O encontro entre mediadores(as) e trabalhadores(as) de saúde |
O processo educativo parte da realidade dos(as) participantes, das condições concretas de trabalho, bem como do conhecimento já acumulado sobre as práticas em saúde e suas relações com a estrutura do modo de produção. |
Debate em torno do interesse e disposição dos(as) trabalhadores(as) em participar dos encontros, usando questões norteadoras relacionadas às inquietações sobre a realidade e a concretude do cotidiano de trabalho. |
ACSs são tradicionalmente conhecidos como “a base da Estratégia Saúde da Família (ESF)”. Contradição inicial se constatou quando participantes revelaram, a partir de sua experiência, não haver reconhecimento de seu trabalho por parte da equipe de saúde. Na atenção a consumidores(as) de drogas do território da ESF, pesada sobrecarga se manifestou quando ACSs relataram que preferiam não se aproximar desses indivíduos e evitar lidar diretamente com o problema. |
A problematização que discute a realidade de saúde |
Caracteriza-se pelo encontro entre os problemas vivenciados no trabalho em saúde, e as interpretações feitas pelos(as) trabalhadores(as), geralmente fundamentadas na perspectiva biomédica ou biopsicossocial. A primeira explicação dos(as) participantes para sua realidade pode ser contraditória em relação ao contexto determinante dos problemas discutidos. |
Uso de notícias, acontecimentos recentes e discussão acerca do impacto sobre a vida prática, em contraposição a interpretações de senso comum. |
O processo oficineiro não era familiar aos(as) trabalhadores(as), habituados(as) a capacitações verticais e informativas, fundamentadas em modelo biopsicossocial. Assim, demonstraram desconfiança em relação às oficinas, que se propunham a investigar seu cotidiano de trabalho na atenção a consumidores(as) de drogas. |
Os problemas trazidos devem ser cotejados com as teorias explicativas da saúde e do trabalho, com objetivo de expor a essência dos problemas debatidos, num esforço para propor aos(às) participantes o reconhecimento da fragmentação da realidade, dos componentes contraditórios do trabalho e da falsa explicação dada a essas contradições. |
Discussão de filmes e documentários que exponham contradições em torno do tema debatido. |
A discussão sobre as angústias do cotidiano de trabalho e o relato de reiteradas ausências por adoecimento e licenças médicas levantaram questões sobre a organização do trabalho na ESF. Evidenciaram que recebem o menor salário de toda a equipe de saúde e que o seu trabalho era o mais inseguro, precário e estressante - falar com o traficante, dar notícias ruins, fazer visitas a lugares distantes e muitas vezes inseguros, preencher tabelas e relatórios burocráticos, entre tantos. |
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Relatos de casos que levantam contradições do trabalho no contexto em que o trabalho se realiza. |
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A instrumentalização, que apoia a mediação entre participantes e conhecimento |
Novos elementos teóricos e dados são apresentados para confrontar as explicações contraditórias identificadas, com a finalidade de rever a teoria explicativa hegemônica e fundamentar novas sínteses. |
Exposição dialogada a respeito de conceitos do campo da Saúde Coletiva (como trabalho, necessidades em saúde, epidemiologia crítica, educação emancipatória), fundamentada no Materialismo Histórico e Dialético em linguagem acessível, a partir dos exemplos e das contradições da realidade dos(as) participantes. |
O aprofundamento da compreensão das relações sociais capitalistas, particularmente da divisão social do trabalho no sistema de produção de serviços de saúde, permitiu aos(às) participantes analisar os elementos do processo de trabalho. Compreendeu-se que são eles(as) mesmos(as) o principal instrumento de seu trabalho e que contam apenas com representações limitadas sobre a realidade, que prescindem de formação técnica e política. |
Leitura e discussão de textos explicativos, escolhidos pela adequação da linguagem ao contexto. |
A nova síntese elaborada pelo grupo |
Quando se expressa a interpretação crítica da realidade e, consequentemente, da essência dos problemas de saúde dos(as) trabalhadores(as) da área, abre-se o horizonte para intervenções nesse âmbito. |
A síntese deve ser elaborada pelos(as) participantes em grupo e é processual. É importante que mediadores(as) retomem o processo histórico do grupo, reiterando as novas construções coletivas. |
Com a elaboração de seu lugar na estrutura produtiva, os(as) participantes perceberam que são, de fato, a base da ESF, não por um lugar de sustentação técnica, mas por serem anteparo para as mazelas sociais, sendo o setor da saúde o principal representante do Estado no território. A figura emblemática representativa desse poder é o(a) ACS, que além de trabalhar, também mora no território. |
A transformação das práticas sociais |
A partir do conhecimento sistematizado, práticas emancipatórias são desenvolvidas pelos(as) trabalhadores(as). Faz-se o caminho contrário ao do início do processo, parte-se da abstração teórica sobre saúde dos(as) trabalhadores(as) para fundamentar a produção de práticas. |
Identificação das práticas fundamentadas no conhecimento sistematizado. |
Os(as) ACSs deixaram de se sentir responsáveis pela “cura” do sofrimento de consumidores de drogas e seus(suas) familiares, e puderam desenvolver ferramentas para o trabalho educativo no território, a partir de elementos de sua experiência nas oficinas. |
Mediadores(as) devem identificar nos discursos dos(as) trabalhadores(as) as transformações operacionalizadas (por vezes bastante sutis), explicitando as relações entre teoria e prática. |
Houve mudanças na relação com os(as) demais trabalhadores(as), por se apropriarem da compreensão sobre o processo de trabalho, podendo verificar que a superação da sua condição de ferramenta está na superação das relações sociais capitalistas, ou seja, na direção emancipadora. |
Ao se operarem transformações na prática, percebe-se que os sentidos do trabalho mudam, e isso se manifesta como sensação de menor peso e menor culpabilização individual relacionados à impossibilidade de atingir metas e ao fracasso para responder às necessidades em saúde. |
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