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Perfil da assistência ao parto em uma maternidade pública

Resumo

Objetivos:

descrever o perfil da assistência ao parto em uma maternidade de referência do estado do Piauí, a partir das Recomendações da Organização Mundial da Saúde de 2018.

Métodos:

estudo quantitativo transversal retrospectivo, descritivo documental, população censitária, contendo os partos vaginais realizados em 2017. Os dados foram inseridos no Microsoft Excel para análise estatística simples.

Resultados:

os percentuais registrados no Centro Obstétrico e Centro de Parto Normal foram, respectivamente, 85,5% e 98% da presença de acompanhante, 34,2% e 94% utilizaram partograma, 63,8% e 98% métodos não-farmacológicos para alívio da dor, 74,8% e 98,7% receberam líquidos durante o trabalho de parto. Amniotomia em 15,2% e 17,2%, ocitocina foi administrada em 26,5% e 14,6% no 1° e 2a períodos, posição não-litotômica em 39,7% e 93, 4%, episiotomia 9,9% e 6,6%. Após o nascimento, 85, 5% e 96% dos recém-nascidos em contato pele a pele e, em 65,5% e 94% houve promoção do aleitamento materno.

Conclusões:

este estudo permitiu conhecer os indicadores de assistência ao parto do serviço, que de maneira geral estão melhores que os indicadores nacionais e da região nordeste. Ressalta-se a importância do registro de indicadores para a avaliação da assistência.

Palavras-chave:
Tocologia; Parto normal; Organização Mundial da Saúde; Indicadores de qualidade em assistência à saúde

Abstract

Objectives:

to describe the profile on childbirth care at a reference maternity hospital in the State of Piauí based on the 2018 World Health Organization Recommendations.

Methods:

retrospective cross-sectional quantitative study, descriptive documentary, population census, containing vaginal deliveries performed in 2017. The data was entered in Microsoft Excel for simple statistical analysis.

Results:

the percentages registered at the Centro Obstétrico Superior (Superior Obstetric Center) and Centro de Parto Normal (Normal Delivery Center) were, respectively, 85.5% and 98% with the presence of a companion, 34.2% and 94% used the partogram, 63.8% and 98% took non-pharmacological methods for pain relief, 74.8% and 98.7% received fluids during labor. Amniotomy at 15.2% and 17.2%, oxytocin was administered at 26.5% and 14.6% in the 1st and 2nd periods, non-lithotomic position at 39.7% and 93.4%, episiotomy 9.9% and 6.6%. After birth, 85.5% and 96% of newborns had skin-to-skin contact and, in 65.5% and 94% there were maternal breastfeeding promotion.

Conclusions:

this study comprehended the indicators on childbirth care service, which are, in general, better than the national and the northeast region ones. The importance of registering indicators to evaluate care is emphasized.

Key words:
Tocology; Normal delivery; World Health Organization; Quality indicators in healthcare

Introdução

Ainda na década de 1990, discussões realizadas em vários países e dados fundamentados em pesquisas resultaram na publicação de um guia prático com recomendações para assistência ao parto, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), buscando fornecer meios para combater as elevadas taxas de mortalidade materna e neonatal. Essa publicação teve impacto global e motivou inúmeros governos a adequarem a assistência ao parto, buscando a redução dos índices de mortes por causas evitáveis.11 Carvalho EMP, Göttems LBD, Pires MRGM. Adesão às boas práticas de atenção ao parto normal: construção e validação de um instrumento. Rev Esc Enferm USP. 2015; 49 (6): 890-8.,22 OMS (Organização Mundial da Saúde). Assistência ao parto normal: um guia prático. Genebra; 1996.

A busca pela melhoria na qualidade da atenção obstétrica em diversos países motivou o debate sobre a utilização cautelosa das tecnologias na assistência ao parto e nascimento. Após 22 anos da publicação do guia prático de recomendações da Organização Mundial da Saúde para assistência ao parto, houve uma atualização das práticas que devem ou não ser adotadas em cada um dos quatro períodos clínicos do parto e ao recém-nascido. Tais recomendações, publicadas em 2018, estão baseadas em evidências científicas, reforçando assim, a sua confiabilidade.33 WHO (World Health Organization).WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva; 2018.

O Brasil foi um dos países que procuram adequar essa assistência e reduzir as mortes evitáveis de mulheres e recém-nascidos. Nas últimas décadas, o Ministério da Saúde instituiu uma série de políticas e programas voltados à atenção ao parto e nascimento: Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher; Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento; Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher.44 Brasil. Ministério da Saúde. Programa de assistência integral à saúde da mulher. Brasília, DF; 1983.

5 Brasil. Ministério da Saúde. Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento (PHPN). Brasília, DF; 2000.
-66 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Política Nacional de Atenção Integral a Saúde da Mulher Princípios e Diretrizes. Brasília, DF; 2011.

Assim também, surgiu a Rede Cegonha como uma rede de cuidados que visa assegurar à mulher o direito ao planejamento reprodutivo e à atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como à criança, o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e ao desenvolvimento saudáveis.77 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria da Saúde. Portaria n° 1.1459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, a Rede Cegonha. DOU N° 121, 27 junho 2011, Seção 1..88 Medeiros RMK, Teixeira RC, Nicolini AB, Alvares AS, Corrêa ACP, Martins DP. Cuidados humanizados: a inserção de enfermeiras obstétricas em um hospital de ensino. Rev Bras Enferm. 2016; 69(6): 1029-36.

A humanização no contexto da Rede Cegonha e das Recomendações da OMS assume a concepção do cuidado obstétrico que respeite a fisiologia do parto e o protagonismo da mulher nesse processo, por meio de práticas baseadas em evidências científicas de forma a desconstruir o modelo tecnocrático que valoriza a utilização de condutas invasivas desnecessárias e danosas.77 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria da Saúde. Portaria n° 1.1459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, a Rede Cegonha. DOU N° 121, 27 junho 2011, Seção 1.

Um elemento frequente na prática obstétrica brasileira é a pressa em acelerar o nascimento, sem respeito à autonomia das mulheres na sua experiência de parto. O controle do tempo e a imposição da dinâmica do trabalho de parto e do parto explicam o índice excessivo de intervenções, incluindo cesarianas desnecessárias, e fazendo com que a assistência ao parto no país seja focada na decisão médica e não no processo fisiológico.99 Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Bastos MH, Gama SGN. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Supl.): S17-S47.

Apesar dos esforços, as pesquisas tem evidenciado que a assistência ao parto ainda está muito distante do recomendado e sofre influência do modelo biomédico, em que aspectos como a autonomia da mulher durante o trabalho de parto não são respeitados e práticas prejudiciais à saúde materna e neonatal acontecem habitualmente.1010 Fujita JALM, Shimo AKK. Parto humanizado: experiências no sistema único de saúde. Rev Min Enferm. 2014; 18 (4): 1006-10.,1111 Andrade PON, Silva JQP, Diniz CMM, Caminha MFC. Fatores associados à violência obstétrica na assistência ao parto vaginal em uma maternidade de alta complexidade em Recife, Pernambuco. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2016; 16(1): 29-37.

As Recomendações da OMS definem um conjunto de intervenções para que o processo de parto não seja apenas seguro, mas também uma experiência positiva para as mulheres e suas famílias. Ao delinear um novo modelo de assistência ao parto adaptável ao contexto de cada país, as recomendações visam a economia de custos substanciais através da redução de intervenções desnecessárias durante o trabalho de parto.33 WHO (World Health Organization).WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva; 2018.

Considerando isso, uma forma de analisar a situação de saúde de um indivíduo ou de uma determinada população de forma quantificada e analisar as informações coletadas é a utilização de instrumentos, como os indicadores de saúde. A análise dos indicadores de saúde possibilita o reconhecimento e o monitoramento do desempenho do sistema de saúde, além de contribuir para uma melhoria contínua do acesso ao cuidado e qualidade da saúde materno-infantil oferecida em nível local e nacional.1212 Organização Pan-Americana da Saúde. REDE Interagencial de Informação para a Saúde Indicadores básicos para a saúde no Brasil: conceitos e aplicações. Rede Interagencial de Informação para a Saúde - Ripsa. 2 ed. Brasília, DF; 2008.,1313 Reis ZSN, Pereira AC, Correia RJC, Freitas JAS, Cabral ACV, Bernardes J. Análise de indicadores da saúde materno-infantil: paralelos entre Portugal e Brasil. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011; 33(9): 234-9. A assistência de qualidade associada à prática baseada em evidências científicas, que está em ascensão no panorama mundial, exige dos serviços de saúde um aprimoramento cada vez maior na assistência, como também a análise permanente de seus indicadores.

Esta pesquisa pauta-se na seguinte hipótese: a assistência à mulher em trabalho de parto em uma maternidade pública do Estado do Piauí está de acordo com o recomendado pela Organização Mundial da Saúde. O estudo objetiva descrever o perfil da assistência ao parto em uma maternidade de referência do estado do Piauí, a partir das Recomendações da Organização Mundial da Saúde.

Métodos

Trata-se de estudo quantitativo transversal retrospectivo, descritivo e documental. A coleta de dados ocorreu em uma maternidade pública de assistência terciária, referência em alto risco, no Estado do Piauí.

A população do estudo foi censitária, contendo o universo de partos vaginais realizados na maternidade no período de janeiro a dezembro de 2017 que possuíam registro dos indicadores. As variáveis do estudo foram as Recomendações da OMS publicadas em 2018 acerca dos cuidados intraparto.

O procedimento para coleta de dados incluiu a solicitação de acesso aos indicadores de parto vaginal, referentes ao Centro Obstétrico Superior (COS) e ao Centro de Parto Normal (CPN). São eles distintos porque cabe ao primeiro o atendimento de partos vaginais de alto risco e ao segundo os partos vaginais de baixo risco.

O serviço dispunha do quantitativo dos indicadores da assistência ao parto em planilhas eletrônicas armazenadas nos computadores do Serviço de Arquivo Médico e Estatística (SAME), registrados sob o nome de Ficha de Indicadores do Parto. Após o acesso, foi realizada a inserção dos dados em formulário próprio que continha as Recomendações da OMS publicadas em 2018.

A seguir, os dados foram inseridos em planilhas do Microsoft Excel a fim realizar a análise de cada indicador coletado, com relação ao de número de partos realizados em cada setor, por meio de estatísticas descritivas. Isso foi feito por meio da adição dos valores de cada indicador e seus percentuais, através da seguinte fórmula:

Percentual (%) do indicador = (S dos valores do indicador x 100) ^ total de partos do setor no ano

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Piauí, Parecer número: 2.948.617 e está de acordo com as determinações da Resolução n° 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.1414 Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n° 466 de 12 de dezembro de 2012. Trata de pesquisas em seres humanos. DOU, 13 junho de 2013. Não foram acessados prontuários ou quaisquer documentos que identificassem a parturiente. Por se tratar de pesquisa documental foi utilizado o Termo de Compromisso de Utilização de Dados (TCUD) para obter acesso aos documentos necessários à coleta dos dados.

Resultados

Conforme a Tabela 1, o número total de partos registrados no COS foi de 2.853, e no CPN a quantidade de partos que tiveram seus indicadores registrados foi de 151 (dados do período de janeiro a maio de 2017). Não havia informação no SAME dos dados de junho a dezembro de 2017. Em relação a esses totais, 85,5% dos partos no COS tiveram a presença de acompanhante ou doula, enquanto no CPN o percentual foi de 98%.

Tabela 1
Indicadores do Centro Obstétrico e do Centro de Parto Normal da Maternidade no ano de 2017. Teresina, Piauí, 2018.

No COS em 34,2% dos partos foi utilizado o partograma. A maioria das mulheres (63,8%) usou métodos não farmacológicos para alívio da dor e 74,8% receberam líquidos durante o trabalho de parto. O percentual de ruptura artificial das membranas foi de 15,2%. A ocitocina foi administrada em 26,5% dos casos no 1° e 2a períodos do parto. Quanto aos partos realizados no CPN,94% utilizaram o partograma, 98% das mulheres usaram métodos não farmacológicos para alívio da dor e 98,7% receberam líquidos durante o trabalho de parto. A amniotomia foi realizada em 17,2% dos partos. A ocitocina foi administrada no 1° e 2a períodos do parto em 14,6% dos casos (Tabela 2).

Tabela 2
Indicadores do Centro Obstétrico e do Centro de Parto Normal da Maternidade no ano de 2017. Teresina, Piauí, 2018.

Menos da metade dos partos ocorreram em posição não litotômica (39,7%) no COS; e no CPN uma posição não litotômica foi adotada em 93,4%. Para COS e CPN a episiotomia foi realizada em 9,9% e 6,6% dos partos, respectivamente (Tabela 3).

Tabela 3
Indicadores do Centro Obstétrico e do Centro de Parto Normal da Maternidade no ano de 2017. Teresina, Piauí, 2018.

Durante a primeira hora após o nascimento, 85,5% dos recém-nascidos foram colocados em contato pele a pele com a mãe e em 65,5% houve promoção do aleitamento materno no COS. Já no CPN durante a primeira hora após o nascimento, 96% dos recém-nascidos foram colocados em contato pele a pele com a mãe e 94% tiveram a promoção do aleitamento materno (Tabela 4).

Tabela 4
Indicadores do Centro Obstétrico e do Centro de Parto Normal da Maternidade no ano de 2017. Teresina, Piauí, 2018.

Discussão

A OMS classifica suas recomendações em práticas que devem ou não ser adotadas durante cada período clínico do parto e ao recém-nascido.33 WHO (World Health Organization).WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva; 2018. Na maternidade em estudo há o monitoramento de indicadores de assistência elaborados pela equipe do serviço compilados em uma planilha do Excel denominada “Ficha de Indicadores do Parto”, entretanto, poucos são relacionados às Recomendações da OMS que foram atualizadas em 2018.

Em relação aos cuidados gerais na atenção ao parto, são recomendados cuidados de maternidade respeitosos, comunicação efetiva, acompanhante de escolha da parturiente e modelos de continuidade do cuidado de parteiras. Na maternidade a presença de acompanhante de escolha da parturiente foi registrada em 85,5% (COS) e 98% (CPN) dos partos. Pesquisa nacional sobre a presença de acompanhante demonstrou que 24,5% das mulheres não tiveram acompanhante algum, apenas 18,7% tiveram companhia contínua e 56,8% tiveram acompanhamento parcial, valores muito abaixo dos encontrados nesta pesquisa, revelando a qualidade do cuidado nesse aspecto.1515 Diniz CSG, d'Orsi E, Domingues RMSM, Torres JA, Dias MAB, Schneck CA, Lansky S,Teixeira NZF, Rance S, Sandall J. Implementação da presença de acompanhantes durante a internação para o parto: dados da pesquisa nacional Nascer no Brasil. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Suppl.1): S140-S153.

No primeiro período do parto foi identificado o uso do partograma para acompanhamento dos partos em 34,2% e 94% no COS e CPN, respectivamente. Dados da pesquisa “Nascer do Brasil”, para a região Nordeste99 Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Bastos MH, Gama SGN. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Supl.): S17-S47. apontam que o monitoramento com partograma ocorreu em 30,4% dos partos. Estudo realizado em Minas Gerais com 230 pacientes1616 Sousa AMM, Souza KV, Rezende EM, Martins EF, Campos D, Lansky S. Práticas na assistência ao parto em maternidades com inserção de enfermeiras obstétricas, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Esc Anna Nery. 2016; 20(2): 32431. demonstrou 77,4% de utilização do partograma. Tal prática continua a ser recomendada pela OMS em 2018, como instrumento sensível para o acompanhamento da evolução do parto, porém sem o critério de dilatação de 1 cm/hora para que seja adotada alguma intervenção.33 WHO (World Health Organization).WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva; 2018.

Não existem evidências científicas que apoiem a restrição de líquidos e alimentos durante o trabalho de parto para as parturientes com baixo risco de complicações.99 Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Bastos MH, Gama SGN. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Supl.): S17-S47. Nesse sentido, dados de pesquisa desenvolvida na cidade do Recife apontam que 80% das mulheres ingeriram líquidos durante o trabalho de parto.1111 Andrade PON, Silva JQP, Diniz CMM, Caminha MFC. Fatores associados à violência obstétrica na assistência ao parto vaginal em uma maternidade de alta complexidade em Recife, Pernambuco. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2016; 16(1): 29-37. Ademais, tal percentual foi semelhante ao encontrado neste estudo para o COS e CPN (74,8% e 98,7%), o que deve continuar sendo encorajado se levando em conta, por exemplo, o gasto energético necessário no trabalho de parto.

O uso de tecnologias não-farmacológicas para alívio da dor identificados na pesquisa (63,8% e 98%) apresentou percentual bem acima dos 19,1% identificados no estudo para a região Nordeste,99 Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Bastos MH, Gama SGN. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Supl.): S17-S47. enquanto que se assemelha ao estudo de Belo Horizonte,1616 Sousa AMM, Souza KV, Rezende EM, Martins EF, Campos D, Lansky S. Práticas na assistência ao parto em maternidades com inserção de enfermeiras obstétricas, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Esc Anna Nery. 2016; 20(2): 32431. que apontou 74,2% de uso. Esses índices podem ser considerados um aspecto positivo das práticas realizadas na instituição, mostrando um cuidado humanizado que promove o bem-estar da parturiente.

A aceleração do trabalho de parto, com amniotomia e/ou ocitocina, desempenha importante papel na "cascata de intervenções" e na redução da taxa de parto espontâneo.1616 Sousa AMM, Souza KV, Rezende EM, Martins EF, Campos D, Lansky S. Práticas na assistência ao parto em maternidades com inserção de enfermeiras obstétricas, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Esc Anna Nery. 2016; 20(2): 32431. Dados de pesquisa realizada no Estado de Goiás,1717 Oliveira NRG, Assis TR, Amaral WN, Falone VE, Salviano LMO. Assistance to Normal Delivery in Two Public Maternities: Perception of the Health Professionals . Rev Bras Ginecol Obstet. 2017; 39(5): 202-8. contendo amostra de 43 partos, descrevem a amniotomia em 16,3% dos partos, semelhante ao encontrado neste estudo (15,2% e 17,2%), e administração de ocitocina em 32,6%, superior aos valores encontrados na maternidade em questão (26,5% e 14,6%), que monitora o seu uso no primeiro e segundo períodos do parto.

No segundo período clínico do parto existem os indicadores que monitoram o número de partos em posição não-litotômica e partos em que houve episiotomia. A liberdade de movimento na primeira fase do trabalho de parto reduz o tempo de trabalho, mas não parece estar associada ao aumento de intervenções ou efeitos negativos relacionados ao bem-estar de mães e recém-nascidos. Neste estudo menos da metade das mulheres (39,7%) tiveram partos em posição não-litotômica no COS, enquanto que no CPN o percentual foi de 93,4%. Pesquisa de abrangência nacional apontou 91,7% de partos em posição litotômica para mulheres de risco habitual e 91,8% para pacientes de risco obstétrico não habitual.99 Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Bastos MH, Gama SGN. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Supl.): S17-S47.

Nesta pesquisa, a episiotomia apresentou resultado adequado estando abaixo dos 10% recomendado pela OMS nos dois cenários do estudo o que pode indicar que no serviço a episiotomia não é um procedimento realizado de rotina, e sim de forma seletiva.11 Carvalho EMP, Göttems LBD, Pires MRGM. Adesão às boas práticas de atenção ao parto normal: construção e validação de um instrumento. Rev Esc Enferm USP. 2015; 49 (6): 890-8. Em nível nacional foi descrito um percentual de 56,1% para as mulheres de risco habitual e de 48,6% das mulheres de risco não habitual.99 Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Bastos MH, Gama SGN. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Supl.): S17-S47.

Intervenções que não são recomendadas, como a Manobra de Kristeller, continuam a ser descritas em 37,3% das mulheres com parto vaginais de risco habitual no Brasil.99 Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Bastos MH, Gama SGN. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Supl.): S17-S47. Entretanto, no terceiro período do parto não há indicadores registrados no serviço que descrevam as boas práticas ou intervenções realizadas.

Os indicadores de cuidados com o recém-nascido demonstram contato pele a pele ininterrupto imediato (85,5% e 96%) e amamentação na primeira hora após o nascimento (65,5% e 94%). Pesquisa realizada em Minas Gerais1616 Sousa AMM, Souza KV, Rezende EM, Martins EF, Campos D, Lansky S. Práticas na assistência ao parto em maternidades com inserção de enfermeiras obstétricas, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Esc Anna Nery. 2016; 20(2): 32431. apresenta o contato pele a pele em 60,5% e a amamentação na primeira hora após o nascimento em apenas 25,5% dos partos. Estas variáveis apresentaram melhores índices nos dois locais deste estudo, entretanto, há de se considerar a grande influência das práticas institucionais e das condições do recém-nascido ao nascimento tanto para o contato pele a pele precoce quanto no início da amamentação na sala de parto.1818 Silva CM, Pereira SCL, Passos IR, Santos LC. Fatores associados ao contato pele a pele entre mãe/filho e amamentação na sala de parto. Rev Nutr. 2016; 29(4): 45771.

Após o parto, os cuidados com a mulher não são monitorados por meio de indicadores em nenhum dos setores, o que precisa ser revisto, pois a hemorragia pós-parto é a causa primária de quase um quarto de todas as mortes maternas em nível global e que poderia ser evitada por meio da avaliação do tônus uterino e sangramento vaginal no pós-parto.1919 OMS (Organização Mundial da Saúde). Recomendações da OMS para a prevenção e tratamento da hemorragia pós-parto. Genebra; 2014.,2020 Periard AM, Rezende BM, Viegas Segundo E, Cosso FMG, Lopes JRB, França MA, Silva RMP, Valadares RFLA, Lima SA, Corrêa Junior MD. Atonia uterina e hemorragia pós-parto. Rev Med Minas Gerais. 2011; 21(4Supl. 6): S1-S143.

Destaca-se a fonte de dados secundária como uma das limitações do estudo. Vários indicadores não existiam acerca das recomendações da OMS e outros não foram registrados, sobretudo no CPN que não informou indicadores padronizados no serviço de junho a dezembro, o que remete a uma reflexão sobre como ocorre a avaliação da assistência no serviço. Entretanto, a existência de planilha padronizada com indicadores de assistência ao parto é positiva, mesmo que não tenha sido possível a descrição de todos os períodos clínicos do parto.

Apesar de alguns indicadores deste estudo apresentarem-se adequados com o que OMS propõe, os maus indicadores maternos e perinatais do Brasil evidenciam a baixa qualidade da atenção obstétrica no nível nacional. Este fato ressalta a importância de se monitorar em indicadores das práticas recomendadas e das intervenções não recomendadas, uma vez que, se eles aparecem na diretriz da OMS é porque há indícios de sua realização, confirmadas por pesquisas em âmbito nacional e regional.11 Carvalho EMP, Göttems LBD, Pires MRGM. Adesão às boas práticas de atenção ao parto normal: construção e validação de um instrumento. Rev Esc Enferm USP. 2015; 49 (6): 890-8.,88 Medeiros RMK, Teixeira RC, Nicolini AB, Alvares AS, Corrêa ACP, Martins DP. Cuidados humanizados: a inserção de enfermeiras obstétricas em um hospital de ensino. Rev Bras Enferm. 2016; 69(6): 1029-36.

9 Leal MC, Pereira APE, Domingues RMSM, Theme Filha MM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Bastos MH, Gama SGN. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Supl.): S17-S47.

10 Fujita JALM, Shimo AKK. Parto humanizado: experiências no sistema único de saúde. Rev Min Enferm. 2014; 18 (4): 1006-10.
-1111 Andrade PON, Silva JQP, Diniz CMM, Caminha MFC. Fatores associados à violência obstétrica na assistência ao parto vaginal em uma maternidade de alta complexidade em Recife, Pernambuco. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2016; 16(1): 29-37.,1515 Diniz CSG, d'Orsi E, Domingues RMSM, Torres JA, Dias MAB, Schneck CA, Lansky S,Teixeira NZF, Rance S, Sandall J. Implementação da presença de acompanhantes durante a internação para o parto: dados da pesquisa nacional Nascer no Brasil. Cad Saúde Pública. 2014; 30 (Suppl.1): S140-S153.

16 Sousa AMM, Souza KV, Rezende EM, Martins EF, Campos D, Lansky S. Práticas na assistência ao parto em maternidades com inserção de enfermeiras obstétricas, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Esc Anna Nery. 2016; 20(2): 32431.

17 Oliveira NRG, Assis TR, Amaral WN, Falone VE, Salviano LMO. Assistance to Normal Delivery in Two Public Maternities: Perception of the Health Professionals . Rev Bras Ginecol Obstet. 2017; 39(5): 202-8.
-1818 Silva CM, Pereira SCL, Passos IR, Santos LC. Fatores associados ao contato pele a pele entre mãe/filho e amamentação na sala de parto. Rev Nutr. 2016; 29(4): 45771.

A realização deste estudo permitiu conhecer os indicadores de assistência ao parto, presentes no serviço e analisá-los a partir das recomendações da OMS. Espera-se contribuir para que os serviços e profissionais compreendam a importância do registro dos indicadores e da avaliação da assistência ao parto e o seu possível avanço nos aspectos que forem necessários.

Este estudo sugere uma adequação da Ficha de Indicadores do Parto utilizado atualmente na maternidade cenário da pesquisa para que possam ser contemplados todos os aspectos recomendados e não recomendados pela OMS em 2018, bem como a elaboração de ações de educação permanente a fim de ser discutida a importância do registro e avaliação da assistência a nível local. Estimula-se a elaboração de estudos posteriores no mesmo cenário para analisar a assistência em comparação aos dados do ano de 2017, assim como analisar outros serviços.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    19 Mar 2019
  • Revisado
    01 Abr 2020
  • Aceito
    06 Maio 2020
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