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Novos procedimentos de confirmação da morte encefálica no Brasil: resultados da Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina

RESUMO

Objetivo:

Analisar o impacto da resolução 2.173/2017 do Conselho Federal de Medicina nos resultados da Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina.

Métodos:

Estudo observacional do tipo transversal, com dados de prontuário de todos os pacientes (1.605) com suspeita de morte encefálica notificados à Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina e que iniciaram procedimentos para confirmação desse diagnóstico entre julho de 2016 e dezembro de 2017 e entre janeiro de 2018 e junho de 2019. A mediana do tempo de duração do protocolo em cada período foi considerada para a comparação entre os intervalos. Os dados coletados foram transformados em taxas (por milhão de população). As taxas médias dos períodos antes e depois da implantação do protocolo foram analisadas pelo teste t de Student, e as variáveis qualitativas foram analisadas pelo teste do qui-quadrado de Pearson.

Resultados:

O tempo médio de duração dos procedimentos de confirmação de morte encefálica apresentou redução de mais de 1 hora no segundo período em relação ao primeiro, com significância estatística (p = 0,001). As taxas de fígados captados e de pâncreas transplantados, o número de notificações por porte hospitalar e a taxa de parada cardiorrespiratória na macrorregião do Vale do Itajaí também apresentaram diferenças com significância estatística na comparação entre os dois períodos.

Conclusão:

No período após a nova resolução sobre morte encefálica, houve redução do tempo de duração do diagnóstico. Contudo, outros indicadores não sofreram alteração significativa, evidenciando a natureza multidimensional do processo de transplante de órgãos em Santa Catarina e a necessidade de mais estudos para a melhor compreensão e otimização do processo.

Descritores:
Morte encefálica; Transplante de órgãos; Indicadores de gestão; Resoluções

ABSTRACT

Objective:

To analyze the impact of Resolution 2.173/2017 of the Federal Council of Medicine on results from the Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina.

Methods:

This was a cross-sectional observational study of medical records of all patients (1,605) with suspected brain death notified to the Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina; for this study, procedures to confirm this diagnosis were initiated between July 2016 and December 2017 and between January 2018 and June 2019. The median duration of the protocol in each period was considered for the comparison between the intervals. The collected data were transformed into rates (per million population). The mean rates for the periods before and after the implementation of the protocol were analyzed by Student’s t-test, and qualitative variables were analyzed by Pearson’s chi-squared test.

Results:

The mean duration of brain death confirmation procedures decreased more than 1 hour in the second period compared to the first period, with statistical significance (p = 0.001). The rates of harvested livers and transplanted pancreas, the number of notifications by hospital size and the rate of cardiac arrest in the macro-region of the Itajaí Valley were significantly different between the two periods.

Conclusion:

In the period after the new resolution on brain death, there was a reduction in the duration for diagnosis. However, other indicators did not change significantly, providing evidence for the multidimensional nature of the organ transplantation process in Santa Catarina and the need for further studies to better understand and optimize the process.

Keywords:
Brain death; Organ transplantation; Management indicators; Resolutions

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, a taxa de notificação de potenciais doadores tem aumentado gradativamente no país.(11 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado. ABTO RBT. 2016;22(4). [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/upload/file/rbt/2016/rbt2016-leitura.pdf
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,22 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado. ABTO RBT. 2018;24(4). [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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) Em 2016, somaram-se 10.185 notificações no Brasil, e, destas, 2.981 (29,3%) se tornaram doadores efetivos.(11 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado. ABTO RBT. 2016;22(4). [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/upload/file/rbt/2016/rbt2016-leitura.pdf
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) No mesmo ano, em Santa Catarina, houve 537 notificações, com 251 (46,7%) doadores efetivos.(33 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2016. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/53-estatisticas-2016
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) Em 2018, o total de notificações no Brasil foi de 10.779, com 3.531 (32,7%) doações; em Santa Catarina foram 581 notificações, com 287 (49,4%) doações efetivas de órgãos.(22 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado. ABTO RBT. 2018;24(4). [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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,44 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2018. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/186-estatistica-2018
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)

A morte encefálica (ME) tem como definição o estado de coma não perceptivo, com ausência de reatividade supraespinhal e apneia persistente, na presença de lesão encefálica de causa conhecida e irreversível.(55 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução nº 2.173, de 23 de novembro de 2017. Define os critérios do diagnóstico de morte encefálica. Diário Oficial da União, 15/12/2017, Seção 1, p. 50-275. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://saude.rs.gov.br/upload/arquivos/carga20171205/19140504-resolucao-do-conselho-federal-de-medicina-2173-2017.pdf
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) Atualmente, no Brasil, os critérios para diagnóstico de ME são definidos pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que publicou a primeira norma referente ao tema em 1991,(66 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução CFM nº 1.346, de 8 de agosto de 1991. Diário Oficial da União 17/10/1991, Seção 1, p. 22731. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/1991/1346_1991.htm
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) sendo revisada em 1997 pela resolução 1.480,(77 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução CFM nº 1.480, de 21 de agosto de 1997. Diário Oficial da União, 21/08/1997, p. 18.227. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/1997/1480_1997.htm
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) a qual, por sua vez, esteve em vigor por 20 anos, até que, em dezembro de 2017, foi emitida a resolução 2.173,(55 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução nº 2.173, de 23 de novembro de 2017. Define os critérios do diagnóstico de morte encefálica. Diário Oficial da União, 15/12/2017, Seção 1, p. 50-275. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://saude.rs.gov.br/upload/arquivos/carga20171205/19140504-resolucao-do-conselho-federal-de-medicina-2173-2017.pdf
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) a qual apresentou algumas diferenças em relação à sua predecessora.

Entre as mudanças formalizadas, destaca-se o intervalo mínimo entre as avaliações clínicas para pacientes com mais de 2 anos, que passou de 6 horas para 1 hora, a redução da necessidade de dois testes de apneia para apenas um positivo e o parâmetro de positividade deste, que passou a ser de pressão de dióxido de carbono (CO2) maior que 55mmHg, em vez de maior ou igual a esse valor, como descrito na resolução de 1997. Ainda, foram estabelecidos alguns pré-requisitos que devem ser cumpridos de forma sistemática e obrigatória, antes da realização de cada uma das etapas do diagnóstico: pressão arterial sistólica (PAS) ≥ 100mmHg ou pressão arterial média (PAM) ≥ 65mmHg, temperatura > 35ºC e saturação de oxigênio > 94%. Os novos procedimentos também detalham alterações morfológicas, orgânicas ou adquiridas que impossibilitam a avaliação unilateral dos reflexos, permitindo, no caso da ausência de reflexos do lado sem alterações, o prosseguimento para as próximas etapas do diagnóstico. Além disso, foram definidos critérios de formação e capacitação dos médicos examinadores, substituindo a obrigatoriedade de um neurologista. Finalmente, o tempo mínimo de tratamento intra-hospitalar, desde a admissão do paciente até o início dos procedimentos para diagnóstico, que não tinha definição na resolução anterior, foi estabelecido em 6 horas.(55 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução nº 2.173, de 23 de novembro de 2017. Define os critérios do diagnóstico de morte encefálica. Diário Oficial da União, 15/12/2017, Seção 1, p. 50-275. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://saude.rs.gov.br/upload/arquivos/carga20171205/19140504-resolucao-do-conselho-federal-de-medicina-2173-2017.pdf
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,77 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução CFM nº 1.480, de 21 de agosto de 1997. Diário Oficial da União, 21/08/1997, p. 18.227. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/1997/1480_1997.htm
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)

A transparência no diagnóstico de ME, além de garantir que todo paciente crítico tenha direito ao diagnóstico seguro de morte e reduzir dúvidas e o sofrimento da família,(88 Pimenta FP, Amorim BR, Silva L. Morte encefálica: diagnóstico possível sem utilização de exames complementares. Arq Bras Neurocir. 2012;31(1):22-7.) tem grande influência no sistema de doação e transplante de órgãos. Nesse sentido, a revisão do processo de diagnóstico de ME era uma reivindicação recorrente no Brasil.(99 Freitas RA, Dell' Agnolo CM, Almeida-Benguella E, Blasco-Donoso LM, Ferreira EC, Marisa-Pelloso S, et al. Diagnóstico de morte encefálica em vítimas de acidentes: análise do processo. Enferm Glob. 2018;17(50):115-22.) Pimenta et al. indicaram que pacientes cujos procedimentos de confirmação da ME apresentaram o intervalo entre os dois testes clínicos maior que 6 horas, a taxa de parada cardíaca foi de 14%.(88 Pimenta FP, Amorim BR, Silva L. Morte encefálica: diagnóstico possível sem utilização de exames complementares. Arq Bras Neurocir. 2012;31(1):22-7.)

Dessa forma, avaliar o impacto causado pela resolução 2.173/2017 do CFM é de extrema importância para a implantação de estratégias que possam agilizar e deixar cada vez mais seguro o processo de diagnóstico de ME, com redução do sofrimento das famílias e ampliação da chance de transplante para inúmeros pacientes com necessidade desse procedimento.

O objetivo deste trabalho foi analisar o impacto da resolução 2.173/2017 do CFM, nos indicadores de gestão da Central Estadual de Transplantes (CET) de Santa Catarina, entre julho de 2016 e junho de 2019.

MÉTODOS

O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos (CEP) da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) sob número CAAE 15650819.5.0000.5369, sendo aprovado pelo parecer 3.431.382.

Este estudo foi delineado como observacional de tipo transversal, analítico, com abordagem quantitativa, tendo como fonte de dados as planilhas e os prontuários individuais de todos os pacientes notificados como suspeitos de ME em Santa Catarina, ambos sob guarda da CET. A população estudada foi constituída de 1.605 pacientes que iniciaram os procedimentos de confirmação da ME entre julho de 2016 e junho de 2019, em 52 hospitais de Santa Catarina. Foram excluídos da pesquisa aqueles com contraindicação que tiveram parada cardiorrespiratória (PCR) antes da conclusão do protocolo, além de uma perda amostral de 13 pacientes cujos prontuários não foram encontrados na CET devido a um processo de auditoria interna em desenvolvimento no período da coleta.

As variáveis avaliadas foram as notificações de abertura de protocolo de ME (em números); sexo (masculino/feminino); idade (em anos); macrorregião (Planalto Norte e Nordeste/Grande Florianópolis/Vale do Itajaí/Foz do Rio Itajaí/Sul/Meio Oeste e Serra Catarinense/Grande Oeste); doações efetivas - aquelas em que houve retirada de órgãos (em números); tempo de duração do protocolo (em horas); abertura do protocolo (em hora do dia); término do protocolo (em hora do dia); óbito por PCR (sim/não); autorizações dos familiares (sim/não); tipo de órgão (rim, fígado, pâncreas, coração e pulmão); porte hospitalar segundo a Política Hospitalar Catarinense, levando em conta critérios como número de leitos, número de leitos UTI adulto, pediátrico e neonatal, taxa de ocupação geral, quantidade de clínicas com internação, exames diagnósticos disponibilizados, número de altas complexidades habilitadas e rede temática com serviço habilitado(1010 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Política Hospitalar Catarinense; 2019. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://www.saude.sc.gov.br/index.php/informacoes-gerais-documentos/politica-hospitalar-catarinense
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) (II/III/IV/V/não classificados); período (antes, de julho/2016 a dezembro/2017; depois, de janeiro/2018 a junho/2019) e mês. As informações coletadas foram dispostas em banco de dados no software Microsoft Excel 2010, sendo as linhas reservadas ao registro de um protocolo e as colunas detalhando cada variável de interesse para o estudo. Os dados foram transformados em taxas ou coeficientes, sendo o numerador a frequência dos protocolos e o denominador a população média do estado no período considerado. Essa razão foi multiplicada pela constante 1 milhão (por milhão de população - pmp). As taxas médias do período antes e depois da implantação do protocolo a que se refere à resolução 2.173/2017 do CFM foram analisadas pelo teste t de Student para amostras independentes. As variáveis qualitativas foram analisadas pelo teste do qui-quadrado de Pearson. Foram considerados significativos os valores de p < 0,05.

RESULTADOS

O número de procedimentos de confirmação de ME notificados no primeiro período (julho de 2016 até dezembro de 2017) foi de 805, ou seja, um pouco maior que o do segundo período (janeiro de 2018 a junho de 2019), que registrou 800 procedimentos, totalizando 1.605 procedimentos estudados.

As características do perfil sociodemográfico dos pacientes submetidos aos procedimentos de confirmação da ME em questão estão na tabela 1.

Tabela 1
Perfil sociodemográfico dos pacientes submetidos a procedimentos para confirmação da morte encefálica

Em relação à caracterização das duas populações estudadas, a média de idade e o desvio-padrão de ambos os períodos foram semelhantes, como mostra a tabela 1. A variação da prevalência de sexo entre o primeiro e o segundo períodos não apresentou significância estatística (valor de p = 0,457), porém, nos dois casos, houve predominância (55,2% e 57%, respectivamente) do sexo masculino.

Quanto à origem dos casos notificados segundo o porte hospitalar, houve aumento significativo no número de notificações de hospitais de porte não classificado na Política Hospitalar Catarinense,(1010 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Política Hospitalar Catarinense; 2019. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://www.saude.sc.gov.br/index.php/informacoes-gerais-documentos/politica-hospitalar-catarinense
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) no segundo período de estudo. Entretanto, os hospitais classificados como de porte II e IV notificaram menos no segundo período, quando comparados ao primeiro, enquanto os classificados nos portes III e V apresentaram aumento no número de notificações a partir de 2018. Na variável de distribuição dos protocolos segundo as macrorregiões de Santa Catarina, não houve alteração significativa no número de protocolos abertos antes e depois da nova resolução do CFM.

Em relação à mediana do tempo de duração dos procedimentos de confirmação da ME (Tabela 2), houve diminuição da duração da confirmação da ME no segundo período em relação ao primeiro, que totalizou 16,4 horas no primeiro período e 15,1 horas no segundo, com significância estatística (valor de p = 0,001).

Tabela 2
Caracterização do desempenho dos processos de captação e doação de órgãos, segundo período estudado

O número de autorizações familiares aumentou do primeiro para o segundo período, mas não apresentou significância estatística (valor de p = 0,275), padrão que se repetiu no critério de doação efetiva (valor de p = 0,226), apesar do aumento do número no período.

A taxa de perdas por PCR diminuiu de 77 casos entre 2016/2017 para 59 casos entre 2018/2019 (-23,37%), apesar de não ter obtido significância estatística (valor de p = 0,115).

Em relação aos órgãos captados, com exceção do fígado, todos os outros órgãos avaliados neste estudo tiveram aumento das captações no segundo período quando comparados ao primeiro, sem, no entanto, obter significância estatística, como consta na tabela 2. Com relação ao fígado, sua captação diminuiu consideravelmente no segundo período, passando de 322 para 309 captados, redução estatisticamente significativa (valor de p = 0,03).

O mesmo padrão se repetiu em relação aos órgãos transplantados, mas, neste caso, a redução de transplantes de fígado não obteve significância (valor de p = 0,063). Entretanto, o número de pâncreas transplantados, que era de 15 no primeiro período, aumentou para 31 no segundo período, apresentando significância estatística (valor de p = 0,023).

Na tabela 3, podem-se observar os indicadores (taxas ou coeficientes) de produtividade do sistema de captação e transplante de órgãos em relação à população média de Santa Catarina nos dois períodos de estudo. Com relação à taxa de procedimentos de confirmação de ME registrados, houve pouca diferença entre os períodos estudados (valor de p = 0,764). O mesmo ocorreu com a taxa de doações efetivas (valor de p = 0,828).

Tabela 3
Taxas de produtividade por milhão de população do sistema de captação, doação e transplante de órgãos, segundo o período estudado

A taxa geral de PCR apresentou redução no segundo período, apesar de não ter significância estatística (valor de p = 0,095). As taxas de PCR segundo macrorregião de ocorrência indicaram que a única macrorregião com redução significativa da taxa de PCR no segundo período foi o Vale do Itajaí (valor de p = 0,029). As demais também apresentaram redução da taxa de PCR, porém sem significância estatística.

Por fim, sobre as taxas de doação por macrorregião, todos os valores obtidos apresentaram valor de p > 0,05, não indicando diferenças estatisticamente significativas entre os dois períodos estudados.

DISCUSSÃO

Esta pesquisa foi orientada para analisar o impacto da resolução 2.173/2017 do CFM,(55 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução nº 2.173, de 23 de novembro de 2017. Define os critérios do diagnóstico de morte encefálica. Diário Oficial da União, 15/12/2017, Seção 1, p. 50-275. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://saude.rs.gov.br/upload/arquivos/carga20171205/19140504-resolucao-do-conselho-federal-de-medicina-2173-2017.pdf
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) em vigor desde dezembro de 2017, nos indicadores de gestão da CET de Santa Catarina, entre julho de 2016 e junho de 2019. O ponto de partida para o delineamento da pesquisa foi a hipótese de que os novos procedimentos definidos pela resolução, ao reduzirem o período entre os dois testes clínicos necessários para a confirmação da ME de 6 para 1 hora, teriam impacto significativo nas perdas por PCR, aumentando a chance de doações efetivas e a oferta de órgãos para transplante.

Por conta disso, para a análise do impacto da nova resolução, o tempo de duração da confirmação do diagnóstico de ME foi um dos indicadores mais importantes do estudo, que confirmou a hipótese inicial. A redução de mais de 1 hora na mediana do tempo de confirmação da ME entre os dois períodos, com significância estatística, indicou que os novos procedimentos definidos pela resolução 2.173/2017 podem ter sido o fator que favoreceu o desempenho das equipes de saúde no diagnóstico da ME entre potenciais doadores. É importante ressaltar que, durante a coleta de dados, foi notada grande variação no tempo de duração dos procedimentos de confirmação da ME, sendo o menor de 1 hora e o mais longo com duração de 227 horas. Essa distribuição produziu desvio-padrão logicamente improvável, quando da utilização da média dos tempos de protocolo (desvio-padrão > valor da média), o que fez os pesquisadores optarem pelo uso da mediana dos tempos de protocolo, reduzindo o efeito dos valores aberrantes no conjunto dos dados pesquisados. Um aspecto que pode ser considerado para explicar a distribuição extremamente ampla da duração dos procedimentos de confirmação da ME pode estar associado à disponibilidade dos equipamentos necessários para a realização da prova gráfica obrigatória na confirmação da ME, visto que existem diferentes possibilidades para tal: arteriografia, Doppler transcraniano, cintilografia cerebral e eletroencefalograma - cada uma com suas particularidades, cuja distribuição é heterogênea no estado, com prejuízo das regiões mais distantes do litoral, que é o caso da macrorregião do Grande Oeste. Segundo Westphal et al.,(1111 Westphal GA, Slaviero TA, Montemezzo A, Lingiardi GT, de Souza FC, Carmin TC, et al. The effect of brain death protocol duration on potential donor losses due to cardiac arrest. Clin Transplant. 2016;30(11):1411-6.) a prova gráfica pode ser responsável por um alongamento considerável do protocolo. Os autores apontam ainda que o Doppler é a modalidade mais usada nos protocolos com menor duração. Esse aspecto, não avaliado neste estudo, pode ter contribuído para a produção dessa grande diferença entre os tempos de duração dos procedimentos estudados.

Outra possibilidade aventada para explicar os procedimentos com tempo de duração excessivamente dilatados foi a inclusão, nas estatísticas, da produção dos hospitais que passaram a notificar a ME apenas após a vigência da nova resolução. Essa possibilidade foi, de alguma forma, reforçada pela diferença na distribuição dos hospitais segundo seu porte, definido pela Política Hospitalar Catarinense.(1010 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Política Hospitalar Catarinense; 2019. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://www.saude.sc.gov.br/index.php/informacoes-gerais-documentos/politica-hospitalar-catarinense
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) Nesse sentido, foi notável a diminuição de notificações de ME abertas nos hospitais de porte IV, e houve aumento importante nos de porte V e aqueles não classificados pelo documento. Não se pode desconsiderar a possibilidade de que o aumento do número de notificações em hospitais não classificados na política hospitalar catarinense, a par de ser resultado das estratégias de ampliação dos estabelecimentos notificantes de ME, também incorpore os resultados do processo de confirmação da ME por equipes ainda inexperientes ou em estabelecimentos com menor acesso a recursos para a confirmação da prova gráfica.(33 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2016. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/53-estatisticas-2016
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,44 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2018. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/186-estatistica-2018
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,1212 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2017. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2020 Abr 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/65-estatisticas-2017
http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/in...
,1313 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2019. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2020 Abr 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/189-estatisticas-2019
http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/in...
)

Levando em conta que o desvio-padrão alargado identificado no tempo de duração do protocolo do segundo período poderia ter sido produzido por esses novos hospitais notificantes incorporados após a vigência da nova norma (n = 5), a análise foi refeita com a exclusão dos mesmos, de modo a diminuir possível viés produzido pelo desempenho diferenciado em razão da curva de aprendizado das equipes desses hospitais. Os resultados não evidenciaram diferenças significativas em relação ao já apresentado, indicando que a pequena produção desses novos hospitais notificantes (apenas dez procedimentos de confirmação de ME após 2017) não foi impactante para os resultados da primeira análise. Dessa forma, optou-se por apresentar apenas os resultados dos dois períodos sem qualquer tratamento em relação à produção dos hospitais notificantes.

Um aspecto relevante da análise dos resultados obtidos é o fato de que, a despeito da redução do tempo de confirmação da ME no período de vigência da resolução do CFM em questão, o número total de autorizações familiares não se alterou de modo significativo. Esse dado pode ser explicado pela pequena diferença no número de procedimentos de confirmação de ME finalizados nos dois períodos (651 entrevistas familiares realizadas no primeiro período e 656 no segundo). Nesse sentido, é necessário destacar que a autorização ou a recusa familiar para a doação de órgãos é um evento de determinação multicausal, não podendo ser atribuída somente ao tempo de duração do protocolo.(1414 Pessoa JL, Schirmer J, Roza BA. Avaliação das causas de recusa familiar a doação de órgãos e tecidos. Acta Paul Enferm. 2013;26(4):323-30.

15 Lira GG, Pontes CM, Schirmer J, Lima LS. Ponderações de familiares sobre a decisão de recusar a doação de órgãos. Acta Paul Enferm. 2012;25(N Esp 2):140-5.
-1616 Vincent A, Logan L. Consent for organ donation. Br J Anaesth. 2012;108 Suppl 1:i80-7.) Segundo Pessoa et al.,(1414 Pessoa JL, Schirmer J, Roza BA. Avaliação das causas de recusa familiar a doação de órgãos e tecidos. Acta Paul Enferm. 2013;26(4):323-30.) a demora no diagnóstico correspondeu apenas a 10% dos motivos de recusa, e o aspecto mais relevante, constatado em 21% dos casos estudados, foi a não compreensão da ME pela família, seguida de fatores religiosos e da falta de competência técnica da equipe. De certa forma, os resultados obtidos neste estudo de Santa Catarina corroboraram a perspectiva de que não é possível estabelecer uma correlação firme entre o tempo de duração dos procedimentos de confirmação de ME e a proporção das autorizações/recusas familiares para a doação. A análise feita por Lira et al.(1515 Lira GG, Pontes CM, Schirmer J, Lima LS. Ponderações de familiares sobre a decisão de recusar a doação de órgãos. Acta Paul Enferm. 2012;25(N Esp 2):140-5.) obteve resultados semelhantes, com destaque para a importância do acolhimento da família por parte da equipe durante o processo de internação e para a abordagem no momento da comunicação do óbito.

Adicionalmente, é necessário levar em consideração que o processamento da morte do potencial doador pela família é tempo-dependente, e nem sempre um diagnóstico rápido resulta em maior autorização familiar.(1616 Vincent A, Logan L. Consent for organ donation. Br J Anaesth. 2012;108 Suppl 1:i80-7.)

Uma das hipóteses deste estudo era a de que a eventual redução do tempo de duração dos procedimentos de confirmação da ME produziria impacto relevante na redução da perda de possíveis doadores por PCR. Segundo o estudo de Pimenta et al.(88 Pimenta FP, Amorim BR, Silva L. Morte encefálica: diagnóstico possível sem utilização de exames complementares. Arq Bras Neurocir. 2012;31(1):22-7.) realizado em dois hospitais no município de Goiânia (GO) em 2011, sob a vigência da antiga resolução, até 14% dos pacientes evoluíram com PCR entre o primeiro e segundo exames clínicos, e em 16% isso ocorreu no período de espera para a realização de exame complementar. Considerando que o tempo mínimo de intervalo entre os exames clínicos, que era de 6 horas e, com a resolução CFM 2.173/2017,(55 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução nº 2.173, de 23 de novembro de 2017. Define os critérios do diagnóstico de morte encefálica. Diário Oficial da União, 15/12/2017, Seção 1, p. 50-275. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://saude.rs.gov.br/upload/arquivos/carga20171205/19140504-resolucao-do-conselho-federal-de-medicina-2173-2017.pdf
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) passou a 1 hora, permitindo ainda que o exame complementar seja realizado dentro desse intervalo, era de se esperar a redução do número de perdas por PCR. Apesar da redução observada, de 77 para 59 perdas por PCR (redução de 23,37%), não foi encontrada significância estatística nesta análise. Além disso, deve-se também considerar que, segundo Westphal et al.,(1717 Westphal GA, Caldeira Filho M, Vieira KD, Zaclikevis VR, Bartz MC, Wanzuita R, et al. Diretrizes para manutenção de múltiplos órgãos no potencial doador adulto falecido. Parte II. Ventilação mecânica, controle endócrino metabólico e aspectos hematológicos e infecciosos. Rev Bras Ter Intensiva. 2011;23(3):269-82.) o cuidado e a manutenção do potencial doador no período inicial da ME, chamado pelo autor de “tempestade simpática”, têm impacto relevante na estabilização hemodinâmica do potencial doador e na preservação da qualidade dos órgãos que podem ser doados, com perda de até 20% dos potenciais doadores nesse período, reforçando a ideia de que o tempo de duração do diagnóstico de ME não é o único fator responsável pelas taxas de PCR.(1818 Martin Loeches I, Sandiumenge A, Charpentier J, Kellum JA, Gaffney AM, Procaccio F, et al. Management of donation after brain death (DBD) in the ICU: the potential donor is identified, what's next? Intensive Care Med. 2019;45(3):322-30.,1919 Salim A, Velmahos GC, Brown C, Belzberg H, Demetriades D. Aggressive organ donor management significantly increases the number of organs available for transplantation. J Trauma. 2005;58(5):991-4.) Em outro estudo, o mesmo autor registrou prevalência menor de perda de potenciais doadores por PCR entre 12 a 30 horas desde o início dos procedimentos de confirmação da ME, com aumento desse valor antes ou após esse intervalo.(1111 Westphal GA, Slaviero TA, Montemezzo A, Lingiardi GT, de Souza FC, Carmin TC, et al. The effect of brain death protocol duration on potential donor losses due to cardiac arrest. Clin Transplant. 2016;30(11):1411-6.)

A taxa de PCR tem se reduzido nos últimos anos, acompanhando a maior estruturação do sistema de transplantes em Santa Catarina e no país. Em 2014, 13% das notificações ME evoluíam para PCR.(2020 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2014. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2020 Abr 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/51-estatisticas-2014
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) Em 2017, essa proporção caiu para 8%,(1212 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2017. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2020 Abr 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/65-estatisticas-2017
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) e, segundo o último relatório da CET, em 2019, a proporção de perdas por essa causa foi de 6,1%.(1313 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2019. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2020 Abr 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/189-estatisticas-2019
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) O mesmo é evidenciado no contexto nacional, com aumento das doações efetivas e redução do número de PCR.(2121 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2012-2019). ABTO RBT. 2019;25(4). [citado 2020 Abr 16]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2019/RBT-2019-leitura.pdf
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) Esses resultados sugerem que a proporção de PCR vem tendo tendência de redução ao longo do tempo, não estando necessariamente associada com a redução do tempo de duração dos procedimentos de confirmação da ME.

Em relação à análise do desempenho do sistema em relação ao número de órgãos captados, foi evidenciada redução estatisticamente significativa na captação de fígados, ao contrário do que ocorreu no país no mesmo período.(2121 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2012-2019). ABTO RBT. 2019;25(4). [citado 2020 Abr 16]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2019/RBT-2019-leitura.pdf
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)

Em contrapartida, houve aumento significativo do número de pâncreas transplantados no segundo período estudado. Esse achado se alinha com os resultados do resto do país, que também apresentaram tendência de crescimento desde 2017.(2121 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2012-2019). ABTO RBT. 2019;25(4). [citado 2020 Abr 16]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2019/RBT-2019-leitura.pdf
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) Uma possível explicação para esses resultados pode ser o fato de que o tempo máximo de isquemia desse órgão, que corresponde a 12 horas,(2222 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Diretrizes básicas para captação e retirada de múltiplos órgãos e tecidos da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. São Paulo: ABTO; 2009. [citado 2020 Abr 16]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/pdf/livro.pdf) o tornar mais sensível ao tempo de duração dos protocolos de ME. Como hipótese, a redução da mediana do tempo de confirmação da ME, já apresentada, pode ter permitido maior aproveitamento do órgão.

Quando analisado o desempenho das macrorregiões em relação aos indicadores do sistema estadual de transplantes nos dois períodos estudados, houve certa discrepância entre as macrorregiões, mas o Vale do Itajaí se destacou tanto pela baixa taxa de PCR, quanto pela significância estatística, quando comparados os dois períodos. A macrorregião do Grande Oeste, por outro lado, apresentou taxa de PCR quase dez vezes maior que a do Vale do Itajaí, com o agravante de ter uma taxa de doação muito inferior a deste. Esse dado evidencia a heterogeneidade encontrada nos resultados das macrorregiões e sua relação com as estruturas e recursos disponíveis para a manutenção do potencial doador, que resultaram em taxas de PCR tão díspares.(1818 Martin Loeches I, Sandiumenge A, Charpentier J, Kellum JA, Gaffney AM, Procaccio F, et al. Management of donation after brain death (DBD) in the ICU: the potential donor is identified, what's next? Intensive Care Med. 2019;45(3):322-30.,1919 Salim A, Velmahos GC, Brown C, Belzberg H, Demetriades D. Aggressive organ donor management significantly increases the number of organs available for transplantation. J Trauma. 2005;58(5):991-4.)

Nesse sentido, é importante destacar o desempenho observado dos hospitais de grande porte da Macrorregião do Vale do Itajaí - o Hospital Santa Isabel, de Blumenau, e o Hospital Regional do Alto Vale, em Rio do Sul -, que apresentaram crescimento no número de notificações e doações no período estudado, associado à redução do número de PCR. Apenas como exemplo, o hospital de Blumenau, em 2017, mesmo sendo um dos hospitais que mais notificou no estado, não registrou nenhuma perda por PCR, o que pode explicar os resultados estatisticamente significantes obtidos pela macrorregião.(33 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2016. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/53-estatisticas-2016
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,44 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2018. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2019 Mar 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/186-estatistica-2018
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,1212 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2017. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2020 Abr 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/65-estatisticas-2017
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,1313 Santa Catarina (Estado). Secretaria de Estado da Saúde. Central Estadual de Transplantes de Santa Catarina. Estatísticas 2019. Dados de doação e transplantes em Santa Catarina. [citado 2020 Abr 15]. Disponível em: http://sctransplantes.saude.sc.gov.br/index.php/estatisticas/file/189-estatisticas-2019
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)

A análise dos resultados obtidos nesta pesquisa indicou que, no período de vigência da resolução 2.173/2017 do CFM, houve redução significativa da mediana do tempo de conclusão dos procedimentos de confirmação da ME, o que pode ter contribuído para a melhoria do desempenho do estado de Santa Catarina nos últimos 2 anos. Somado a isso, a definição mais clara dos pré-requisitos que permitiram a abertura dos procedimentos de confirmação da ME, além dos critérios para capacitação dos médicos responsáveis pelo diagnóstico, é determinação da resolução 2.173/2017 do CFM e pode ter contribuição importante na segurança do processo, sendo isso uma das motivações da atualização dos procedimentos estudados.(55 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução nº 2.173, de 23 de novembro de 2017. Define os critérios do diagnóstico de morte encefálica. Diário Oficial da União, 15/12/2017, Seção 1, p. 50-275. [citado 2019 Mar 10]. Disponível em: https://saude.rs.gov.br/upload/arquivos/carga20171205/19140504-resolucao-do-conselho-federal-de-medicina-2173-2017.pdf
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) No entanto, apesar da redução do tempo de duração dos procedimentos de confirmação de ME, os outros indicadores estudados revelaram pouca diferença em relação ao período anterior, expondo o caráter multifatorial do desempenho do processo de diagnóstico, doação, captação e transplante de órgãos.

CONCLUSÃO

Os novos procedimentos de confirmação da morte encefálica definidos pela resolução 2.173/2017 do Conselho Federal de Medicina trouxeram importantes acréscimos ao diagnóstico de morte encefálica, com impacto relativamente positivo em Santa Catarina, no que diz respeito à redução do tempo de confirmação do diagnóstico. No entanto, indicadores como a taxa de parada cardiorrespiratória, o número de autorizações familiares e as diferenças de doação entre as macrorregiões não se alteraram significativamente com as novas definições normativas, evidenciando a natureza multidimensional do processo de doação, captação e transplante no estado e a necessidade de novos estudos que possam investigar tal processo, com abordagens mais adequadas aos seus objetivos.

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Editado por

Editor responsável: Viviane Cordeiro Veiga

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2021

Histórico

  • Recebido
    10 Jul 2020
  • Aceito
    12 Set 2020
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