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Prevalência da deficiência da glicose-6-fosfato desidrogenase em doadores de sangue de Mossoró, Rio Grande do Norte

Resumo

Glucose-6-phosphate dehydrogenase (G6PD) deficiency is the most common human enzymopathy. It affects as many as 330 million individuals worldwide. This deficiency may determine neonatal jaundice, chronic nonspherocytic hemolytic anemia and acute hemolytic anemia induced by drugs, infections and broad bean ingestion. The efficacy of blood transfusion is decreased when the donor is G6PD deficient. In this study, we aimed at determining the prevalence of G6PD deficiency in blood donors of Mossoro, Brazil. Samples of 714 blood donors (576 men and 138 women; 343 white and 371 non-white) with ages ranging from 18 to 62 years and that accepted to participate in the study were analyzed. All participants answered a standard questionnaire. G6PD activity was analyzed by the methemoglobin reduction test with deficiency being confirmed by the semiquantitative test. The overall prevalence of G6PD deficiency in blood donors was 3.8%, similar to the rate described for others regions of Brazil. There was no significant statistical difference in the frequency of G6PD deficiency between men and women, nor between white and non-white blood donors. This relatively high frequency of G6PD deficiency highlights a need to screen blood donors for this condition.

Glucosephosphate dehydrogenase deficiency; Blood donors; Anemia


Carta ao Editor / Letter to Editor

Prevalência da deficiência da glicose-6-fosfato desidrogenase em doadores de sangue de Mossoró, Rio Grande do Norte

Ulysses Madureira MaiaI; Danielle Cristiny de Azevedo BatistaI; Wogelsanger Oliveira PereiraII; Thales Allyrio Araújo de Medeiros FernandesIII

ICurso de Ciências Biológicas, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Mossoró (RN), Brasil.

IIDisciplina de Citologia e Organização Biomolecular, Departamento de Ciências Biomédicas, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Mossoró (RN), Brasil.

IIIDisciplina de Genética Humana, Departamento de Ciências Biomé- dicas, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Mossoró (RN), Brasil.

Endereço para correspondência Correspondência: Thales Allyrio Araújo de Medeiros Fernandes Faculdade de Ciências da Saúde - UERN Rua Miguel Antônio da Silva Neto, S/N, Aeroporto 59607-360 _ Mossoró (RN), Brasil Tel./Fax: (55 84) 3315-2248 E-mail: thalesallyrio@uern.br

ABSTRACT

Glucose-6-phosphate dehydrogenase (G6PD) deficiency is the most common human enzymopathy. It affects as many as 330 million individuals worldwide. This deficiency may determine neonatal jaundice, chronic nonspherocytic hemolytic anemia and acute hemolytic anemia induced by drugs, infections and broad bean ingestion. The efficacy of blood transfusion is decreased when the donor is G6PD deficient. In this study, we aimed at determining the prevalence of G6PD deficiency in blood donors of Mossoro, Brazil. Samples of 714 blood donors (576 men and 138 women; 343 white and 371 non-white) with ages ranging from 18 to 62 years and that accepted to participate in the study were analyzed. All participants answered a standard questionnaire. G6PD activity was analyzed by the methemoglobin reduction test with deficiency being confirmed by the semiquantitative test. The overall prevalence of G6PD deficiency in blood donors was 3.8%, similar to the rate described for others regions of Brazil. There was no significant statistical difference in the frequency of G6PD deficiency between men and women, nor between white and non-white blood donors. This relatively high frequency of G6PD deficiency highlights a need to screen blood donors for this condition.

Keywords: Glucosephosphate dehydrogenase deficiency; Blood donors; Anemia

Senhor Editor

A deficiência da glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD) se constitui na mais frequente das enzimopatias hereditárias, afetando cerca de 330 milhões de pessoas em todo o mundo.(1) Embora a maioria dos indivíduos afetados seja assintomática, essa patologia pode levar ao desenvolvimento de icterícia neonatal, anemia hemolítica crônica não esferocítica e, principalmente, anemia hemolítica aguda induzida por determinados tipos de fármacos, infecções ou ingestão de feijão-fava.(2)

Somado a isso, a transfusão de sangue proveniente de doadores com deficiência de G6PD é menos eficaz, visto que as hemácias destes indivíduos apresentam deficiência nas defesas antioxidantes, sendo mais vulneráveis à hemólise extra e intra-vasculares na presença de estresse oxidativo, além de poderem sofrer lesões de estocagem exageradas, com diminuição das suas sobrevidas.(3)

Sua prevalência global se encontra geograficamente correlacionada às áreas endêmicas em malária, sendo maiores na África Sub-Sahariana, Oriente Médio, Sudeste da Ásia, Europa Mediterrânea

e algumas áreas da América Latina.(1) Estudos realizados na população brasileira revelaram uma prevalência de deficientes de G6PD em torno de 1% a 10%, com os maiores índices sendo encontrados entre os homens de ascendência africana.(4) No caso particular do Rio Grande do Norte, trabalho realizado anteriormente mostrou uma prevalência de 3,5% em pacientes atendidos em hospital de referência da cidade de Natal.(5) No entanto, nenhum estudo a respeito da deficiência da G6PD na população do interior do Rio Grande Norte tinha sido feito até o presente momento.

Diante disso, realizou-se esse estudo transversal, durante o período de agosto de 2006 a agosto de 2008, objetivando determinar a prevalência da deficiência da G6PD em doadores de sangue da cidade de Mossoró, a maior cidade do interior do Rio Grande do Norte.

Foram analisados 714 indivíduos (idades variando de 18 a 62 anos, média de 30 anos) que se dirigiram voluntariamente ao Hemocentro local para a realização do procedimento de doação de sangue, dos quais 576 (80,7%) eram homens e 138 (19,3%) mulheres, 343 (48,0%) se declararam brancos e 371 (52,0%) se declararam mulatos, pardos, amarelos ou negros, agrupados no grupo dos não brancos.

Os doadores foram esclarecidos a respeito dos objetivos e importância do trabalho a ser desenvolvido e foram questionados sobre a disponibilidade em participar do estudo. Aos que aceitaram participar, foi solicitada a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) e aplicado um questionário padronizado, destinado a obtenção de dados sociodemográficos. Posteriormente, coletaram-se alíquotas de 5 ml de sangue venoso periférico em tubos contendo 50 ml de ácido etilenodiaminotetraacético (EDTA) a 10%, para a realização das análises laboratoriais.

A determinação qualitativa da atividade da G6PD foi feita inicialmente pelo teste de redução da meta-hemoglobina(6) e as amostras que se apresentaram deficientes foram confirmadas através do teste de redução da meta-hemoglobina modificado para avaliação semiquantitativa,(7) sendo considerados deficientes os indivíduos que apresentaram valores de atividade enzimática inferiores a 70%. As análises estatísticas dos resultados obtidos foram feitas por meio dos testes do c2 de Pearson, utilizando-se o programa PEPI, considerando-se como estatisticamente significantes os valores de p < 0,05. O protocolo de realização deste estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes (CEP-HUOL), sob o número CAAE - 0395.0.000.294-07.

Entre os doadores analisados, detectaram-se 27 (3,8%) casos de deficiência da G6PD, semelhantes aos descritos para a população de Natal (3,5%) e da Bahia (3,2%). Dentre os deficientes, 21 (77,8%) eram do sexo masculino e 6 (22,2%) eram do sexo feminino. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas na prevalência dessa deficiência enzimática entre os sexos (c2=0,151, p=0,698) (Tabela 1), apesar de ser uma característica com padrão de herança ligada ao X. Este achado pode ser atribuído ao fato dessa deficiência não causar prejuízos significativos ao indivíduo afetado, tornando assim relativamente frequente a reprodução entre indivíduos afetados e portadores da deficiência da G6PD.

A distribuição dos casos por etnia revelou que 13 (48,1%) dos deficientes se declararam brancos e 14 (51,9%) se declararam não brancos, não sendo observadas, novamente, diferenças estatísticas entre os grupos considerados (c2=0,145, p=0,703) (Tabela 2).

Esses relativamente altos índices de prevalência da deficiência da G6PD, somados a menor eficiência da transfusão de sangue proveniente de indivíduos portadores desta condição genética, reforçam a necessidade de se fazer a triagem da deficiência de G6PD entre os doadores, principalmente quando as amostras de sangue forem destinadas a neonatos.

Conflito de interesse: sem conflito de interesse

Referências

1. Nkhoma AT, Poole C, Vannappagari V, Hall AS, Beutler E. The global prevalence of glucose-6-phosphate dehydrogenase deficiency: a systematic review and meta-analysis. Blood Cells Mol Dis. 2009; 42(3):267-78.

2. Minucci A, Giardina B, Zuppi C, Capoluongo E. Glucose-6-phosphate dehydrogenase laboratory assay: how, when and why. IUBMB Life. 2009;61(1):27-34.

3. Samanta S, Kumar P, Kishore SS, Garewal G, Narang A. Donor blood glucose-6-phosphate dehydrogenase deficiency reduces the efficacy of exchange transfusion in neonatal hyperbilirrubinemia. Pediatrics. 2009;123(1):96-100.

4. Silva RT, Iglessias MAC, Medeiros ID, Bezerra IM, Medeiros TMD. Deficiências de glicose-6-fosfato desidrogenase em adultos. Newslab [Internet]. 2005 [citado 2009 Jul 27];79:96-102. Disponível em: http://www.newslab.com.br/ed_anteriores/79/art03/art03.pdf

5. Mauricio CRF, Maia RD, Queiroz SMV, Araújo MGM, Miranda RGC, Medeiros TMD. Deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase: dados de prevalência em pacientes atendidos no Hospital Universitário Onofre Lopes, Natal - RN. RBAC [Internet].2006[citado 2009 Maio 24];38(1):57-9. Disponível em: http://www.sbac.org.br/pt/pdfs/rbac/rbac_38_01/rbac3801_14.pdf

6. Brewer GJ, Tarlov AR, Alving AS. Methaemoglobin reduction test : a new simple in vitro test for identifying primaquine-sensitivy. Bul World Health Organ. 1960;22:633-40.

7. Severo LG, Nogueira DM, Hoxter G. Determinação da atividade da G-6-PD em eritrócitos humanos. Laes & Haes. 1985;1:22-30.

Recebido: 28/5/2010

Aceito: 28/6/2010

  • 1. Nkhoma AT, Poole C, Vannappagari V, Hall AS, Beutler E. The global prevalence of glucose-6-phosphate dehydrogenase deficiency: a systematic review and meta-analysis. Blood Cells Mol Dis. 2009; 42(3):267-78.
  • 2. Minucci A, Giardina B, Zuppi C, Capoluongo E. Glucose-6-phosphate dehydrogenase laboratory assay: how, when and why. IUBMB Life. 2009;61(1):27-34.
  • 3. Samanta S, Kumar P, Kishore SS, Garewal G, Narang A. Donor blood glucose-6-phosphate dehydrogenase deficiency reduces the efficacy of exchange transfusion in neonatal hyperbilirrubinemia. Pediatrics. 2009;123(1):96-100.
  • 4. Silva RT, Iglessias MAC, Medeiros ID, Bezerra IM, Medeiros TMD. Deficiências de glicose-6-fosfato desidrogenase em adultos. Newslab [Internet]. 2005 [citado 2009 Jul 27];79:96-102. Disponível em: http://www.newslab.com.br/ed_anteriores/79/art03/art03.pdf
  • 6. Brewer GJ, Tarlov AR, Alving AS. Methaemoglobin reduction test : a new simple in vitro test for identifying primaquine-sensitivy. Bul World Health Organ. 1960;22:633-40.
  • 7. Severo LG, Nogueira DM, Hoxter G. Determinação da atividade da G-6-PD em eritrócitos humanos. Laes & Haes. 1985;1:22-30.
  • Correspondência: Thales Allyrio Araújo de Medeiros Fernandes
    Faculdade de Ciências da Saúde - UERN
    Rua Miguel Antônio da Silva Neto, S/N, Aeroporto
    59607-360 _ Mossoró (RN), Brasil
    Tel./Fax: (55 84) 3315-2248
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Fev 2012
    • Data do Fascículo
      2010

    Histórico

    • Recebido
      28 Maio 2010
    • Aceito
      28 Jun 2010
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