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Poliorquidismo: relato de caso comparando a ultrassonografia e a ressonância magnética

Resumo

Introdução:

o poliorquidismo é uma patologia incomum, contando cerca de 200 casos na literatura mundial.

Relato de caso:

relatamos um caso de poliorquidismo em um paciente do sexo masculino de 16 anos, diagnosticado por ultrassom e confirmado por ressonância magnética.

Discussão:

na maioria dos casos apresentados, há um testículo supranumérico, mas há relatos de mais de três, até cinco testículos, com gônadas supranuméricas em ambos os lados do escroto. O diagnóstico geralmente é feito no final da puberdade, aliás, com massa escrotal indolor ou no pronto-socorro, apresentando torção de todo o hemiscroto ou somente do testículo supranumerário, e o diagnóstico diferencial deve ser feito com cisto epididimário e espermatocele, além de outros massas extratesticulares (hidroceles, varicoceles, lipomas, tumores) e massas paratesticulares (hérnias, cálculos escrotais). Após a avaliação clínica inicial, o ultrassom é a primeira linha do exame subsidiário. A ressonância magnética é muito útil se o diagnóstico por ultrassom não for certo. Os testículos supranumerários têm as mesmas características de ressonância magnética que os testículos normais (intensidade do sinal intermediário nas imagens ponderadas em T1 e alta intensidade do sinal nas imagens ponderadas em T2).

Palavras-chave:
Testículo; Ultrassonografia; Ressonância magnética; Poliorquidismo

Abstract

Introduction:

polyorchidism is an unusual pathology, about 200 cases in the world literature.

Case report:

we reported a case of polyorchidism in a 16-year-old male patient diagnosed by ultrasound and confirmed by magnetic resonance imaging.

Discussion:

most of the cases presented, there is a supernumerary testis, but there are reports on more than three, up to five testicles with supranumerical gonads on both sides of the scrotum. The diagnosis is usually performed in late puberty, incidentally, with a painless scrotal mass or at the emergency room, presenting a testicular torsion of the whole hemiscrotum or supernumerary testisalone, and the differential diagnosis should be made with epididymal cyst and spermatocele, besides other extra-testicular masses (hydroceles, varicoceles, lipomas, tumors.) and para-testicular masses (hernias, scrotal calculi). After the initial clinical evaluation, ultrasound is the first line subsidiary exam. Magnetic Resonance Imaging is very helpful, just in case the ultrasound diagnosis is uncertain. The supernumerary testishave the same Magnetic Resonance Imaging characteristics as the normal testes (intermediate signal intensity on T1- weighted images and high signal intensity on T2-weighted images).

Key words:
Testicle; Ultrasonography; Magnetic resonance imaging; Polyorchidism

Introdução

O poliorquidismo é uma patologia incomum, sendo relatado cerca de 200 casos na literatura mundial. 11 Amodio JB, Maybody M, Slowotsky C, Fried K, Foresto C. Polyorchidism: Report of 3 cases and review of the literature. J Ultrasound Med. 2004; 23: 951-7. Na maioria dos casos apresentados, há um testículo supranumérico, mas há relatos de mais de três, até cinco testículos, supranuméricos em ambos os lados do escroto. 22 Bergholz R and Wenke K. Polyorchidism: A meta-analysis. J Urol. 2009; 182: 2422-7.,33 Alamsahebpour A, Hidas G, Kaplan A, McAleer IM. Bilateral polyorchidism with diffuse microlithiasis: A case report of an adolescent with 4 testes. Urology. 2013; 82: 1421-3.

Os testículos extras são geralmente intraescrotais (até 75% dos casos), mas há muitos relatos deles apresentando-se como testículos distópicos, mimeti-zando uma hérnia inguinal, ou mesmo intra-abdominal (até 5% dos relatos). 11 Amodio JB, Maybody M, Slowotsky C, Fried K, Foresto C. Polyorchidism: Report of 3 cases and review of the literature. J Ultrasound Med. 2004; 23: 951-7.,44 Otero J, Ben-Yakar N, Alemayehu B, Kozusko SD, Borao F, Vates III TS. A Unique Case of Intraabdominal Polyorchidism: A Case Study. Case Rep Urol. 2016; 2016: 2729614. O lado esquerdo é mais comumente afetado, com apenas 25% dos relatos comprometendo o lado direito. 44 Otero J, Ben-Yakar N, Alemayehu B, Kozusko SD, Borao F, Vates III TS. A Unique Case of Intraabdominal Polyorchidism: A Case Study. Case Rep Urol. 2016; 2016: 2729614.

A fisiopatologia dessa condição ainda é pouco conhecida. Atualmente, concebe-se que a crista genital sofre uma duplicação, muito provavelmente devido à degeneração incompleta do mesonefron, que predispõe ao desenvolvimento de bandas peri-toneais; essas bandas causam a divisão da crista genital. 22 Bergholz R and Wenke K. Polyorchidism: A meta-analysis. J Urol. 2009; 182: 2422-7.

Nosso objetivo é relatar um caso de poliorquidismo em paciente do sexo masculino, 16 anos, diagnosticado por ultrassom e confirmado por ressonância magnética

Relato de Caso

Paciente do sexo masculino, 16 anos, com queixa de abaulamento indolor no escroto. O exame físico revelou nódulo fibroelástico e móvel na transição pênis-escroto e na porção proximal do pênis; o restante do exame físico era normal. Paciente negava qualquer história de trauma ou cirurgias anteriores. Referia uso contínuo de somatotropina 4,0 UI por via subcutánea para baixa estatura, tendo interrompido uso de testosterona parenteral há oito meses (que usava há nove meses). Sua altura era de 163 cm e peso de 36,5 kg, estadiamento de Tanner G3P4. Os principais achados laboratoriais estão descritos na Tabela 1.

Tabela 1
Resultados de testes laboratoriais

Foi realizada ultrassonografia (US), que detectou uma estrutura compatível com testículo no lado direito da base do pênis e dois no lado esquerdo (Figura 1). Os achados foram confirmados por ressonância magnética (RM) (Figura 2); RM não encontrou testículos extras no abdômen. O paciente foi, então, encaminhado para cirurgia de exérese do testículo supranumerário, após discussão do caso com o serviço de urologia, devido à sua localização e risco de malignização.

Figura 1
Ultrassonografia de Poliorquidismo. A: ultrassom demonstrando um testículo direito na base do pênis; B: ultrassom demonstrando dois testículos à esquerda na base do pênis (setas).

Figura 2
Ressonância magnética de Poliorquidismo. RM na sequência T1 em corte sagital em A e corte coronal em B, demonstrando 2 testículos à esquerda (setas brancas) e 1 testículo à direita (seta cinza).

Discussão

O diagnóstico do testículo supranumerário geralmente é feito no final da puberdade, incidentalmente, com massa escrotal indolor ou no pronto-socorro, apresentando torção de todo o hemiscroto ou apenas do testículo supranumerário, 11 Amodio JB, Maybody M, Slowotsky C, Fried K, Foresto C. Polyorchidism: Report of 3 cases and review of the literature. J Ultrasound Med. 2004; 23: 951-7.,22 Bergholz R and Wenke K. Polyorchidism: A meta-analysis. J Urol. 2009; 182: 2422-7. e o diagnóstico diferencial deve ser feito com cisto epididimal e espermatocele, além de outras massas extratesticulares (hidroceles, varicoceles, lipomas, tumores.) e massas paratesticulares (hérnias, cálculos escrotais). 55 Arslanoglu A, TuncelSA,Hamarat M. Polyorchidism: Color Doppler ultrasonography and magnetic resonance imaging findings. Clin Imaging. 2013; 37: 189-91.

Após a avaliação clínica inicial, a ultrassono-grafia é a primeira linha de exame subsidiário, identificando uma massa escrotal, com características idênticas ao testículo normal, que pode ser fixa ou separada da gônada ipsilateral, localizada inferior ou superiormente; 55 Arslanoglu A, TuncelSA,Hamarat M. Polyorchidism: Color Doppler ultrasonography and magnetic resonance imaging findings. Clin Imaging. 2013; 37: 189-91. ultrassom com contraste (USC) pode ser usado para ajudar a excluir a presença de neoplasia. 66 Rafailidis V, Arvaniti M, Rafailidis D, Sfoungaris D. Multiparametric ultrasound findings in a patient with polyorchidism. Ultrasound. 2017; 25 (3): 177-81.

No ultrassom Doppler, o testículo supranu-merário demonstra textura ecológica e fluxo vascular semelhantes aos do testículo normal. 55 Arslanoglu A, TuncelSA,Hamarat M. Polyorchidism: Color Doppler ultrasonography and magnetic resonance imaging findings. Clin Imaging. 2013; 37: 189-91. A RM é muito útil se o diagnóstico de ultrassom não for certo55 Arslanoglu A, TuncelSA,Hamarat M. Polyorchidism: Color Doppler ultrasonography and magnetic resonance imaging findings. Clin Imaging. 2013; 37: 189-91.; os testículos supranumerários têm as mesmas características de RM que os testículos normais (intensidade de sinal intermediário em imagens ponderadas em T1 e alto sinal em imagens ponderadas em T2). 55 Arslanoglu A, TuncelSA,Hamarat M. Polyorchidism: Color Doppler ultrasonography and magnetic resonance imaging findings. Clin Imaging. 2013; 37: 189-91.

Além das complicações mecânicas, a malig-nidade também pode surgir do testículo supranumérico; testículo distópico é um fator de risco clássico para tumores de células germinativas, e o poliorquidismo também pode estar associado. 77 Nayak SP, Sreejayan MP. Management of supernumerary testis in an adult: case report and review. Andrologia. 2011; 43 (2): 149-52. A associação de testículo supranumérico e seminoma tem cerca de cem casos relatados na literatura atual, mas relatos histológicos mais recentes mostram mais de 30% de incidência de anormalidades celulares e até 7% dos casos de poliorquidismo podem estar associados à malignidade. 77 Nayak SP, Sreejayan MP. Management of supernumerary testis in an adult: case report and review. Andrologia. 2011; 43 (2): 149-52. Os padrões histológicos de malignidade relatados são seminomas, coriocarci-nomas, teratomas e carcinoma embrionário. 22 Bergholz R and Wenke K. Polyorchidism: A meta-analysis. J Urol. 2009; 182: 2422-7.

A localização da gônada supranumérica desempenha um papel importante no risco de malignidade, já que localização extra-escrotal apresenta um risco mais elevado. 88 Boussaffa H, Naouar S, Ati N, Amri M, Khelifa BB, Salem B, El Kamel R. Neoplasm of a supernumerary undescended testis: A case report and review of the literature. Int J Surg Case Rep. 2018; 53: 345-7.

A gestão do poliorquidismo ainda é uma questão de debate; a abordagem clássica é a retirada do testículo supranumerário independente da localização. 99 Leung AK: Polyorchidism. Am Fam Physician. 1988; 38: 153-6. Com o passar dos anos, com a evolução da ultrassonografia e da ressonância magnética, um manejo mais conservador, com observação clínica, tornou-se mais aceitável; atualmente, existem relatos de até 6 anos de observação, podendo ser aceitável se não ocorrerem complicações agudas. 88 Boussaffa H, Naouar S, Ati N, Amri M, Khelifa BB, Salem B, El Kamel R. Neoplasm of a supernumerary undescended testis: A case report and review of the literature. Int J Surg Case Rep. 2018; 53: 345-7.

Um fator importante a se ter em mente ao lidar com um testículo supranumerário é a fixação dele a um canal deferente, uma vez que isto pode inferir um testículo com funcionamento normal, já que testículos não drenados não podem contribuir para fertilidade. 22 Bergholz R and Wenke K. Polyorchidism: A meta-analysis. J Urol. 2009; 182: 2422-7.

Bergholz e Wenke22 Bergholz R and Wenke K. Polyorchidism: A meta-analysis. J Urol. 2009; 182: 2422-7. sugeriram que os casos ambulatoriais deveriam ser submetidos à biópsia com congelação intra-operatória e prosseguir com orquiectomia se os sinais de malignidade forem aparentes, ou orquipexia se a malignidade for descartada. É importante notar que essa malformação geralmente preserva a espermatogênese e a função endócrina1010 Tzvetkova PD, Ilieva IN. Polyorchidism and fertility. MD-Medical Data. 2014; 6 (1): 029-032.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    21 Abr 2020
  • Revisado
    27 Maio 2020
  • Aceito
    30 Jun 2020
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