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A experiência com contraceptivos no Brasil: uma questão de geração

Resumos

Através da memória de duas gerações de mulheres, este texto pretende focalizar a maneira como foi vivida no Brasil a experiência com métodos contraceptivos, e a grande mudança que ocorreu, a partir dos anos 60, com o início do comércio das pílulas anticoncepcionais. Pretendo também fazer comparações com o mesmo acontecimento ocorrido na França.

memória; mulheres; contraceptivos


Through the recollection of two women's generation, this text intends to focus on how the contraceptive method experience was lived in Brazil and the great shift, which occurred from the sixties, with the launching of the contraceptive pills trade. I also intend to compare to the same happenings in France.

memory; women; contraceptives


ARTIGOS

A experiência com contraceptivos no Brasil: uma questão de geração

Joana Maria Pedro

Universidade Federal de Santa Catarina

RESUMO

Através da memória de duas gerações de mulheres, este texto pretende focalizar a maneira como foi vivida no Brasil a experiência com métodos contraceptivos, e a grande mudança que ocorreu, a partir dos anos 60, com o início do comércio das pílulas anticoncepcionais. Pretendo também fazer comparações com o mesmo acontecimento ocorrido na França.

Palavras-chave: memória; mulheres; contraceptivos.

ABSTRACT

Through the recollection of two women's generation, this text intends to focus on how the contraceptive method experience was lived in Brazil and the great shift, which occurred from the sixties, with the launching of the contraceptive pills trade. I also intend to compare to the same happenings in France.

Keywords: memory; women; contraceptives.

A memória das mulheres de duas gerações1 1 Estas memórias foram coletadas como parte das fontes que compunham as pesquisas: "Autonomia e Criminalização: O controle do corpo feminino. (1900-1950)" e "A medicalização da contracepção: conhecimento e autonomia (1960-1980)", ambas financiadas pelo CNPq. — as nascidas nas décadas de 20 e 30, que estarei chamando de "geração 20-30", e as nascidas nas décadas de 40 e 50, que chamarei de "geração pílula" — possibilita explicar de que maneira foi vivida, no privado, uma questão eminentemente política — as políticas de planejamento populacional vinculadas à guerra fria. Ou seja, de que maneira questões de política internacional repercutiram no dia-a-dia das pessoas. Estou considerando que era de sexo e de corpo feminino que se estava falando, quando acordos internacionais exigiam a redução da natalidade de países de terceiro mundo, como o Brasil. Era também de sexo que se falava, quando a Igreja Católica publicava documentos como a Humanae Vitae, decidindo pelos casais quais os métodos que estes poderiam utilizar para planejar o número de filhos que desejavam ter.

A memória das mulheres tem sido focalizada ultimamente de forma bastante intensa. A pesquisa histórica sobre o privado e a intimidade no cotidiano tem-se utilizado deste tipo de memória. Na década de 70, quando surgiu no Brasil, a História Oral2 2 Aspásia Camargo, em entrevista a Maria Celina D´Araújo, informa que a História Oral começou a ser utilizada, no Brasil, no CPDOC — Centro de Pesquisa e Documentação da Fundação Getúlio Vargas, em 1973, e que, em 1977, graças a financiamento fornecido pela Fundação Ford, desenvolveu-se um programa de História Oral por todo o País. Ver D'ARAÚJO Maria Celina, 1999, "Como a História Oral chegou no Brasil: entrevista com Aspásia Camargo". História Oral. N. 2, pp. 167-179. era empregada especialmente para "preencher lacunas",3 3 FENELON, Déa Ribeiro. "O papel da História Oral na Historiografia Moderna". In MEIHY, José Carlos Sebe Bom. (Re)Introduzindo a História Oral no Brasil. São Paulo: Xamã, 1996, pp.22-32. ou então para obter informações sobre os acontecimentos da esfera pública4 4 MEIHY, José Carlos Sebe Bom. (Re)Introduzindo a História Oral no Brasil.. São Paulo: Xamã, 1996. . Recorria-se principalmente à memória masculina. O argumento era de que as mulheres não eram conhecedoras dos acontecimentos desta esfera, por não transitarem nela. A perspectiva de uma história que buscava "o que realmente aconteceu" exigia que o depoimento fosse fornecido por quem estivesse presente nos acontecimentos. A partir dos anos 80, o fazer historiográfico no Brasil passou a comportar discussões que focalizavam "as diferenças, multiplicidades e diversidades"5 5 FENELON, D. Op. cit. . Esta perspectiva passou a utilizar cada vez mais o depoimento das mulheres como fontes para a História. Além disso, por estarem mais ligadas ao privado e à intimidade, era à sua memória que se recorria para focalizar aquilo que passou a se chamar História da Vida Privada.

Procurei tomar muitos cuidados ao inquirir a memória de nossas entrevistadas. Além dos riscos do esquecimento, o passado, nós sabemos, nunca é recuperado; o que se pode obter são interpretações desse passado, permeadas por vivências do presente e, muitas vezes, influenciadas pelas questões suscitadas por quem entrevista. Entendo ainda que aquilo que essas mulheres individualmente me narraram fez parte da vida de inúmeras mulheres de camadas urbanas brasileiras, nascidas nas décadas de 20-30 e de 40 e 50.

As questões da memória feminina já foram amplamente debatidas. As discussões de Michelle Perrot apontam a especificidade da memória feminina relacionada aos mil nadas: vestidos, bibelôs, lembranças de viagem, objetos que povoam a cristaleira, reencenam o passado. Estas, de acordo com ela, são formas de as mulheres prenderem o tempo, de fazê-lo retornar através da rememoração6 6 PERROT, Michelle. "Práticas da memória feminina". In Revista Brasileira de História. São Paulo, v.9, n. 18, pp. 9-18, ago./set. 1989. . Nesta pesquisa, o recurso à memória feminina não se explica por ser esta a guardiã privilegiada da memória da intimidade. Tanto a intimidade quanto os acontecimentos da esfera pública fazem parte da sua memória7 7 FLORES, Maria Bernardete Ramos. "Entre a casa e a rua... memória feminina das festas açorianas no sul do Brasil". In Cadernos Pagu. Campinas, (4), 1995, pp. 117-142. ; recorri a ela porque a pesquisa pretende investigar a experiência feminina de práticas contraceptivas.

Pela memória das mulheres é possível observar de perto, ou melhor, na vivência do dia-a-dia, aquilo que ficou explícito em dados estatísticos: a sensível queda da natalidade ocorrida no Brasil a partir de 1960. Desta forma, aquilo que não passaria de números estéreis, que nada dizem da existência, pode ser observado através da memória das mulheres, transmitida por meio de testemunhos orais. Aquilo que poderia configurar-se como algo a ser lamentado — como, por exemplo, o número de mulheres que se submeteram à laqueadura —, pode ser nuançado por seus depoimentos, explicando o porquê da decisão pela esterilização.

Além disso, por intermédio dos depoimentos é possível perceber como foi importante a posição da Igreja Católica para uma geração anterior àquela do surgimento dos novos contraceptivos hormonais, e como as mulheres da "geração pílula" resolveram o impasse que tanto afligia a geração de suas mães e avós. Os depoimentos permitem saber como as mulheres obtiveram informações a respeito dos novos contraceptivos hormonais, e ainda observar, não necessariamente, como foi vivido, ou pelo menos como diferentes gerações de mulheres constroem uma narrativa de suas vidas, de suas experiências.

Estarei ainda procurando permear estas análises com comparações entre a maneira como as pílulas anticoncepcionais passaram a ser usadas no Brasil, e o mesmo processo que ocorreu na França. Deste modo, estarei observando, através da memória, não só a generalidade da vivência de diferentes gerações de mulheres, mas a especificidade desta experiência que, se por um lado atingiu a sociedade como um todo, foi vivida de maneira diversa por diferentes mulheres.

CONTEXTO: AS POLÍTICAS POPULACIONAIS

No Brasil — assim como nos países do terceiro mundo —, a divulgação dos métodos contraceptivos modernos, entre estes o das pílulas anticoncepcionais, fez parte de políticas internacionais voltadas para a redução da população. Isto foi muito diferente do que ocorreu com mulheres de países europeus, cujas políticas natalistas tinham adquirido muita força após as guerras mundiais. Assim, enquanto em lugares como a França a pílula somente foi liberada para consumo em 1967, no Brasil a pílula anticoncepcional e o DIU foram comercializados sem entraves desde o início da década de 60.

As notícias sobre o novo contraceptivo — considerado mais eficaz que os anteriores — vieram acompanhadas, no Brasil, de dados alarmantes sobre o perigo de superpopulação no mundo. Assim, em abril de 1960, a revista Seleções, num artigo intitulado "Gente Demais! Que Fazer?", informava que dali a 40 anos, ou seja, no ano 2000, o mundo teria 8 bilhões de pessoas e, dessas, 70% seriam afro-asiáticas. A razão disso, informavam, era a redução da mortalidade infantil, bem como o aumento da longevidade. No mesmo artigo eram anunciadas as experiências dos doutores Gregory Pincus e John Rock, os quais desde 1956 estavam experimentando os contraceptivos hormonais em mulheres do Haiti e de Porto Rico, chamados no artigo da revista de "campos de prova". Dizia também que o medicamento era muito recente para se poder assegurar qualquer promessa de eficácia; que ainda era muito caro e que se registraram, nas mulheres que o experimentaram, queixas de "efeitos secundários desagradáveis como náusea, dor de cabeça e tonturas". Entretanto — afirmava o autor —, diante do perigo do crescimento demográfico, "até mesmo um recurso anticoncepcional que não seja infalível poderá ter virtualmente importância nos países que mais crescem demograficamente"8 8 COUGHLAN, Robert. "Gente demais! Que fazer"? In Seleções do Reader's Digest. nº 219, abril 1960, pp. 46-51. Surgida em fevereiro de 1922, a revista Seleções do Reader's Digest gabava-se de atingir mais de 100 milhões de pessoas e de ser "verdadeiramente internacional", sendo escrita em 13 idiomas. Além disso, afirmava ter "permanentemente denunciado os males do comunismo e retratado as vantagens do sistema de economia livre". No Brasil, esta revista passou a circular, em português, em fevereiro de 1942, em plena Segunda Guerra Mundial, divulgando a participação dos Estados Unidos no conflito. Depois, passou a trazer inúmeros artigos a respeito da guerra-fria. Divulgava em linguagem simples os mais diversos assuntos: política, medicina, literatura, comportamento. . O Brasil foi, nesse contexto, classificado entre os que estavam ameaçando a superpopulação do mundo9 9 O Brasil contava, em 2001, com 169,8 milhões de habitantes, uma densidade populacional de 20hab/km2, com uma taxa de 2,2 filhos por mulher e com um ritmo de crescimento de 1,64% ao ano. Estes números estão significando 2,8% dos habitantes do planeta que, atualmente, somam 6,1 bilhões de pessoas. Na França, o número de filhos por mulher é de 1,75, uma das taxas de fecundidade mais altas da Europa; a densidade demográfica é de 109hab./km2. Na Europa, o balanço demográfico publicado pelo INSEE, em 4 de fevereiro de 1999, apresenta a Itália com 1,22 a Espanha com 1,15 e a média européia com 1,44. BAULIEU, Étienne-Émile, HÉRITIER, Françoise et LERIDON, Henri . Contraception: contrainte ou liberté. Paris: Éditions Odile Jacob, 1999, p. 131. . Como explicar este tipo de argumento demográfico no Brasil?

O investimento no controle da natalidade no Brasil, e em outros países da América Latina, teve relação direta com a Revolução Cubana de 1959. A partir daí, a política norte-americana passou a considerar a América Latina como um "continente explosivo", um campo fértil para a agitação comunista. Começaram a ser criadas, então, organizações de ajuda aos latino-americanos. Estas ajudas traziam como exigência a adoção de programas e estratégias de redução do crescimento populacional. Em 1961, por exemplo, a Conferência da OEA, que criou a Aliança para o Progresso, foi a mesma que expulsou Cuba daquele organismo. O entendimento era de que o crescimento rápido da população latino-americana, e sua conseqüente pobreza, seriam fortes aliados da revolução comunista. Deste modo, o perigo representado por uma questão política foi transformado no da "bomba demográfica"10 10 FONSECA SOBRINHO, Délcio da. Estado e população: uma história do planejamento familiar no Brasil. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos; FNUAP, 1993, pp. 81-95. .

Nas décadas de sessenta e setenta, em vez de revoluções comunistas, o Brasil e diversos países da América Latina tiveram a implantação de várias ditaduras militares. Estas impediram manifestações, definiram um percurso histórico na direção da sociedade capitalista, e receberam pressões de organismos internacionais para a adoção de políticas antinatalistas.

Entretanto a política internacional, voltada para a redução da população — principalmente dos países pobres —, encontrou no governo brasileiro durante a vigência do regime militar, além de ambigüidade, um debate que não conheceu consenso. De um lado havia os "antinatalistas"; de outro, os "anticontrolistas". Os primeiros reivindicavam um projeto de desenvolvimento para o País, dentre cujas exigências encontrava-se a redução da natalidade como parâmetro de país desenvolvido. Além disso, havia o argumento de que, com o crescimento demográfico então observado, a economia teria dificuldades em manter altas taxas de crescimento capazes de darem conta da demanda exigida.11 11 BARBOSA, Regina Maria. Mulher e contracepção: entre o técnico e o político. Rio de Janeiro, UERJ, 1989, 233pp. Dissertação (Mestrado em Medicina Social), Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 1989. Por outro lado, os anticontrolistas, com a teoria geopolítica de "ocupação de espaços vazios", encontravam entre os militares nacionalistas fortes aliados. Estes argumentavam que a soberania nacional dependia da presença de brasileiros em todas as regiões do País12 12 FONSECA SOBRINHO, D. Op. cit., p. 135. . Aos anticontrolistas no Brasil, muitas vezes aliaram-se vários setores da Igreja Católica, e até mesmo grupos feministas.

Embora não tenha partido do Estado brasileiro qualquer iniciativa explicitamente controlista13 13 Somente em 1977 foi criado no Ministério da Saúde o PPGAR — Programa de Prevenção da Gravidez de Alto Risco, o qual já vinha sendo, desde 1975, divulgado pela imprensa. Este programa, entretanto, não chegou a ser efetivado: foi acusado, pelas feministas e pela Igreja Católica, de promover o controle da natalidade. Ver FONSECA SOBRINHO, D. Op. cit., pp. 150-153. , atuaram no País sociedades civis internacionais, principalmente nas camadas populares. Foi o caso da IPPF — International Planning Parenthood Federation, que viria a financiar, a partir de 1965, a BEMFAM — Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil14 14 Ver FONSECA SOBRINHO, D. Op. cit., e BARBOSA, R. M. Op. cit. .

O comércio da pílula anticoncepcional teve início no Brasil em 196215 15 Ver o artigo " A velha pílula", Jornal do Brasil, em 12/5/1972. , dois anos após ter sido aprovada nos Estados Unidos pelo FDA — Food and Drug Administration — a pílula chamada ENOVID, produzida pelo laboratório Searle. Os jornais e revistas voltados para o público feminino publicaram alguns artigos informando sobre suas potencialidades; porém, muito da divulgação foi realizado por representantes comerciais que atuaram junto aos médicos. Convém destacar que foi em instituições estrangeiras que os médicos buscaram, já na década de 50, conhecimentos sobre a contracepção, a qual até a década de 60 não era ensinada nas faculdades de medicina brasileiras. Foi entretanto, a partir de 1966, que as revistas médicas brasileiras começaram a difundir, para os ginecologistas e obstetras, as pesquisas e estudos já realizados por médicos tanto brasileiros quanto estrangeiros. Contudo, desde 1962 eram feitas pesquisas isoladas, visando a prestar informações sobre anticoncepcionais para mulheres de camadas populares, com recursos da International Planned Parenthood Federation, em várias cidades brasileiras16 16 BRASIL, José Anselmo Nunes. "Métodos anticoncepcionais para ginecologistas e obstetras". In SCAVONE, Lucila e BATISTA, Luís Eduardo. Pesquisas de gênero: entre o público e o privado. Faculdade de Ciências e Letras, Laboratório Editorial, 2000, pp.108-109. .

As mulheres de camadas médias brasileiras aderiram ao consumo da pílula, representando um mercado em crescimento acelerado. Em 1970, 6,8 milhões de cartelas de pílulas anticoncepcionais foram vendidas e, em 1980, este número subiu para 40,9 milhões.17 17 BARBOSA, R. M. Op. cit., pp. 23-24. Muito deste consumo foi certamente de mulheres das camadas médias, já que as das camadas populares poderiam obtê-las, de forma gratuita, através de organismos como a BEMFAM — Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil.

Convém lembrar que os argumentos que acompanharam a entrada das pílulas anticoncepcionais no mercado francês não foram os mesmos usados no Brasil. Na França, apesar da referência à superpopulação e ao "baby-boom" do pós-guerra, a ênfase da argumentação foi centrada na afirmação de que o país vinha, há muito tempo, tendo um comportamento de redução do número de filhos, e de que, portanto, os novos métodos não trariam qualquer mudança na perspectiva que já vinha se configurando. Era necessário, então, combater a política natalista que vinha sendo adotada desde o final da Primeira Guerra Mundial18 18 Ver BERGUES, Héléne et ARIÈS, Philippe et alli. La prevéntion des naissances dans la famille. Ses origines dans les temps modernes. Paris: Presses Universitaires de France, 1960, e MICHEL, Andrée et TEXIER, Geneviève. La condition de la française d'aujourd'hui. V. I et II, Genève (Suisse), Éditions Gonthier, 1964. . Em 1956 foi criada uma associação chamada "Maternité Heureuse", que pretendia promover o planejamento familiar e se diferenciar dos antigos neomalthusianos19 19 CHAPERON, Sylvie. Les années Beauvoir 1945-1970. Paris: Fayard, 2000, p. 242. . Em 1958, a "Maternité Heureuse", coordenada pela médica Marie-Andrée Lagroua Weill-Hallé, associou-se à IPPF — International Planned Parenthood Federation, a mesma que no Brasil financiava a BEMFAM20 20 MORE, Caroline. Les debuts du planning familial à Grenoble 1961-1967. Mémoire de Maîtrise. Université Grenoble II. UFR Sciences Humaines. Département Histoire, Septembre 2000, p. 25. . Esta situação foi, por conseguinte, muito diferente daquela que estimulava a utilização de meios contraceptivos em países como o Brasil.

Para as mulheres que viviam em países nos quais a cidadania era respeitada minimamente, como na França, o período que se iniciou em 1960 apresentou repercussões e mudanças que provocaram intensas transformações nas relações de gênero. Uma parcela destas transformações teve como pano de fundo a disponibilidade dos contraceptivos modernos, que separaram, de forma mais eficiente do que em qualquer outro período da história, a sexualidade da reprodução. No Brasil, este momento foi vivido como expansão de "campo de prova", como preocupação com a expansão da população pobre, e também com o perigo subversivo que esta pobreza poderia trazer.

A AMOSTRA

Ao me confessar, dizia ao padre que tinha "tirado" (coitus interruptus), nós usávamos o método do ritmo que era aprovado pela Igreja, e no período fértil usava "tirar", este então dizia-me que não me daria a absolvição, o que significava que não poderia comungar enquanto não parasse de usar este método. Eu então saía chorando da igreja e, em casa, discutia com meu marido. A partir de então, deixávamos de "tirar", eu voltava no outro domingo e comungava. Foi assim que tive cinco dos seis filhos que tenho. (Sebastiana, geração 20-30)21 21 Sebastiana (nascida em 1929, casada em 1948), entrevistada em 20/8/1995, em Florianópolis, por Joana Maria Pedro.

Eu ia experimentando tudo quanto era pílula. Mas eu não me adaptei. E eu tive um processo de engorda muito grande. Eu engordei demais. Não queria tomar, mas não queria ter filhos, então a gente...[...]. (Sueli, geração pílula)22 22 Sueli (nascida em 1946, casada em 1974), em Itajaí/UNIVALI, entrevistada em 10/2/2000 por Joana Maria Pedro.

Estes são alguns dos testemunhos orais que coletei por intermédio de entrevistas com duas gerações de mulheres. Estas entrevistas compõem um conjunto de fontes que formei em duas pesquisas focalizando as questões do aborto e da contracepção23 23 Estas pesquisas são: "Autonomia e Criminalização: O controle do corpo feminino. (1900-1950)" e "A medicalização da contracepção: conhecimento e autonomia (1960-1980)", financiadas pelo CNPq. . Por meio destas pesquisas tenho investigado a transmissão, através das gerações, de variadas práticas abortivas e contraceptivas, e a maneira como foi vivida pelas mulheres a experiência da entrada no Brasil dos novos contraceptivos hormonais, promovendo uma grande queda na natalidade.

Trata-se de duas gerações de mulheres, em sua maioria oriundas das camadas médias. Elas possuem posições muito diferenciadas, expressadas nas narrativas que fizeram das estratégias que utilizaram para viver os desafios de sua época.

As mulheres que estou chamando de "geração 20-30" nasceram entre 1920 e 1939 e foram entrevistadas entre 1995 e 1997, por ocasião de uma pesquisa sobre práticas abortivas. Desejava saber como as práticas costumeiras de aborto estavam sendo transmitidas. Foram realizadas 11 entrevistas. Todas as mulheres eram moradoras de Florianópolis, muitas pertencentes às camadas médias, mas duas pertenciam às camadas populares. Nessas entrevistas, perguntei se haviam, em algum momento da vida, utilizado métodos para fazer "vir a menstruação"24 24 Eufemismo para práticas abortivas. quando esta faltava.

Tive algumas dificuldades em obter as informações, mas aos poucos elas foram narrando práticas costumeiras, transmitidas entre mulheres casadas e já com alguns filhos. A idade — mais de 65 anos —, tornou difícil a aproximação com estudantes muito jovens. Em vista disso, procurei realizar, eu mesma, várias das entrevistas. Nestas, fui acompanhada por minha mãe, que na época tinha a mesma idade das entrevistadas, e fazia parte de sua rede de amizades, facilitando o contato. Nas entrevistas, minha mãe iniciava a conversa, contando como ela mesma tentara, em diversas ocasiões, utilizar técnicas que fariam "vir a menstruação". Nesta troca de confidências, as mulheres descreviam suas práticas, sentindo-se confiantes de que, se a mãe da entrevistadora era capaz de fazer este tipo de narrativa, elas também poderiam25 25 Convém destacar que, até os dias de hoje, as práticas abortivas são criminalizadas pela legislação brasileira. Relatei esta experiência com a entrevista em PEDRO, Joana Maria. "Memórias do corpo" 1º Seminário Docência, Memória e Gênero. São Paulo, FEUSP, Ed. Plêiade, pp. 303-312. .

As mulheres que estou chamando de "geração pílula" nasceram entre 1940 e 1959 e foram entrevistadas entre 1999 e 2000, por ocasião da pesquisa sobre a experiência das mulheres com os contraceptivos hormonais. Foram realizadas 150 entrevistas com mulheres das camadas médias. As focalizadas são funcionárias e professoras das instituições de ensino superior do Estado de Santa Catarina26 26 Entrevistamos as mulheres da UNOESC na cidade de Chapecó; da UNIVALI, em Itajaí; da UNIVILLE, em Joinville; da FURB, em Blumenau; da UNISUL, em Tubarão; da UNIPLAC, em Lages; e da UFSC e UDESC, na cidade de Florianópolis. . Considero-as como pertencentes às camadas médias, em vista das exigências do ambiente em que estão inseridas, do seu rendimento e do nível de instrução exigido para este tipo de trabalho. A amostragem foi composta por cerca de 10% das funcionárias e professoras dessas instituições de ensino. Nessas instituições, contei com a colaboração de pessoas que me forneceram listas das funcionárias e professoras que se enquadravam na faixa etária desta amostra, facilitando os contatos. Além disso, proporcionaram-me infra-estrutura de apoio27 27 As entrevistas foram realizadas por mim e pelas bolsistas de iniciação científica: Janine Petersen, Josilene Silva e Lenita Farias Raad. .

Em cada uma dessas cidades e instituições de ensino, eu e minha mãe fomos recebidas inicialmente por pessoas que possuíam prestígio institucional. Obtivemos as entrevistas durante o horário de trabalho; portanto, precisávamos de autorização para que elas interrompessem o que estavam fazendo e nos atendessem. Em vista do ambiente onde era realizada, a entrevista não podia ser muito longa; informávamos, então, que duraria em torno de 15 minutos. Algumas, entretanto, duraram mais.

Estas entrevistas foram, em sua grande maioria, gravadas (só duas entrevistadas não permitiram a gravação). Apresentávamos a elas o roteiro de perguntas, um termo de doação de sua entrevista para ser assinado e, a seguir, iniciávamos a gravação.

Nas entrevistas procurávamos obter três tipos de informação: a) a forma como viveram a experiência do uso de contraceptivos, principalmente os orais, explicitando os benefícios e efeitos colaterais que elas relacionavam com o uso deste medicamento; b) a forma como obtiveram as informações; c) a influência da religião em suas decisões contraceptivas; d) o número de filhos de suas mães e avós.

Nem todas foram loquazes. Algumas foram lacônicas, responderam às nossas perguntas com monossílabos. Os limites do tempo e o local onde eram realizadas as entrevistas devem tê-las influenciado. Observamos, além disso, que a disposição em falar mais, ou menos, teve alguma relação com o perfil da entrevistadora. Pertencentes à mesma faixa etária que as entrevistadas, Lenita e eu28 28 Lenita tinha 40 anos e eu, 50, quando realizamos a maior parte das entrevistas. obtivemos mais detalhes. Espontaneamente, as mulheres deram-nos mais informações. Além de nos informar sobre o tempo de utilização das pílulas, os problemas, ou não, que tiveram, o número de filhos, os outros métodos que experimentaram, algumas nos contaram vários detalhes de suas vidas: como conheceram os maridos, suas relações com os familiares, as inúmeras consultas aos médicos, de como viram seus corpos se transformarem em função das pílulas, dos dramas das histerectomias, das gravidezes indesejadas, e até dos abortos que fizeram. Possivelmente identificaram-se conosco, mulheres como elas, de camadas médias e com idades semelhantes.

Outras entrevistadas, entretanto, não se sentiram muito bem: responderam, como já disse, laconicamente. Josilene e Janine, talvez por terem em torno de 20 anos, encontraram maior resistência em obter entrevistas mais detalhadas. As mulheres aparentemente tiveram um certo "pudor" de falar com mulheres tão jovens sobre suas experiências contraceptivas.

O que essas mulheres nos forneceram através das entrevistas foi uma memória do corpo e da intimidade. Corpos que, a partir dos anos sessenta, foram alvo de contracepção. A partir de nossas perguntas, elas nos falaram de menstruação, de pílulas, de exame pré-nupcial, de aborto, de nascimento dos filhos, de dores, de sofrimentos, de laqueaduras, de histerectomias, de menopausas. Foram nossas perguntas que fizeram as mulheres darem significado29 29 MALUF, Marina. Ruídos da memória. São Paulo: Siciliano, 1995, p. 83. àquilo que estou chamando de "memória da contracepção". Muitas se espantaram com nossas perguntas. Consideraram trivial, desimportante para a história o que ocorria individualmente com seus corpos.

Embora sejam relatos pessoais, individualizados, e cada narrativa, por suas especificidades, seja distinta das demais, obtivemos com as entrevistas uma "trama coletiva de existência social", mesmo reconhecendo que muitos depoimentos opõem-se a uma possível "memória coletiva"30 30 HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990. .

Assim, posso afirmar a partir dos testemunhos que obtive, que é possível constituir um certo perfil de geração: a "geração da pílula". Um perfil do trato que essas mulheres passaram a dar a seus corpos, para o significado que passaram a ter suas funções reprodutivas. Obviamente, é o historiador — e no caso, sou eu quem está classificando essas mulheres como pertencentes a uma geração31 31 SIRINELLI Jean-François. "A geração". In FERREIRA, Marieta de Moraes. Usos e abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getulio Vargas, 1998, p. 133. . Elas, em alguns depoimentos, reconheceram-se como sendo de uma geração definida:

Eu sou da geração da pílula. Era uma coisa que era muito falada, que estava para a geração de universitários... Quando concluí meu 2º grau em Porto Alegre, isto já fazia parte do cotidiano. Acho que toda a mídia abordava o tema (Vera, geração pílula).32 32 Vera (nascida em 1953, casada em 1978) entrevistada em Blumenau/FURB, em 14/8/2000, por Janine Petersen.

A QUEDA DA FERTILIDADE NO BRASIL E A INFORMAÇÃO SOBRE A PÍLULA.

As camadas médias não foram alvo de qualquer política controlista. Todavia, acompanharam a tendência geral de queda de fecundidade no País, utilizando também contraceptivos hormonais.33 33 BEMFAM, Pesquisa nacional sobre demografia e saúde. Rio de Janeiro: Bemfam, 1997, p. 56, aponta que, em 1997, 19,4% das mulheres com mais de 12 anos de escolaridade utilizavam pílulas, enquanto este método era usado por apenas 14% das mulheres que possuíam entre 1 e 3 anos de escolaridade. A taxa de fecundidade no Brasil ficou assim configurada: em 1940: 6,16; em 1950: 6,21; em 1960: 6,28; em 1970: 5,76; em 1980: 4,3534 34 IBGE — Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1986. Séries estatísticas retrospectivas/ Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Rio de Janeiro: IBGE, p.49. . Neste caso, por que as camadas médias também teriam reduzido tão significativamente o número de filhos? Onde estas mulheres estavam obtendo informações? Teria a imprensa sido importante na definição do número de filhos da classe média?

Na imprensa dos anos sessenta e oitenta35 35 Para esta pesquisa, utilizamos as revistas e jornais de circulação nacional referentes aos anos de 1960 a 1980. Foram coletadas 164 notícias, reportagens e comentários entre 1960 e 1989. A amostra foi constituída por anos alternados, ou seja: se num jorna1 investigávamos os anos pares, em outro investigávamos os anos ímpares. observam-se divulgações bastante contraditórias. Havia, principalmente no início dos anos sessenta, um clima de pânico em relação às possibilidades de alimentos disponíveis no mundo para uma população que, diziam, crescia assustadoramente — a chamada "bomba demográfica". Divulgavam também modelos de famílias com apenas dois filhos, estimulando o consumo de bens duráveis e semiduráveis. Por outro lado, e contraditoriamente, a partir de meados da década de sessenta divulgavam-se notícias alarmantes em relação aos perigos que os novos contraceptivos orais traziam para a saúde das mulheres.

Convém aqui relembrar o que tem sido divulgado pelos historiadores: os métodos contraceptivos já eram conhecidos há muito tempo — embora com alta ineficácia. As sanções jurídicas36 36 Refiro-me, aqui, às legislações adotadas em vários momentos da história ocidental contra as práticas de aborto, infanticídio, abandono de crianças e, inclusive, divulgação de métodos contraceptivos. e culturais, e especialmente as de cunho religioso e por parte do Estado representaram no passado sérios impedimentos a tal uso. Teria a imprensa brasileira colaborado com a queda de restrições ao uso de contraceptivos?

Para as mulheres urbanas de camadas médias, a imprensa tinha há muito tempo uma importante participação. Certamente, essas mulheres interpretaram a seu modo as leituras que fizeram. Filtravam assim, conforme seu interesse, as informações que liam.

Nas entrevistas que realizamos, ao serem indagadas sobre como obtiveram a informação sobre as pílulas, as entrevistadas falaram de contatos com médicos, amigos de médicos, parentas, amigas, e muitas vezes não souberam precisar como conheceram a pílula. A imprensa foi citada como fonte de informações ambíguas: ora estimulava o uso, ora alertava para os perigos dos efeitos secundários das pílulas anticoncepcionais. Inquiridas sobre qual veículo costumavam ler, citaram Seleções do Reader's Digest, Cruzeiro, Manchete, Cláudia, e fotonovelas diversas, além de jornais. Na verdade, a memória não conseguiu precisar qual a fonte de informação. Muitas referiram-se ao contato com médicos, mas disseram também que ao procurá-los já possuíam alguma informação sobre o que buscavam: um método seguro de contracepção. Uma das revistas muito citadas, para minha surpresa, foi Seleções do Reader's Digest. Diversas mulheres da "geração pílula" afirmaram que possuíam a revista em casa, que a liam, e que era assinada por elas mesmas ou por amigos e parentes.

Lia, bastante. Lia muito Pais e Filhos, Cláudia. Mas não (posso) dizer que foi isso, que houve influência. Conforme a minha educação, eu sabia que tinha que tomar para não engravidar. (Arlete, geração pílula)37 37 Arlete (nascida em 1951, casada em 1975), entrevista realizada em Itajaí/UNIVALI, em 10/2/2000, por Janine Petersen. .

Várias foram as mulheres que narraram que suas famílias, ou elas mesmas, assinavam a revista Seleções do Reader's Digest. Esta foi, durante os anos 50, juntamente com a revista Cruzeiro, uma das mais lidas no Brasil. Chegou, nos anos 50 e 60, a atingir a tiragem de 600 mil exemplares38 38 JUNQUEIRA, Mary Anne. Ao Sul do Rio Grande — imaginando a América Latina em Seleções: oeste, wilderness e fronteira (1942-1970). Bragança Paulista: EDUSF, 2000, p.49. .

Seleções? Lia, e meus pais assinavam. (Liane, geração pílula)39 39 Liane (nascida em 1959, casada em 1985), entrevista realizada em Blumenau/FURB, em 14/8/2000, por Janine Petersen. .

Meus pais assinavam sempre. Seleções, eu leio até hoje. (Suzeli, geração pílula)40 40 Suzeli (nascida em 1954, casada em 1977), entrevista realizada em Blumenau/FURB, em 14/8/2000, por Janine Petersen. .

Algumas falaram da revista, mas disseram que a informação estava bastante difundida, e que não tinham a certeza de onde obtiveram a informação. O médico foi citado como fonte, mas, ao consultá-lo, já sabiam o que queriam.

A pílula foi porque eu fiz o pré-nupcial e o médico então achou melhor, achou que era um método mais seguro. Então foi o médico que receitou, porque eu falei que não gostaria de engravidar logo em seguida (...). Então ele achou que o melhor era o anticoncepcional, a pílula. (Beatriz, geração pílula)41 41 Beatriz (nascida em 1954, casada em 1980), entrevista realizada em Itajaí/UNIVALI, em 10/2/2000, por Joana Maria Pedro. .

Ao procurarem médicos para os exames pré-nupciais, já recebiam deles receitas de pílulas anticoncepcionais. Muitas iniciavam o uso desta medicação um mês antes do casamento. Pode-se, portanto, afirmar que na década de sessenta, meios seguros de contracepção eram buscados pelas mulheres.

De qualquer maneira, o que se observa é que, nos anos sessenta e setenta, a imprensa, de maneira geral, ocupou-se desta questão. Ao lado de discussões sobre a guerra fria e a ameaça de superpopulação, figuravam discussões sobre os modernos métodos contraceptivos e a opinião das mulheres sobre o assunto. Foi neste sentido que, em 1967, a revista Realidade, em seu famoso nº 1042 42 Este número foi apreendido pela censura, num período de endurecimento da ditadura militar no Brasil. , que focalizou "A mulher brasileira, hoje", informava numa pesquisa que 87% das mulheres consideravam importante evitar filhos, 46% adotavam alguma forma de contracepção e 19% delas já utilizavam as pílulas.43 43 A mulher brasileira, hoje. Realidade. Nº 10, ano 1, janeiro 1967, p. 28.

É este tipo de preocupação que esteve presente nos depoimentos que obtive. A questão da possibilidade de reduzir o tamanho das famílias era consenso, por mais que os novos métodos contraceptivos pudessem vir acompanhados de ameaças à saúde. Esta posição pode explicar a sensível queda na natalidade, presente nas estatísticas da época. Nas entrevistas realizadas, esta queda ganhou vida. Era experimentada no cotidiano e se expressava na diferença entre gerações. Observei, por exemplo, através das entrevistas, a significativa redução no número de filhos dessas mulheres em relação às suas mães e avós.

Considero que a redução no número de filhos entre as camadas médias, constatada nas entrevistas, representou um resultado não esperado pelos planejadores da redução das taxas demográficas, uma vez que as políticas eram dirigidas especialmente à pobreza. Esses é que eram os "inimigos internos"44 44 FONSECA SOBRINHO, D. Op. cit., pp. 85-87, narra que nos relatórios dos Estados Unidos sobre o Brasil, no início da década de 60, a pobreza no Nordeste é apontada como o «inimigo interno», campo fértil para agitadores políticos, como Francisco Julião, pró- Castro,(...). .

No caso brasileiro, apesar de as políticas populacionais dirigirem-se para a pobreza, as mulheres envolveram-se, a partir dos anos 60, na experiência da contracepção, na busca da redução do número de filhos. A facilidade dada no Brasil para a entrada de anticoncepcionais expôs as mulheres brasileiras aos experimentos iniciais deste medicamento. As altas dosagens hormonais que essas pílulas possuíam geraram inúmeras queixas. A memória das mulheres registrou o mal-estar, os enjôos, as dores de cabeça, as varizes, os engordamentos. Em seus depoimentos, estes desconfortos promoveram, no final da vida reprodutiva, a busca por formas definitivas de controlar a fertilidade.

OS TESTEMUNHOS ORAIS DA "GERAÇÃO PÍLULA"

Sempre tinha. O médico mudava a marca, mas sempre dava problema. Enjôo direto. Uma me causava enjôo; outra, tontura, inchaço, dores de cabeça. (Zilma, geração pílula)45 45 Zilma (nascida em 1957 e casada em 1980), entrevista realizada em Itajaí/UNIVALI, em 2/2/2000, por Lenita Farias Raad. .

As entrevistas têm trazido depoimentos muito ricos; falam, muitas delas, de sérios problemas de saúde surgidos com o uso das pílulas, do enfrentamento da oposição da Igreja, da mudança sensível no padrão de fecundidade das famílias e dos tipos de informações que obtiveram. O contexto das cidades nas quais estas mulheres moram - em geral pequenas46 46 Os dados de população do IBGE para estas cidades apontavam, em 1970, o seguinte: Blumenau: 100.275; Chapecó: 49.865; Florianópolis: 138.337; Itajaí: 63.139; Joinville: 126.058; Lages: 128.728; Tubarão: 66.876 habitantes. , com pouca circulação de informações e possibilidades de participação em movimentos sociais reivindicativos de direitos — reflete o que foi comum à maioria das mulheres brasileiras dessa geração, ou seja, o enfrentamento da questão da contracepção com medo da pílula, mas sem outra alternativa contraceptiva mais eficaz.

Eu tinha ânsia de vômito, náusea, dor de cabeça, com o Neovlar; depois tinha o Primovlar. Este último que dava problema. Depois passei a tomar o Neovlar. Mas mesmo assim com problema (...) eu tinha que tomar. (Dolores, geração pílula)47 47 Dolores (nascida em 1947, casada em 1980), entrevista realizada em Florianópolis/UFSC, no dia 27/9/2000, por Lenita Raad. .

A maioria fala que, devido aos problemas causados pela pílula, inventou diferenciadas formas de contracepção: tabelinha, camisinha, coito interrompido, etc... Muitas narram sua laqueadura, e poucas, a alternativa da vasectomia. A narrativa vem permeada por desencontro de informações, medo e, ao mesmo tempo, pela busca por uma forma de contracepção adequada.

Na tabela abaixo é possível observar os experimentos que as mulheres da "geração pílula" fizeram, as alternativas que adotaram no sentido de definir o número de filhos que queriam ter:

Esta busca por alguma forma de controle da reprodução esteve ligada a mudanças na sociedade brasileira de maneira geral. O processo de urbanização, o estímulo ao consumo, os novos meios de comunicação, a política previdenciária e de saúde proporcionaram um ambiente propício à demanda por formas de regulação da fecundidade48 48 FARIA, Vilmar E. "Políticas de governo e regulação da fecundidade: conseqüências não antecipadas e efeitos perversos". In Ciências Sociais Hoje. São Paulo: Vértice/ANPOCS, 1989, pp. 62-103. .

A vida reprodutiva da "geração pílula" começava com as pílulas, em geral acompanhada de enjôos e problemas de circulação sanguínea, ou com o uso da tabelinha e do preservativo masculino; a seguir, passava pela laqueadura e, por fim, pela histerectomia e retirada dos ovários, prosseguindo com a reposição hormonal.

Este percurso é, muitas vezes, vivido sob tensão. A maternidade já não é mais o destino obrigatório; entretanto, o útero e os ovários são constantes fontes de preocupação, a ponto de uma das mulheres entrevistadas, que recentemente fizera uma histerectomia, dizer: "De lá para cá sou feliz"(I. geração pílula)49 49 I. (nascida em 1954, casada em 1978), entrevista realizada em Joinville/UNIVILLE, em 17/2/2000, por Joana Maria Pedro. .

Na memória das mulheres, os órgãos reprodutores vão adquirindo novos significados através dos ciclos da vida. Inicialmente, são os lugares de prazer e de reprodução a serem controlados; depois, vistos como capazes de originar moléstias e, por fim, órgãos passíveis de descarte. Estes depoimentos são muito diferentes daqueles da "geração 20-30".

Quando nós ficávamos grávidas, que não queríamos mais, era uma tristeza. A gente ficava quase louca porque não existia nada, a gente sofria, não é, porque não queria mais engravidar (...). (Ruth, geração 20-30)50 50 Ruth (nascida em 1924, casada em 1940), entrevista realizada em Florianópolis, em 1/4/96, por Joana Maria Pedro. .

Inúmeras publicações têm destacado a utilização de métodos irreversíveis, como as esterilizações, as quais têm tido um crescimento vertiginoso em nosso país, passando de 26,9% em 1986, para 40,1% em 1996.51 51 SCAVONE, Lucila. "Anticoncepción, aborto y tecnologias conceptivas: entre la salud, la ética y los derechos". In SCAVONE, Lucila (comp.). Género y salud reproductiva en América Latina. Cartago: Libro Universitario Regional, 1999, pp. 21-56. Estes números destoam dos encontrados em países nos quais a desigualdade social não é tão acentuada. "Neles, as mulheres preferem lançar mão de métodos mais tradicionais e, no caso de falha, recorrer ao aborto legal, sem perder contudo a capacidade reprodutiva"52 52 BERQUÓ, Elza. Brasil, um caso exemplar — anticoncepção e partos cirúrgicos — à espera de uma ação exemplar. Estudos Feministas, CIEC/ECO/UFRJ, v.1, nº 2/93, pp.366-381. .

No entanto, não devemos transformar em vítimas essas mulheres que fizeram a esterilização. Muitas fizeram laqueadura por "conforto".

Porque achei mais conveniente, mais prático. Não tem essa de esquecer (as pílulas). Então já que decidi ter meu último filho, resolvi fazer a laqueadura. (Liane, geração pílula)53 53 Liane (nascida em 1959, casada em 1985), entrevista realizada em Blumenau/FURB, em 14/8/2000, por Janine Petersen. .

Com a pílula, sim. Eu ficava extremamente ansiosa. Não sei se era pelo fato de você ter que tomar e tinha medo de engravidar e que não desse certo, eu ficava muito angustiada. A laqueadura me tranqüilizou. (Aliete, geração pílula)54 54 Arlete (nascida em 1951, casada em 1975), entrevista realizada em Itajaí/UNIVALI, em 10/2/2000, por Janine Petersen. .

Os testemunhos orais das mulheres de camadas médias que optaram pela laqueadura não falam de imposição ou do resultado de contingências que não poderiam controlar. Apresentam-na, em sua maior parte, como sendo uma decisão refletida e planejada55 55 Obviamente, nem todos os depoimentos têm o mesmo perfil. Duas entrevistadas acusam médicos de terem feito laqueadura sem seu pleno consentimento. . Além de se livrarem das náuseas, dores de cabeça, engordamentos e outros desconfortos que atribuem à pílula, a possibilidade de tranqüilidade garantida pelo fato de não terem que se lembrar todo dia de tomá-la, de não terem mais medo de esquecer, acompanham muitas vezes a explicação do porquê fizeram laqueadura.

A INTERFERÊNCIA DA IGREJA

As mulheres de uma geração anterior à "geração pílula" não viveram estes dramas de engordamento, náuseas e dores de cabeça; entretanto, narraram outros dramas. Um deles era o controle da Igreja Católica sobre suas vidas. A posição da instituição era importante nas decisões dos casais quanto aos métodos que utilizariam para definir o número de filhos que queriam ter. Ou seja, elas falaram da interferência religiosa em questões íntimas como a contracepção. Era através da negativa da absolvição, diante da prática de determinados métodos, que os sacerdotes controlavam as famílias.

Isto não significa que todas as mulheres católicas dessa geração, em Santa Catarina, seguissem à risca as palavras do padre. É possível que em cidades mais populosas as mulheres pudessem contar com alguns sacerdotes que davam a absolvição, não as fazendo passar por esses constrangimentos56 56 Agradeço o alerta dado pela historiadora Muriel Nazzari, de Indiana University, presente no Congresso Internacional BRASA V, em Recife (junho de 2000). . Mas pude verificar que várias mulheres da "geração 20-30", quando iniciaram sua vida reprodutiva, preocuparam-se com a inquirição do confessor sobre os métodos do ritmo e o uso do coitus interruptus. Porém, este comportamento não se observa na "geração pílula". Esta geração, principalmente as mulheres nascidas nos anos 50, não prestou mais a mínima atenção às ordens papais, e mesmo assim as mulheres continuaram a considerar-se "boas católicas". Elas encontraram, em pronunciamentos do próprio clero, argumentos para se considerarem livres e seguirem novos métodos contraceptivos.

Em 1968, quando foi publicada a encíclica Humanae Vitae, já havia consenso entre as mulheres letradas de camadas médias de que o uso de métodos contraceptivos não era considerado um "pecado". Indagadas hoje se a religião teria alguma influência sobre a decisão de uso de métodos contraceptivos, elas respondem, em sua maioria: "Não, a religião não interfere em minha decisão".

Por sua vez, a "geração 20-30" encontrava na intimidade de seu leito conjugal, além do marido, as palavras do confessor. A partir do final do século XIX, a Igreja Católica, que até então, e desde o Concílio de Trento, tinha sido discreta em suas perguntas no confessionário, passou a inquirir sobre o uso de métodos contraceptivos, e a negar a absolvição aos casais que afirmavam utilizar meios para evitar a gravidez indesejada. Em 25 de julho de 1968, a Encíclica Humanae Vitae reafirmou que qualquer ato matrimonial deveria permanecer aberto à transmissão da vida. Assim, somente o método do ritmo continuava sendo considerado lícito. As pílulas, ou outros métodos chamados de "artificiais", foram condenados57 57 PAULO VI, Documentos do Papa Paulo VI. Tradução de Lourenço Costa. São Paulo: Paulus, 1997. .

As posições da Igreja Católica, contrárias às "formas artificiais" de contracepção, não foram levadas em conta pelas mulheres da "geração pílula". O que acontecera com as mulheres? Eram estas as filhas daquelas mulheres que, na década de 50, afligiam-se por não receber absolvição no confessionário, por estarem usando coitus interruptus? As filhas destas mulheres nem sequer cogitavam de contar ao padre que estavam tomando pílulas: as decisões contraceptivas não seriam mais partilhadas pelas inquirições confessionais.

AUTONOMIA PARA AS MULHERES?

Aparentemente, já não há mais dúvidas de que o movimento de mulheres, a partir dos anos 60, ocorrido em diferentes países, tem sido responsabilizado por mudanças culturais significativas. Pesquisas têm apontado os novos meios contraceptivos como um dos principais responsáveis por mudanças na relação de gêneros, e pela própria atuação do movimento das mulheres. A presença feminina cada vez mais forte no mercado de trabalho, nas políticas sindical e partidária, na exigência de cotas, na ocupação de cargos de destaque, tudo isso tem sido possível certamente graças às possibilidades, antes nunca alcançadas, de separar com mais segurança a sexualidade da reprodução. As mulheres tornaram-se independentes da vontade, ou da falta de destreza masculina no coitus interruptus, no uso do preservativo ou na abstinência.58 58 MOSSUZ-LAVAU, Janine. As mulheres e a sexualidade: novos direitos, novos poderes? In DUBY, Georges e PERROT, Michelle. As mulheres e a história. Lisboa: Dom Quixote, 1995. As pílulas sempre podem ser tomadas às escondidas, seja dos pais, do marido, do amante, seja até do líder da religião que estiverem seguindo. No dizer de Françoise Thébaud, "A utilização de métodos modernos de contracepção não liberta apenas as mulheres de gravidezes indesejadas; ela dá-lhes, em detrimento dos homens, o domínio da fecundidade, e deve ser colocada no mesmo plano que as modificações do direito civil que, na mesma altura, põem termo à sua subordinação na vida privada"59 59 THÉBAUD, Françoise. Introdução. In: DUBY, Georges e PERROT, Michelle (org.). História das Mulheres no Ocidente. Porto: Afrontamento; São Paulo: Ebradil, 1995, p.13. .

Convém destacar que o uso intensivo das pílulas anticoncepcionais coincidiu também, no Brasil, com um grande aumento da força de trabalho feminina no trabalho formal, passando de 31% em 1981, para 35% em 198960 60 BEMFAM, Pesquisa nacional sobre demografia e saúde. Rio de Janeiro: Bemfam, 1997, p. 7. , crescendo ainda mais na década de noventa.

Entretanto, no Brasil, a possibilidade de usar os novos métodos contraceptivos não foi resultado de reivindicação ou luta coletiva, e por isso não consta da memória das mulheres como tendo grande significado para a sua autonomia. As mulheres da "geração pílula", entrevistadas por minha equipe, não consideram a contracepção uma conquista. A pílula é pensada como algo necessário para definir uma família de menor porte e, ao mesmo tempo, um perigo constante para a saúde.

Para as mulheres da França, assim como para as de outros países ditos desenvolvidos — as quais poderiam usufruir de sua cidadania —, a possibilidade de controlar a reprodução foi um dado muito importante na busca de autonomia e dos direitos reprodutivos. Assim, além do direito à educação, ao salário igual por trabalho igual, direitos políticos, etc., as mulheres reivindicavam contraceptivos. A liberação dos contraceptivos para a comercialização, conquistada pela Lei Neuwirth em 1967, foi fruto da atuação de inúmeras mulheres e homens na defesa pelo direito de controlar a sexualidade. Esta trajetória tem sido narrada em muitos textos, e demonstra quanto ela tem sido definida como uma conquista das mulheres.

No Brasil, contudo, o movimento feminista não teve participação direta na liberação dos contraceptivos para o uso. A ditadura militar, iniciada em 1964, impediu qualquer manifestação popular, assim como reuniões, associações, debates. O espaço de atuação no interior da ditadura militar foi conseguido graças à instituição, pela ONU, do Ano Internacional da Mulher, em 1975. Mesmo assim, para existir, o movimento feminista precisou contar no início com o apoio da Igreja Católica. Esta forneceu um lugar abrigado para discussões e articulações; por outro lado, limitou muito essa atuação. A prudência para "não assustar a Igreja" foi uma posição utilizada pelo renascente movimento feminista brasileiro, àquela época, o qual precisava contar com todos os aliados possíveis em vista da situação em que se encontrava o País.

Assim, ao ressurgir o movimento feminista no Brasil em meados dos anos setenta, tornou-se inicialmente e em razão das circunstâncias aliado da Igreja Católica na crítica aos contraceptivos hormonais, chegando inclusive algumas vezes a repetir alguns dos discursos da Igreja Católica, coisa impensável no movimento feminista europeu. Afinal, este era o espaço abrigado do terrorismo de Estado implantado com o Golpe Militar de 1964, no interior do qual muitas militantes feministas ganharam lugares de proteção, discussão e articulação. De forma sintética sobre os novos métodos contraceptivos, o movimento feminista afirmava: a) que a solução para o problema demográfico era o desenvolvimento econômico com justiça social; b) que os métodos artificiais disponíveis traziam problemas de saúde; c) que as políticas do Estado em relação à natalidade visavam ao corpo das mulheres e pretendiam acabar com a miséria, não deixando nascer os pobres. Algumas, todavia, criticavam apenas a falta de acompanhamento médico no uso de contraceptivos 61 61 RÉGIS, Isabel. "Contracepção no dizer feminista". In Revista de Ciências Humanas, vol. 9, nº10, 1991- pp.43-71. .

Foi certamente esta aliança inicial com a Igreja Católica que orientou algumas das publicações do jornal Brasil Mulher, surgido em 1975. Este periódico publicou, naquele ano, um artigo de um médico católico que aconselhava as mulheres a "jogar fora a sua pílula", em vista dos possíveis problemas de saúde que esta provocaria62 62 Trata-se do artigo "Pílulas... ora pílulas". Jornal Brasil Mulher, nº 1, dez. 1975, ano 1, p. 7. .

Este e outros artigos deste tipo instigaram discussões com mulheres brasileiras que naquela mesma época encontravam-se como exiladas políticas na França. Estas tinham fundado, em 1976, o Círculo de Mulheres de Paris63 63 O Círculo de Mulheres de Paris(1976-1979) foi formado por mulheres que se exilaram na França entre 1964 e 1979, após o golpe que instituiu uma ditadura militar. . Este grupo acompanhava as discussões e o movimento feminista que ocorria na França64 64 GOLDBERG-SALINAS, Anette. Brésiliennes en exil: de femmes migrantes à féministes étrangères. Cahiers du Cedref, ns. 8/9, 2000. . Correspondiam-se com os grupos que, no Brasil, começavam a organizar os primeiros grupos feministas. O Círculo, muito mais que as feministas no Brasil, reivindicava os direitos ao aborto e à contracepção, livres e gratuitos65 65 GOLDBERG, Anette. Feminismo e autoritarismo: a metamorfose de uma utopia de liberação em ideologia Liberalizante. Rio de Janeiro, UFRJ (Dissertação de Mestrado em Sociologia), 1987, pp. 146-147. .

Em vários momentos, cobraram das brasileiras posições mais avançadas em relação às reivindicações feministas. Ao retornarem do exílio após a anistia, em 1979, ajudaram a fundar grupos e jornais feministas, ou incorporaram-se aos que já existiam. Trouxeram outras reivindicações e exigências, muito diferentes daquelas que eram veiculadas naquele momento no Brasil.

Foi, portanto, num contexto de ditadura militar que as pílulas anticoncepcionais foram comercializadas e distribuídas no Brasil. Certamente é em vista deste contexto que, na memória das mulheres da "geração pílula", estes contraceptivos não são relacionados com as possibilidades de autonomia para as mulheres. Estes medicamentos não foram reivindicados. Em outros países, nos quais a cidadania podia ser plenamente exercida, a conquista do direito de uso de anticoncepcionais hormonais significou, no mínimo, a consciência de que a luta coletiva podia trazer conquistas significativas.

Podemos dizer que a memória destas mulheres mostra-nos, através de seus depoimentos, as sensíveis mudanças nas taxas de fecundidade da população brasileira e as transformações que ocorreram. No Brasil, o índice de filhos por mulher é atualmente de 2,2; em 1960 era de 6,366 66 IBGE, 2001. . Esta diferença ganha vida e história nos depoimentos orais das mulheres.

Eu tenho 3 filhos, (...).Nós somos 7; minha avó, 11 (Miriam, geração pílula)67 67 Mirian (nascida em 1956, casada em 1979, com 2 filhos), entrevista realizada por Janine Petersen, em Itajaí/UNIVALI, em 10/2/2000. .

Mesmo ligada ao privado, à intimidade, a memória feminina recupera, pelas marcas no corpo, as trajetórias da esfera política; justamente esta, da qual se costuma dizer que é território privilegiadamente masculino. A facilidade com que as mulheres brasileiras aderiram à contracepção hormonal esteve imbricada com políticas internacionais de redução da natalidade em países do terceiro mundo. A forma como estas mulheres aderiram a métodos esterilizadores reflete o descaso com as conseqüências das altas dosagens hormonais, que as pílulas anticoncepcionais trouxeram no início dos anos sessenta do século XX. A maneira como lidaram com as pílulas — pensando-a muito mais como um problema do que como uma conquista —, mostra como a história das lutas políticas interfere nas decisões da intimidade.

NOTAS

Artigo recebido em 2/2003

Aprovado em 4/2003

  • 2 Aspásia Camargo, em entrevista a Maria Celina D´Araújo, informa que a História Oral começou a ser utilizada, no Brasil, no CPDOC Centro de Pesquisa e Documentação da Fundação Getúlio Vargas, em 1973, e que, em 1977, graças a financiamento fornecido pela Fundação Ford, desenvolveu-se um programa de História Oral por todo o País. Ver D'ARAÚJO Maria Celina, 1999, "Como a História Oral chegou no Brasil: entrevista com Aspásia Camargo". História Oral. N. 2, pp. 167-179.
  • 3 FENELON, Déa Ribeiro. "O papel da História Oral na Historiografia Moderna". In MEIHY, José Carlos Sebe Bom. (Re)Introduzindo a História Oral no Brasil São Paulo: Xamã, 1996, pp.22-32.
  • 4 MEIHY, José Carlos Sebe Bom. (Re)Introduzindo a História Oral no Brasil.. São Paulo: Xamã, 1996.
  • 6 PERROT, Michelle. "Práticas da memória feminina". In Revista Brasileira de História São Paulo, v.9, n. 18, pp. 9-18, ago./set. 1989.
  • 7 FLORES, Maria Bernardete Ramos. "Entre a casa e a rua... memória feminina das festas açorianas no sul do Brasil". In Cadernos Pagu Campinas, (4), 1995, pp. 117-142.
  • 8 COUGHLAN, Robert. "Gente demais! Que fazer"? In Seleções do Reader's Digest. nº 219, abril 1960, pp. 46-51.
  • 9 O Brasil contava, em 2001, com 169,8 milhões de habitantes, uma densidade populacional de 20hab/km2, com uma taxa de 2,2 filhos por mulher e com um ritmo de crescimento de 1,64% ao ano. Estes números estão significando 2,8% dos habitantes do planeta que, atualmente, somam 6,1 bilhões de pessoas. Na França, o número de filhos por mulher é de 1,75, uma das taxas de fecundidade mais altas da Europa; a densidade demográfica é de 109hab./km2. Na Europa, o balanço demográfico publicado pelo INSEE, em 4 de fevereiro de 1999, apresenta a Itália com 1,22 a Espanha com 1,15 e a média européia com 1,44. BAULIEU, Étienne-Émile, HÉRITIER, Françoise et LERIDON, Henri. Contraception: contrainte ou liberté Paris: Éditions Odile Jacob, 1999, p. 131.
  • 10 FONSECA SOBRINHO, Délcio da. Estado e população: uma história do planejamento familiar no Brasil. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos; FNUAP, 1993, pp. 81-95.
  • 11 BARBOSA, Regina Maria. Mulher e contracepção: entre o técnico e o político Rio de Janeiro, UERJ, 1989, 233pp. Dissertação (Mestrado em Medicina Social), Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 1989.
  • 15 Ver o artigo " A velha pílula", Jornal do Brasil, em 12/5/1972.
  • 16 BRASIL, José Anselmo Nunes. "Métodos anticoncepcionais para ginecologistas e obstetras". In SCAVONE, Lucila e BATISTA, Luís Eduardo. Pesquisas de gênero: entre o público e o privado. Faculdade de Ciências e Letras, Laboratório Editorial, 2000, pp.108-109.
  • 18 Ver BERGUES, Héléne et ARIÈS, Philippe et alli. La prevéntion des naissances dans la famille. Ses origines dans les temps modernes. Paris: Presses Universitaires de France, 1960,
  • e MICHEL, Andrée et TEXIER, Geneviève. La condition de la française d'aujourd'hui. V. I et II, Genève (Suisse), Éditions Gonthier, 1964.
  • 19 CHAPERON, Sylvie. Les années Beauvoir 1945-1970 Paris: Fayard, 2000, p. 242.
  • 20 MORE, Caroline. Les debuts du planning familial à Grenoble 1961-1967 Mémoire de Maîtrise. Université Grenoble II. UFR Sciences Humaines. Département Histoire, Septembre 2000, p. 25.
  • 25 Convém destacar que, até os dias de hoje, as práticas abortivas são criminalizadas pela legislação brasileira. Relatei esta experiência com a entrevista em PEDRO, Joana Maria. "Memórias do corpo" 1º Seminário Docência, Memória e Gênero. São Paulo, FEUSP, Ed. Plêiade, pp. 303-312.
  • 29 MALUF, Marina. Ruídos da memória São Paulo: Siciliano, 1995, p. 83.
  • 30 HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990.
  • 31 SIRINELLI Jean-François. "A geração". In FERREIRA, Marieta de Moraes. Usos e abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getulio Vargas, 1998, p. 133.
  • 33 BEMFAM, Pesquisa nacional sobre demografia e saúde. Rio de Janeiro: Bemfam, 1997, p. 56,
  • 34 IBGE — Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1986. Séries estatísticas retrospectivas/ Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Rio de Janeiro: IBGE, p.49.
  • 38 JUNQUEIRA, Mary Anne. Ao Sul do Rio Grande imaginando a América Latina em Seleções: oeste, wilderness e fronteira (1942-1970). Bragança Paulista: EDUSF, 2000, p.49.
  • 43 A mulher brasileira, hoje. Realidade Nº 10, ano 1, janeiro 1967, p. 28.
  • 48 FARIA, Vilmar E. "Políticas de governo e regulação da fecundidade: conseqüências não antecipadas e efeitos perversos". In Ciências Sociais Hoje. São Paulo: Vértice/ANPOCS, 1989, pp. 62-103.
  • 51 SCAVONE, Lucila. "Anticoncepción, aborto y tecnologias conceptivas: entre la salud, la ética y los derechos". In SCAVONE, Lucila (comp.). Género y salud reproductiva en América Latina Cartago: Libro Universitario Regional, 1999, pp. 21-56.
  • 52 BERQUÓ, Elza. Brasil, um caso exemplar anticoncepção e partos cirúrgicos à espera de uma ação exemplar. Estudos Feministas, CIEC/ECO/UFRJ, v.1, nº 2/93, pp.366-381.
  • 57 PAULO VI, Documentos do Papa Paulo VI Tradução de Lourenço Costa. São Paulo: Paulus, 1997.
  • 58 MOSSUZ-LAVAU, Janine. As mulheres e a sexualidade: novos direitos, novos poderes? In DUBY, Georges e PERROT, Michelle. As mulheres e a história Lisboa: Dom Quixote, 1995.
  • 59 THÉBAUD, Françoise. Introdução. In: DUBY, Georges e PERROT, Michelle (org.). História das Mulheres no Ocidente Porto: Afrontamento; São Paulo: Ebradil, 1995, p.13.
  • 60 BEMFAM, Pesquisa nacional sobre demografia e saúde Rio de Janeiro: Bemfam, 1997, p. 7.
  • 61 RÉGIS, Isabel. "Contracepção no dizer feminista". In Revista de Ciências Humanas, vol. 9, nº10, 1991- pp.43-71.
  • 62 Trata-se do artigo "Pílulas... ora pílulas". Jornal Brasil Mulher, nº 1, dez. 1975, ano 1, p. 7.
  • 64 GOLDBERG-SALINAS, Anette. Brésiliennes en exil: de femmes migrantes à féministes étrangères. Cahiers du Cedref, ns. 8/9, 2000.
  • 65 GOLDBERG, Anette. Feminismo e autoritarismo: a metamorfose de uma utopia de liberação em ideologia Liberalizante. Rio de Janeiro, UFRJ (Dissertação de Mestrado em Sociologia), 1987, pp. 146-147.
  • 1
    Estas memórias foram coletadas como parte das fontes que compunham as pesquisas: "Autonomia e Criminalização: O controle do corpo feminino. (1900-1950)" e "A medicalização da contracepção: conhecimento e autonomia (1960-1980)", ambas financiadas pelo CNPq.
  • 2
    Aspásia Camargo, em entrevista a Maria Celina D´Araújo, informa que a História Oral começou a ser utilizada, no Brasil, no CPDOC — Centro de Pesquisa e Documentação da Fundação Getúlio Vargas, em 1973, e que, em 1977, graças a financiamento fornecido pela Fundação Ford, desenvolveu-se um programa de História Oral por todo o País. Ver D'ARAÚJO Maria Celina, 1999, "Como a História Oral chegou no Brasil: entrevista com Aspásia Camargo".
    História Oral. N. 2, pp. 167-179.
  • 3
    FENELON, Déa Ribeiro. "O papel da História Oral na Historiografia Moderna". In MEIHY, José Carlos Sebe Bom.
    (Re)Introduzindo a História Oral no Brasil. São Paulo: Xamã, 1996, pp.22-32.
  • 4
    MEIHY, José Carlos Sebe Bom.
    (Re)Introduzindo a História Oral no Brasil.. São Paulo: Xamã, 1996.
  • 5
    FENELON, D.
    Op. cit.
  • 6
    PERROT, Michelle. "Práticas da memória feminina". In
    Revista Brasileira de História. São Paulo, v.9, n. 18, pp. 9-18, ago./set. 1989.
  • 7
    FLORES, Maria Bernardete Ramos. "Entre a casa e a rua... memória feminina das festas açorianas no sul do Brasil". In
    Cadernos Pagu. Campinas, (4), 1995, pp. 117-142.
  • 8
    COUGHLAN, Robert. "Gente demais! Que fazer"? In
    Seleções do Reader's Digest. nº 219, abril 1960, pp. 46-51. Surgida em fevereiro de 1922, a revista
    Seleções do Reader's Digest gabava-se de atingir mais de 100 milhões de pessoas e de ser "verdadeiramente internacional", sendo escrita em 13 idiomas. Além disso, afirmava ter "permanentemente denunciado os males do comunismo e retratado as vantagens do sistema de economia livre". No Brasil, esta revista passou a circular, em português, em fevereiro de 1942, em plena Segunda Guerra Mundial, divulgando a participação dos Estados Unidos no conflito. Depois, passou a trazer inúmeros artigos a respeito da guerra-fria. Divulgava em linguagem simples os mais diversos assuntos: política, medicina, literatura, comportamento.
  • 9
    O Brasil contava, em 2001, com 169,8 milhões de habitantes, uma densidade populacional de 20hab/km2, com uma taxa de 2,2 filhos por mulher e com um ritmo de crescimento de 1,64% ao ano. Estes números estão significando 2,8% dos habitantes do planeta que, atualmente, somam 6,1 bilhões de pessoas. Na França, o número de filhos por mulher é de 1,75, uma das taxas de fecundidade mais altas da Europa; a densidade demográfica é de 109hab./km2. Na Europa, o balanço demográfico publicado pelo INSEE, em 4 de fevereiro de 1999, apresenta a Itália com 1,22 a Espanha com 1,15 e a média européia com 1,44. BAULIEU, Étienne-Émile, HÉRITIER, Françoise et LERIDON, Henri
    . Contraception: contrainte ou liberté. Paris: Éditions Odile Jacob, 1999, p. 131.
  • 10
    FONSECA SOBRINHO, Délcio da.
    Estado e população: uma história do planejamento familiar no Brasil. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos; FNUAP, 1993, pp. 81-95.
  • 11
    BARBOSA, Regina Maria.
    Mulher e contracepção: entre o técnico e o político. Rio de Janeiro, UERJ, 1989, 233pp. Dissertação (Mestrado em Medicina Social), Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 1989.
  • 12
    FONSECA SOBRINHO, D.
    Op. cit., p. 135.
  • 13
    Somente em 1977 foi criado no Ministério da Saúde o PPGAR — Programa de Prevenção da Gravidez de Alto Risco, o qual já vinha sendo, desde 1975, divulgado pela imprensa. Este programa, entretanto, não chegou a ser efetivado: foi acusado, pelas feministas e pela Igreja Católica, de promover o controle da natalidade. Ver FONSECA SOBRINHO, D.
    Op. cit., pp. 150-153.
  • 14
    Ver FONSECA SOBRINHO, D.
    Op. cit., e BARBOSA, R. M.
    Op. cit.
  • 15
    Ver o artigo " A velha pílula",
    Jornal do Brasil, em 12/5/1972.
  • 16
    BRASIL, José Anselmo Nunes. "Métodos anticoncepcionais para ginecologistas e obstetras". In SCAVONE, Lucila e BATISTA, Luís Eduardo.
    Pesquisas de gênero: entre o público e o privado. Faculdade de Ciências e Letras, Laboratório Editorial, 2000, pp.108-109.
  • 17
    BARBOSA, R. M.
    Op. cit., pp. 23-24.
  • 18
    Ver BERGUES, Héléne et ARIÈS, Philippe et alli.
    La prevéntion des naissances dans la famille. Ses origines dans les temps modernes. Paris: Presses Universitaires de France, 1960, e MICHEL, Andrée et TEXIER, Geneviève.
    La condition de la française d'aujourd'hui. V. I et II, Genève (Suisse), Éditions Gonthier, 1964.
  • 19
    CHAPERON, Sylvie.
    Les années Beauvoir 1945-1970. Paris: Fayard, 2000, p. 242.
  • 20
    MORE, Caroline.
    Les debuts du planning familial à Grenoble 1961-1967. Mémoire de Maîtrise. Université Grenoble II. UFR Sciences Humaines. Département Histoire, Septembre 2000, p. 25.
  • 21
    Sebastiana (nascida em 1929, casada em 1948), entrevistada em 20/8/1995, em Florianópolis, por Joana Maria Pedro.
  • 22
    Sueli (nascida em 1946, casada em 1974), em Itajaí/UNIVALI, entrevistada em 10/2/2000 por Joana Maria Pedro.
  • 23
    Estas pesquisas são: "Autonomia e Criminalização: O controle do corpo feminino. (1900-1950)" e "A medicalização da contracepção: conhecimento e autonomia (1960-1980)", financiadas pelo CNPq.
  • 24
    Eufemismo para práticas abortivas.
  • 25
    Convém destacar que, até os dias de hoje, as práticas abortivas são criminalizadas pela legislação brasileira. Relatei esta experiência com a entrevista em PEDRO, Joana Maria. "Memórias do corpo"
    1º Seminário Docência, Memória e Gênero. São Paulo, FEUSP, Ed. Plêiade, pp. 303-312.
  • 26
    Entrevistamos as mulheres da UNOESC na cidade de Chapecó; da UNIVALI, em Itajaí; da UNIVILLE, em Joinville; da FURB, em Blumenau; da UNISUL, em Tubarão; da UNIPLAC, em Lages; e da UFSC e UDESC, na cidade de Florianópolis.
  • 27
    As entrevistas foram realizadas por mim e pelas bolsistas de iniciação científica: Janine Petersen, Josilene Silva e Lenita Farias Raad.
  • 28
    Lenita tinha 40 anos e eu, 50, quando realizamos a maior parte das entrevistas.
  • 29
    MALUF, Marina.
    Ruídos da memória. São Paulo: Siciliano, 1995, p. 83.
  • 30
    HALBWACHS, Maurice.
    A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990.
  • 31
    SIRINELLI Jean-François. "A geração". In FERREIRA, Marieta de Moraes.
    Usos e abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getulio Vargas, 1998, p. 133.
  • 32
    Vera (nascida em 1953, casada em 1978) entrevistada em Blumenau/FURB, em 14/8/2000, por Janine Petersen.
  • 33
    BEMFAM,
    Pesquisa nacional sobre demografia e saúde. Rio de Janeiro: Bemfam, 1997, p. 56, aponta que, em 1997, 19,4% das mulheres com mais de 12 anos de escolaridade utilizavam pílulas, enquanto este método era usado por apenas 14% das mulheres que possuíam entre 1 e 3 anos de escolaridade.
  • 34
    IBGE — Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1986.
    Séries estatísticas retrospectivas/ Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Rio de Janeiro: IBGE, p.49.
  • 35
    Para esta pesquisa, utilizamos as revistas e jornais de circulação nacional referentes aos anos de 1960 a 1980. Foram coletadas 164 notícias, reportagens e comentários entre 1960 e 1989. A amostra foi constituída por anos alternados, ou seja: se num jorna1 investigávamos os anos pares, em outro investigávamos os anos ímpares.
  • 36
    Refiro-me, aqui, às legislações adotadas em vários momentos da história ocidental contra as práticas de aborto, infanticídio, abandono de crianças e, inclusive, divulgação de métodos contraceptivos.
  • 37
    Arlete (nascida em 1951, casada em 1975), entrevista realizada em Itajaí/UNIVALI, em 10/2/2000, por Janine Petersen.
  • 38
    JUNQUEIRA, Mary Anne.
    Ao Sul do Rio Grande — imaginando a América Latina em Seleções: oeste,
    wilderness e fronteira (1942-1970). Bragança Paulista: EDUSF, 2000, p.49.
  • 39
    Liane (nascida em 1959, casada em 1985), entrevista realizada em Blumenau/FURB, em 14/8/2000, por Janine Petersen.
  • 40
    Suzeli (nascida em 1954, casada em 1977), entrevista realizada em Blumenau/FURB, em 14/8/2000, por Janine Petersen.
  • 41
    Beatriz (nascida em 1954, casada em 1980), entrevista realizada em Itajaí/UNIVALI, em 10/2/2000, por Joana Maria Pedro.
  • 42
    Este número foi apreendido pela censura, num período de endurecimento da ditadura militar no Brasil.
  • 43
    A mulher brasileira, hoje.
    Realidade. Nº 10, ano 1, janeiro 1967, p. 28.
  • 44
    FONSECA SOBRINHO, D.
    Op. cit., pp. 85-87, narra que nos relatórios dos Estados Unidos sobre o Brasil, no início da década de 60, a pobreza no Nordeste é apontada como o «inimigo interno»,
    campo fértil para agitadores políticos, como Francisco Julião, pró-
    Castro,(...).
  • 45
    Zilma (nascida em 1957 e casada em 1980), entrevista realizada em Itajaí/UNIVALI, em 2/2/2000, por Lenita Farias Raad.
  • 46
    Os dados de população do IBGE para estas cidades apontavam, em 1970, o seguinte: Blumenau: 100.275; Chapecó: 49.865; Florianópolis: 138.337; Itajaí: 63.139; Joinville: 126.058; Lages: 128.728; Tubarão: 66.876 habitantes.
  • 47
    Dolores (nascida em 1947, casada em 1980), entrevista realizada em Florianópolis/UFSC, no dia 27/9/2000, por Lenita Raad.
  • 48
    FARIA, Vilmar E. "Políticas de governo e regulação da fecundidade: conseqüências não antecipadas e efeitos perversos". In
    Ciências Sociais Hoje. São Paulo: Vértice/ANPOCS, 1989, pp. 62-103.
  • 49
    I. (nascida em 1954, casada em 1978), entrevista realizada em Joinville/UNIVILLE, em 17/2/2000, por Joana Maria Pedro.
  • 50
    Ruth (nascida em 1924, casada em 1940), entrevista realizada em Florianópolis, em 1/4/96, por Joana Maria Pedro.
  • 51
    SCAVONE, Lucila. "Anticoncepción, aborto y tecnologias conceptivas: entre la salud, la ética y los derechos". In SCAVONE, Lucila (comp.).
    Género y salud reproductiva en América Latina. Cartago: Libro Universitario Regional, 1999, pp. 21-56.
  • 52
    BERQUÓ, Elza. Brasil, um caso exemplar — anticoncepção e partos cirúrgicos — à espera de uma ação exemplar.
    Estudos Feministas, CIEC/ECO/UFRJ, v.1, nº 2/93, pp.366-381.
  • 53
    Liane (nascida em 1959, casada em 1985), entrevista realizada em Blumenau/FURB, em 14/8/2000, por Janine Petersen.
  • 54
    Arlete (nascida em 1951, casada em 1975), entrevista realizada em Itajaí/UNIVALI, em 10/2/2000, por Janine Petersen.
  • 55
    Obviamente, nem todos os depoimentos têm o mesmo perfil. Duas entrevistadas acusam médicos de terem feito laqueadura sem seu pleno consentimento.
  • 56
    Agradeço o alerta dado pela historiadora Muriel Nazzari, de Indiana University, presente no Congresso Internacional BRASA V, em Recife (junho de 2000).
  • 57
    PAULO VI,
    Documentos do Papa Paulo VI. Tradução de Lourenço Costa. São Paulo: Paulus, 1997.
  • 58
    MOSSUZ-LAVAU, Janine. As mulheres e a sexualidade: novos direitos, novos poderes? In DUBY, Georges e PERROT, Michelle.
    As mulheres e a história. Lisboa: Dom Quixote, 1995.
  • 59
    THÉBAUD, Françoise. Introdução. In: DUBY, Georges e PERROT, Michelle (org.).
    História das Mulheres no Ocidente. Porto: Afrontamento; São Paulo: Ebradil, 1995, p.13.
  • 60
    BEMFAM,
    Pesquisa nacional sobre demografia e saúde. Rio de Janeiro: Bemfam, 1997, p. 7.
  • 61
    RÉGIS, Isabel. "Contracepção no dizer feminista". In
    Revista de Ciências Humanas, vol. 9, nº10, 1991- pp.43-71.
  • 62
    Trata-se do artigo "Pílulas... ora pílulas". Jornal
    Brasil Mulher, nº 1, dez. 1975, ano 1, p. 7.
  • 63
    O Círculo de Mulheres de Paris(1976-1979) foi formado por mulheres que se exilaram na França entre 1964 e 1979, após o golpe que instituiu uma ditadura militar.
  • 64
    GOLDBERG-SALINAS, Anette. Brésiliennes en exil: de femmes migrantes à féministes étrangères.
    Cahiers du Cedref, ns. 8/9, 2000.
  • 65
    GOLDBERG, Anette.
    Feminismo e autoritarismo: a metamorfose de uma utopia de liberação em ideologia Liberalizante. Rio de Janeiro, UFRJ (Dissertação de Mestrado em Sociologia), 1987, pp. 146-147.
  • 66
    IBGE, 2001.
  • 67
    Mirian (nascida em 1956, casada em 1979, com 2 filhos), entrevista realizada por Janine Petersen, em Itajaí/UNIVALI, em 10/2/2000.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Ago 2003
    • Data do Fascículo
      Jul 2003

    Histórico

    • Aceito
      Abr 2003
    • Recebido
      Fev 2003
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