Acessibilidade / Reportar erro

Fratura da região distal da clavícula em crianças Trabalho desenvolvido no Serviço de Ortopedia e Traumatologia Prof. Dr. Donato D'Ângelo, Hospital Santa Teresa e Faculdade de Medicina de Petrópolis, Petrópolis, RJ, Brasil.

RESUMO

OBJETIVO:

Analisar as fraturas da região distal da clavícula em pacientes pediátricos.

MÉTODOS:

Foram observados dez pacientes entre cinco a 11 anos com média de 7,3 anos. Nove pacientes foram tratados conservadoramente e um cirurgicamente. As fraturas foram classificadas segundo a classificação de Nenopoulos.

RESULTADOS:

Todas as fraturas consolidaram sem complicações. O tratamento conservador foi usado em nove pacientes, três do grupo IIIb; três IIb; dois IIa e um IV. O único paciente tratado cirurgicamente foi uma paciente do gênero feminino de 11 anos com fratura do grupo IV.

CONCLUSÃO:

A indicação do tratamento para as fraturas distais da clavícula em crianças deve ser baseada na idade do paciente e no desvio dos fragmentos.

Palavras-chave:
Crianças; Fraturas ósseas; Clavícula

ABSTRACT

OBJECTIVE:

To analyze fractures of the distal clavicle region in pediatric patients.

METHODS:

Ten patients between the ages of five to eleven years (mean of 7.3 years) were observed. Nine patients were treated conservatively and one surgically. All the fractures were classified using the Nenopoulos classification system.

RESULTS:

All the fractures consolidated without complications. Conservative treatment was used for nine patients, of whom three were in group IIIB, three IIb, two IIa and one IV. The only patient who was treated surgically was a female patient of eleven years of age with a group IV fracture.

CONCLUSION:

The treatment indication for distal fractures of the clavicle in children should be based on the patient's age and the displacement of the fragments.

Keywords:
Child; Fractures bone; Clavicle

Introdução

As fraturas da clavícula, especialmente as do terço médio, são muito comuns em pacientes com o esqueleto imaturo. Porém, são lesões raras na região distal, somente 10 a 20% de todas as fraturas da clavícula.11. Sarwark JF, King EC, Luhmann SJ. Proximal humerus, scapula and clavicle. In: Rockwood CA Jr, Wilkins KE, editors. Fractures in children. 6th ed. Philadelphia: Lippincott, Williams & Wilkins; 2006. p. 724-8.and22. Shah RR, Kinder J, Peelman J, Moen TC, Sarwark J. Paediatric clavicle and acromioclavicular injuries. J Pediatr Orthop. 2010;30:S69-72.

Existem poucos estudos na literatura com tempo de seguimento longo sobre essas lesões.33. Ogden JA. Chest and shoulder girdle. In: Ogden JA, editor. Skeletal injury in the child. 3rd ed. New York: Springer- Verlag; 2000. p. 438-41.and44. Black GB, McPherson JAM, Reed MH. Traumatic pseudodislocation of the acromioclavicular joint in children. A fifteen year review. Am J Sports Med. 1991;19(6):644-6. As fraturas do terço distal da clavícula em crianças são geralmente causadas por trauma direto sobre o ombro, aproximadamente 85% resultado de traumas nos esportes ou nas atividades recreacionais.22. Shah RR, Kinder J, Peelman J, Moen TC, Sarwark J. Paediatric clavicle and acromioclavicular injuries. J Pediatr Orthop. 2010;30:S69-72. O fato de o centro de ossificação da epífise distal da clavícula aparecer após os 18 anos e o fragmento medial da clavícula se avulsionar do periósteo, ambos com grande potencial de remodelação, podem desenvolver deformidades importantes do ombro das crianças.33. Ogden JA. Chest and shoulder girdle. In: Ogden JA, editor. Skeletal injury in the child. 3rd ed. New York: Springer- Verlag; 2000. p. 438-41.

O tratamento das fraturas desviadas permanece controverso, embora o tratamento conservador ainda seja mais comumente indicado nessa idade.11. Sarwark JF, King EC, Luhmann SJ. Proximal humerus, scapula and clavicle. In: Rockwood CA Jr, Wilkins KE, editors. Fractures in children. 6th ed. Philadelphia: Lippincott, Williams & Wilkins; 2006. p. 724-8. Em condições excepcionais, a estabilização cirúrgica pode ser necessária.

O objetivo deste trabalho foi analisar retrospectivamente os casos de fratura da região distal da clavícula em pacientes pediátricos.

Material e método

De janeiro de 2000 a dezembro de 2010 foram analisados os prontuários e as radiografias de 10 pacientes com fratura da região distal da clavícula. A idade variou entre cinco a 11 anos, com média de 7,3. Foram excluídos pacientes com traumas obstétricos, fraturas da clavícula prévias, doenças congênitas ou infecciosas do ombro e maus-tratos. Seis pacientes apresentavam fratura do lado direito e quatro à esquerda. Sete pacientes eram do gênero masculino e três do feminino. As causas do acidente foram: três quedas de bicicleta, três quedas simples, duas quedas de altura e duas quedas da escada. Os pacientes tratados conservadoramente usaram gesso tóraco-braquial por seis semanas. Na paciente tratada cirurgicamente foi feita redução aberta com fixação interna por meio de um fio de Kirschner, suficiente para dar estabilidade, entre o acrômio e a clavícula e gesso tóraco-braquial por seis semanas.

As fraturas foram classificadas por Nenopoulos et al.55. Nenopoulos SP, Gigis IP, Chytas AA, Beslikas TA, Nenopoulos AS, Christoforidis JE. Outcome of distal clavicular fracture separations and dislocations in immature skeleton. Injury. 2011;42(4):376-80. de I a V: grupo I - fratura em galho verde; grupo IIa - transversa sem desvio; grupo IIb - transversa desviada; grupo IIIa - oblíqua sem desvio; grupo IIIb - oblíqua desviada; grupo IV - fratura cominuída e grupo V - luxação acromioclavicular (fig. 1).

Figura 1
Esquema da classificação de Nenopoulos et al.55. Nenopoulos SP, Gigis IP, Chytas AA, Beslikas TA, Nenopoulos AS, Christoforidis JE. Outcome of distal clavicular fracture separations and dislocations in immature skeleton. Injury. 2011;42(4):376-80.

Resultados

Todos os pacientes foram tratados em nosso hospital. O tratamento conservador ocorreu em nove pacientes, três do grupo IIIb; três IIb; dois IIa e um IV (fig. 2). O único tratado cirurgicamente foi um paciente do gênero feminino de 11 anos que apresentava uma fratura do grupo IV e foi tratada com fio de Kirschner (fig. 3). Todas as fraturas consolidaram sem complicações (tabela 1).

Figura 2
Tratamento conservador da fratura distal da clavícula.

Figura 3
Fratura do terço distal da clavícula tratada cirurgicamente.

Tabela 1
Dados dos pacientes

Discussão

A literatura internacional, no que se refere às lesões da articulação acromioclavicular e fraturas da região distal da clavícula em pacientes pediátricos, é limitada e apresenta poucos casos ou relatos de caso.44. Black GB, McPherson JAM, Reed MH. Traumatic pseudodislocation of the acromioclavicular joint in children. A fifteen year review. Am J Sports Med. 1991;19(6):644-6.,66. Dartou C, Fenoll B, Paule R, Le Nen D, Colin D, Thoma M. Particularités des fractures des extrémités de la clavicule chez l'enfant. Acta Orthop Belg. 1994;60(3):296-9.,77. Eidman DK, Sherwin JS, Tullos HS. Acromioclavicular lesions in children. Am J Sports Med. 1981;9(3):150-4.,88. Falstie- Jensen S, Mikkelsen P. Pseudodislocation of the acromioclavicular joint. J Bone Joint Surg Br. 1982;64(3):368-9.,99. Havránek P. Injuries of distal clavicular physis in children. J Pediatr Orthop. 1989;9(2):213-5.,1010. Kirkos JM, Papavasiliou KA, Sarris IK, Kapetanos GA. A rare acromioclavicular joint injury in a twelve- year-old boy. J Bone Joint Surg Am. 2007;89(11):2504-7.,1111. Kubiak R, Slongo T. Operative treatment of clavicle fractures in children: a review of 21 years. J Pediatr Orthop. 2002;22(6):736-9.and1212. Ogden JA. Distal clavicular physeal injury. Clin Orthop Relat Res. 1984;(188):68-73. Dessa forma, achamos interessante demonstrar nossa casuística com o objetivo de ajudar no diagnóstico e na indicação do tratamento.

Quando a região lateral da clavícula é afetada, mesmo nos casos em que ocorre fratura com grande desvio, na maioria das vezes o resultado é satisfatório com o tratamento conservador, seja com imobilização do tipo oito ou tipoia, e se consegue um adequado retorno da função. Isso acontece porque a fise lateral só se fecha após os 19 anos e o periósteo espesso e em tubo, ligado aos ligamentos coracoclaviculares e acromioclavicular, auxilia na remodelação.88. Falstie- Jensen S, Mikkelsen P. Pseudodislocation of the acromioclavicular joint. J Bone Joint Surg Br. 1982;64(3):368-9.,1212. Ogden JA. Distal clavicular physeal injury. Clin Orthop Relat Res. 1984;(188):68-73.,1313. Sanders JO, Rockwood CA, Curtis RJ. Fractures and dislocations of the humeral shaft and shoulder. In: Rockwood CA, Wilkins KE, Beaty JH, editors. Fractures in children. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1996. p. 905-1019.and1414. Wilkes JA, Hoffer MM. Clavicle fractures in head-injured children. J Orthop Trauma. 1987;1(1):55-8.

O tratamento cirúrgico na criança é indicado em casos raros. Ogden1212. Ogden JA. Distal clavicular physeal injury. Clin Orthop Relat Res. 1984;(188):68-73. observou reduplicação da clavícula após lesões da epífise distal e sugeriu tratamento conservador. Mas quando isso não fosse possível, redução aberta e fixação com fios de Kirschner para prevenir a formação de "dupla" clavícula. Pela mesma razão, Lietchti1515. Liechti R. Frakturen der clavicula und der scapula. In: Weber BG, Brunner C, Freuler F, editors. Die Frakturbehandlung bei Kindern und Jugendlichen. Berlin: Springer- Verlag; 1978. p. 87-94. indica a redução aberta e fixação com fios de Kirschner e sutura periosteal. Havránek99. Havránek P. Injuries of distal clavicular physis in children. J Pediatr Orthop. 1989;9(2):213-5. descreveu o resultado de 10 meninos com lesões do tipo Salter II na região lateral da clavícula e em uma criança foi feito o tratamento cirúrgico. Apesar de a função do membro não ter sido afetada em nenhum dos tratamentos indicados, ele observou deformidade no ombro em sete pacientes e recomendou cirurgia por razões estéticas quando existiam um grande desvio e encurtamento dos fragmentos. Nenopoulos et al.55. Nenopoulos SP, Gigis IP, Chytas AA, Beslikas TA, Nenopoulos AS, Christoforidis JE. Outcome of distal clavicular fracture separations and dislocations in immature skeleton. Injury. 2011;42(4):376-80. observaram que os resultados funcionais foram excelentes independentemente da escolha do tratamento indicado. Porém, a idade do paciente e o grau do desvio são fatores que deveriam ser levados em conta na decisão do tratamento com o objetivo de obter um bom resultado estético. Kubiak e Slongo1111. Kubiak R, Slongo T. Operative treatment of clavicle fractures in children: a review of 21 years. J Pediatr Orthop. 2002;22(6):736-9. observaram que o tratamento cirúrgico das fraturas distais da clavícula em crianças é raro e está indicado em crianças mais velhas. As indicações foram: fraturas expostas, impacto sobre as partes moles, risco de perfuração da pele, grave encurtamento da cintura escapular com ou sem desvios intermediários dos fragmentos e fraturas desviadas com risco potencial de lesão das estruturas do feixe neuromuscular ou mediastino.

Nossos resultados demonstraram bons resultados funcionais em todos os pacientes. Seguindo as orientações da literatura, somente um paciente de 11 anos do gênero feminino foi tratado cirurgicamente com redução aberta e fixação com fio de Kirschner, pois, nesse caso, o resultado estético poderia gerar um mau resultado devido ao curto tempo para haver a remodelação. Acreditamos também que em casos de fratura com grandes desvios, a ressonância magnética poderia auxiliar na indicação do tipo de tratamento, pois poderíamos avaliar o grau de descolamento de periósteo dessa região.

Conclusão

As fraturas distais da clavícula em crianças são raras. A maioria das fraturas é de tratamento conservador. Porém, apesar de ser um estudo retrospectivo com pequeno número de casos, a indicação do tratamento deve ser baseada na idade do paciente e no desvio dos fragmentos.

References

  • 1
    Sarwark JF, King EC, Luhmann SJ. Proximal humerus, scapula and clavicle. In: Rockwood CA Jr, Wilkins KE, editors. Fractures in children. 6th ed. Philadelphia: Lippincott, Williams & Wilkins; 2006. p. 724-8.
  • 2
    Shah RR, Kinder J, Peelman J, Moen TC, Sarwark J. Paediatric clavicle and acromioclavicular injuries. J Pediatr Orthop. 2010;30:S69-72.
  • 3
    Ogden JA. Chest and shoulder girdle. In: Ogden JA, editor. Skeletal injury in the child. 3rd ed. New York: Springer- Verlag; 2000. p. 438-41.
  • 4
    Black GB, McPherson JAM, Reed MH. Traumatic pseudodislocation of the acromioclavicular joint in children. A fifteen year review. Am J Sports Med. 1991;19(6):644-6.
  • 5
    Nenopoulos SP, Gigis IP, Chytas AA, Beslikas TA, Nenopoulos AS, Christoforidis JE. Outcome of distal clavicular fracture separations and dislocations in immature skeleton. Injury. 2011;42(4):376-80.
  • 6
    Dartou C, Fenoll B, Paule R, Le Nen D, Colin D, Thoma M. Particularités des fractures des extrémités de la clavicule chez l'enfant. Acta Orthop Belg. 1994;60(3):296-9.
  • 7
    Eidman DK, Sherwin JS, Tullos HS. Acromioclavicular lesions in children. Am J Sports Med. 1981;9(3):150-4.
  • 8
    Falstie- Jensen S, Mikkelsen P. Pseudodislocation of the acromioclavicular joint. J Bone Joint Surg Br. 1982;64(3):368-9.
  • 9
    Havránek P. Injuries of distal clavicular physis in children. J Pediatr Orthop. 1989;9(2):213-5.
  • 10
    Kirkos JM, Papavasiliou KA, Sarris IK, Kapetanos GA. A rare acromioclavicular joint injury in a twelve- year-old boy. J Bone Joint Surg Am. 2007;89(11):2504-7.
  • 11
    Kubiak R, Slongo T. Operative treatment of clavicle fractures in children: a review of 21 years. J Pediatr Orthop. 2002;22(6):736-9.
  • 12
    Ogden JA. Distal clavicular physeal injury. Clin Orthop Relat Res. 1984;(188):68-73.
  • 13
    Sanders JO, Rockwood CA, Curtis RJ. Fractures and dislocations of the humeral shaft and shoulder. In: Rockwood CA, Wilkins KE, Beaty JH, editors. Fractures in children. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1996. p. 905-1019.
  • 14
    Wilkes JA, Hoffer MM. Clavicle fractures in head-injured children. J Orthop Trauma. 1987;1(1):55-8.
  • 15
    Liechti R. Frakturen der clavicula und der scapula. In: Weber BG, Brunner C, Freuler F, editors. Die Frakturbehandlung bei Kindern und Jugendlichen. Berlin: Springer- Verlag; 1978. p. 87-94.
  • Trabalho desenvolvido no Serviço de Ortopedia e Traumatologia Prof. Dr. Donato D'Ângelo, Hospital Santa Teresa e Faculdade de Medicina de Petrópolis, Petrópolis, RJ, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    jan-feb 2016

Histórico

  • Recebido
    19 Jan 2015
  • Aceito
    23 Fev 2015
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbo@sbot.org.br