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Transtorno do pânico e gravidez

CARTA AOS EDITORES

Transtorno do pânico e gravidez

Isabella Nascimento; Fabiana L Lopes; Alexandre M Valença; Marco A Mezzasalma; Antonio E Nardi

Laboratório de Pânico e Respiração. Instituto de Psiquiatria – Universidade Federal do Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Sr. Editor,

Alguns relatos de caso sugerem que a gravidez protege contra o transtorno do pânico (TP), mas a piora ou a ausência de alteração no TP durante a gravidez também são relatadas.1-2 Descrevemos duas mulheres com TP (DSM-IV) com graves ataques de pânico durante a gravidez e que foram eficaz e seguramente tratadas com um antidepressivo tricíclico – nortriptilina, no Laboratório de Pânico e Respiração da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Caso A:

A., negra, 29 anos. Aos 24 anos de idade começou a ter ataques de pânico espontâneos. Foi tratada com nortriptilina (75 mg/dia). Após 20 meses, estava assintomática e começou a diminuir a dose. Teve sua primeira gravidez após um ano sem medicação. No entanto, durante o quarto mês de gestação, ela desenvolveu ataques de pânico intensos, quase diários. Um grave padrão agorafóbico se desenvolveu e ela também apresentava intensa ansiedade antecipatória, perturbando sua qualidade de vida. Foi inicialmente tratada com nortriptilina, 10 mg/dia. Após cinco semanas, com a dose de 75 mg/dia, atingiu remissão completa de seus ataques. Durante as últimas duas semanas de sua gravidez a nortriptilina foi retirada. O período assintomático persistiu após um acompanhamento de dois anos sem medicação.

Caso B:

C., negra, 29 anos. Começou a ter ataques de pânico aos 24 anos de idade. Foi tratada com imipramina, 200 mg/dia. Após seis meses de tratamento estava livre de ataques de pânico. Durante os 12 meses seguintes, esteve assintomática, mas ainda tomando imipramina. Durante o primeiro mês de sua primeira gravidez parou de tomar imipramina, mas os ataques de pânico recrudesceram. Começou terapia cognitivo-comportamental, mas somente conseguiu uma leve melhora. As conseqüências incapacitantes de seu alto nível de ansiedade e da freqüência dos ataques de pânico pioraram seus sintomas agorafóbicos. Começou-se nortriptilina no quarto mês de gravidez e com 100 mg/dia alcançou-se uma remissão completa. A medicação foi mantida durante o ultimo mês de gravidez. Ela não teve nenhum ataque de pânico após um acompanhamento de um ano com nortriptilina.

Discussão

A gravidez poderia impedir o TP pela diminuição da reatividade do sistema nervoso simpático, através da facilitação da atividade GABAérgica por meio do efeito da progesterona na adenosina, ou pela diminuição dos níveis séricos de CO2 arterial por meio de ventilação/minuto.3 Klein4 hipotetizou que o aumento da progesterona, associado à gravidez, estimularia a respiração e diminuindo a pCO2; portanto a gravidez protegeria as pacientes, aumentando a distância entre seus níveis de pCO2 em relação ao limiar do pânico. Klein também sugeriu que a lactação protegeria contra o TP devido à ação da ocitocina na ansiedade.

Durante a gravidez, as estratégias não-farmacológicas, tais como a terapia cognitivo-comportamental, são preferíveis às medicações antipânico. Essas estratégias, no entanto, podem não ser suficientes e os clínicos podem necessitar do uso de medicações para mulheres grávidas que permaneçam gravemente sintomáticas. Nossos casos sugerem que alguns subgrupos de mulheres com TP podem ser particularmente vulneráveis à persistência dos sintomas durante a gravidez. Os antidepressivos tricíclicos são uma opção razoável, pois os dados sobre seu uso na gravidez mostram que eles não parecem estar associados a efeitos teratogênicos.5

Referências

1. Northcott CJ, Stein MB. Panic disorder in pregnancy. J Clin Psychiatry. 1994;55:539-42.

2. Villeponteaux VA, Lydiard RB, Laraia MT, Stuart GW, Ballenger JC. The effects of pregnancy on preexisting panic disorder. J Clin Psychiatry. 1992;53:201-3.

3. Costei AM, Kozer E, Ho T, Ito S, Koren G. Perinatal outcome following third trimester exposure to paroxetine. Arch Pediatr Adolesc Med. 2002;156:1129-32.

4. Klein DF. False suffocation alarms, spontaneous panics, and related conditions: an integrative hypothesis. Arch Gen Psychiatry. 1993;50:306-17.

5. American Academy of Pediatrics. Use of psychoactive medication during pregnancy and possible effects on the fetus and newborn. Committee on Drugs. Pediatrics. 2000;105:880-7.

Financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Processo 304671/2003-7.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Fev 2005
  • Data do Fascículo
    Set 2004
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