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Fratura-avulsão tuberosidade anterior da tíbia em adolescente - Relato de dois casos#x2606; Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, GO, Brasil.

RESUMO

O objetivo é relatar dois casos raros de fratura-avulsão da tuberosidade anterior da tíbia em adolescentes. Caso 1: 15 anos, masculino, apresentou trauma em aterrissagem em joelho esquerdo, com limitação da extensão. Caso 2: 16 anos, jogador de basquete com dor súbita joelho direito e incapacidade funcional após salto. Exames de imagem (radiografias e tomografias) evidenciaram as fraturas-avulsão da tuberosidade anterior da tíbia. Feita fixação cirúrgica com parafusos e âncoras que evitou a lesão fisária. Evoluíram sem deformidades em membros inferiores.

Palavras-chave:
Fraturas da tíbia/cirurgia; Fraturas da tíbia/radiografia; Tomografia computadorizada por raios X; Traumatismos do joelho

ABSTRACT

The objective here was to report two rare cases of anterior avulsion fracture of the tibial tuberosity in adolescents. Case 1 was a 15-year-old male who became injured through landing on his left knee and presented limited extension. Case 2 was a 16-year-old basketball player who presented sudden pain in the right knee and functional incapacity, after a jump. Imaging examinations (radiographs and computed tomography) showed anterior avulsion fractures of the tibial tuberosity. Surgical fixation was performed using screws and anchors, while avoiding growth plate injury. The cases evolved without lower-limb deformities.

Keywords:
Tibial fractures/surgery; Tibial fractures/radiography; X-ray computed tomography; Knee injuries

Introdução

A tuberosidade anterior da tíbia (TAT) se desenvolve a partir de um centro de ossificação secundário no aspecto anterolateral da tíbia em contraste com o núcleo de ossificação proximal da tíbia. A TAT é uma apófise e desenvolve-se por tração,11. Ogden JA, Southwick WO. Osgood-Schlatter's disease and tibial tuberosity development. Clin Orthop Relat Res. 1976;(116):180-9. enquanto o núcleo proximal da tíbia se desenvolve por compressão. O desenvolvimento da TAT é dividido em quatro etapas: cartilaginoso, apofiseal, epifisário e ósseo.22. Ehrenborg G, Engfeldt B. The insertion of the ligamentum patellae on the tibial tuberosity. Some views in connection with the Osgood-Schlatter lesion. Acta Chir Scand. 1961;121:491-9.

As fraturas-avulsões da TAT em crianças/adolescentes são raras, com poucos casos descritos na literatura, correspondem a 1% de todas as lesões fisárias,33. Ryu RK, Debenham JO. An unusual avulsion fracture of the proximal tibial epiphysis. Case report and proposed addition to the Watson- Jones classification. Clin Orthop Relat Res. 1985;194:181-4. são predominante do sexo masculino (aproximadamente 98%).44. Pesl T, Havranek P. Acute tibial tubercle avulsion fractures in children: selective use of the closed reduction and internal fixation method. J Child Orthop. 2008;2(5):353-6. São resultados de dois possíveis mecanismos de ação: 1) flexão abrupta do joelho com a contração do quadríceps, típico na aterrissagem de um salto; 2) contração violenta do quadríceps com o pé fixo, como no salto.55. Albuquerque RP, Giordano V, Carvalho ACP, Puell T, Albuquerque MIP, Amaral NP. Fratura avulsão bilateral e simultânea da tuberosidade tibial em uma adolescente: relato de caso e terapêutica adotada. Rev Bras Ortop. 2012;47(3):56-60.,66. Carvalho Júnior LH, Benevides WA, Nogueira FCS, Fonseca WV, Andrade RP. Fraturas da tuberosidade tibial anterior em adolescentes. Relato de casos e revisão da literatura. Rev Bras Ortop. 1995;30(1):70-3.and77. Jakoi A, Freidl M, Old A, Javandel M, Tom J, Realyvasquez J. Tibial tubercle avulsion fractures in adolescent basketball players. Orthopedics. 2012;35(8):692-6.

O objetivo deste estudo é relatar dois casos raros de fratura-avulsão da tuberosidade anterior da tíbia em adolescentes tratados cirurgicamente.

Relato dos casos

Caso 1

Paciente de 15 anos, sexo masculino apresentou trauma em aterrissagem em joelho esquerdo em partida de futebol, evoluiu com edema e limitação para extensão da perna esquerda. Ao exame apresentava equimose, dor à palpação em TAT, edema 2+/4+, limitação para extensão da perna esquerda. Radiografias do joelho (fig. 1) e tomografia computadorizada (fig. 2) evidenciaram fratura-avulsão da tuberosidade anterior da tíbia com avulsão do fragmento ósseo.

Figura 1
Aspecto clínico do joelho esquerdo (A) em comparação com contralateral, que evidencia edema importante na região anterior; radiografia do joelho esquerdo em anteroposterior (B) demonstrao edema de partes moles; em perfil (C) evidencia avulsão de fragmento da TAT.

Figura 2
Tomografia computadorizada de joelho esquerdo, reconstrução 3 D em perfil (A) e anteroposterior (B) que evidencia avulsão da TAT e corte sagital (C) com lesão tipo 1 pela classificação de Watson Jones.

O paciente foi submetido a tratamento cirúrgico por meio de fixação do fragmento ósseo avulsionado com um parafuso maleolar e arruela, além de reinserção do tendão patelar com três âncoras (fig. 3). Reabilitação precoce com carga total e amplitude de movimento total em dois meses. Foi liberado para a prática esportiva após seis meses de pós-operatório. Em controle radiográfico apresentou crescimento normal sem discrepância de membros inferiores. O paciente não apresentou recurvatum ou antecurvatum.

Figura 3
Imagem do intraoperatório (A) que evidenciando fragmento avulsionado da TAT; radiografias de controle no pós-operatório anteroposterior (B) e em perfil (C) com fixação com parafuso e âncoras.

Caso 2

Paciente de 16 anos, jogador juvenil de basquete com dor súbita joelho direito e incapacidade funcional após salto durante jogo. Foi diagnosticada fratura-avulsão da TAT com fragmento que se estendia para a articulação (fig. 4A e B). Feitos cuidados imediatos com imobilização e indicado tratamento cirúrgico após sete dias de trauma devido ao edema importante imediato. Feita fixação com parafusos e âncoras sob controle de escopia para evitar lesão fisária (fig. 4 C e D). A reabilitação fisioterápica foi iniciada no sétimo dia pós-operatório, o paciente evoluiu sem deformidades em membros inferiores e retornou à atividade esportiva após oito semanas do trauma.

Figura 4
Radiografias em AP e perfil do joelho direito mostram fratura avulsão da TAT tipo Ogden 3 B (A e B); radiografias de controle pós-operatório (C e D) com 90 dias de evolução já demonstram consolidação da TAT.

Discussão

A fratura-avulsão da tuberosidade anterior da tíbia abrange um número maior de lesões em homens, provavelmente pelo maior número de praticantes de atividades que envolvem saltos. Nos casos apresentados, são resultados de dois possíveis mecanismos de ação: 1) flexão abrupta do joelho com a contração do quadríceps, típico na aterrissagem de um salto; 2) contração violenta do quadríceps com o pé fixo, como no salto.

O sistema de classificação original foi fornecido por Watson-Jones,88. Watson- Jones R. Fractures and joint injuries. 4th ed. Baltimore: Williams & Wilkins; 1955. que definiu três tipos. O tipo I é uma avulsão de uma pequena parte do tubérculo tibial, distal à fise da tibial proximal; o tipo II compromete toda a fise, mas não se estende à articulação do joelho; o tipo III corresponde à avulsão que se estende proximalmente à fise no joelho. Essa classificação foi modificada por Ogden e Southwick,11. Ogden JA, Southwick WO. Osgood-Schlatter's disease and tibial tuberosity development. Clin Orthop Relat Res. 1976;(116):180-9. para definir com mais precisão padrões de fratura específicos e estabelecer tratamento para diferentes tipos de fratura, incluindo deslocamento e fragmentação. Ryu e Debenham33. Ryu RK, Debenham JO. An unusual avulsion fracture of the proximal tibial epiphysis. Case report and proposed addition to the Watson- Jones classification. Clin Orthop Relat Res. 1985;194:181-4. então sugeriram a adição de um tipo IV, que é uma fratura da tuberosidade da tíbia, que se estende posteriormente ao longo da fise tibial proximal e cria uma avulsão de toda a epífise proximal. Em seguida, a adição de um tipo C foi proposta por Frankl et al.99. Frankl U, Wasilewski SA, Healy WL. Avulsion fracture of the tibial tubercle with avulsion of the patellar ligament. Report of two cases. J Bone Joint Surg Am. 1990;72(9):1411-3. para fraturas com avulsão do ligamento da patela associados. Finalmente, um tipo V foi sugerido por McKoy e Stanitski,1010. McKoy BE, Stanitski CL. Acute tibial tubercle avulsion fractures. Orthop Clin North Am. 2003;34(3):397-403. também descrito por Curtis,1111. Curtis JF. Type IV tibial tubercle fracture revisited: a case report. Clin Orthop Relat Res. 2001;389:191-5. que consiste em uma fratura tipo IIIB com uma fratura tipo associado IV que cria a configuração de um Y.

O tratamento dessas lesões apresenta di?culdade de manter uma redução satisfatória da fratura contra a força de tração constante do quadríceps por métodos que não comprometam o crescimento futuro dessa região. No entanto, os doentes com esse tipo de lesão encontram-se frequentemente muito perto do ?m do crescimento cartilaginoso, o que faz com que a redução e a ?xação aberta, quando indicada, possam ser feitas com segurança.

Desse modo, fraturas tipo IA de Ogden são de forma geral tratadas conservadoramente com imobilização em extensão, enquanto que para os restantes tipos é preconizada a redução aberta e a osteossíntese rígida, com reabilitação precoce fisioterápica.1212. Batista N, Sarmento M, Thuesing M, Tavares D, Neves MC. Fracturas- avulsão da tuberosidade anterior da tíbia em adolescente. Rev Port Ortop Traumatol. 2011;19(1): 61-6. Acreditamos que o diagnóstico, bem como o tratamento cirúrgico precoce, possibilitou bons resultados funcionais e retorno ao esporte.

Entre as complicações possíveis dessa lesão estão: a discrepância de membros, o genorecurvatum,33. Ryu RK, Debenham JO. An unusual avulsion fracture of the proximal tibial epiphysis. Case report and proposed addition to the Watson- Jones classification. Clin Orthop Relat Res. 1985;194:181-4.and44. Pesl T, Havranek P. Acute tibial tubercle avulsion fractures in children: selective use of the closed reduction and internal fixation method. J Child Orthop. 2008;2(5):353-6. a patela baixa, a pseudoartrose, a calcificação do tendão patelar e a instabilidade do ligamento cruzado anterior.11. Ogden JA, Southwick WO. Osgood-Schlatter's disease and tibial tuberosity development. Clin Orthop Relat Res. 1976;(116):180-9. As complicações, como fraturas do tubérculo tibial, são relativamente incomuns. No entanto, síndrome compartimental é uma complicação potencialmente grave que deve ser considerada após a apresentação inicial da lesão.33. Ryu RK, Debenham JO. An unusual avulsion fracture of the proximal tibial epiphysis. Case report and proposed addition to the Watson- Jones classification. Clin Orthop Relat Res. 1985;194:181-4.,44. Pesl T, Havranek P. Acute tibial tubercle avulsion fractures in children: selective use of the closed reduction and internal fixation method. J Child Orthop. 2008;2(5):353-6.and55. Albuquerque RP, Giordano V, Carvalho ACP, Puell T, Albuquerque MIP, Amaral NP. Fratura avulsão bilateral e simultânea da tuberosidade tibial em uma adolescente: relato de caso e terapêutica adotada. Rev Bras Ortop. 2012;47(3):56-60.

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  • Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, GO, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2016

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2015
  • Aceito
    30 Out 2015
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