de dezembro de 1998 a 26 de agosto de 1999. Foram excluídas do estudo pacientes com patologia mamária detectável ao exame clínico ou após propedêutica pertinente (mamografia e/ou ultra-sonografia) ou que estivessem fazendo uso de drogas que pudessem de alguma maneira influir na dor mamária: anticoncepcional hormonal, tamoxifeno, bromocriptina, etc. Foram também excluídas pacientes com dor referida na mama mas de causa extramamária e as portadoras de mastalgia acíclica.

A mastalgia cíclica (variável dependente) foi classificada em quatro diferentes categorias, levando-se em consideração a intensidade maior ou menor da dor: grau I (leve), grau II (moderado), grau III (intenso) e grau 0 (ausência de dor).

Na mastalgia grau I (leve), as mamas eram pouco dolorosas, a dor não interferia nas atividades habituais e não requeria analgésicos. Na mastalgia grau II (moderado), as mamas eram moderadamente dolorosas, a dor chegava a interferir com as atividades habituais e raramente requeria analgésicos. Na mastalgia grau III (intenso), as mamas eram intensamente dolorosas, a dor interferia nas atividades habituais e quase sempre necessitava de analgésicos. No grau 0 de mastalgia (ausência de dor), eram classificadas as pacientes que após tratamento não-medicamentoso (orientação verbal) sentiam-se curadas.

A orientação verbal fundamenta-se na abordagem sistemática dos seguintes aspectos: 1) explicação sobre a natureza não-neoplásica do sintoma; 2) a não-elevação do risco relativo para o câncer nas portadoras de dor mamária e 3) as possíveis causas do sintoma e a sua evolução natural. Tudo isso, após exame físico detalhado com propedêutica pertinente. Nesse tipo de abordagem, a relação médico-paciente é fundamental.

Para permitir um referencial comparativo pré e pós-tratamento, as pacientes submeteram-se a uma avaliação basal da dor, que consistiu na verificação de parâmetros, de base subjetiva, informados pela paciente com supervisão e orientação do pesquisador:

1º - Classificação sintomática da dor mamária em graus I, II ou III (anamnese). Parâmetro básico, alicerce do estudo; 2º - Atribuição de nota para a intensidade da dor mamária pela própria paciente de 0 a 10 (nota 10 para a dor máxima) - parâmetro secundário, usado como apoio; 3º - Avaliação da intensidade da dor mamária, mediante uso da escala linear analógica visual da dor, que foi apresentada à paciente pelo pesquisador - parâmetro secundário, também usado como apoio.

Para a análise evolutiva do quadro doloroso foi utilizado o CBS ¾ "Cardiff Breast Score" modificado14, que consistia na autoavaliação da paciente em relação à sua sintomatologia dolorosa. Após a autoavaliação a evolução foi categorizada em: cura - quando não há qualquer dor residual após tratamento; melhora - quando permanece alguma dor residual, mas considerada pela paciente perfeitamente tolerável; nenhuma resposta - a dor permanece inalterada e considera-se piora quando há um agravamento dos índices da sintomatologia.

A eficácia do tratamento não-medicamentoso foi constatada quando pelo menos três dos quatro parâmetros (classificação sintomática da dor, nota, escala linear analógica visual da dor, análise evolutiva do quadro doloroso) utilizados com essa finalidade mostrassem diminuição de intensidade da dor em qualquer nível.

A nota, a escala analógica visual da dor e a classificação em graus I, II e III em relação à intensidade da dor mamária, depois de estabelecidas, permaneceram inacessíveis ao entrevistador na consulta de reavaliação do tratamento usado até a análise final dos resultados.

O presente trabalho foi submetido à Comissão de Ética em Pesquisa do CISAM e aprovado.

Resultados

Das 227 pacientes selecionadas para participar do estudo, satisfazendo, portanto os critérios de inclusão e exclusão, 128 retornaram para reavaliação final efetiva, constituindo a casuística de fato. A distribuição dessas pacientes em relação ao grau de intensidade da dor mamária antes do tratamento não-medicamentoso (orientação verbal) está exposta na Tabela 1. Observa-se que a maioria das pacientes apresentava mastalgia moderada.

A Tabela 2 mostra que um número maior (61,7%) de pacientes apresentava mastalgia por um longo período de tempo, isto é, superior a 12 meses, independente do grau de mastalgia (grau I = 51,1%; grau II = 68,1%; grau III = 64,7); no entanto, não houve diferença estatisticamente significante quando se comparou o grau I de mastalgia com os graus II e III, levando em consideração o tempo de existência da sintomatologia por mais de 12 meses ou por menos.

Numa visão inicial observamos que, após o tratamento não-medicamentoso (orientação verbal), 19 das pacientes (14,8%) dos diversos grupos de intensidade da dor encontravam-se sem mastalgia na consulta de reavaliação (período médio de retorno = dois meses e dez dias), conforme se observa na Tabela 3. O aumento no número de pacientes na mastalgia leve, de 45 para 74, significa que pacientes dos dois grupos subseqüentes melhoraram com o tratamento proposto.

Foram consideradas curadas ou com melhora, segundo autoavaliação das pacientes (análise evolutiva do quadro doloroso), 66,7% dos casos com grau I, 65,2% e 47% com graus II e III, respectivamente, como pode ser visto na Tabela 4. Não houve, porém, diferença estatisticamente significante quando comparamos as curadas e melhoradas de grau III de mastalgia com aquelas curadas e melhoradas de graus I e II.

Na Tabela 5, observa-se que metade das pacientes (64 de 128) evoluiu para mastalgia de menor intensidade após tratamento. Observa-se também que, no grupo originalmente constituído por pacientes com mastalgia grau III (intensa), aproximadamente dois terços (64,8%) sofreram alteração da sintomatologia após o tratamento, havendo diminuição da intensidade da dor. A mudança para graus mais baixos de mastalgia nas pacientes que inicialmente se queixavam de dor de moderada intensidade (grau II) ocorreu em 69,8% dos casos, com diferença estatisticamente significante em relação aos outros grupos.

O tempo de existência da sintomatologia alterou o resultado do tratamento não-medicamentoso das mastalgias cíclicas nos diversos graus de intensidade da dor. As pacientes que apresentavam a sintomatologia por um período de tempo mais longo (>12 meses) responderam menos satisfatoriamente ao tratamento, mas não se observou uma diferença estatisticamente significante entre esse grupo e os demais.

Em resumo, em 76 (59,4%) das 128 pacientes estudadas, comprovou-se a eficiência do tratamento. Foi sugerida uma eficiência diretamente proporcional à maior intensidade da sintomatologia, porém não houve diferença estatisticamente significante quando comparamos pacientes com graus II e III de mastalgia com as de grau I.

Discussão

Nosso estudo avaliou os resultados da conduta não-farmacológica (orientação verbal), especificamente em pacientes com mastalgia cíclica, por se tratar da forma mais freqüente de mastalgia e ser a que responde melhor aos tratamentos convencionais propostos14.

O índice de eficiência obtido por nós foi de 59.4% de uma forma global, porém variando nos casos de mastalgia leve (grau I; 51,1%), moderada (grau II; 63,6%) e intensa (grau III; 64,7%), mas não houve diferença estatisticamente significante entre esses grupos. Pesquisadores ingleses15 referiram 85% de sucesso no alívio da dor mamária com a orientação verbal (reassurance).

Uma orientação adequada indicando que a condição é benigna permite pelo menos que 85% das pacientes aceitem e tolerem a sua dor mamária sem medicação14. Consideramos esse aspecto fundamental, pois põe em evidência que o sucesso do tratamento não significa necessariamente a cura total da dor, mas a sua melhora a níveis toleráveis. Gateley et al.14 consideram uma resposta clínica útil mesmo que persista alguma dor residual, porém considerada pela paciente facilmente tolerável. Barros et al.16 obtiveram sucesso com esse método em 70,2% dos casos e recomendam esta medida como conduta de eleição para mulheres com mastalgia.

A menor eficiência da orientação verbal nos nossos achados, em relação aos resultados obtidos pelos autores ingleses, talvez possa ser explicada pelo fato de que a população atendida no nosso ambulatório é predominantemente constituída por mulheres com formas moderadas ou intensas de mastalgia (64,9%), para as quais os resultados não são tão satisfatórios16. A mastalgia severa, por exemplo, tem um curso crônico de recidivas, freqüentemente requerendo repetidos tratamentos com drogas17.

Na nossa casuística as pacientes com mastalgia intensa e moderada se beneficiaram mais com o tratamento do que as portadoras das formas leves de mastalgia, porém não se observou diferença estatisticamente significante entre esses grupos. Pode-se ainda especular que as pacientes que não voltaram (227 foram selecionadas e somente o número suficiente para a amostra de 128 retornou, boa parte delas convocadas por cartas) para reavaliação obtiveram melhora e, por isso mesmo, não voltaram ao ambulatório. Este comportamento já havia sido sugerido por McFayden et al.18, em trabalho realizado em Edinburgh. Outra explicação é que as pacientes simplesmente não se adaptaram ao tratamento proposto, pelo fato de nossa cultura ser fortemente voltada para o tratamento farmacológico nas mais variadas circunstâncias, impossibilitando assim a avaliação do tratamento usado.

Pode-se considerar ainda a possibilidade levantada por McFayden et al.18 de que o tratamento não-medicamentoso (orientação verbal) pode não alcançar todo o sucesso esperado na primeira consulta, pois requer tempo considerável com a repetição de explicações da causa provável da dor e grande paciência. É pertinente colocar em evidência que, nos nossos índices de eficiência com a terapêutica não-medicamentosa, estão incluídas pacientes que aparentemente ficaram curadas como também outras que sentiram melhora, apesar de permanecerem com alguma dor residual, equivalente a CBS II, escore usado na "Cardiff Mastalgia Clinic" e que significa melhora com dor residual facilmente tolerável pela paciente14. Ainda é prudente lembrar que em algumas pacientes os sintomas mamários irão desaparecer independentemente de qualquer terapêutica, como foi muito bem observado por Fentiman e Hamed4, que afirmaram: "Para a maioria das pacientes com mastalgia cíclica a condição dura por dois a três meses e cura espontaneamente. Nessas circunstâncias, nenhum tratamento é necessário". Considerar ainda o fato de que a dor varia em severidade de ciclo a ciclo19.

No nosso estudo, 25% das pacientes apresentavam sintomatologia dolorosa das mamas por um período de tempo considerado curto (seis meses ou menos). Poderiam, portanto, ser excluídas de participação se os critérios de elegibilidade assim o determinassem. Fentiman et al.20 e Sismondi et al.21, por exemplo, recomendam que a terapêutica medicamentosa deve ser reservada para aqueles casos nos quais os sintomas duram mais que seis meses. Por outro lado, a ausência absoluta de efeitos colaterais, contra-indicações e custo financeiro da orientação verbal viabilizaram a inclusão dessas pacientes sem a preocupação com aspectos éticos que poderiam eventualmente estar envolvidos e que são tão importantes, particularmente nos estudos experimentais. Outro aspecto a considerar é que grande parte das nossas pacientes (61,7%) eram portadoras de mastalgia cíclica por um longo período de tempo (>12 meses) e eram jovens (a faixa etária entre 20 e 29 anos representava o grupo maior), significando que a expectativa de cura ou melhora não era facilmente esperada, segundo dados da literatura. O início de dor cíclica na mama, antes da idade de 20 anos, é seguido normalmente por um longo período de tempo sintomático. A idade do início da sintomatologia permite predizer, de alguma maneira, o curso da doença. Pacientes jovens com sintomas severos devem esperar muitos anos de sintomatologia17.

Na nossa casuística, foram incluídas mulheres classificadas como portadoras da forma leve (35,1%), forma moderada (51,7%) e forma intensa (13,2%) de mastalgia, contrastando também com a prevalência do sintoma em uma população de universitárias do Estado de São Paulo, que foram classificadas da seguinte forma: 91,8% de forma leve, 6,8% de forma moderada e 1,2% de forma intensa22. Por outro lado, quando questionadas diretamente, 45% das mulheres referiram dor suave nas mamas e 21% dor severa15.

O predomínio da forma moderada (grau II) de mastalgia em nossa casuística em relação à de outros autores pode ser explicado pelo fato de, neste estudo, ter-se pesquisado detalhadamente a possibilidade de interferência da dor mamária nas atividades normais das pacientes. Na classificação das mastalgias usada na pesquisa, esse era um aspecto fundamental, levando algumas pacientes ora para a forma moderada, ora para a forma severa de mastalgia. Essas diferenças também poderiam ser explicadas pelo fato de que nossa amostragem foi constituída de pacientes referidas ao nosso ambulatório especializado.

Visando tornar mais objetivos e de certa forma quantitativos os efeitos sobre um sintoma altamente subjetivo como é a dor, usamos sistematicamente a escala linear analógica visual da dor (EAVD) antes e após o tratamento, escala esta considerada como o melhor método para avaliar a severidade da dor objetivamente4.

Na classificação sintomática da dor em graus, o fato de a dor interferir ou não nas atividades normais como sono, trabalho e vida sexual, promove também uma útil análise da severidade da dor23. Essa classificação também foi usada sistematicamente, antes e após o tratamento não-farmacológico. A nota atribuída pela paciente, antes e após o tratamento, e usada também para avaliar a severidade da dor e a resposta ao tratamento, é eqüivalente aos resultados obtidos com a EAVD, podendo ser dispensada em novas avaliações. Observamos que, em 89% das vezes, a nota atribuída à intensidade da dor corresponde ao mesmo número da escala analógica visual da dor apontada pela paciente.

A explicação sobre como a orientação verbal permite obter tão bons resultados no alívio da dor mamária passa seguramente por aspectos psicológicos. Sabe-se que sintomas somáticos que levam pacientes a departamentos médicos e cirúrgicos podem ser manifestação de estados de an-siedade e de depressão e que seguramente não têm base em patologia orgânica24.

Finalmente, o tempo decorrido entre a primeira consulta (com o efeito inicial do tratamento não-medicamentoso) e a reavaliação do tratamento subseqüente pode, de alguma maneira, ter influenciado os resultados, obrigando a um estudo mais aprofundado sobre esse aspecto posteriormente. A tentativa de diminuir vieses de informação usando vários critérios para avaliar a intensidade da dor antes e após o tratamento não-medicamentoso pareceu extremamente válida porque informações contraditórias, ora observadas na pontuação da EAVD, ora na atribuição da nota pelas pacientes, além da dificuldade às vezes encontrada para classificar a dor em diferentes graus de intensidade, foram mais freqüentes do que o esperado.

Quanto às pacientes que precisaram de propedêutica complementar como mamografia e/ou ultra-sonografia, observou-se que foram submetidas a esses exames somente 9,3% das pa-cientes, a maioria com mastalgia de leve intensidade, grau I (66,6%). Sentiram-se curadas ou melhoraram na análise evolutiva do quadro doloroso (auto-avaliação) 58,3%, também melhorando nos demais parâmetros (diminuindo a nota e alterando a escala analógica visual para menos). O valor que tais exames possam ter exercido em relação a proporcionarem ou não uma maior eficiência ao tratamento é difícil de avaliar, considerando que essas pacientes eram tratadas, na primeira consulta, com a orientação verbal e só depois voltavam para reavaliação com os resultados. Na realidade, se eles tivessem de influir o fariam provavelmente negativamente, considerando a expectativa gerada antes de sua realização até o resultado final.

Concluímos que a conduta não-medicamentosa (orientação verbal) deve ser tentada sempre como a primeira opção terapêutica para mulheres com mastalgia cíclica (índice de sucesso de 59,4%). Não houve diferença estatisticamente significante em termos de eficiência do método entre os grupos que apresentavam mastalgia leve, moderada ou intensa. O tempo de existência da sintomatologia dolorosa não alterou os resultados.

SUMMARY

Purpose: to evaluate the nonpharmacologic treatment (reassurance) as a first line therapy for women with cyclical mastalgia, and to observe if a prolonged course of pain alters the outcome.

Methods: we conducted a noncontrolled experimental study with a sample of 128 eligible women with a clear history of cyclical mastalgia treated with reassurance. A visual linear analogical scale of the pain was used before and after treatment in order to assess its severity and the mastalgias were classified into degrees I (mild), II (moderate) and III (severe) according to the intensity of pain. We also used a modified Cardiff Breast Score (CBS) to assess the clinical response. The data analysis was performed using the c2 test (Epi-Info 6.04 software).

Results: we verified a success rate of 59.4% with reassurance, but there was no significant statistical difference between the groups (p = 0.16) with different degrees of mastalgia. The less satisfactory response to the nonpharmacologic treatment in those pacients with a prolonged course of pain was only apparent, since there was no significant statistical difference (p = 0.14).

Conclusion: reassurance should be always tried as the first choice treatment for women with cyclical mastalgia, independently of pain intensity. Prolonged course of pain did not alter the outcome.

KEY WORDS: Breast: benign diseases. Mastalgia, reassurance.

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  • 1
    Departamento Materno-Infantil da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco.
    2
    Instituto de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco.
    Correspondência:
    Flávio Nunes Sivini
    Av. Boa Viagem, 5600 ap. 302
    51030-000 ¾ Recife ¾ Pernambuco
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Jun 2003
    • Data do Fascículo
      Mar 2001
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