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Excisão de tumor de células gigantes de bainha de tendão com envolvimento ósseo por dupla via de acesso: relato de caso

Resumos

O tumor de células gigantes de bainha de tendão (TCGBT) é uma lesão frequente e é o segundo tumor mais frequente na mão, após o cisto sinovial. O diagnóstico é feito através do exame clínico e por exames complementares (radiografia simples e ressonância magnética). Ao exame radiológico, pode-se observar invasão ou erosão óssea da falange atingida. Na ressonância magnética, um "efeito fluorescente ou brilhoso" pode ser observado, devido à alta quantidade de hemossiderina encontrada no tumor. O tratamento cirúrgico é a prática mais comum, sendo a excisão completa importante para se evitar a recidiva do tumor, especialmente quando se observar invasão óssea nos exames de imagem, que geralmente se relaciona a uma maior recidiva do tumor. Neste trabalho, apresenta-se um caso de tumor de células gigantes de bainha de tendão, encontrado na falange média do terceiro dedo de uma paciente de 45 anos, tratado cirurgicamente com sucesso, por dupla via de acesso, dorsal e volar.

Tumores de Células Gigantes; Osso e Ossos; Radiografia; Ressonância Magnética


Giant cell tumors of the tendon sheath are common lesions and are the second most frequent tumors in the hand, after synovial cysts. They are diagnosed by means of clinical examination and complementary examinations (simple radiography and magnetic resonance). Erosion and invasion of the phalangeal bone affected may be seen on radiological examination. Magnetic resonance may show a "fluorescent or radiant effect" may be observed, caused by the high quantity of hemosiderin inside the tumor. Surgical treatment is the commonest practice, and complete excision is important for avoiding recurrence of the tumor, especially when bone invasion is observed on imaging examinations, which is generally related to greater tumor recurrence. In this paper, a case of a giant cell tumor of the tendon sheath in the middle phalanx of the third finger of a 45-year-old female patient is presented. This was successfully treated by means of surgery using a double access route (dorsal and volar).

Giant Cell Tumors; Bone and Bones; Radiography; Magnetic Resonance


RELATO DE CASO

Excisão de tumor de células gigantes de bainha de tendão com envolvimento ósseo por dupla via de acesso - relato de caso

Excision of giant cell tumor of tendon sheath with bone involvement by means of double access route: case report

Marcelo de Pinho Teixeira Alves

Membro Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia e Associação Brasileira de Cirurgia da Mão; Mestrando em Ciências Médicas pela Universidade Federal Fluminense

Correspondência Correspondência: Av. Genaro de Carvalho, 2.597 22795-077 - Rio de Janeiro, RJ E-mail: marceloptalves@hotmail.com

RESUMO

O tumor de células gigantes de bainha de tendão (TCGBT) é uma lesão frequente e é o segundo tumor mais frequente na mão, após o cisto sinovial. O diagnóstico é feito através do exame clínico e por exames complementares (radiografia simples e ressonância magnética). Ao exame radiológico, pode-se observar invasão ou erosão óssea da falange atingida. Na ressonância magnética, um "efeito fluorescente ou brilhoso" pode ser observado, devido à alta quantidade de hemossiderina encontrada no tumor. O tratamento cirúrgico é a prática mais comum, sendo a excisão completa importante para se evitar a recidiva do tumor, especialmente quando se observar invasão óssea nos exames de imagem, que geralmente se relaciona a uma maior recidiva do tumor. Neste trabalho, apresenta-se um caso de tumor de células gigantes de bainha de tendão, encontrado na falange média do terceiro dedo de uma paciente de 45 anos, tratado cirurgicamente com sucesso, por dupla via de acesso, dorsal e volar.

Descritores: Tumores de Células Gigantes; Osso e Ossos; Radiografia; Ressonância Magnética

ABSTRACT

Giant cell tumors of the tendon sheath are common lesions and are the second most frequent tumors in the hand, after synovial cysts. They are diagnosed by means of clinical examination and complementary examinations (simple radiography and magnetic resonance). Erosion and invasion of the phalangeal bone affected may be seen on radiological examination. Magnetic resonance may show a "fluorescent or radiant effect" may be observed, caused by the high quantity of hemosiderin inside the tumor. Surgical treatment is the commonest practice, and complete excision is important for avoiding recurrence of the tumor, especially when bone invasion is observed on imaging examinations, which is generally related to greater tumor recurrence. In this paper, a case of a giant cell tumor of the tendon sheath in the middle phalanx of the third finger of a 45-year-old female patient is presented. This was successfully treated by means of surgery using a double access route (dorsal and volar).

Keywords: Giant Cell Tumors; Bone and Bones; Radiography; Magnetic Resonance

INTRODUÇÃO

O tumor de células gigantes de bainha de tendão (TCGBT) é uma lesão frequente e é o segundo tumor mais frequente na mão, após o cisto sinovial (1,2). É uma lesão tumoral benigna com comportamento agressivo, em alguns casos, e seu melhor tratamento é o cirúrgico, com excisão ampla(3), evitando danos às estruturas vasculonervosas e tendinosas adjacentes.

Caracteristicamente, é um nódulo indolor, dorsal ou volar ao dedo, geralmente localizado proximalmente à articulação interfalangiana distal (1). Ao exame radiográfico, o TCGBT geralmente se apresenta como uma massa de partes moles que pode causar impressão óssea na face volar da falange adjacente. Eventualmente, o TCGBT pode se assemelhar a uma lesão intraóssea, isto é, cortical ou intramedular, bem definida e osteolítica. A invasão óssea verdadeira ocorre em cerca de 5% dos casos(4).

Macroscopicamente, é uma lesão tipicamente pequena, encapsulada e lobulada. Microscopicamente, consiste de tecido fibroso, hialinizado, com células multinucleadas, macrófagos e células xantomatosas; geralmente, existem quantidades variáveis de hemossiderina(5). A hemossiderina e as células xantomatosas são responsáveis pela diferença de gradientes ao exame de ressonância magnética, causando um "efeito fluorescente" nas imagens(4).

Em relação ao tratamento cirúrgico, existem duas possibilidades mais frequentes, que são a incisão circunferencial preconizada por Braga Silva et al(1) e as incisões de Brunner ou mediolateral para lesões volares e longitudinal ou transversal para lesões dorsais, preconizadas por Glowalcki e Weiss(3).

Apresenta-se neste trabalho um caso de TCGBT na região da falange média do terceiro dedo, de envolvimento circunferencial atípico da falange, causando impressão óssea e deformação da falange média, excisado por dupla via de acesso, dorsal e volar.

RELATO DO CASO

Paciente feminina, 45 anos, referindo aumento de volume do terceiro dedo da mão direita, com cerca de dois anos de evolução, sem dor ou queixas neurológicas.

Ao exame físico, evidenciou-se aumento de volume do terceiro dedo, na região falangiana média, sem sinais de lesões vasculonervosas e sem déficit de flexoextensão do dedo (Figuras 1 e 2).



O exame radiológico simples do dedo evidenciou alteração morfoestrutural da falange média, com estenose segmentar diafisária e cistos subcondrais distais (Figuras 3 e 4).



O exame de ressonância nuclear magnética evidenciou lesão expansiva localizada na falange média, com aparente epicentro na topografia do complexo flexor correspondente, de limites definidos e contornos discretamente lobulados, promovendo remodelamento diafisário da falange média, com dimensões de 1,9 x 2,1 x 1,8 centímetros (Figura 5).


Após assinatura de termo de consentimento livre e esclarecido para a cirurgia, a paciente foi submetida à excisão cirúrgica da lesão, utilizando dupla via de acesso, sob bloqueio anestésico do plexo braquial e após exsanguinação do membro superior. Iniciou-se o ato cirúrgico por via de acesso dorsal, em "S", sobre a falange média, estendendo-se proximalmente à articulação interfalangiana proximal (Figura 6). Com dissecção cuidadosa, observou -se que a lesão envolvia a falange média, poupando o complexo tendinoso extensor, porém afilando a falange (Figura 7). Liberando-se os contornos da lesão, evitando atingir as estruturas vasculonervosas, passou-se à incisão volar, longitudinal na falange média (Figura 8), seccionando-se longitudinalmente a massa tumoral (Figura 9), para permitir sua retirada completa por via dorsal (Figuras 10, 11 e 12). Posteriormente, a peça foi encaminhada para exame histopatológico, confirmando o diagnóstico de TCGBT.








Após a cirurgia, retirou-se o manguito pneumático, para permitir observação direta da integridade do suprimento vascular do dedo. Limpeza da ferida com solução fisiológica a 0,9% e sutura simples da pele com fio mononáilon 4-0 (Figura 13) e curativo compressivo leve.


Após um ano da cirurgia, não houve recidiva da lesão.

DISCUSSÃO

O TCGBT ocorre mais frequentemente na mão e dedos, tipicamente acometendo pacientes femininos com idade entre 30 e 50 anos. É mais frequente nos dedos indicador e médio, próximo à articulação interfalangiana distal, sendo volar em cerca de dois terços dos casos(1,6).

A deformação óssea da falange média, no caso apresentado, ilustra a necessidade de se fazer diagnóstico diferencial do TCGBT com outras lesões que causem impressões e erosões ósseas, como defeitos corticais e lesões císticas nos dedos(4). O mecanismo de invasão óssea ainda não foi demonstrado, mas acredita-se que o TCGBT atinja o canal medular através dos foramens vasculares dos ossos(7).

O exame de ressonância magnética (RM) é de grande valia no planejamento pré-operatório (8), evidenciando as características morfológicas do tumor, como uma massa de tecidos moles bem definida, arredondada, oval ou polilobular, excêntrica ou envolvendo a bainha tendinosa(4). A invasão óssea é também bem evidenciada pela RM, como se observa no caso apresentado.

No caso em questão, o diagnóstico de TCGBT ficou em acordo com a literatura em relação aos achados de sexo, idade e dedo acometido(6), mas mais especificamente com Braga Silva et al(1) que, em seu trabalho, observaram que a maioria das lesões operadas era dorsal e volar e atingindo a falange média.

O tratamento cirúrgico, pela exérese completa do tumor, preservando as estruturas adjacentes, é o preconizado. O cirurgião deve levar em consideração a remoção completa e agressiva do tumor e a preservação dos tecidos normais para função e recuperação(8). As incisões planejadas por Glowalcki e Weiss (3) e Braga Silva et al(1) são opções para ressecção dos TCGBT, com excelente exposição dos tumores. Porém, no caso apresentado, optou-se pela excisão do tumor por dupla via de acesso, dorsal e volar, devido às características evidenciadas pela ressonância magnética, mostrando envolvimento circunferencial do dedo, permitindo sua completa ressecção, evitando, assim, comprometimento do suprimento vascular da extremidade distal do dedo.

Apesar da alta taxa de recidiva relatada na literatura(1,9), de até 45% dos casos(10), não houve recorrência após um ano de acompanhamento pós-operatório nesta paciente. Geralmente, a recorrência do tumor é mais frequente quando há invasão óssea(8,11). No trabalho de Reilly(11)et al, o envolvimento ósseo com erosão foi encontrado em 9% dos pacientes operados inicialmente e, em 26% dos casos que recidivaram. O tempo de seguimento pós-operatório desta paciente ainda é curto, pois, de acordo com Williams et al(10), a taxa de recidiva encontrada após cinco anos da cirurgia foi de 13%. Em seu trabalho, encontraram recidivas, em geral, após uma média de três anos da cirurgia. Estes autores afirmam que se pode prever maior risco de recidiva, baseados em aspectos característicos: envolvimento da cápsula articular, tendão extensor e tendão flexor - o acometimento de qualquer ou todas estas estruturas estava associado com 32% de recidivas. Entretanto, no caso apresentado neste trabalho, não havia envolvimento de nenhuma destas estruturas, o que pode levar a uma menor previsão de recorrência.

O tumor de células gigantes de bainha de tendão (TCGBT) é uma lesão frequente na mão, acometendo especialmente as falanges dos dedos. Benigno e agressivo, tem sua principal indicação o tratamento cirúrgico, que deve ser agressivo e, ao mesmo tempo, preservar o máximo de tecidos normais para não haver comprometimento funcional do dedo.

Além de uma boa anamnese e exame físico, a realização de um bom exame radiológico demonstrando possível envolvimento ósseo, além do exame de ressonância magnética (quando disponível), são fundamentais para o diagnóstico clínico e imagiológico, permitindo-se prever se existe predisposição de recidiva da lesão.

No caso apresentado, o tratamento cirúrgico do TCGBT por dupla via de acesso foi apropriado para a ressecção completa do tumor, não havendo, até a presente data, recidiva do mesmo, apesar da alta taxa encontrada na literatura, tornando o seguimento pós-operatório mais longo uma necessidade para esta paciente.

Trabalho recebido para publicação: 28/02/10, aceito para publicação: 20/08/10.

Trabalho realizado na Clínica Traumato-Ortopédica Madureira - Rio de Janeiro.

Declaramos inexistência de conflito de interesses neste artigo

  • 1. Braga Silva J, Calcagnotto GN, Scolari J, Fridman M. Tumor de células gigantes da bainha tendinosa no nível dos dedos: exérese através da incisão circunferencial. Rev Bras Ortop. 2002;37(4):129-32.
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  • 3. Glowacki KA, Weiss AP. Giant cell tumors of tendon sheath. Hand Clin. 1995;11(2):245-53.
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  • 5. Nahra ME, Bucchieri JS. Ganglion cysts and other tumor related conditions of the hand and wrist. Hand Clin. 2004;20(3):249-60.
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  • 11. Reilly KE, Stern PJ, Dale JA. Recurrent giant cell tumors of the tendon sheath. J Hand Surg Am. 1999;24(6):1298-302.
  • Correspondência:

    Av. Genaro de Carvalho, 2.597
    22795-077 - Rio de Janeiro, RJ
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Jun 2011
    • Data do Fascículo
      2011

    Histórico

    • Recebido
      28 Fev 2010
    • Aceito
      20 Ago 2010
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