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Estudo epidemiológico das fraturas do calcâneo em um hospital terciário Trabalho desenvolvido no Instituto de Ortopedia e Traumatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

RESUMO

Objetivo:

Analisar a epidemiologia e as características das lesões e dos pacientes com fraturas do calcâneo.

Métodos:

Revisão retrospectiva dos pacientes com fraturas do calcâneo internados de 2006 a 2010, no Instituto de Ortopedia e Traumatologia dessa instituição. Foram analisados parâmetros como idade, gênero, lateralidade, mecanismo de trauma, tipo de fratura, lesões associadas, exposição e tempo decorrido até o tratamento cirúrgico.

Resultados:

Foram encontrados 52 pacientes com fratura do calcâneo, dez casos bilaterais (19,2%), total de 62 calcâneos fraturados, com predomínio do gênero masculino, na relação 5,5:1. A média de idade foi de 36,8 anos. O mecanismo de trauma mais frequente foi a queda de altura (75,0% dos casos), seguido por acidentes de motocicleta (11,5%) e acidentes de automóvel (9,6%). Fraturas intra-articulares foram mais frequentes, com 47 casos. Quinze pacientes apresentaram fraturas expostas (28,9%). Dos 52 pacientes com fratura do calcâneo, 11 foram tratados conservadoramente e 41, cirurgicamente. O tempo médio entre o trauma e o tratamento cirúrgico definitivo foi de 7,8 dias, variou de 0 a 21 dias, com a maioria dentro dos primeiros sete dias (58,5%).

Conclusão:

Pacientes com fraturas do calcâneo atendidos em um hospital voltado para o atendimento de alta complexidade foram na maioria jovens, do sexo masculino, que sofreram queda de altura e com algum tipo de lesão associada. Os índices elevados de bilateralidade (19,2%) e de exposição da fratura (28,9%) caracterizam a maior gravidade dessas fraturas nesse grupo populacional.

Palavras-chave:
Fraturas ósseas; Calcâneo; Epidemiologia

ABSTRACT

Objective:

To analyze the epidemiology and characteristics of patients with calcaneus fractures.

Methods:

This is a retrospective revision of patients with calcaneus fractures hospitalized in the Institute of Orthopedics and Traumatology of this institution between 2006 and 2010. Data such as age, gender, laterality, trauma mechanism, type of fracture, associated injuries, compound fractures, and time from injury to surgery were analyzed.

Results:

The analysis of 52 patients showed that men were more commonly affected than women, at a ratio of 5.5:1. Bilateral fractures were observed in ten cases, resulting in a total of 62 calcaneus fractures. A fall from a height was the most frequent trauma mechanism (75%), followed by motorcycle accidents (11.5%) and automobile accidents (9.6%). The most frequent fractures were intra-articular, with 47 cases. Compound fractures were observed in 15 patients (28.9%). Non-surgical management was adopted for 11 patients while 41 patients underwent surgery. The mean time between trauma and the definitive treatment was 7.8 days (range: 0-21 days), and 58.5% of cases were treated within seven days.

Conclusion:

Patients with calcaneus fractures, most commonly young men, were admitted to a high complexity care hospital, victims of a fall from a height with associated injuries. The great severity of these fractures is characterized by the high prevalence of bilateral (19.2%) and compound fractures (28.9%) in this population group.

Keywords:
Fractures, bone; Calcaneus; Epidemiology

Introdução

As fraturas do calcâneo são pouco comuns, correspondem a cerca de 2% do total de fraturas.11 Dhillon MS, Bali K, Prabhakar S. Controversies in calcaneus fracture management: a systematic review of the literature. Musculoskelet Surg. 2011;95(3):171-81.

2 Bruce J, Sutherland A. Surgical versus conservative interventions for displaced intra-articular calcaneal fractures. Cochrane Database Syst Rev. 2013;(1). CD008628.
-33 Veltman ES, Doornberg JN, Stufkens SA, Luitse JS, van den Bekerom MP. Long-term outcomes of 1,730 calcaneal fractures: systematic review of the literature. J Foot Ankle Surg. 2013;52(4):486-90. Ainda assim, são as mais frequentes dos ossos do tarso (60%).11 Dhillon MS, Bali K, Prabhakar S. Controversies in calcaneus fracture management: a systematic review of the literature. Musculoskelet Surg. 2011;95(3):171-81. Frequentemente estão associadas a traumas axiais de alta energia, principalmente por quedas de altura e acidentes automobilísticos.11 Dhillon MS, Bali K, Prabhakar S. Controversies in calcaneus fracture management: a systematic review of the literature. Musculoskelet Surg. 2011;95(3):171-81.,22 Bruce J, Sutherland A. Surgical versus conservative interventions for displaced intra-articular calcaneal fractures. Cochrane Database Syst Rev. 2013;(1). CD008628.,44 Palmersheim K, Hines B, Olsen BL. Calcaneal fractures: update on current treatments. Clin Podiatr Med Surg. 2012;29(2):205-20.,55 Pelliccioni AA, Bittar CK, Zabeu JL. Surgical treatment of intraarticular calcaneous fractures of Sanders’ types II and III. Systematic review. Acta Ortop Bras. 2012;20(1):39-42. A energia elevada do trauma tem correlação com acometimento de partes moles e lesões combinadas encontradas em 50% dos casos,66 Medeiros CM, Henao JE, Rohenkohl C, Hirata LM, Baruffi NA, Klein Junior A, et al. Functional evaluation of surgically-treated intra-articular fractures of the calcaneus. Rev Bras Ortop. 2008;43(11-12):482-9. sendo outras fraturas dos membros inferiores e fraturas da coluna lombar (10%) as associações mais frequentes.77 Worsham JR, Elliott MR, Harris AM. Open calcaneus fractures and associated injuries. J Foot Ankle Surg. 2016;55(1):68-71.,88 Stapleton JJ, Zgonis T. Surgical treatment of intra-articular calcaneal fractures. Clin Podiatr Med Surg. 2014;31(4):539-46.

As fraturas intra-articulares representam 70% dos casos e são as mais desafiadoras e com piores desfechos.11 Dhillon MS, Bali K, Prabhakar S. Controversies in calcaneus fracture management: a systematic review of the literature. Musculoskelet Surg. 2011;95(3):171-81. Trabalhos americanos mostram que, usualmente, acometem adultos jovens entre 21 e 45 anos (90% dos casos).55 Pelliccioni AA, Bittar CK, Zabeu JL. Surgical treatment of intraarticular calcaneous fractures of Sanders’ types II and III. Systematic review. Acta Ortop Bras. 2012;20(1):39-42.,77 Worsham JR, Elliott MR, Harris AM. Open calcaneus fractures and associated injuries. J Foot Ankle Surg. 2016;55(1):68-71.,99 Maskill JD, Bohay DR, Anderson JG. Calcaneus fractures: a review article. Foot Ankle Clin. 2005;10(3):463-89.

O diagnóstico é confirmado por meio de radiografias com imagens de perfil e anteroposterior do pé e a incidência de Harris (axial) do calcâneo.44 Palmersheim K, Hines B, Olsen BL. Calcaneal fractures: update on current treatments. Clin Podiatr Med Surg. 2012;29(2):205-20. Nos casos de fraturas intra-articulares, a complementação com a tomografia computadorizada é indicada para melhor compreensão da lesão.44 Palmersheim K, Hines B, Olsen BL. Calcaneal fractures: update on current treatments. Clin Podiatr Med Surg. 2012;29(2):205-20.,99 Maskill JD, Bohay DR, Anderson JG. Calcaneus fractures: a review article. Foot Ankle Clin. 2005;10(3):463-89.

O tratamento é baseado nas características da fratura e das lesões associadas e nas condições de partes moles locais.77 Worsham JR, Elliott MR, Harris AM. Open calcaneus fractures and associated injuries. J Foot Ankle Surg. 2016;55(1):68-71.,1010 Sharr PJ, Mangupli MM, Winson IG, Buckley RE. Current management options for displaced intra-articular calcaneal fractures: non-operative. ORIF, minimally invasive reduction and fixation or primary ORIF and subtalar arthrodesis. A contemporary review. Foot Ankle Surg. 2016;22(1):1-8. Sabe-se que o reestabelecimento da anatomia normal tem correlação com o bom desfecho funcional.1010 Sharr PJ, Mangupli MM, Winson IG, Buckley RE. Current management options for displaced intra-articular calcaneal fractures: non-operative. ORIF, minimally invasive reduction and fixation or primary ORIF and subtalar arthrodesis. A contemporary review. Foot Ankle Surg. 2016;22(1):1-8.,1111 Zhang W, Chen E, Xue D, Yin H, Pan Z. Risk factors for wound complications of closed calcaneal fractures after surgery: a systematic review and meta-analysis. Scand J Trauma Resusc Emerg Med. 2015;23:18. O tratamento conservador costuma ser indicado para lesões extra-articulares, ou lesões com pequeno comprometimento intra-articular, com pouco ou nenhum desvio. A presença de grave comprometimento articular, desvio significativo e lesões expostas é indicação para cirurgia.1010 Sharr PJ, Mangupli MM, Winson IG, Buckley RE. Current management options for displaced intra-articular calcaneal fractures: non-operative. ORIF, minimally invasive reduction and fixation or primary ORIF and subtalar arthrodesis. A contemporary review. Foot Ankle Surg. 2016;22(1):1-8.

Uma busca nas bases de dados Scielo e Lilacs e das revistas Acta Ortopédica e Revista Brasileira de Ortopedia com os termos “fratura” e “calcâneo” e da Pubmed com os termos “calcaneus”, “fractures” e “Brasil” não localizou trabalhos em língua portuguesa sobre a epidemiologia das fraturas de calcâneo.

O objetivo do trabalho é estudar a epidemiologia das fraturas do calcâneo de pacientes internados e tratados de 2006 a 2010 em um hospital terciário de ortopedia e traumatologia, sendo útil para conhecer as características, os padrões e a frequência das fraturas e serve para um tratamento e prevenção mais adequados.

Casuística e métodos

Foi realizada uma revisão retrospectiva por meio do levantamento de dados dos prontuários e exames de imagem dos pacientes com fraturas do calcâneo, de 2006 a 2010, atendidos em um hospital terciário de ortopedia e traumatologia. Foram analisados parâmetros como idade, gênero, lateralidade, mecanismo de trauma, tipo de fratura, lesões associadas, exposição e tempo decorrido até o tratamento cirúrgico. Foram incluídos todos os pacientes atendidos no serviço, que apresentaram o diagnóstico de fratura do calcâneo. Excluíram-se pacientes cujos dados encontravam-se incompletos (identificação, exames radiográficos de diagnóstico e pós-tratamento definitivo, irregularidade na descrição do procedimento feito e em seu intervalo de tempo a partir do diagnóstico).

O presente estudo teve aprovação da comissão de ética para análise de projetos de pesquisa, com o numero 06577712.8.0000.0068.

Resultados

Foram encontrados 52 pacientes com fratura do calcâneo, 44 homens e oito mulheres (5,5:1). A média de idade foi de 36,8 anos, variou de 16 a 70 anos. Dos 52 pacientes, 10 apresentaram fratura bilateral (19,2%), total de 62 calcâneos fraturados. Assim, em 31 casos o lado direito foi acometido (50%) e em 31 casos, o esquerdo (50%).

O mecanismo de trauma mais frequente foi a queda de altura, com 39 casos (75,0%), seguido por acidentes de motocicleta, seis casos (11,5%) e acidentes de automóvel, cinco casos (9,6%) (fig. 1).

Figura 1
Mecanismo de trauma.

As fraturas intra-articulares foram as mais comuns, encontradas em 47 ocasiões (75,8%). Dessas, 14 eram cominutas (29,8%). As fraturas extra-articulares ocorreram em 15 ocasiões (24,2%).

Vinte e cinco pacientes apresentaram fraturas associadas (48,0%): sete casos em outros ossos do pé (13,4%), cinco na coluna lombar (9,6%), quatro na pelve (7,7%), três no fêmur (5,7%), dois no planalto tibial (3,8%) e um no pilão tibial (1,9%) (fig. 2). Lesões não ortopédicas foram observadas em cinco casos (9,6%) (dois com contusão hepática (3,8%), dois com fraturas da face (3,8%) e um com hemopneumoperitôneo (1,9%).

Figura 2
Fraturas associadas.

Quinze pacientes sofreram fraturas expostas (28,9%). Seis classificados como Gustilo tipo II (40% das fraturas expostas), seis tipo IIIA (40%) e três tipos IIIB (20%).

Dos 62 casos de calcâneo fraturados, 11 foram tratados conservadoramente (17,8%) e 51 foram submetidos a cirurgia (82,2%). O tempo médio decorrido entre o trauma e o tratamento cirúrgico definitivo foi de 7,8 dias, variou de 0 a 21. Foi feito o procedimento definitivo dentro dos primeiros seis dias em 24 casos (47%). Dezesseis casos foram tratados na segunda semana, sete a 13 dias (31,4%), e 11 casos na terceira semana (21,6%), após 14 dias (fig. 3).

Figura 3
Tempo decorrido entre o trauma e o tratamento cirúrgico definitivo.

Discussão

Observaram-se 62 casos de fraturas do calcâneo entre 2006 e 2010, 12,4 ao ano. Como o presente trabalho foi desenvolvido em um hospital terciário direcionado para ortopedia e traumatologia, com mais de 2.900 atendimentos ao mês de pronto-socorro, fica evidente se tratar de uma lesão pouco frequente quando comparada com outras fraturas. Esse fato, aliado ao complexo formato anatômico ósseo, faz da fratura do calcâneo uma lesão que necessita de longos períodos de tempo para um treinamento cirúrgico adequado.

A maior parte das fraturas ocorreu em pacientes jovens, do sexo masculino (84,6%), com média de 36,8 anos, semelhante ao encontrado na literatura.55 Pelliccioni AA, Bittar CK, Zabeu JL. Surgical treatment of intraarticular calcaneous fractures of Sanders’ types II and III. Systematic review. Acta Ortop Bras. 2012;20(1):39-42.,77 Worsham JR, Elliott MR, Harris AM. Open calcaneus fractures and associated injuries. J Foot Ankle Surg. 2016;55(1):68-71.,1212 Mitchell MJ, McKinley JC, Robinson CM. The epidemiology of calcaneal fractures. Foot. 2009;19(4):197-200. Considerando que a maioria dos pacientes com fraturas do calcâneo necessita de um ano para uma plena recuperação funcional e que apenas 46% terão resultados funcionais excelentes após cinco anos,1313 Zwipp H, Rammelt S, Barthel S. Calcaneal fractures - open reduction and internal fixation (ORIF). Injury. 2004;35(2):46-54. o acometimento preferencial de uma população jovem e economicamente ativa traz sérias consequências à saúde pública do país. Isso mostra também a importância da necessidade de um tratamento correto, a fim de se evitar ou retardar complicações tardias com potenciais sequelas incapacitantes e que necessitem de novos tratamentos cirúrgicos. O predomínio da população masculina jovem pode ter relação com a maior exposição desse grupo aos acidentes de trabalho e de trânsito.

Queda de altura foi o mecanismo de trauma mais prevalente (75,0%), seguido por acidentes de motocicleta (11,5%) e acidentes de automóvel (9,6%). Os trabalhos divergem quanto ao mecanismo mais frequente de lesão, embora esses sejam sempre os mais citados.77 Worsham JR, Elliott MR, Harris AM. Open calcaneus fractures and associated injuries. J Foot Ankle Surg. 2016;55(1):68-71.,99 Maskill JD, Bohay DR, Anderson JG. Calcaneus fractures: a review article. Foot Ankle Clin. 2005;10(3):463-89.,1212 Mitchell MJ, McKinley JC, Robinson CM. The epidemiology of calcaneal fractures. Foot. 2009;19(4):197-200.,1414 Bohl DD, Ondeck NT, Samuel AM, Diaz-Collado PJ, Nelson SJ, Basques BA, et al. Demographics mechanisms of injury, and concurrent injuries associated with calcaneus fractures: a study of 14 516 patients in the American College of Surgeons National Trauma Data Bank. Foot Ankle Spec. 2016, pii:1938640016679703 [Epub ahead of print]. Mitchell et al.1212 Mitchell MJ, McKinley JC, Robinson CM. The epidemiology of calcaneal fractures. Foot. 2009;19(4):197-200. demonstraram um valor superior a 70% para esse tipo de lesão decorrente de queda de altura,1212 Mitchell MJ, McKinley JC, Robinson CM. The epidemiology of calcaneal fractures. Foot. 2009;19(4):197-200. à semelhança do encontrado no presente estudo. Bohl et al.,1414 Bohl DD, Ondeck NT, Samuel AM, Diaz-Collado PJ, Nelson SJ, Basques BA, et al. Demographics mechanisms of injury, and concurrent injuries associated with calcaneus fractures: a study of 14 516 patients in the American College of Surgeons National Trauma Data Bank. Foot Ankle Spec. 2016, pii:1938640016679703 [Epub ahead of print]. entretanto, encontraram dados um pouco diferentes dos apresentados neste estudo, com 49% dos casos ocorridos após acidentes de trânsito, 37% por automóveis e 8% por motocicletas, e apenas 43% dos casos decorrentes por quedas de altura.

Não houve predominância por lateralidade (1:1) e fraturas bilaterais foram encontradas em 19,2%, diferentemente da literatura, que mostra bilateralidade com variação de 3 a 8%.77 Worsham JR, Elliott MR, Harris AM. Open calcaneus fractures and associated injuries. J Foot Ankle Surg. 2016;55(1):68-71.,1212 Mitchell MJ, McKinley JC, Robinson CM. The epidemiology of calcaneal fractures. Foot. 2009;19(4):197-200. Segundo sugerem os estudos, fraturas bilaterais do calcâneo costumam ter maior depressão do ângulo de Bohler e estão relacionadas a maiores taxas de complicações, lesões associadas e piores resultados quando comparadas com lesões unilaterais.1515 Dooley P, Buckley R, Tough S, McCormack B, Pate G, Leighton R, et al. Bilateral calcaneal fractures: operative versus nonoperative treatment. Foot Ankle Int. 2004;25(2):47-52.,1616 Zeman J, Matejka J, Matejka T, Salasek M, Zeman P, Nepras P. Open reduction and plate fixation (ORIF LCP) for treatment of bilateral calcaneal fractures. Acta Chir Orthop Traumatol Cech. 2013;80(2):142-7. A maior prevalência de fraturas bilaterais encontradas neste trabalho pode estar relacionada com o fato do serviço se tratar de um hospital focado no atendimento do trauma de alta complexidade.

A elevada prevalência de fraturas expostas (28,9%) contrasta com o encontrado na literatura, que evidencia taxas de até 10,0%.1313 Zwipp H, Rammelt S, Barthel S. Calcaneal fractures - open reduction and internal fixation (ORIF). Injury. 2004;35(2):46-54.,1717 Heier KA, Infante AF, Walling AK, Sanders RW. Open fractures of the calcaneus: soft-tissue injury determines outcome. J Bone Jt Surg Am. 2003;85-A(12):2276-82. Dos 15 casos de fraturas expostas encontradas no presente trabalho, cinco (33,3%) estiveram relacionados a acidentes de trânsito (quatro com motocicleta e um com automóvel). Considerando apenas as fraturas de calcâneo decorrentes de acidentes com motocicleta (seis casos), quatro foram expostas (66,7%). Esse fato é preocupante, uma vez que a taxa de infecção nas fraturas expostas do calcâneo tende a variar de 7,7% a 39,0%,1818 Richter M, Kwon JY, Digiovanni CW. Foot injuries. In: Skeletal trauma: basic science, management and reconstruction. 5th ed. Philadelphia: Mosby Elsevier; 2014. p. 2251–387. leva à necessidade de cirurgias adicionais em 41%,1919 Beltran MJ, Collinge CA. Outcomes of high-grade open calcaneus fractures managed with open reduction via the medial wound and percutaneous screw fixation. J Orthop Trauma. 2012;26(11):662-70. taxas de osteomielite de até 19% e amputações em 5,2% dos casos.2020 Wiersema B, Brokaw D, Weber T, Psaradellis T, Panero C, Weber C, et al. Complications associated with open calcaneus fractures. Foot Ankle Int. 2011;32(11):1052-7.

Em 25 pacientes foram encontradas lesões associadas (48%), número grande e que reflete a elevada energia dos traumas sofridos pelos pacientes. Dentre esses casos, fraturas em outros ossos do pé foram as mais comuns, com sete casos. Fraturas da coluna lombar, classicamente descritas como lesões comumente associadas, ocorreram em 9,6% do total de casos, número bem próximo ao encontrado em outras séries.77 Worsham JR, Elliott MR, Harris AM. Open calcaneus fractures and associated injuries. J Foot Ankle Surg. 2016;55(1):68-71.,88 Stapleton JJ, Zgonis T. Surgical treatment of intra-articular calcaneal fractures. Clin Podiatr Med Surg. 2014;31(4):539-46. Dados sobre lesões associadas são divergentes entre os estudos; alguns mostram elevada prevalência,1414 Bohl DD, Ondeck NT, Samuel AM, Diaz-Collado PJ, Nelson SJ, Basques BA, et al. Demographics mechanisms of injury, and concurrent injuries associated with calcaneus fractures: a study of 14 516 patients in the American College of Surgeons National Trauma Data Bank. Foot Ankle Spec. 2016, pii:1938640016679703 [Epub ahead of print]. enquanto outros mostram números pouco significativos.1212 Mitchell MJ, McKinley JC, Robinson CM. The epidemiology of calcaneal fractures. Foot. 2009;19(4):197-200. Porém, quando presentes, evidenciam na maioria dos casos fraturas dos membros inferiores, principalmente nos demais ossos do pé e perna, seguidas por fraturas vertebrais.1212 Mitchell MJ, McKinley JC, Robinson CM. The epidemiology of calcaneal fractures. Foot. 2009;19(4):197-200.,1414 Bohl DD, Ondeck NT, Samuel AM, Diaz-Collado PJ, Nelson SJ, Basques BA, et al. Demographics mechanisms of injury, and concurrent injuries associated with calcaneus fractures: a study of 14 516 patients in the American College of Surgeons National Trauma Data Bank. Foot Ankle Spec. 2016, pii:1938640016679703 [Epub ahead of print].

O tempo médio decorrido para a realização do tratamento cirúrgico foi de 7,8 dias, em sua maioria foi feito na primeira semana após o trauma (47,0%). Fatores como lesões associadas, estado geral do paciente e condições dos tecidos moles locais influenciaram o tempo esperado para o tratamento cirúrgico definitivo. Chamam atenção os 11 casos (26,8%) que puderam ser operados somente na terceira semana, pois um tempo de espera tão longo chega a impossibilitar a cirurgia por via minimamente invasiva, uma vez que o processo de consolidação dos fragmentos de osso esponjoso já está avançado, dificulta a redução adequada da fratura.

Os trabalhos epidemiológicos são úteis para o conhecimento da frequência, distribuição e características das fraturas, que servirá como base para prevenção e um tratamento mais adequado. Um ponto fraco do presente trabalho está no fato de ser uma casuística encontrada em um hospital de uma grande metrópole especializado no atendimento de alta complexidade e que tem um fluxo controlado de pacientes, de forma que os dados aqui encontrados não podem ser usados de maneira ampla no nosso país.

Conclusão

Os pacientes com fraturas do calcâneo atendidos em um hospital voltado para o atendimento de alta complexidade são na maioria jovens do gênero masculino que sofreram queda de altura e têm algum tipo de lesão associada. No entanto, os índices de bilateralidade (19,2%) e de exposição da fratura (28,9%) são elevados e caracterizam a maior gravidade dessas fraturas nesse grupo populacional.

  • Trabalho desenvolvido no Instituto de Ortopedia e Traumatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    11 Abr 2017
  • Aceito
    20 Jun 2017
  • Publicado
    13 Jun 2018
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
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