Resumos
OBJETIVO: identificar os efeitos do uso dos contraceptivos hormonais orais (ACHO) de baixa dosagem estrogênica (<30 mg de etinilestradiol) nas taxas intra-eritrocitárias de folatos. MÉTODOS: este foi estudo prospectivo transversal que incluiu 95 pacientes atendidas no Ambulatório de Planejamento Familiar da Escola Paulista de Medicina - UNIFESP. O grupo controle (grupo Condom) foi constituído por pacientes usuárias de condom como método contraceptivo exclusivo nos últimos doze meses e os grupos de estudo eram compostos por usuárias de ACHO de baixa dosagem agrupadas de acordo com o tempo de uso do método, quer seja, grupo ACHO 3 (três a seis meses de uso), grupo ACHO 6 (seis a doze meses de uso) e grupo ACHO 12 (mais de doze meses de uso). A dosagem de folatos intra-eritrocitários foi feita pelo método de captura iônica. A avaliação estatística dos resultados foi feita pela análise de variância e teste c². RESULTADOS: no grupo Condom observou-se que 44% das pacientes apresentaram níveis de folato intra-eritrocitárioreduzidos (<186,0 ng/mL), ao passo que nos grupos de usuárias de ACHO este índice foi de 32% (grupo ACHO 3), 16% (grupo ACHO 6) e 31% (grupo ACHO 12). Não se encontrou nos grupos de usuárias de ACHO de baixa dosagem estrogênica redução significativa na média das taxas de folato intra-eritrocitário em relação ao grupo controle, nem houve diferença dos resultados em função do tempo de uso do método. CONCLUSÕES: verificaram-se níveis reduzidos de folato intra-eritrocitário numa parcela significativa (44%) de pacientes não usuárias de ACHO, com valores próximos ao limite inferior do que é considerado normal pela maioria dos autores, traduzindo deficiência basal de folatos na população estudada. Não se observou influência do uso de ACHO de baixa dosagem estrogênica sobre as taxas de folato intra-eritrocitário.
Contracepção; Condom; Contraceptivos orais
PURPOSE: to study the effects of low-dose oral hormonal contraceptives (OHC) (<30 mg of ethynylestradiol) on the intraerythrocytic folate levels. METHODS: this was a prospective transversal study with 95 patients treated in the Family Planning Clinic of UNIFESP (Federal University of São Paulo). The control group (Condom group) consisted of patients using condom as their exclusive contraceptive method during the last 12 months, and the study groups consisted of patients using low-dose oral hormonal contraceptives, in the following way: OHC 3 group (three to six months of use), OHC 6 group (six to twelve months of use) and OHC 12 group (more than twelve months of use). Intraerythrocytic folate was determined by the ionic capture method. Analysis of variance and c² test were used for statistical analysis. RESULTS: the Condom group showed a rate of 44% of patients with folate lower than 186.0 ng/mL and the users of low-dose oral contraceptives showed a rate of 32% (OHC 3 group), 16% (OHC 6 group) and 31% (OHC 12 group). We did not find in the group using low-dose oral contraceptives a significant reduction in the average level of intraerythrocytic folate compared to the control group and there was no statistically significant difference (p=0.28) regarding time of use. CONCLUSION: we observed reduced levels of intraerythrocytic folate in a significant number (44%) of patients not using low-dose oral hormonal contraceptives. Their rates were similar to the lower limit considered to be normal by most authors, which points to a basal folate deficiency in the studied group. We did not observe any alteration in the level of intraerythrocytic folate in patients using low-dose oral hormonal contraceptives.
Contraceptives; Condom; Intraerythrocytic folate
TRABALHOS ORIGINAIS
Efeitos dos contraceptivos hormonais orais de baixa dosagem estrogênica nas taxas de folato intra-eritrocitário
Effects of low-dose oral hormonal contraceptive on intraerythrocytic folate levels
Túlio Bráulio Cantalice de PaulaI; Antonio Fernandes MoronI; Cristina GuazzelliII; Kimyio NonoyamaIII; Cristiani Martinez SalzoneIII
IDisciplina de Medicina Fetal/Escola Paulista de Medicina/Universidade Federal de São Paulo
IIDisciplina de Obstetrícia Fundamental/Escola Paulista de Medicina/Universidade Federal de São Paulo
IIISecretaria de Saúde do Estado de São Paulo: Instituto Adolfo Lutz
Endereço para correspondência Endereço para correspondência Túlio Bráulio Cantalice de Paula Rua João Fragoso de Medeiros, nº 2428, apto. 1401 - Bairro Candeias 54430-250 - Jaboatão dos Guararapes - PE Fone: (81) 3091-3074, (81) 3474-0331, (81) 9972-3331/Fone/Fax: (11) 5572-4449 e-mail: Raqueleta2002@yahoo.com.br mariarachelviegas@terra.com.br
RESUMO
OBJETIVO: identificar os efeitos do uso dos contraceptivos hormonais orais (ACHO) de baixa dosagem estrogênica (<30 mg de etinilestradiol) nas taxas intra-eritrocitárias de folatos.
MÉTODOS: este foi estudo prospectivo transversal que incluiu 95 pacientes atendidas no Ambulatório de Planejamento Familiar da Escola Paulista de Medicina UNIFESP. O grupo controle (grupo Condom) foi constituído por pacientes usuárias de condom como método contraceptivo exclusivo nos últimos doze meses e os grupos de estudo eram compostos por usuárias de ACHO de baixa dosagem agrupadas de acordo com o tempo de uso do método, quer seja, grupo ACHO 3 (três a seis meses de uso), grupo ACHO 6 (seis a doze meses de uso) e grupo ACHO 12 (mais de doze meses de uso). A dosagem de folatos intra-eritrocitários foi feita pelo método de captura iônica. A avaliação estatística dos resultados foi feita pela análise de variância e teste c2.
RESULTADOS: no grupo Condom observou-se que 44% das pacientes apresentaram níveis de folato intra-eritrocitárioreduzidos (<186,0 ng/mL), ao passo que nos grupos de usuárias de ACHO este índice foi de 32% (grupo ACHO 3), 16% (grupo ACHO 6) e 31% (grupo ACHO 12). Não se encontrou nos grupos de usuárias de ACHO de baixa dosagem estrogênica redução significativa na média das taxas de folato intra-eritrocitário em relação ao grupo controle, nem houve diferença dos resultados em função do tempo de uso do método.
CONCLUSÕES: verificaram-se níveis reduzidos de folato intra-eritrocitário numa parcela significativa (44%) de pacientes não usuárias de ACHO, com valores próximos ao limite inferior do que é considerado normal pela maioria dos autores, traduzindo deficiência basal de folatos na população estudada. Não se observou influência do uso de ACHO de baixa dosagem estrogênica sobre as taxas de folato intra-eritrocitário.
Palavras-chave: Contracepção. Condom. Contraceptivos orais.
ABSTRACT
PURPOSE: to study the effects of low-dose oral hormonal contraceptives (OHC) (<30 mg of ethynylestradiol) on the intraerythrocytic folate levels.
METHODS: this was a prospective transversal study with 95 patients treated in the Family Planning Clinic of UNIFESP (Federal University of São Paulo). The control group (Condom group) consisted of patients using condom as their exclusive contraceptive method during the last 12 months, and the study groups consisted of patients using low-dose oral hormonal contraceptives, in the following way: OHC 3 group (three to six months of use), OHC 6 group (six to twelve months of use) and OHC 12 group (more than twelve months of use). Intraerythrocytic folate was determined by the ionic capture method. Analysis of variance and c2 test were used for statistical analysis.
RESULTS: the Condom group showed a rate of 44% of patients with folate lower than 186.0 ng/mL and the users of low-dose oral contraceptives showed a rate of 32% (OHC 3 group), 16% (OHC 6 group) and 31% (OHC 12 group). We did not find in the group using low-dose oral contraceptives a significant reduction in the average level of intraerythrocytic folate compared to the control group and there was no statistically significant difference (p=0.28) regarding time of use.
CONCLUSION: we observed reduced levels of intraerythrocytic folate in a significant number (44%) of patients not using low-dose oral hormonal contraceptives. Their rates were similar to the lower limit considered to be normal by most authors, which points to a basal folate deficiency in the studied group. We did not observe any alteration in the level of intraerythrocytic folate in patients using low-dose oral hormonal contraceptives.
Keywords: Contraceptives. Condom. Intraerythrocytic folate.
Introdução
Os folatos são coenzimas necessárias para a multiplicação celular, participando da síntese das purinas e pirimidinas na replicação do DNA, do ciclo homocisteína-metionina e do metabolismo dos aminoácidos glicina, serina e histidina, além do metabolismo das aminas¹.
Entre as deficiências vitamínicas, a dos folatos é a mais comum entre as mulheres norte-americanas, causando alterações hematológicas em 15 a 30% das gestantes. Em estudo realizado na cidade de São Paulo observou-se que 12,2% das gestantes eram deficientes em folatos e 6,5% apresentavam anemia associada a esta deficiência. Ressalta-se, ainda, que a causa mais comum da redução dos níveis de folato é a baixa ingestão desta vitamina².
Os seres humanos não são capazes de sintetizar folatos, o que os torna dependentes das fontes alimentares3,4. O aporte adequado de folatos pode ser feito pela ingestão de vegetais frescos, frutas cítricas, fígado, feijão, nozes, pão integral e leguminosas, pela suplementação vitamínica ou pela ingestão de alimentos enriquecidos com ácido fólico, tais como farináceos5.
As concentrações teciduais de folato refletem mais fielmente as suas reservas do que os níveis séricos. A dosagem de folato sérico representa a ingesta deste elemento na última semana (ingestão recente), enquanto que o folato intra-eritrocitário representa a real concentração tecidual (ingestão crônica)6. O único tecido utilizado na prática para a dosagem de folatos é o sangue, mais precisamente os eritrócitos, que são menos sujeitos a flutuações de suas taxas7. Os folatos são incorporados aos eritrócitos durante a eritropoese, refletindo com maior precisão o estado corpóreo das reservas de folato8.
A influência dos contraceptivos hormonais orais (ACHO) no metabolismo dos folatos é assunto bastante controverso e tema de estudos desde a década de 60. Shojania et al.9 foram os primeiros a relatar a deficiência de folatos séricos e intra-eritrocitários em usuárias de contraceptivos hormonais orais. Mostraram, ainda, que estas alterações desaparecem logo após a suspensão do método.
Os ACHO podem reduzir os níveis de folato sérico e intra-eritrocitário por meio de interferência na absorção do folato contido nos alimentos, aumento da sua excreção urinária e indução de enzimas hepáticas (aumento da metabolização), além do aumento das proteínas séricas ligadoras de folatos. A inibição da conjugase intestinal reduz a absorção dos folatos poliglutâmicos da dieta em aproximadamente 50%, porém não altera a absorção dos folatos monoglutâmicos10.
Sabe-se que o uso de ACHO durante os três meses que antecedem a gestação aumenta o risco de defeitos de fechamento do tubo neural (DFTN), fendas faciais e anomalias cromossômicas11. Verificou-se que o uso periconcepcional de multivitamínicos com ácido fólico reduz o risco de lábio leporino com ou sem fenda palatina12, defeitos cardíacos e dos membros13 e estenose hipertrófica de piloro14.
Não é conhecida a relação entre o tipo e a dosagem hormonal utilizados nos contraceptivos e seus efeitos nas reservas intra-eritrocitárias de folatos, uma vez que os estudos mais amplos disponíveis envolveram doses elevadas de etinilestradiol15.
O nível de folato intra-eritrocitário considerado normal em adultos varia de 160 a 640 ng/mL, considerando-se deficiente quando inferior a 140 ng/ml. Durante a gestação, consideram-se normais os valores de 200 a 800 ng/mL para as mães e de 400 a 1350 ng/mL para o feto16.
Alguns estudos17 mostram que o risco para DFTN em gestantes com folato intra-eritrocitário entre 200 a 299 ng/mL na época do fechamento do tubo neural é três vezes maior e quando estes níveis estão abaixo de 150 ng/mL o risco é oito vezes maior comparado a gestantes com folato intra-eritrocitário acima de 400 ng/mL.
Para mulheres que interromperam o uso de ACHO nos últimos três meses antes de engravidar ou que continuaram a sua utilização durante o início da gestação, o risco para DFTN é de 1,18 quando comparado com mulheres que nunca tomaram contraceptivos orais18.
Para preservar a saúde do binômio mãe-feto, no contexto da Saúde Pública, a investigação sobre os efeitos dos ACHO contendo baixas doses de etinilestradiol nas taxas de folato intra-eritrocitário deve ser valorizada, pois persistem questionamentos importantes para uma adequada orientação sobre a prevenção de anomalias fetais associadas às deficiências nutricionais e exposição a medicamentos. O presente estudo teve como objetivo estudar os efeitos dos contraceptivos hormonais orais de baixa dosagem estrogênica (<30 mg), ou seja, das modernas pílulas anticoncepcionais, sobre as reservas intra-eritrocitárias de folato.
Pacientes e Métodos
Este foi um estudo prospectivo transversal aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa da Escola Paulista de Medicina UNIFESP, que incluiu 95 pacientes divididas em quatro grupos. O grupo controle (grupo Condom foi constituído por pacientes que optaram pelo uso do condom como método contraceptivo exclusivo nos últimos doze meses, sem que possuíssem qualquer problema clínico ou contra-indicação para o uso de contraceptivos hormonais. Os demais grupos eram compostos por pacientes que usavam ACHO de baixa dosagem (<30 mg de etinilestradiol) por um período de três a seis meses (grupo ACHO 3), seis a doze meses (grupo ACHO 6) e mais de doze meses (grupo ACHO 12). Todas as pacientes eram acompanhadas no Setor de Planejamento Familiar da Disciplina de Obstetrícia/EPM-UNIFESP. A participação no presente estudo foi voluntária, realizando-se a coleta de amostra de sangue venoso periférico (5 mL) no período da manhã, após minuciosa explicação sobre o estudo e conseqüente assinatura do consentimento informado.
Foram incluídas no estudo apenas usuárias de ACHO de baixa dosagem estrogênica (<30 mg de etinilestradiol) ou condom como método contraceptivo exclusivo, com idade de 18 a 28 anos. O tipo de progesterona (desogestrel, gestodeno ou levonorgestrel) contido na pílula não foi considerado como critério discriminativo. As pacientes não foram classificadas de acordo com o índice de massa corporal, raça, paridade ou antecedente de filho com malformação congênita.
Os critérios de exclusão foram: pacientes com hipermenorragia ou hipermenorréia, anemia (Hb <10,5 g/dL), usuárias de DIU, portadoras de doenças hematológicas, endocrinopatias, doenças auto-imunes, coagulopatias, curto intervalo após o último parto (<2 anos), usuárias de outras medicações, tabagistas e etilistas.
A dosagem de folatos intra-eritrocitários foi feita pelo método de captura iônica na Seção de Hematologia, Divisão de Patologia do Instituto Adolfo Lutz da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. O ensaio IMX Folatos (Abbott) utiliza reagente de afinidade solúvel composto por uma proteína de ligação aos folatos (FBP) ligada a anticorpos monoclonais, que por sua vez têm uma ligação covalente com a carboximetilamilose. Os complexos de analitos com carga negativa são formados durante o ensaio IMX Folatos pela ligação entre os folatos e o reagente de afinidade solúvel. Os complexos de analitos de carga negativa resultantes são então capturados por meio da interação eletrostática com a matriz de carga positiva. Os folatos são quantificados medindo a quantidade de locais de união da FBP ligados a matriz que não foram ocupados pelo analito utilizando um conjugado de ácido pteróico (um análogo dos folatos) e fosfatase alcalina como molécula geradora do sinal. A matriz é lavada de forma a remover o conjugado não ligado. O substrato 4-metilumbeliferil-fosfato é adicionado à matriz e o produto fluorescente é medido pelo conjunto óptico MEIA.
A tecnologia MEIA (enzimaimunoensaio por micropartículas) tem como princípio o uso de micropartículas sensibilizadas com anticorpos ou antígenos (dependendo da finalidade do produto), sendo sua técnica utilizada para testes qualitativos e quantitativos. O fato de esta nova tecnologia utilizar micropartículas como fase sólida aumenta a sensibilidade e a especificidade do método e diminui o seu tempo de incubação. Isto se deve ao número de sítios de ligações de um teste por micropartículas ser de 4000 a 10000 vezes maior do que o EIA (enzimaimunoensaio) tradicional.
A análise estatística baseou-se na análise de variantes múltiplas e teste t de Student, com um poder de amostragem superior a 0,80 e nível de significância em p<0,05 (nível de rejeição de hipótese). Os grupos ACHO 3, ACHO 6 e ACHO 12 foram comparados entre si e com o grupo controle (grupo Condom).
Os resultados obtidos também foram comparados com um estudo16 envolvendo 118 indivíduos saudáveis, que encontrou concentração média de folatos intra-eritrocitários de 297,5 ng/mL, com intervalo de 111,6 a 761,5 ng/mL. Utilizando análise não-paramétrica, verificamos que 95% da população apresentava resultados de 148,8 a 645,4 ng/mL, definindo como limite inferior da faixa de normalidade o valor de 186 ng/mL.
Resultados
A dosagem das taxas de folato intra-eritrocitário das 95 pacientes estudadas revelou que 69,5% destas apresentavam níveis de folato intra-eritrocitário acima do limite inferior da normalidade (>186 ng/mL), ao passo que em 30,5% dos casos encontraram-se níveis de folato inferiores ao normal.
A população utilizada como controle (grupo Condom), composta por pacientes que optaram pelo uso do condom como método contraceptivo exclusivo nos últimos doze meses, apresentou 44% de pacientes com folato intra-eritrocitário reduzido (<186,0 ng/mL), ao passo que nos grupos de estudo, compostos por pacientes que usavam ACHO de baixa dosagem estrogênica (<30 mg de etinilestradiol) por um período de três a seis meses (grupo ACHO 3), seis a doze meses (grupo ACHO 6) e mais de doze meses (grupo ACHO 12), este índice foi de 32, 16 e 31%, respectivamente. Contrariando estudos anteriores6,7 sobre a influência dos ACHO sobre as taxas de folato intra-eritrocitário, não se encontrou nas usuárias de ACHO de baixa dosagem estrogênica uma redução na média das taxas de folato intra-eritrocitário (Tabelas 1, 2).
A Tabela 3 mostra a distribuição de pacientes com valores de folato intra-eritrocitário inferiores ao normal. Observa-se que o grupo Condom apresenta 38% das 29 pacientes com taxas reduzidas de folato intra-eritrocitário encontradas durante o estudo. Do total de pacientes estudadas, 83% apresentaram valores abaixo de 299 ng/mL.
Discussão
Os primeiros relatos da deficiência de folatos séricos e intra-eritrocitários em usuárias de ACHO surgiram na década de sessenta. Mostraram, também, que estas alterações desaparecem logo após a suspensão do contraceptivo e são de ocorrência rara. De acordo com os primeiros estudos9,18, os contraceptivos orais interferem na absorção e metabolismo dos folatos.
Em um estudoenvolvendo 118 indivíduos saudáveis16, encontrou-se concentração média de folatos intra-eritrocitários de 297,5 ng/mL, com intervalo de 111,6 a 761,5 ng/mL. Utilizando análise não-paramétrica, estes autores verificaram que 95% da população apresentava resultados de 148,8 a 645,4 ng/mL, definindo como limite inferior da faixa de normalidade o valor de 186 ng/mL.
Estudo recente envolvendo o uso de ACHO contendo baixas doses de etinilestradiol (<30 mg) mostrou que pode haver minimização da redução de folatos com esta dosagem do componente estrogênico3. Nossos resultados não mostraram redução nas taxas de folato intra-eritrocitário de usuárias de ACHO de baixa dosagem estrogênica ao serem compararadas com aquelas observadas no grupo Condom, mesmo após 12 meses de uso das pílulas. Paralelamente, observaram-se níveisreduzidos (<186,0 ng/mL) de folato intra-eritrocitário em 44% das pacientes do grupo Condom, sendo a média dos valores deste grupo de 243,9 ng/mL. Isto nos alerta para a presença de deficiência basal de folatos na população estudada, seja por um componente nutricional isolado ou associado ao fator genético, podendo ter sido suficiente para mascarar o efeito intrínseco do uso dos ACHO de baixa dosagem sobre o metabolismo e reserva de folatos.
Não se encontrou nos grupos de usuárias de ACHO de baixa dosagem estrogênica deficiência nas taxas de folato intra-eritrocitário maior que no grupo controle (grupo Condom), o que se traduz em ausência de inibição significativa da atividade da enzima conjugase intestinal com o uso de doses reduzidas do componente estrogênico nas pílulas, contrariando estudos10,19 que avaliaram usuárias de pílulas com maior dosagem estrogênica (>30 mg).
Nosso estudo revelou dados importantes sobre os reduzidos níveis de folato na população investigada, mostrando que 83% das pacientes apresentam taxas de folato intra-eritrocitário inferiores a 299,0 ng/mL, colocando esta população em um grupo de risco três vezes maior para DFTN quando se compara com pacientes que apresentam níveis de folato intra-eritrocitário superiores a 400 ng/ml17.
Comparando-se os grupos de usuárias de ACHO de baixa dosagem estrogênica (grupos ACHO 3, ACHO 6 e ACHO 12) em função do tempo de uso do método com o grupo controle (grupo Condom), não se observou diferença estatisticamente significativa nas taxas de folato intra-eritrocitário, podendo esta dose reduzida do componente estrogênico ser incapaz de interferir na absorção do folato da dieta, na sua excreção urinária e metabolização hepática ou na indução do aumento da síntese das proteínas ligadoras de folatos.
Alguns autores10 tentam justificar a queda dos níveis de folato intra-eritrocitário em usuárias de ACHO como sendo devida a uma restrição global da ingestão de alimentos visando evitar o ganho de peso inerente ao uso de hormônios esteróides. Porém, as modernas pílulas com dosagens estrogênicas mínimas e derivados progestagênicos de última geração (gestodeno e desogestrel) não apresentam os efeitos de retenção hídrica e conseqüente ganho ponderal, portanto deixando de constituir fator que impulsione a mudança do padrão alimentar das usuárias, podendo-se manter a ingestão habitual de folatos na dieta.
Recebido em: 7/7/2003
Aceito com modificações em: 15/8/2003
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
04 Nov 2003 -
Data do Fascículo
Ago 2003
Histórico
-
Recebido
07 Jul 2003 -
Aceito
15 Ago 2003