RESUMO
Objetivo: Caracterizar a disponibilidade de recursos a partir de amostra aleatória representativa das unidades de terapia intensiva do Brasil.
Métodos: Realizou-se um questionário estruturado on-line para ser respondido pelo diretor médico de cada unidade participante do estudo SPREAD (Sepsis PREvalence Assessment Database), um estudo de prevalência de um único dia para avaliar o ônus da sepse no Brasil.
Resultados: Uma amostra representativa de 277 das 317 unidades convidadas participou por meio de resposta ao questionário estruturado. Em sua maior parte, os hospitais participantes tinham menos que 500 leitos (94,6%), com mediana de 14 leitos na unidade de terapia intensiva. A principal fonte de recursos financeiros para dois terços das unidades pesquisadas era o atendimento de pacientes do sistema público de saúde. Não havia disponibilidade de laboratório de microbiologia próprio em 26,8% das unidades de terapia intensiva pesquisadas, e 10,5% geralmente não tinham acesso à realização de hemoculturas. Em 10,5% das unidades pesquisadas geralmente não estavam disponíveis antibióticos de amplo espectro, e 21,3% das unidades geralmente não podiam obter mensurações de lactato dentro de 3 horas. As instituições com alta disponibilidade de recursos (158 unidades; 57%) eram, em geral, maiores e atendiam principalmente pacientes do sistema de saúde privado. As unidades sem alta disponibilidade de recursos geralmente não dispunham de antibióticos de amplo espectro (24,4%), vasopressores (4,2%) e cristaloides (7,6%).
Conclusão: Um número importante de unidades não tem condições para realizar intervenções básicas de monitoramento e terapêutica em pacientes sépticos. Nossos resultados salientam importantes oportunidades que o Brasil tem para melhorar, em termos de adesão a intervenções simples, porém eficazes.
Descritores: Cuidados críticos; Recursos em saúde; Sepse/epidemiologia; Terapêutica; Monitoramento epidemiológico; Brasil/epidemiologia; Países em desenvolvimento; Unidades de terapia intensiva
ABSTRACT
Objective: To characterize resource availability from a nationally representative random sample of intensive care units in Brazil.
Methods: A structured online survey of participating units in the Sepsis PREvalence Assessment Database (SPREAD) study, a nationwide 1-day point prevalence survey to assess the burden of sepsis in Brazil, was sent to the medical director of each unit.
Results: A representative sample of 277 of the 317 invited units responded to the resources survey. Most of the hospitals had fewer than 500 beds (94.6%) with a median of 14 beds in the intensive care unit. Providing care for public-insured patients was the main source of income in two-thirds of the surveyed units. Own microbiology laboratory was not available for 26.8% of the surveyed intensive care units, and 10.5% did not always have access to blood cultures. Broad spectrum antibiotics were not always available in 10.5% of surveyed units, and 21.3% could not always measure lactate within three hours. Those institutions with a high resource availability (158 units, 57%) were usually larger and preferentially served patients from the private health system compared to institutions without high resource availability. Otherwise, those without high resource availability did not always have broad-spectrum antibiotics (24.4%), vasopressors (4.2%) or crystalloids (7.6%).
Conclusion: Our study indicates that a relevant number of units cannot perform basic monitoring and therapeutic interventions in septic patients. Our results highlight major opportunities for improvement to adhere to simple but effective interventions in Brazil.
Keywords: Critical care; Health resources; Sepsis/epidemiology; Therapeutics; Epidemiological monitoring; Brazil/epidemiology; Developing countries; Intensive care units
INTRODUÇÃO
A sepse é uma prioridade global de saúde, conforme recentemente declarado pela Organização Mundial da Saúde.(1,2) Uma extrapolação atual, com base em recente revisão sistemática, estima incidência mundial de 31,5 milhões de casos de sepse ao ano, com potencial de 5,3 milhões de óbitos. Contudo, esta extrapolação se baseou nos dados de países com níveis elevados de renda.(3) Como mais de 80% da população mundial vive em países com baixa e média renda (PBMRs), nos quais são frequentes as limitações de recursos, as taxas de letalidade são, provavelmente, muito mais elevadas.(1,4,5) É digna de nota a falta de dados confiáveis sobre os recursos disponíveis nos PBMRs.(6) Embora esteja disponível algum nível de informação,(7-10) tais estudos são descrições de centros únicos ou levantamentos com base em questionários sem aleatorização da amostra, o que pode induzir a viés de seleção.
Segundo o Banco Mundial,(11) o Brasil é um país de renda média, com população estimada de cerca de 209 milhões de pessoas;(12) alguns dados sugerem aumento em nosso país dos óbitos relacionados à sepse entre 2002 e 2010.(13) O estudo SPREAD (Sepsis PREvalence Assessment Database), um levantamento nacional da prevalência em 1 único dia em unidades de terapia intensiva (UTIs) brasileiras, observou incidência de sepse nas UTIs de 36,3 casos por mil pacientes-dias e alarmante mortalidade hospitalar de 55,7%. A baixa disponibilidade de recursos se mostrou independentemente associada com mortalidade (odds ratio 1,67; p = 0,045).(14) Como este levantamento gerou amostra aleatórioa nacional representativa das UTIs brasileiras, com descrição da infraestrutura das instituições, disponibilidade de recursos e aspectos organizacionais das unidades participantes, a informação resultante é mais representativa do que as pequenas coortes prévias de conveniência.(15,16)
Assim, conduzimos análise post hoc da base de dados do estudo SPREAD para caracterizar e comparar a disponibilidade de recursos das unidades participantes. A caracterização dos pacientes e seus desfechos foram descritos na publicação original.(14)
MÉTODOS
O SPREAD é um estudo prospectivo de prevalência em 1 único dia, que visa avaliar a epidemiologia da sepse em UTIs para adultos localizadas no Brasil.(14) Gerou-se amostra aleatória estratificada de todas as UTIs brasileiras para pacientes adultos, a partir do censo da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) de 2010.(17) O estudo compreendeu 2.623 UTIs com total de 28.849 leitos. Após exclusão das UTIs neonatais e pediátricas, assim como das unidades para pacientes queimados, restou uma lista com um total de 1.690 UTIs e 19.316 leitos.
Nosso método de amostragem foi explicado na publicação original.(14) Em resumo, criamos estratos com tamanhos similares, cada um deles composto por 100 a 500 leitos de UTI, com a finalidade de acentuar a representatividade de nossa seleção aleatória de UTIs. Com base na lista da AMIB, produzimos uma regra aleatória inicialmente estratificada por região geográfica e tamanho das cidades (considerando a localização como capitais ou cidades do interior). Cada nível foi, então, estratificado segundo a principal fonte de recursos financeiros do hospital (atendimento a pacientes do sistema público estatal ou privados) e o tamanho da UTI (dez ou menos leitos vs. mais de dez leitos), gerando finalmente 40 estratos. Aplicamos a função "randomizar" (RAND) do programa Microsoft Excel 2010, que gera números aleatórios para as UTIs dentro de cada estrato e, sequencialmente, entramos em contato por telefone ou e-mail com seus diretores médicos, convidando-os para tomar parte do estudo. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do centro coordenador (Universidade Federal de São Paulo) sob o número CAAE 04719512.0.1001.5505. Foi dispensada a necessidade de obter assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em razão da natureza observacional do estudo.
Participantes e instrumento do levantamento
Avaliamos os fatores organizacionais das UTIs e a disponibilidade de recursos para a instituição, por meio de levantamento realizado com questionário de autopreenchimento com base na internet (Material suplementar). O diretor médico de cada UTI respondeu ao questionário antes da entrada no estudo e coleta de dados dos pacientes. Não se ofereceu qualquer incentivo financeiro para tomar parte do levantamento ou do estudo SPREAD.
O questionário foi delineado pelo Comitê Diretivo do SPREAD e continha 97 itens, agrupados em oito categorias principais (informações gerais, instalações hospitalares, uso de protocolos clínicos e disponibilidade de fármacos, ferramentas para monitoramento, exames laboratoriais, equipamentos e descartáveis). A seção "informações gerais" tinha duas perguntas abertas ("número de leitos hospitalares" e "número de leitos de UTI" na instituição), mais tarde categorizadas pelos investigadores do estudo. As respostas foram classificadas como "sim" ou "não" e "não sei" quanto à seção "instalações hospitalares"; "sim, um protocolo gerenciado", "sim, mas não gerenciado", "não", e "não sei" para a seção "protocolos clínicos"; e "sempre", "na maioria das vezes", "na minoria das vezes", "nunca" e "não sei" para as demais seções. Não se permitiram respostas faltantes. Para avaliar os recursos mais importantes, o Comitê Diretivo selecionou oito itens utilizando um processo Delphi informal, antes de realizar qualquer análise, sob a premissa de que deveriam cumprir os critérios relativos ao conjunto de medidas de 6 horas da Campanha Sobrevivendo à Sepse.(18) Esses oito itens foram: análise de gasometria sanguínea dentro de 3 horas; culturas de sangue, urina e material de aspiração traqueal (quantitativa e qualitativa); antibióticos tanto para cobertura de Gram-negativos (uma cefalosporina de terceira geração mais carbapenêmicos ou piperacilina/tazobactam) como de Gram-positivos (vancomicina, teicoplanina ou linezolida); cristaloides; noradrenalina; cateter venoso central (com lúmen único ou duplo); e disponibilidade para mensuração da pressão venosa central.
Variáveis do estudo e análise dos dados
Considerando que a literatura prévia,(19) assim como os dados do estudo SPREAD,(14) sugere que a adesão ao conjunto de medidas de 6 horas se associa com menor mortalidade hospitalar, categorizamos as unidades segundo a disponibilidade de todos os oito itens ("alta disponibilidade de recursos" quando os oito itens estavam sempre disponíveis e "sem alta disponibilidade de recursos" quando um ou mais dos oito itens não estava sempre disponível). Para a análise, consideramos as unidades como tendo disponibilidade do recurso apenas quando a resposta era "sempre".(7) Também comparamos o recurso de análise microbiológica e a possibilidade de administrar antibióticos de amplo espectro (definidos como antibióticos tanto para cobertura de Gram-negativos quanto de Gram-positivos, conforme definido na seção sobre os oito itens). Avaliou-se a possibilidade de aderir às recomendações da Campanha Sobrevivendo à Sepse rotuladas como "fortes" e ao recente conjunto de medidas para 1 hora.(20)
Os dados contínuos são apresentados como a mediana (25º - 75º percentil) e comparados com utilização do teste U de Mann-Whitney. As variáveis categóricas são apresentadas como números absolutos e frequências ou percentagens, e comparadas com uso do teste qui-quadrado. Valores de p inferiores a 0,05 foram considerados estatisticamente significantes. As análises estatísticas foram conduzidas com utilização do pacote estatístico Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 20 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA).
RESULTADOS
Dentre as 368 UTIs com as quais entramos em contato, 317 foram elegíveis e 13 (4%) recusaram-se a tomar parte. Das 317 unidades elegíveis, 277 (87%) responderam ao questionário do levantamento de recursos e são descritas na presente publicação. A maior parte era constituída por hospitais de tamanho pequeno ou médio (262 hospitais, 94,6%) com mediana de 14 (9 - 30) leitos de UTI. Em dois terços dos hospitais, a principal fonte de recursos financeiros era o cuidado de pacientes do Sistema Único de Saúde (169 UTIs; 61%). A distribuição geográfica das instituições participantes manteve paralelismo com a distribuição da população entre as diferentes regiões do país. A proporção enfermeiro/paciente foi de 0,13 (0,10 - 0,19), e a proporção entre técnicos de enfermagem/paciente foi de 0,5 (0,5 - 0,5). Embora a maioria dos hospitais tivesse prontos-socorros (247 hospitais; 89,5%) e centros cirúrgicos (274 hospitais; 98,9%), apenas 73,2% deles tinham seu próprio laboratório de microbiologia, e quase metade não tinha banco de sangue próprio (Tabela 1). Vinte e nove unidades (10,5%) geralmente não tinham a possibilidade de administrar antibióticos de amplo espectro, 9 (3,2%) geralmente não tinham acesso a cristaloides e 5 (1,8%) geralmente não tinham vasopressores disponíveis (nem noradrenalina nem dopamina) (Tabela 2). Em 29 instituições (10,5%) geralmente não era possível ter acesso a hemocultura, e 59 (21,3%) geralmente não podiam medir os níveis de lactato dentro de 3 horas (Tabela 3).
As unidades com alta disponibilidade de recursos eram, em geral, maiores, localizadas em capitais e cuidavam de pacientes do sistema privado, em comparação com as sem alta disponibilidade de recursos. Tinham também um número maior de técnicos de enfermagem por paciente, mas número semelhante de enfermeiros de nível superior e médicos diurnos por paciente (Tabela 1). Dentre as unidades sem alta disponibilidade de recursos, 24,4% não tinham antibióticos de alto espectro, 42,5% não tinham vasopressores e 7,6% não tinham cristaloides (Tabela 2). Os recursos de laboratório microbiológico, mensurações de lactato, descartáveis e disponibilidade de dispositivos e equipamentos de monitoramento foram sistematicamente diferentes entre ambos os tipos de unidades (Tabelas 3 e 4). A dispensação de cuidados, segundo protocolos, também foi diferente (Tabela 5). Instituições com menor acesso a análises microbiológicas também tinham menor acesso a antibióticos de amplo espectro (Tabela 6).
Disponibilidade de descartáveis e dispositivos de monitoramento/diagnóstico, os recursos da instituição
Dentre todas as unidades, 214 (77,3%) tinham adesão ao conjunto de medidas em 1 hora, e 219 (79,1%) tinham adesão às recomendações "fortes" da Campanha Sobrevivendo à Sepse. Observaram-se notáveis diferenças entre as unidades com alta disponibilidade de recursos e as sem esse grau de disponibilidade (Tabela 7).
Possibilidade de aderir ao conjunto de medidas em 1 hora e às recomendações “fortes” da Campanha Sobrevivendo à Sepse
DISCUSSÃO
Os resultados de nosso levantamento nacional aleatorizado com base em questionários de amostra representativa das UTIs brasileiras para pacientes adultos indicam que número substancial de unidades não pode realizar algumas intervenções básicas de monitoramento (por exemplo, mensuração do lactato) e terapêuticas (por exemplo, antibioticoterapia de amplo espectro) para pacientes sépticos. Os níveis de disponibilidade de recursos humanos, medicamentos, equipamentos e laboratório são sistematicamente diferentes quando se comparam unidades com alta disponibilidade de recursos (como indicador da adesão ao conjunto de medidas em 6 horas) com as sem alta disponibilidade de recursos. Quase um quarto das UTIs não tem como cumprir o conjunto de medidas em 1 hora, mais porque não tem os recursos do que por conta do curto período de tempo. Nossos resultados são relevantes tanto para nosso país como para servir de base para estudos de disponibilidade de recursos em PBMRs.
As informações sobre disponibilidade de recursos em PBMRs são escassas e, principalmente, limitadas a dados de centro único, e não de amostras nacionais representativas.(21) No estudo ICON apenas 8,5% dos centros participantes eram de países com baixa renda. Notavelmente, um risco mais elevado de morte hospitalar se associou independentemente com as diferenças entre os centros, em termos de disponibilidade de equipamentos, treinamento e recursos.(22) Tais diferenças podem afetar a possibilidade de aderir aos tratamentos de primeira linha. Na análise multivariada do estudo SPREAD, níveis mais baixos de disponibilidade de recursos se associaram com maior mortalidade.(14) Por outro lado, o estudo IMPRESS sugere que a adesão a conjuntos de medidas com base em evidências se associa com níveis de mortalidade mais baixos.(19) Como a disponibilidade de recursos em terapia intensiva parece associar-se com os desfechos, as iniquidades do sistema de saúde dos PBMRs, embora notórias,(23) devem ser melhor caracterizadas.
Publicações prévias sugeriram que a implantação de conjuntos de medida para sepse em alguns PBMRs está comprometida, em razão da inadequada disponibilidade de equipamentos, fármacos e descartáveis.(7-10) Baelani et al. relataram que, em alguns países africanos, 16,3% das unidades conseguiram implantar conjuntos de medidas de ressuscitação, o que é muito menos que a porcentagem em países de alta renda (93,2%).(7) Embora nossos resultados para o conjunto de medidas em 1 hora sejam melhores do que nas unidades africanas, apenas 77,3% de nossas instituições têm disponibilidade dos recursos necessários. Quando se avaliam componentes individuais do conjunto de medidas em 1 hora, é particularmente chocante que algumas intervenções-chave nem sempre estão disponíveis (por exemplo, 3,2% das unidades não tinham cristaloides, 1,8% não tinha vasopressores e 10,5% não tinham antibióticos de amplo espectro). A indisponibilidade de antibióticos é particularmente preocupante, já que 60% das infecções observadas nos pacientes do SPREAD estavam associadas aos cuidados da saúde (que, em geral, são causadas por microrganismos multirresistentes). Observamos também uma associação entre os recursos de análise microbiológica e a disponibilidade de antibióticos (isto é, a falta de exames microbiológicos se associou com menor disponibilidade de antibióticos). Embora algumas instituições não possam realizar todas as análises microbiológicas, elas deveriam ter antibióticos disponíveis para evitar retardos do tratamento, já que o tempo entre a infecção e o uso de antibióticos se associa com os desfechos da sepse.(24)
Avaliamos também em nossa amostra as equipes de UTI, com valores observados mais baixos do que em países de alta renda(25) e mesmo em centros da Mongólia.(9) Infelizmente há uma falta de dados atuais sobre as equipes de UTI nos PBMRs, assim como seu relacionamento com os desfechos. Informações prévias demonstraram a associação entre as proporções em relação a pacientes de enfermagem(26) e intensivistas(27) com a mortalidade hospitalar e esgotamento grave,(28) porém estes dados são principalmente oriundos de países de alta renda. No Brasil, Tironi et al. observaram prevalência de esgotamento de 61,7% em intensivistas, e que a falta de recursos é um fator estressor durante os plantões de UTI em 47,4% da equipe.(29) Recentemente, o estudo ORCHESTRA não conseguiu demonstrar impacto significante dos padrões de equipes de médicos e enfermagem na mortalidade hospitalar no Brasil.(30) Embora reconheçamos que o estudo ORCHESTRA não teve como objetivo específico tratar de pacientes sépticos, e que existem algumas diferenças entre as unidades participantes daquele e do nosso estudo (como número de unidades participantes que atendem pacientes privados, distribuição geográfica em relação às regiões do Brasil e capitais, e proporção enfermagem/paciente), também não conseguimos identificar um padrão de equipe como fator significante associado com mortalidade hospitalar (Apêndice suplementar e a Tabela 5 publicados com o estudo SPREAD - Lancet Infect Dis. 2017;17(11):1180-9).(14)
Nosso estudo tem alguns pontos fortes. Nosso sistema de amostragem foi representativo das instituições brasileiras com UTIs. O delineamento de nosso estudo é original e pode ajudar a explicar a dinâmica da disponibilidade de recursos em países com renda média e a planejar futuros estudos em nível nacional. O baixo índice de recusas de participação também melhora nossa validade interna e externa.
Este estudo tem também algumas limitações. Primeiramente o levantamento dependeu de autopreenchimento dos questionários, e não realizamos auditorias para avaliar se as respostas eram precisas. Entretanto, o questionário deveria ser preenchido completamente antes que as unidades pudessem tomar parte do estudo SPREAD, e o método de estratificação aleatória da amostra aumenta a validade e a representatividade de nossos resultados. Em segundo lugar, embora o questionário tenha sido delineado por um comitê com experiência prévia em pesquisa nas áreas de terapia intensiva e aspectos organizacionais de UTIs, e revisado por intensivistas especializados envolvidos na gestão de UTIs, não foi realizada qualquer avaliação de confiabilidade de teste-reteste. Em terceiro lugar, nossos dados podem não ser aplicáveis a outros países, mesmo PBMRs, embora os métodos possam ser replicáveis em outros países para obtenção de dados de alta qualidade.(4)
CONCLUSÃO
Nosso levantamento nacional aleatório de amostra representativa de unidades de terapia intensiva brasileiras indica que, em um número substancial de instituições, faltam recursos necessários para realizar procedimentos básicos de monitoramento e intervenção em pacientes sépticos. Nossos resultados salientam importantes oportunidades no Brasil para melhora na efetivação de intervenções baseadas em evidência. Este estudo pode também servir como base para avaliação de disponibilidade de recursos em países de baixa e média renda.
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Declarações: Leandro Utino Taniguchi, Editor de Seção da Revista Brasileira de Terapia Intensiva, não esteve envolvido na avaliação ou decisão de publicar este artigo. Luciano Cesar Pontes de Azevedo, Editor Associado da Revista Brasileira de Terapia Intensiva, não esteve envolvido na avaliação ou decisão de publicar este artigo. Fernando Augusto Bozza, membro do Corpo Editorial da Revista Brasileira de Terapia Intensiva, não esteve envolvido na avaliação ou decisão de publicar este artigo. Alexandre Biasi Cavalcanti, Editor de Seção da Revista Brasileira de Terapia Intensiva, não esteve envolvido na avaliação ou decisão de publicar este artigo. Flávia Ribeiro Machado, Editora Associada da Revista Brasileira de Terapia Intensiva, não esteve envolvido na avaliação ou decisão de publicar este artigo.
AGRADECIMENTOS
Este estudo foi coordenado pelo Instituto Latino Americano da Sepse e teve suporte da Brazilian Research in Intensive Care Network (BRICNet). O instituto de pesquisa do HCor-Hospital do Coração forneceu o gerenciamento de dados para o estudo.
Esta pesquisa recebeu suporte financeiro da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), sob o número 2011/20401-4. A fonte do financiamento não teve qualquer influência no delineamento do estudo, e nem na coleção, na análise e na interpretação dos dados. Não influenciou também na redação do manuscrito da presente publicação, assim como não influenciou na decisão de submeter o artigo para publicação. Queremos agradecer à Associação Brasileira de Medicina Intensiva (AMIB) pelo fornecimento da lista de unidades de terapia intensiva do Brasil em 2010.
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Editor responsável: Pedro Póvoa
Disponibilidade de dados
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
30 Maio 2019 -
Data do Fascículo
Apr-Jun 2019
Histórico
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Recebido
22 Nov 2018 -
Aceito
04 Fev 2019