As trabalhadoras e os trabalhadores do SUS desempenham um papel essencial na garantia da saúde e bem-estar da população brasileira. No entanto, enfrentam uma série de desafios que comprometem sua saúde e segurança, como: insatisfação, acidentes e adoecimento devido à falta de medidas adequadas de proteção nos ambientes e processos de trabalho1. Esse cenário se agrava pela ausência de ações sistemáticas de atenção à saúde e segurança dos trabalhadores, que muitas vezes não são incorporadas de forma planejada e estruturada pela gestão do Sistema Único de Saúde (SUS)2.
Atualmente, o SUS emprega cerca de 4 milhões de trabalhadoras e trabalhadores, representando aproximadamente 10% da população empregada formalmente. Esse contingente inclui desde profissionais da saúde, como enfermeiros e médicos, até trabalhadores de áreas de apoio, como condutores de ambulância e serviços de limpeza. A diversidade de modelos de gestão e de vínculos empregatícios, que abrange contratos estatutários, temporários, celetistas e terceirizados, entre outros, reflete a complexidade e a fragmentação das relações de trabalho no sistema3.
Desde a sua criação, o SUS enfrenta grandes desafios para sua consolidação, exacerbados pela vinculação ao mercado e pela ofensiva neoliberal que promove a privatização da saúde pública. Esse processo não somente privilegia hospitais e seguros de saúde privados, mas também resulta na precarização dos serviços e das condições de trabalho, impactando negativamente tanto os usuários quanto os trabalhadores do SUS4.
A saúde desses trabalhadores é gravemente comprometida por uma variedade de riscos ocupacionais. Profissionais do SUS estão expostos a patógenos perigosos, substâncias tóxicas, radiação, ruído excessivo e condições que levam a distúrbios osteomusculares. Além disso, enfrentam estresse crônico e sobrecarga emocional, o que contribui para alta prevalência de transtornos mentais, como a síndrome de burnout. Os riscos de acidentes, como lesões por perfurocortantes, também aumentam a vulnerabilidade desses trabalhadores, evidenciando a necessidade urgente de implementação de medidas preventivas e fortalecimento das normas de segurança e saúde1.
Nesse contexto, o Governo Federal reafirma seu compromisso com o trabalho decente e digno, destacando a saúde e segurança dos trabalhadores do SUS como uma de suas prioridades. Para tanto, está em desenvolvimento o Programa Nacional de Atenção Integral à Saúde e Segurança da Trabalhadora e do Trabalhador do SUS (PNAIST/SUS), que busca promover a saúde e prevenir doenças e agravos relacionados ao trabalho, além de oferecer assistência à saúde e promover a saúde mental desses profissionais5.
O PNAIST/SUS adota como modelo a saúde do trabalhador e como princípio o controle social, fortalecendo a formação de comissões locais e fóruns de trabalhadores para garantir a participação ativa destes nas decisões que afetam suas condições de trabalho. Essa participação é um componente fundamental do sistema de governança do programa, assegurando que as políticas sejam eficazes e alinhadas com as necessidades reais dos trabalhadores6.
Para coordenar a elaboração e implementação do PNAIST/SUS, o Departamento de Gestão e Regulação do Trabalho em Saúde (DEGERTS), em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) e o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS), aprovou na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) a criação de uma Comissão Técnica (CT). Esta comissão, instituída pela Portaria do Gabinete da Ministra do Ministério da Saúde (GM/MS) nº 3.115, de 24 de janeiro de 2024, inclui representantes de todas as secretarias do MS, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e de outras entidades, além de convidados como o Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego5.
A elaboração do PNAIST/SUS está sendo realizada de forma participativa, democrática e ascendente. Neste sentido, além das reuniões da CT, foram realizadas oficinas em todos os estados e no Distrito Federal, em parceria com o Grupo de Pesquisa GERIR da Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia. Nessas oficinas, representantes de Conselhos de Saúde, Comissões Intersetoriais de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, sindicatos, distritos sanitários especiais indígenas, universidades, gestores e trabalhadores do SUS discutem e identificam prioridades para o programa, que são, então, traduzidas em objetivos, diretrizes e linhas de ação7.
Entretanto, a implementação do PNAIST/SUS enfrenta desafios importantes que refletem a complexidade das condições de emprego e trabalho no SUS. Entre os principais obstáculos estão as insatisfatórias condições enfrentadas pelos trabalhadores do Subsistema de Saúde Indígena (Sasi-SUS), que sofrem com a falta de recursos e apoio adequado. A diversidade da categoria, que inclui variações geracionais, de escolaridade e de ocupação, torna a padronização das políticas de gestão do trabalho no SUS um desafio. Além disso, o contexto de intensa disputa no plano da política monetária e fiscal restringe os investimentos necessários para a implementação eficaz do programa. Assim, a efetivação do PNAIST/SUS exige um esforço coordenado para superar esses desafios estruturais, garantindo que as políticas de saúde e segurança atendam à diversidade e às necessidades reais dos trabalhadores do SUS.
Referências
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1 Heliotério MC, Lopes FQRDS, Sousa CCD, Souza FDO, Pinho PDS, Sousa FN, Araújo TMD. Covid-19: Por que a proteção dos trabalhadores e trabalhadoras da saúde é prioritária no combate à pandemia? Trab Educ Saude. 2020;18(3):e00289121. https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00289
» https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00289 -
2 Almeida BG, Pinto ICM. Gestão do trabalho no SUS Bahia: esquadrinhando caminhos e esperançando a prática. Belo Horizonte: Avohai; 2021. Menezes ACC, Cruz AFB, Almeida BG, Conceição CS, Bowes ECSB, Iracema Viterbo Silva, Letícia Coelho da Costa Nobre. O trabalho como dignidade humana: o histórico de construção do programa de atenção integral à saúde da trabalhadora e do trabalhador da SESAB (PAIST). p. 169-192. Disponível em: https://www.saude.ba.gov.br/wp-content/uploads/2021/11/LIVRO-GESTAO-DO-TRABALHO-NO-SUS-BAHIA-ESQUADRINHANDO-CAMINHOS-E-ESPERANCANDO-A-PRATICA.pdf
» https://www.saude.ba.gov.br/wp-content/uploads/2021/11/LIVRO-GESTAO-DO-TRABALHO-NO-SUS-BAHIA-ESQUADRINHANDO-CAMINHOS-E-ESPERANCANDO-A-PRATICA.pdf -
3 Brasil. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. 2023 [citado 10 ago 2023]. Disponível em: https://cnes.datasus.gov.br
» https://cnes.datasus.gov.br -
4 Assunção AA, Machado AF, Araújo TM. Vulnerabilidades ocupacionais e percepção de saúde em trabalhadores do SUS. Rev Bras Estud Popul. 2012 jun;29(1):147-67. https://doi.org/10.1590/S0102-30982012000100010
» https://doi.org/10.1590/S0102-30982012000100010 - 5 BRASIL. Portaria GM/MS nº 3.115, de 24 de janeiro de 2024. Institui a Comissão Técnica para elaboração do Programa Nacional de Atenção Integral à Saúde e Segurança da Trabalhadora e do Trabalhador da Saúde do SUS (PNAIST/SUS). Diário Oficial União. 24 jan. 2024.
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6 Ministério da Saúde (BR). Portaria de Consolidação nº 2, de 28 de setembro de 2017. Consolidação das normas sobre as políticas nacionais de saúde do Sistema Único de Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2017 [citado 16 set 2024]. Disponível em: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lis-48598
» https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lis-48598 -
7 Universidade Federal da Bahia. Relatório de Oficinas do PNAIST/SUS. Salvador: Universidade Federal da Bahia; 2024 [citado 16 set 2024]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/sgtes/eventos/oficinas-do-pnaist-sus
» https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/sgtes/eventos/oficinas-do-pnaist-sus
Editado por
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Editora-Chefe:
Ada Ávila Assunção
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
07 Abr 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
26 Jun 2024 -
Revisado
16 Set 2024 -
Aceito
02 Dez 2024
