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Avaliação da atividade citotóxica das sementes de Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae)

Evaluation of the cytotoxic activity of seeds of Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae)

Resumos

Na família Annonaceae, especialmente o gênero Annona é muito apreciado por fornecer frutos comestíveis. Espécies desse gênero são utilizadas na medicina popular contra diabetes, malária e infecções. Muitas dessas atividades biológicas têm sido relacionadas às acetogeninas de anonáceas. O objetivo deste estudo foi avaliar a atividade citotóxica dos grupos e de uma acetogenina pura (cornifolina) obtidos a partir do extrato etanólico das sementes de Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae). Esta atividade foi avaliada pelo ensaio colorimétrico MTT. Cornifolina (1), a única substância pura testada, apresentou citotoxicidade positiva sobre todas as linhagens tumorais avaliadas. Os grupos testados, todos caracterizados por espectroscopia no infravermelho (IV), apresentaram 68,7% dos valores de CI50 menores que 20,0 µg mL-1, sendo também considerados citotóxicos. As amostras testadas foram mais ativas que o taxol sobre melanoma humano (MeWo) e, ainda, o grupo G10-5 apresentou melhor atividade sobre fibroblasto tumorigênico de camundongo (L929). Além disso, os grupos mostraram menor citotoxidade do que o taxol sobre a linhagem normal (CHO).

Annona cornifolia; atividade citotóxica; cornifolina; MTT


The family Annonaceae, especially the genus Annona, is greatly appreciated for providing edible fruits. Species of this genus are used in folk medicine against diabetes, malaria and infections. Many of these biological activities have been related to annonaceous acetogenins. The aim of this study was to evaluate the cytotoxic activity of groups and a pure acetogenin (cornifolin) obtained from the ethanol extract of the seeds of Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae). This activity was evaluated by using MTT colorimetric assay. Cornifolin (1), the only tested substance that was pure, showed positive cytotoxicity on all evaluated tumor cell lines. The tested groups, all characterized by infrared spectroscopy (IR), showed 68.7% of the IC50 values lower than 20.0 µg mL-1, also considered cytotoxic. The tested samples were more active than taxol on human melanoma (MeWo) and the group G10-5 showed better activity on mouse tumorigenic fibroblast (L929). In addition, the tested groups showed less cytotoxicity than taxol on the normal line (CHO).

Annona cornifolia; cytotoxic activity; cornifolin; MTT


Avaliação da atividade citotóxica das sementes de Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae)

Evaluation of the cytotoxic activity of seeds of Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae)

Lima, L.A.R.S.I, * * luarsantos@ufsj.edu.br ; Lopes, M.T.P.II; Cunha, M.M.II; Pimenta, L.P.S.III; Boaventura, M.A.D.III

ICampus Centro-Oeste Dona Lindu, Universidade Federal de São João Del-Rei, CEP: 35501-296, Divinópolis-Brasil

IIUniversidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Farmacologia, Instituto de Ciências Biológicas

IIIDepartamento de Química, Instituto de Ciências Exatas, CEP: 31270-901, Belo Horizonte-Brasil

RESUMO

Na família Annonaceae, especialmente o gênero Annona é muito apreciado por fornecer frutos comestíveis. Espécies desse gênero são utilizadas na medicina popular contra diabetes, malária e infecções. Muitas dessas atividades biológicas têm sido relacionadas às acetogeninas de anonáceas. O objetivo deste estudo foi avaliar a atividade citotóxica dos grupos e de uma acetogenina pura (cornifolina) obtidos a partir do extrato etanólico das sementes de Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae). Esta atividade foi avaliada pelo ensaio colorimétrico MTT. Cornifolina (1), a única substância pura testada, apresentou citotoxicidade positiva sobre todas as linhagens tumorais avaliadas. Os grupos testados, todos caracterizados por espectroscopia no infravermelho (IV), apresentaram 68,7% dos valores de CI50 menores que 20,0 µg mL-1, sendo também considerados citotóxicos. As amostras testadas foram mais ativas que o taxol sobre melanoma humano (MeWo) e, ainda, o grupo G10-5 apresentou melhor atividade sobre fibroblasto tumorigênico de camundongo (L929). Além disso, os grupos mostraram menor citotoxidade do que o taxol sobre a linhagem normal (CHO).

Palavras-chave:Annona cornifolia, atividade citotóxica, cornifolina, MTT

ABSTRACT

The family Annonaceae, especially the genus Annona, is greatly appreciated for providing edible fruits. Species of this genus are used in folk medicine against diabetes, malaria and infections. Many of these biological activities have been related to annonaceous acetogenins. The aim of this study was to evaluate the cytotoxic activity of groups and a pure acetogenin (cornifolin) obtained from the ethanol extract of the seeds of Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae). This activity was evaluated by using MTT colorimetric assay. Cornifolin (1), the only tested substance that was pure, showed positive cytotoxicity on all evaluated tumor cell lines. The tested groups, all characterized by infrared spectroscopy (IR), showed 68.7% of the IC50 values lower than 20.0 µg mL-1, also considered cytotoxic. The tested samples were more active than taxol on human melanoma (MeWo) and the group G10-5 showed better activity on mouse tumorigenic fibroblast (L929). In addition, the tested groups showed less cytotoxicity than taxol on the normal line (CHO).

Key words:Annona cornifolia, cytotoxic activity, cornifolin, MTT

INTRODUÇÃO

A família Annonaceae compreende cerca de 130 gêneros e 2300 espécies, distribuídas em países de clima tropical e subtropical (Alali et al., 1999). O gênero Annona, que possui mais de 120 espécies catalogadas, é muito apreciado no Brasil, por fornecer frutos comestíveis, como Annona crassiflora (araticum), Annona squamosa (fruta do conde) e Annona muricata (graviola). Os frutos são normalmente consumidos in natura ou usados em sucos, sobremesas e sorvetes (Correa, 1984). Casca, folhas, raízes, frutos e sementes de espécies de Annona têm sido utilizados na medicina popular contra diabetes, malária e infecções (Sousa et al., 1991). Essas atividades, no âmbito fitoquímico, foram inicialmente atribuídas aos alcalóides, constituintes químicos muito comuns nessa família, identificados em várias partes das plantas, pertencendo principalmente às classes benziltetraidroisoquino-línicos, aporfínicos e oxaporfínicos (Alali et al., 1999). Hoje em dia, diversas atividades biológicas têm sido relacionadas a outra classe de compostos naturais isolados nesta família, as acetogeninas, sendo isoladas em praticamente todas as partes da planta (Alali et al., 1999).

As acetogeninas são derivadas de ácidos graxos de cadeia longa isoladas, até 2008, exclusivamente a partir de plantas pertencentes à família Annonaceae (Pettit et al., 2008). Estes produtos naturais apresentam ampla variedade de propriedades biológicas, tais como atividades citotóxica, imunossupressora, pesticida, antiparasitária e antimicrobiana, e interesse crescente tem sido despertado devido ao potencial para inibir células resistentes a múltiplos fármacos (Bermejo et al., 2005).

Annona cornifolia A. St.-Hil é arbusto frutífero encontrado no cerrado e conhecido popularmente como ''araticum-mirim". A polpa laranja dos frutos maduros é doce e aromática. O fruto verde é usado popularmente contra úlcera (Correa, 1984). O primeiro estudo fitoquímico dessa espécie foi feito pelo nosso grupo de pesquisa, sendo já descrito o isolamento e a caracterização de doze acetogeninas (Santos et al., 2006; 2007; Lima et al., 2009; 2010).

O presente trabalho relata a atividade citotóxica de uma acetogenina pura (cornifolina, 1) e de grupos obtidos a partir do extrato etanólico das sementes de Annona cornifolia A. St.-Hil (Annonaceae), dos quais já foram isoladas as acetogeninas esquamocina M, esquamocina L, folianina B e anofolina.

MATERIAL E MÉTODO

Sílica gel 60 (70-230 mesh, Merck, D-6100 Darmstadt, Germany) foi utilizada para os procedimentos cromatográficos. Nas análises por cromatografia em camada delgada (CCD) foram utilizadas placas de sílica gel 60 F254 (Merck, Germany), com 0,25 mm de espessura. A detecção das placas de cromatografia em camada delgada analítica foi feita por borrifamento com o reagente de Kedde (Wagner et al., 1984). Os espectros de absorção na região do infravermelho foram obtidos em espectrômetro Shimadzu/IR-400, em partilhas de KBr. As frequências de absorção foram medidas em unidades de número de onda (cm-1). Os espectros de RMN de 1H a 400 MHz e de 13C a 100 MHz (1D e 2D), em CDCl3, foram obtidos em espectrômetro Bruker Advance DRX-400. Os deslocamentos químicos foram registrados tendo o TMS como padrão interno. Os espectros de massas ESIMS-Q/TOF (Eletrospray Ionization Mass Spectrum - Quadrupole Ion Trap/ Time of Flight) em espectrômetro marca Micromass, modelo Micro TMQ-TOF, equipado com fonte de ionização eletrospray operando com íon no modo positivo. A rotação ótica foi medida em polarímetro Perkin-Elmer modelo 341, usando-se CHCl3 como solvente. O ponto de fusão foi determinado em aparelho Mettler FP5 e não foi corrigido.

Material botânico

As sementes de Annona cornifolia A. St.-Hil. (Annonaceae) foram coletadas na região de Curvelo - Minas Gerais, entre janeiro a março de 1998. A espécie foi identificada pelo botânico Dr. R. Mello-Silva e a exsicata (BHCB 68114) se encontra depositada no Departamento de Botânica do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.

Fracionamento dos extratos etanólicos

Os extratos, frações e grupos resultantes foram submetidos à análise por CCD. As placas foram pulverizadas com reagente Kedde que indica um resultado positivo para g-lactona-a,b-insaturada, comumente encontrada em acetogeninas (Cavé et al., 1997).

As sementes de Annona cornifolia (150 g), após secagem à temperatura ambiente, foram trituradas em moinho de facas e extraídas exaustivamente em extrator tipo Soxhlet, sob refluxo, durante 48 horas com etanol. A destilação do etanol foi feita sob pressão reduzida e forneceu 10 g de resíduo. Este material foi solubilizado em metanol/ água (1:1) e submetido a partição com C6H14 e AcOEt (2 extrações com 100 mL de cada solvente), obtendo-se uma fração hexânica (6,0 g) e uma em acetato de etila (3,5 g), respectivamente. A fração hexânica foi submetida à cromatografia em coluna de sílica gel 60 Merck (250 g, 3 cm de diâmetro), utilizando-se como eluentes C6H14/CH2Cl2/ AcOEt/MeOH com gradiente de polaridade crescente, sendo obtidas 166 frações que foram reunidas em 15 grupos com base no perfil por CCD. Os grupos 9, 10 e 11, após revelação com reagente de Kedde e análise dos espectros no IV, indicaram presença de acetogeninas. O grupo 10 foi recromatografado em coluna de sílica flash 230-400 mesh (14,8 g; 2 cm de diâmetro), eluído com CHCl3/AcOEt (1:1), obtendo-se os subgrupos G10-3 e G10-5.

Outra parte das sementes (850 g) foi extraída por percolação (EtOH, 7 L, 50 h), dando um resíduo marron (120 g), após evaporação total do solvente, que foi dissolvido em MeOH/H2O (3:7) e extraído sucessivamente com C6H14 e CHCl3, resultando em 79,5; 7,3 e 21,1 g das frações hexânica, clorofórmica e hidroalcoólica, respectivamente. A fração clorofórmica foi cromatografada, conforme protocolo descrito por Santos et al (2006), resultando no isolamento da acetogenina cornifolina (1).

Avaliação da atividade citotóxica pelo método MTT

A avaliação da atividade citotóxica pelo ensaio colorimétrico MTT (brometo de 3- (4,5-dimetil-2-tiazolil)-2,5-difenil-2H tetrazólio) foi feito de acordo com a metodologia descrita por Bellamy (1992). As linhagens celulares de fibroblasto tumorigênico de camundongo (L929), de glioma de rato (C6) e a linhagem celular normal de ovário de hamster chinês (CHO) foram gentilmente cedidas pelo Instituto de Química/USP-Brasil. As outras linhagens celulares, melanoma (MeWo) e carcinoma de mama humano (MDA MB-231) foram doadas pelo Instituto Ludwig para Pesquisa do Câncer/São Paulo-Brasil. As células foram cultivadas rotineiramente em RPMI 1640 (Roswell Park Memorial Institute) com 5% (v/v) de SBF (Soro Fetal Bovino). As culturas foram incubadas em atmosfera úmida com 3% de CO2, a 37ºC, no escuro. As células proliferaram aderidas à superfície das garrafas plásticas de cultura e foram subcultivadas a cada três dias da seguinte maneira, ou seja, após a retirada do meio, a cultura foi lavada com 1,5 mL de PBS-EDTA (Solução de tampão fosfato/Ácido etilenodiaminotetracético pH 7,4 com concentração final 2 mM de EDTA), e em seguida adicionada de 0,5 mL da solução de tripsina 0,2% até que as células se desprendessem da garrafa. Em seguida, as células foram suspensas em meio e soro (5 mL) e distribuídas para novas garrafas e/ou placas multicavadas nas densidades desejadas.

As suspensões celulares foram semeadas em 100 µL de meio RPMI 1640 com 5% de SBF, na densidade de 5 x 103 células/orifício, em microplacas de 96 poços. As células foram incubadas em atmosfera úmida a 3% de CO2, a 37ºC por 24 horas. Soluções estoque das amostras (1, G-9, G10-3, G10-5 e G11) e dos controles, dissolvidas em DMSO, foram diluídas em série (0,02; 0,2; 2 e 20 µg mL-1) e o volume de 100 µL de cada uma das quatro diluições foi adicionado as células. As leituras foram realizadas em 24, 48, 72 e 96 horas após a adição das amostras, em espectrofotômetro a 600 nm. O sal de tetrazólio - MTT (5 mg mL-1) (Sigma Chem. Co.) foi adicionado 4 horas antes das leituras (50 µL/orifício). A concentração inibitória 50% (CI50) foi calculada através de regressão linear a partir das quatro concentrações em triplicata, utilizando o software GraphPad Prism 5.0 (San Diego, USA) Foram usados como controles positivos no experimento, o taxol (paclitaxel/Sigma-Aldrich Chem. Co.), a mitomicina C (Bristol-Myers Squibb) e a crassiflorina (acetogenina obtida de Annona crassiflora).

RESULTADO E DISCUSSÃO

A acetogenina cornifolina (1) (Figura 1) foi obtida como um sólido branco de ponto de fusão 33,7-34,3ºC e [α]D: +18,50º (c 0,200; CHCl3). Esta foi caracterizada por IV, RMN de 1H e de 13C e EM (Santos et al., 2006).


A Tabela 1 resume os valores de CI50 para a acetogenina pura e os grupos sobre as linhagens celulares CHO, MDA MB-231, L929, MeWo e C6. Segundo Rieser et al. (1993), extratos brutos com CI50 menor que 20,0 µg mL-1 e substâncias puras com CI50 menores que 4,0 µg mL-1 são considerados ativos quando avaliados sobre linhagens celulares.

O grupo G9 apresentou-se mais ativo sobre a linhagem C6, com o valor da CI50 de 1,49 x 10-2 µg mL-1, sendo a menor obtida entre os grupos testados. Sobre as outras linhagens, este grupo apresentou baixa atividade com valores de CI50 maior que 70 µg mL-1.

O grupo G10-3 mostrou valores de CI50 menores que 3,4 µg mL-1 sobre todas as linhagens tumorais, duas ordens de magnitude menores, que os determinados sobre a linhagem normal CHO (102 µg mL-1).

O grupo G10-5, quando testado sobre as linhagens celulares tumorais, apresentou CI50 na ordem de grandeza de 10-1 µg mL-1 em C6 e L929, sendo essas linhagens as mais sensíveis ao grupo, e valores de 101 µg mL-1 em MeWo e MDA MB-231. Sobre a linhagem normal CHO o valor de CI50 também ficou na ordem de 101 µg mL-1.

O grupo G11 atuou sobre MDA MB-231 e L929 apresentando valores de CI50 menores uma ordem de magnitude, que os obtidos para CHO e MeWo, que foram determinados na ordem de 101 µg mL-1. Na linhagem C6, a CI50 ficou na ordem dos 10-1 µg mL-1, sendo a linhagem mais sensível ao grupo.

Todos os grupos obtidos a partir da fração hexânica foram ativos, apresentando valores de CI50 até três ordens de magnitude menores sobre as linhagens tumorais quando comparado aos valores determinados sobre a linhagem normal CHO, indicando menor interação com estruturas celulares proliferativas do tecido normal. Estes grupos foram ainda, especialmente ativos, sobre a linhagem C6, a mais sensível entre as linhagens tumorais utilizadas. Este fato indica que diferentes linhagens celulares possuem sensibilidades diferentes quando expostas às mesmas amostras. Os grupos testados, todos caracterizados por espectroscopia no infravermelho (IV), apresentaram 68,7% dos valores de CI50 menores que 20,0 µg mL-1, sendo também considerados citotóxicos.

A acetogenina cornifolina (1) apresentou valor de CI50 de 2,79 x 10-2 µg mL-1 sobre a linhagem CHO. A CI50 foi de 3,21 x 10-1 µg mL-1 sobre C6, a menor entre as linhagens tumorais, e uma ordem de magnitude maior quando comparadas com as linhagens MDA MB-231 e MeWo.

A mitomicina C, um agente alquilante que atua através da formação de ligações covalentes conjugadas com bases no DNA impedindo a replicação, e pode também degradá-lo pela produção de radicais livres (Rang & Dale, 1993), foi mais citotóxica que a cornifolina sobre todas as linhagens tumorais. Comparando com o taxol, que atua sobre os microtúbulos, estabilizando-os no estado polimerizado na fase G2 final ou na mitose (Gelmon, 1994), a cornifolina (1) foi mais ativa sobre MeWo e apresentou valores de CI50 da mesma ordem de grandeza para as linhagens MDA MB-231 e normal CHO.

As acetogeninas são compostos que inibem a nicotinamida adenina dinucleotídeo (forma reduzida) NADH-ubiquinona oxido-redutase, impedindo o transporte de elétrons no complexo I mitocondrial (Alali et al., 1999). Estudos de relação estrutura atividade - REA, revisados por Alali et al. (1999), mostraram que as acetogeninas com o sistema bis-tetraidrofurânico (THF) adjacente são muito ativas e, quando apresentam estruturas semelhantes, acetogeninas com 35 átomos de carbono são mais potentes que aquelas com 37. Estudos de REA mostraram também que acetogeninas com três grupos hidroxila, dois vizinhos aos anéis THF e outro em qualquer posição ao longo da cadeia hidrocarbônica, favorecem a polaridade necessária para atividade citotóxica das acetogeninas mais potentes.

A acetogenina cornifolina (1), possui 37 átomos de carbonos, dois anéis tetraidrofurânicos flanqueados por hidroxilas nos carbonos 17 e 26, e uma terceira hidroxila em C-7 (Santos et al., 2006). Esse sistema com dois anéis THF adjacentes é o que confere a maior potência, dentre os demais arranjos do anel THF (Alali et al., 1999). A parviflorina, uma acetogenina bis-THF com hidroxila em C-4 e com os anéis entre C-13 e C-22, apresentou valor de CI50 de 1,72 µg mL-1 em células MCF-7 (Gu et al., 1995), valor muito próximo ao obtido para cornifolina (1) em células MDA MB-231 (1,15 µg mL-1). Esse resultado é importante porque essas duas linhagens celulares são de carcinoma mamário humano.

A partir do grupo G9 foram isoladas as esquamocinas L (2) e M (3), acetogeninas bis-tetraidrofurânicas, com 37 carbonos, possuindo grupos hidroxilas vizinhos aos anéis, nos carbonos 15 e 24, inéditas nesta espécie (Santos et al., 2007), mas já isoladas previamente na espécie Annona squamosa (Sahai et al., 1994). A acetogenina anonina I ou esquamocina, análoga as esquamocinas L e M, mas possuindo uma hidroxila em C-28, apresentou valor de CI50 da ordem de 10-2 µg mL-1 sobre a linhagem C6, valor da mesma ordem de grandeza obtido para o grupo G9 (1,49 x 10-2 µg mL-1) (Lewis et al., 1993).

De G11 foi isolada uma nova acetogenina bis-THF adjacente, a anofolina (4), com 37 átomos de carbono, triidroxilada nos carbonos 9, 11 e 20 (Lima et al., 2010). Este grupo mostrou valor de CI50 em células MDA MB-231 da mesma ordem que aquela apresentada pela parviflorina em células MCF-7 (Gu et al., 1995).

CONCLUSÃO

A acetogenina cornifolina e os grupos testados foram ativos sobre as linhagens tumorais, especialmente sobre glioma de rato (C6). Sobre a linhagem normal, os grupos foram menos citotóxicos, indicando menor interação com estruturas celulares proliferativas do tecido normal. Todas as amostras testadas foram mais ativas que o taxol sobre melanoma humano (MeWo), ainda, o grupo G10-5 apresentou melhor atividade sobre fibroblasto tumorigênico de camundongo (L929). Considerando o potencial antitumoral das acetogeninas, e a toxicidade seletiva dos grupos em células tumorais versus normal, uma avaliação mais aprofundada dos grupos é necessária para avaliar seu potencial terapêutico.

AGRADECIMENTO

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro. Ao Dr. H. Armelin (Instituto de Química/USP-Brasil) e ao Dr. R. R. Brentani (Instituto Ludwig para Pesquisa do Câncer/São Paulo-Brasil) pela doação das linhagens de células tumorais. Ao Dr. R. Mello-Silva pela identificação do material vegetal.

Recebido para publicação em 05/11/2010

Aceito para publicação em 29/03/2012

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  • *
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      05 Nov 2010
    • Aceito
      29 Mar 2012
    Sociedade Brasileira de Plantas Medicinais Sociedade Brasileira de Plantas Medicinais, Revista Brasileira de Plantas Medicinais, Universidade Estadual de Maringá, Departamento de Farmácia, Bloco T22, Avenida Colombo, 5790, 87020-900 - Maringá - PR, Tel: +55-44-3011-4627 - Botucatu - SP - Brazil
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