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Reparo direto das lesões distais crônicas do tendão bicipital Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Hospital Santa Casa de Misericórdia de Vitória, Vitória, ES, Brasil.

RESUMO

OBJETIVO:

Apresentar os resultados do reparo direto do tendão com EndoButton e parafuso de interferência nos pacientes com lesão do bíceps distal com evolução maior do que 28 dias.

MÉTODOS:

Entre janeiro de 2012 e novembro de 2013, 11 pacientes (todos do sexo masculino) com ruptura do bíceps distal com intervalo da lesão e cirurgia maior do que 28 dias. A idade média foi de 46 anos e o mecanismo de trauma mais comum foi uma carga excêntrica com o cotovelo em flexão e supinação.

RESULTADOS:

Foi feita uma análise subjetiva da dor e função com a Escala Visual Analógica de Dor (EVA) e o Mayo Elbow Performance Score (MEPS) pré e pós-operatório. Houve uma diminuição da EVA de 5 pontos para 0,8 ponto em média. O MEPS melhorou de 69,3 pontos no pré para 97,5 pontos no pós-operatório. A média de flexão foi de 133,1° do lado operado contra 134,3°. A média de extensão foi de -2,5° e 0° (lado operado × não operado). Supinação foi de 88,2° × 89,5° e pronação 82,5° × 84,1° quando comparado o lado operado versus o lado não operado. A força de flexão e supinação foi avaliada com o auxílio de um dinamômetro e verificamos que a força média de flexão e supinação correspondia, respectivamente, a 78,57% e 89,65% a força do membro não operado.

CONCLUSÃO:

A técnica do reparo direto do tendão com o uso de EndoButton e parafuso de interferência mostra-se como uma opção segura e eficaz para o reparo direto das lesões crônicas do bíceps distal.

Palavras-chave:
Traumatismos dos tendões; Tenodese; Transferência tendinosa; Medicina física e reabilitação

ABSTRACT

OBJECTIVE:

To present the results from direct tendon repair using EndoButton and interference screws in patients with lesions of the distal biceps that had evolved over a period of more than 28 days.

METHODS:

Between January 2012 and November 2013, eleven patients (all male) with a torn distal biceps and a time interval between injury and surgery of more than 28 days were evaluated. The patients' mean age was 46 years and the most common mechanism of injury was eccentric loading with the elbow flexed and supinated.

RESULTS:

A subjective analysis on pain and function was conducted using a visual analog scale of pain (VAS) and the Mayo Elbow Performance Score (MEPS), before and after surgery. The VAS showed a decrease of 5 points to 0.8 points on average. The MEPS improved from 69.3 points before the operation to 97.5 points afterwards. The mean flexion was 133.1° on the operated side, versus 134.3°. The mean extension was -2.5° and 0° (operated side versus non-operated). Supination was 88.2° versus 89.5° and pronation was 82.5° versus 84.1°, comparing the operated side versus the non-operated side. Flexion and supination strengths were evaluated with the aid of a dynamometer, and the mean flexion and supination strengths were found to be respectively 78.57% and 89.65% of the strength of the non-operated limb.

CONCLUSION:

Use of the technique of direct tendon repair using EndoButton and interference screws was shown to be a safe and effective alternative for repairing chronic lesions of the distal biceps.

Keywords:
Tendon injuries; Tenodesis; Tendon transfer; Physical and rehabilitation medicine

Introdução

As lesões do tendão bicipital distal são lesões relativamente raras, representam apenas 3% das lesões do bíceps, a mais frequente é o acometimento da cabeça longa em sua porção proximal (96%).11. McDonald LS, Dewing CB, Shupe PG, Provencher MT. Disorders of the proximal and distal aspects of the biceps muscle. J Bone Joint Surg Am. 2013;95(13):1235-45. Mais comumente o mecanismo de lesão é uma carga excêntrica com o cotovelo em flexão e supinação em pacientes do sexo masculino entre a quinta e sexta década de vida. A fisiopatologia é pouco compreendida, mas sabe-se que a tendinopatia degenerativa, o impacto mecânico, algumas doenças endócrinas e o uso de esteroides anabolizantes estão implicados no aparecimento dessa entidade.22. Geaney LE, Mazzocca AD. Biceps brachii tendon ruptures: a review of diagnosis and treatment of proximal and distal biceps tendon ruptures. Phys Sportsmed. 2010;38(2):117-25.

Apesar de os achados clínicos serem clássicos, a raridade da lesão e o bom arco de movimento que o paciente apresenta resultam em uma apresentação e um diagnóstico tardio. Historicamente, o tratamento conservador foi sugerido no manejo das lesões agudas. No entanto, com estudos biomecânicos demonstrando perda da força de flexão e supinação de até 30% e 40% respectivamente, muitos autores recomendam preferencialmente o reparo anatômico agudo em vez do reparo não anatômico com o tendão braquial.33. Mazzocca AD, Burton KJ, Romeo AA, Santangelo S, Adams DA, Arciero RA. Biomechanical evaluation of 4 techniques of distal biceps brachii tendon repair. Am J Sports Med. 2007;35(2):252-8. Com resultados de perda de força de supinação em torno de 50% com a técnica de transferência com o tendão braquial, novas técnicas surgiram para proporcionar que o reparo direto fosse o tratamento preferido principalmente naqueles pacientes que almejam o retorno total às atividades.44. D'Alessandro DF, Shields CL Jr, Tibone JE, Chandler RW. Repair of distal biceps tendon ruptures in athletes. Am J Sports Med. 1993;21:114-9.

Lesões crônicas muitas vezes são difíceis de ser tratadas devido à retração do tendão, atrofia muscular e fibrose associada. No entanto, o tratamento conservador apresenta resultados insatisfatórios. Apesar de não haver consenso quanto à definição do intervalo de tempo da lesão crônica, o uso de enxerto tendinoso é recomendado nas rupturas crônicas, pois dessa forma restaura o comprimento e evita a contratura em flexão do cotovelo.55. Flint JH, Wade AM, Giuliani J, Rue JP. Defining the terms acute and chronic in orthopaedic sports injuries: a systematic review. Am J Sports Med. 2014;42(1):235-41. O enxerto autólogo pode causar morbidade no local da doação e usar aloenxerto ainda tem o risco de infecção e custos elevados em alguns locais. A literatura apresenta inúmeras técnicas para o reparo nas lesões agudas e para a reconstrução com enxerto nas lesões crônicas. No entanto, há poucos trabalhos que demonstram o resultado do tratamento com reparo direto sem enxerto nas lesões crônicas.11. McDonald LS, Dewing CB, Shupe PG, Provencher MT. Disorders of the proximal and distal aspects of the biceps muscle. J Bone Joint Surg Am. 2013;95(13):1235-45.,22. Geaney LE, Mazzocca AD. Biceps brachii tendon ruptures: a review of diagnosis and treatment of proximal and distal biceps tendon ruptures. Phys Sportsmed. 2010;38(2):117-25.,66. Kettler M, Tingart MJ, Lunger J, Kuhn V. Reattachment of the distal tendon of biceps: factors affecting the failure strength of the repair. J Bone Joint Surg Br. 2008;90(1):103-6.and77. Rios CG, Mazzocca AD. Interference screw with cortical button for distal biceps repair. Sports Med Arthrosc. 2008;16(3):136-42.

O objetivo deste trabalho é apresentar os resultados da modificação da técnica de Bain et al.,88. Bain GI, Prem H, Heptinstall RJ, Verhellen R, Paix D. Repair of distal biceps tendon rupture: a new technique using the Endobutton. J Shoulder Elbow Surg. 2000;9(2):120-6. que faz o reparo direto do tendão com EndoButton e parafuso de interferência nos pacientes com lesão do bíceps distal com evolução maior do que 28 dias.

Material e métodos

De janeiro de 2012 a novembro de 2013, oito pacientes (todos do sexo masculino) com ruptura do bíceps distal com intervalo da lesão e apresentação maior do que 28 dias foram operados por um único especialista de cotovelo, após aprovação do conselho de ética da instituição. O diagnóstico era feito com base na história clínica, no exame físico e nos exames complementares (Figura 1, Figura 2 and Figura 3).

Figura 1
Corte sagital de ressonância magnética no qual se evidencia a lesão do bíceps distal.

Figura 2
Corte sagital de ressonância magnética no qual se evidencia a lesão do bíceps distal.

Figura 3
Corte axial de ressonância magnética no qual se evidencia a lesão do bíceps distal.

A idade média dos pacientes foi de 47,5 anos e o mecanismo de trauma mais comum foi uma carga excêntrica com o cotovelo em flexão e supinação. Dois pacientes apresentaram a lesão durante o levantamento de peso (pneu de trator e barra de academia com peso) e um durante uma queda ao solo. O tempo médio do dia do trauma até a cirurgia foi de 71,8 dias.

Foram aplicados os escores da Clínica Mayo e a Escala Visual Analógica de Dor no pré e pós-operatório. A avaliação da força de flexão e supinação foi feita somente no pós-operatório e a comparação foi feita com o lado contralateral.

Para aferir as forças de flexão e supinação foi usado um dinamômetro digital (Lafayette Manual Muscle Testing System modelo 01165, Lafayette, IN 47903) com auxílio de um cabo de madeira devidamente marcado para facilitar a medição da supinação e não interferir no momento das forças aplicadas (Figura 4, Figura 5, Figura 6 and Figura 7). Quatro medidas eram tomadas sempre pelo mesmo avaliador e a média entre as três últimas era feita. A primeira medida era desconsiderada para evitar o viés do aprendizado da forma da medida por parte do paciente. O tempo médio do seguimento com a avaliação clínica e os escores foi em média de 14 meses (12-19).

Figura 4
Dinamômetro usado para as aferições de força.

Figura 5
Bastão com marcação usado para auxiliar a aferição da força de supinação.

Figura 6
Aferição da força de supinação.

Figura 7
Aferição da força de flexão.

Foi feita análise descritiva das variáveis estudadas. Na análise dos dados foi usado teste não paramétrico, devido a não normalidade. Para a comparação entre os momentos pré e pós-cirúrgico por meios dos instrumentos EVA e Mayo e comparação entre os lados operados e não operado nos arcos de movimentos flexão, extensão, supinação e pronação e força em flexão e supinação foi empregado o teste não paramétrico de Wilcoxon. Para toda a inferência estatística um p-valor de 0,05 foi considerado. O software usado foi SPSS for Windows version 20.0

Técnica operatória

Todos os pacientes foram posicionados em decúbito dorsal horizontal e submetidos ao bloqueio anestésico plexular + sedação. Um garrote com faixa de Esmarch foi aplicado na raiz do membro. Uma incisão curvilínea (fig. 8) única de aproximadamente 7 cm foi feita levemente distal à prega antecubital. A via de Henry's foi usada para expor a tuberosidade radial em supinação e um furo bicortical foi feito com uma broca de 4,5 mm. Uma goiva de ponta fina foi usada para alargar o furo de entrada (proximal) de acordo com a espessura da extremidade do tendão. Se necessário, uma segunda e pequena incisão era feita aproximadamente 5 cm proximal à prega do cotovelo para isolar o coto do tendão retraído. O coto do tendão retraído normalmente apresentava-se envolvido por um tecido fibrótico juntamente com sua bainha e não nos preocupamos em preservar o lacertus fibrosus. A junção musculotendínea era identificada após dissecção e liberação de todo tecido fibrótico peritendinoso. Esse procedimento permitia um ganho de comprimento em torno de 2-3 cm. Dois fios de alta resistência eram passados pelo tendão pela técnica de Krackow com intervalos de 1 cm entre eles para ser acoplados ao EndoButton.

Figura 8
Imagem intraoperatória que mostra a incisão.

Dissecção romba era feita com o dedo para liberar o ventre muscular do bíceps da fáscia profunda e do músculo braquial profundamente. Cuidado especial era tomado na identificação do nervo cutâneo lateral do antebraço (ramo do musculocutâneo) que passa entre o bíceps e o braquial (fig. 9). Em seguida o tendão reparado com o EndoButton era passado através do túnel original abaixo da prega anterior antecubital até a tuberosidade radial. Evitávamos ao máximo expor a face lateral da ulna devido a complicações como ossificação heterotópica.

Figura 9
Imagem intraoperatória que mostra o nervo musculocutâneo.

Em praticamente todos os casos, apesar da liberação do coto tendinoso e do ventre muscular dos tecidos fibróticos e de uma tensão constante no tendão para ganho de comprimento, só se conseguia passar o EndoButton pelos furos na tuberosidade com o cotovelo em flexão aproximada de 90-120°. As extremidades do EndoButton eram conectadas a dois fios de Ethibond, os quais, por sua vez, eram amarrados à extremidade do fio-guia da broca do EndoButton e exteriorizavam pelo compartimento móvel dorsal do antebraço. Em seguida fazia-se o tombamento ("flip") do EndoButton e o controle pela fluroscopia (fig. 10).

Figura 10
Imagem fluoroscópica no intraoperatório que mostrando o posicionamento do EndoButton.

Após confirmação do correto posicionamento do EndoButton, um parafuso de interferência absorvível (Smith & Nephew, Andover MA) era usado para aumentar o contato do tendão com o furo proximal na posição de máxima extensão conseguida pelo cotovelo nesse momento (Figura 11, Figura 12 and Figura 13).

Figura 11
Medida do diâmetro do coto tendíneo do bíceps.

Figura 12
Colocação do parafuso de interferência.

Figura 13
Desenho esquemático que mostra os dois implantes.

Protocolo pós-operatório

Uma tipoia velpeau era colocada no paciente no pós-operatório imediato. Se percebêssemos que o paciente apresentava alguma dificuldade de entendimento em obedecer ao protocolo de reabilitação, deixávamos uma tala gessada com o cotovelo em 90° de flexão e neutro. Arco de movimento passivo de flexão e ativo de extensão era iniciado no segundo dia de pós-operatório no limite da dor. A tipoia era usada somente para conforto. Com três semanas a tipoia era descontinuada e exercícios ativos de flexão e passivos de extensão iniciados com quatro semanas. Exercícios de fortalecimento eram iniciados com oito semanas e contra resistência a partir da 10 semanas. O retorno às atividades esportivas era permitido em torno de quatro a seis meses, após o treino do gesto esportivo bem realizado.

Avaliação dos pacientes

O arco de movimento foi mensurado com um goniômetro manual por um examinador (cirurgião) seguindo os critérios da Academia Americana (AAOS). Todos os pacientes foram avaliados pelo escore funcional da Clínica Mayo e pela Escala Visual Analógica de Dor.99. Broberg MA, Morrey BF. Results of delayed excision of the radial head after fracture. J Bone Joint Surg Am. 1986;68(5):669-74.

Resultados

Os resultados estão representados nas Tabela 1, Tabela 2 and Tabela 3. Todos pacientes ao longo dos meses ganharam arco de movimento. A média de flexão foi de aproximadamente 133° e correspondeu a 99% do membro não operado. A média de extensão foi de 2,5° de flexão. Dois pacientes ficaram com uma contratura em flexão de aproximadamente 10°. A média da supinação foi de 88 e pronação de 82,5°, o que correspondeu a 98,5 e 98% do membro contralateral.

Tabela 1
Comparação pré e pós-cirúrgico, segundo EVA e escore da clínica Mayo
Tabela 2
Comparação arcos de movimento entre os lados operados e não operados
Tabela 3
Comparação de força entre os lados operados e não operados

Pela Escala da Clínica Mayo todos os pacientes obtiveram resultados excelentes com pontuação maior do que 90°. A média da Escala Visual Analógica de Dor foi de 5 para 0,8 no pós-operatório e foi observada diferença estatística nos dois escores funcionais (p < 0,05).

A força de flexão média foi de 17,6 newtons e correspondeu a 79,25% do lado não operado. A força média de supinação foi de 2,6 N e correspondeu a 89,75%, do lado não operado.

Complicações como parestesia na face lateral do antebraço correspondente a neuropraxia do nervo cutâneo lateral do antebraço foram observadas em uma paciente e se resolveram em três meses. Não tivemos casos de rerruptura do tendão, fratura da cortical do rádio e ossificação heterotópica.

Discussão

Nossa série de casos de ruptura do bíceps distal apresenta o perfil epidemiológico clássico do homem de meia-idade, porém ativo, em que o tratamento conservador resulta em elevado déficit funcional. O reparo cirúrgico das lesões distais do bíceps demonstra resultados superiores ao tratamento conservador. Baker et al. compararam o tratamento conservador e cirúrgico e mostraram uma diminuição da força e resistência de supinação de 55% e 86%, respectivamente.1010. Baker BE, Bierwagen D. Rupture of the distal tendon of the biceps brachii, operative versus non- operative treatment. J Bone Joint Surg Am. 1985;67(3):414-7.

Há várias opções cirúrgicas para a reparação das rupturas do bíceps distal. Lesões agudas podem ser tratadas com reparo primário à tuberosidade bicipital radial ou reparo não anatômico com a transferência de tendão para o braquial. Klonz et al.1111. Klonz A, Eggers C, Reilmann H. Proximal and distal biceps tendon rupture - an indication for surgery? Unfallchirurg. 1998;101(9):735-9. compararam a transferência para o tendão braquial e a correção anatômica via sutura com âncora. Embora a resistência à flexão tenha sido restaurada, metade dos pacientes do grupo do reparo indireto teve uma diminuição de 50% na força de supinação De Carli et al.1212. De Carli A, Zanzotto E, Vadalà AP, Luzon D, Di Salvo M, Ferretti A. Surgical repair of the distal biceps brachii tendon: clinical and isokinetic long-term follow- up. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2009;17(7):850-6. também relataram resultados de reparação indireta em 23 pacientes e mostraram uma redução na resistência em flexão de 12%, supinação de 13% e redução do trabalho total em supinação de 25%. Na nossa casuística, o reparo direto mostrou uma força de flexão e supinação aproximadamente de 80 e 90%, respectivamente, quando comparado ao lado contra lateral.

As lesões do bíceps distal podem ser reparadas por meio de uma única via de acesso anterior estendida, abordagem de Boyd e Anderson1313. Boyd H, Anderson L. A method for reinsertion of the distal biceps brachii tendon. J Bone Joint Surg Am. 1961;43:1041-3. com dois acessos, acesso de Boyd-Anderson modificado ou até mesmo um acesso endoscópico modificado. Usamos uma abordagem anterior com uma incisão levemente distal à prega do cotovelo e não precisamos em fazer uma segunda incisão proximal para isolar o coto tendíneo retraído. Cuidado especial deve ser tomado ao isolar o ramo sensitivo do musculocutâneo.

Métodos de fixação direta variam desde a tradicional calha óssea até a reparação com o uso de dispositivos modernos, tais como âncoras, EndoButton e parafusos de interferência. Os protocolos de reabilitação usados dependerão, em parte, da força da reconstrução ou reparo. Weinstein et al.1414. Weinstein DM, Ciccone WJ 2nd, Buckler MC, Balthrop PM, Busey TD, Elias JJ. Elbow function after repair of the distal biceps brachii tendon with a two-incision approach. J Shoulder Elbow Surg. 2008;17 Suppl. 1:82S-6S. monitoraram 32 pacientes tratados pela técnica de duas incisões com âncoras ósseas. O protocolo pós-operatório determinava quatro semanas de imobilização em uma tala e quatro meses de atividades protegida. Apesar disso, a amplitude de movimento foi restaurada e uma pontuação Dash de 4 ± 7 foi obtida. Cil et al.1515. Cil A, Merten S, Steinmann SP. Immediate active range of motion after modified 2-incision repair in acute distal biceps tendon rupture. Am J Sports Med. 2009;37(1):130-5. também relataram o resultado da abordagem com duas incisões em 21 pacientes, excluindo rupturas crônicas. Seu protocolo pós-operatório incentivava iniciar a amplitude de movimento no primeiro ou segundo dia pós-operatório, com a limitação de resistência de uma libra para as primeiras seis semanas e duas libras para os primeiros três meses. Flexão e pronossupinação foram restauradas, com arcos de movimento de 0 a 145° e 74° a 75°, respectivamente. A pontuação média Dash em seu grupo foi de 3,6 ± 3,6. Nossos pacientes ficaram imobilizados apenas com uma tipoia por três semanas, com movimentação ativa de punho de dedos permitida no primeiro dia pós-operatório e exercícios de flexão passiva e extensão ativa conforme tolerado iniciados a partir da terceira semana. O arco de movimento de flexoextensão e pronossupinação foram de -2,5-133 e de 82,5-88,2 graus, respectivamente.

A técnica com EndoButton, descrita pela primeira vez por Bain et al., revelou-se eficaz na reparação aguda, com forças de arrancamento superiores em comparação com outros métodos correspondentes.1313. Boyd H, Anderson L. A method for reinsertion of the distal biceps brachii tendon. J Bone Joint Surg Am. 1961;43:1041-3.and1414. Weinstein DM, Ciccone WJ 2nd, Buckler MC, Balthrop PM, Busey TD, Elias JJ. Elbow function after repair of the distal biceps brachii tendon with a two-incision approach. J Shoulder Elbow Surg. 2008;17 Suppl. 1:82S-6S. Isso de certa forma permite uma mobilização já no pós-operatório imediato, promove um ganho gradual de extensão precocemente, com recuperação praticamente completa da extensão. Apesar dessa vantagem teórica, os estudos publicados sobre a técnica com EndoButton apresentaram programas de reabilitação com retorno limitado ou estagiado ao movimento.33. Mazzocca AD, Burton KJ, Romeo AA, Santangelo S, Adams DA, Arciero RA. Biomechanical evaluation of 4 techniques of distal biceps brachii tendon repair. Am J Sports Med. 2007;35(2):252-8.,1515. Cil A, Merten S, Steinmann SP. Immediate active range of motion after modified 2-incision repair in acute distal biceps tendon rupture. Am J Sports Med. 2009;37(1):130-5.and1616. Bain GI, Johnson LJ, Turner PC. Treatment of partial distal biceps tendon tears. Sports Med Arthrosc. 2008;16(3):154-61. Deixamos os pacientes com uma tipoia começarem a se mobilizar em torno da terceira semana. Isso permitiu que os pacientes recuperassem quase a extensão total em cinco semanas e acreditamos que isso contribuiu para a excelente amplitude de movimento obtida. Em dois casos, deixamos uma tala gessada por duas semanas como medida de precaução, devido à dificuldade cognitiva que os pacientes apresentavam.

Reparo direto em rupturas crônicas com tendão retraído era relatado previamente ser "impossível sem limitar a extensão". A retração do tendão tem forçado alguns autores a usar autoenxerto de interposição para recuperar a extensão prévia do cotovelo. O uso de enxerto foi recomendado onde o reparo não poderia ser alcançado pelo tendão nativo além de 70° de flexão. Bain et al.1616. Bain GI, Johnson LJ, Turner PC. Treatment of partial distal biceps tendon tears. Sports Med Arthrosc. 2008;16(3):154-61. usaram o EndoButton para reparo de 12 lesões agudas e uma lesão crônica, por meio de enxerto autólogo do semitendíneo para suprir e retração. A amplitude de movimento durante o seguimento foi de 5-146°, com pronossupinação de 81-80°. A força foi mensurada subjetivamente em 5/5. Apesar do tempo de evolução dos nossos pacientes, fixávamos o parafuso de interferência com flexão em torno de 90-110 graus de flexão e no entanto não tivemos casos de contratura em flexão ou déficit de extensão significativos.

Em reparos tardios, mesmo com ampla mobilização, a extremidade retraída do tendão só pode ser trazida para a inserção radial com máxima flexão do cotovelo.88. Bain GI, Prem H, Heptinstall RJ, Verhellen R, Paix D. Repair of distal biceps tendon rupture: a new technique using the Endobutton. J Shoulder Elbow Surg. 2000;9(2):120-6.,1515. Cil A, Merten S, Steinmann SP. Immediate active range of motion after modified 2-incision repair in acute distal biceps tendon rupture. Am J Sports Med. 2009;37(1):130-5.,1717. Bosman HA, Fincher M, Saw N. Anatomic direct repair of chronic distal biceps brachii tendon rupture without interposition graft. J Shoulder Elbow Surg. 2012;21(10): 1342-7.and1818. Dillon MT, Bollier MJ, King JC. Repair of acute and chronic distal biceps tendon ruptures using the EndoButton. Hand (NY). 2011;6(1):39-46. Quanto maior for a flexão do cotovelo, mais difícil é para inserir os parafusos de interferência ou fazer suturas na face volar. A vantagem do EndoButton é que ele permite que a passagem do tendão pelo rádio seja feita às cegas, com uma tração sobre o tendão e o EndoButton mantido na linha de tração. A passagem dos fios pode ser feita com um guia de ponta romba de menos de 2 mm de diâmetro que torna a lesão de estruturas neurovasculares improvável. A técnica com EndoButton é segura, com estudos em cadáver que mostram o nervo interósseo posterior distando em torno de 7 e 14 mm do local da passagem do EndoButton.1919. Kettler M, Lunger J, Kuhn V, Mutschler W, Tingart MJ. Failure strengths in distal biceps tendon repair. Am J Sports Med. 2007;35(9):1544-8.and2020. Eames MH, Bain GI, Fogg QA, van Riet RP. Distal biceps tendon anatomy: a cadaveric study. J Bone Joint Surg Am. 2007;89(5):1044-9. Uma vez que o EndoButton "tomba", o cotovelo pode ser estendido e a passagem do tendão no osso vista diretamente para a inserção do parafuso de interferência ser inserido.

Embora tenhamos sido capazes de recolocar o tendão em todos os casos, a possibilidade de formação de fibrose excessiva ou má qualidade tendão residual existe. Como isso é verificado apenas no intraoperatório, é prudente preparar um termo de consentimento informado para a colheita de um enxerto de tendão se necessário. Nos nossos casos operados todos os tendões reparados conseguiram chegar à tuberosidade radial sem muita tensão, o que acreditamos também ser em decorrência da integridade do lacertus fibrosus na grande maioria dos casos.

Taxas de complicação de até 31% foram relatadas depois do reparo agudo.2121. Klonz A, Loitz D, Wöhler P, Reilmann H. Rupture of the distal biceps brachii tendon: isokinetic power analysis and complications after anatomic reinsertion compared with fixation to the brachialis muscle. J Shoulder Elbow Surg. 2003;12(6):607-11.and2222. Loitz D, Klonz A, Reilmann H. Technique of distal biceps tendon repair using a limited anterior approach. Unfallchirurg. 2002;105(9):837-42. Os maiores riscos são de lesão dos nervos cutâneo lateral do antebraço, interósseo posterior e radial, além de infecção da ferida operatória, contratura em flexão e ossificação heterotópica. As taxas de complicação semelhantes foram mostradas para uma ou duas incisões, apesar de o risco adicional de sinostose ter sido relatado com uma segunda abordagem posterior contra o aumento do risco de paralisia do nervo radial, no método de incisão única. Quanto mais cedo o reparo, menor o risco de complicação. Bisson et al.2323. Bisson L, Moyer M, Lanighan K, Marzo J. Complications associated with repair of a distal biceps rupture using the modified two-incision technique. J Shoulder Elbow Surg. 2008;17 Suppl. 1:67S-71S. demonstraram uma taxa complicação de até 40% quando o reparo ocorreu 14 dias ou mais após a lesão em comparação com 20% no reparo precoce. A taxa de complicações em nosso grupo foi menor, apesar de nossos reparos terem sido feitos tardiamente (28-180 dias). Nenhum paciente apresentou lesão do nervo interósseo posterior. O nervo cutâneo lateral do antebraço estava aderido à face profunda do músculo bíceps e em risco quando o músculo foi mobilizado. Apesar dos cuidados tomados, um paciente desenvolveu neuropraxia transitória do cutâneo lateral do antebraço que resolveu com três meses.

A técnica do reparo direto das lesões crônicas do bíceps distal permite uma boa fixação do tendão ao mesmo tempo com recuperação do arco do movimento e uma boa força de flexão e supinação com baixa taxa de complicações.

Como pontos fracos do trabalho podemos citar o número de casos pequeno, tipo de estudo (série de casos sem amostra comparativa), custo da técnica por usar dois implantes.

Como pontos fortes podemos ressaltar a baixa morbidade do procedimento por não usar enxerto mesmo sendo lesões crônicas, via única de acesso que permite visualizar e isolar as estruturas neurovasculares, além de uma boa cosmese (fig. 14). Devido à fixação rígida e mais resistente do tendão com dois implantes, permitimos uma reabilitação mais precoce e não usamos imobilização gessada.

Figura 14
Aspecto cosmético da incisão.

Conclusão

As lesões crônicas do bíceps distal podem acarretar déficits funcionais na população adulto jovem e que desempenha alguma atividade física ou atlética. O uso da técnica do reparo direto do tendão com de EndoButton e parafuso de interferência mostra-se uma opção segura e eficaz nas lesões crônicas do bíceps distal com mais de quatro semanas de evolução.

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  • Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Hospital Santa Casa de Misericórdia de Vitória, Vitória, ES, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    29 Abr 2015
  • Aceito
    11 Jun 2015
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