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Para: Fatores na admissão à unidade de terapia intensiva associados à readmissão em pacientes onco-hematológicos graves: estudo retrospectivo de coorte

Ao editor,

Lemos com grande interesse o artigo de Rodrigues et al., publicado no mais recente número da Revista Brasileira de Terapia Intensiva.(11 Rodrigues CM, Pires EM, Feliciano JP, Vieira Jr JM, Taniguchi LU. Admission factors associated with intensive care unit readmission in critically ill oncohematological patients: a retrospective cohort study. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(1):33-9.) Neste estudo observacional retrospectivo de coorte realizado em um único centro, Rodrigues et al. tiveram como alvo identificar fatores de risco associados com readmissão à unidade de terapia intensiva (UTI) em pacientes onco-hematológicos graves, por meio da avaliação de suas primeiras admissões à UTI. Os autores identificaram sexo, cirurgia de emergência como razão para a admissão, tempo maior de permanência no hospital antes da transferência à UTI e ventilação mecânica (VM) como fatores independentes de risco para readmissões à UTI. A hipótese deste artigo foi interessante, já que os autores avaliaram um grupo específico de pacientes definidos como "onco-hematológicos", que vem sendo acompanhados em um crescente número de unidades de terapia intensiva e que apresentam características diferentes dos pacientes da usual população das UTI clínicas e cirúrgicas. No entanto, ao avaliar apenas os fatores de admissão à primeira permanência na UTI, Rodrigues et al. limitaram seus resultados a uma estreita janela. Deixaram de lado outros fatores de risco mais importantes, alguns dos quais já mencionados na seção de discussão.

Para avaliar as readmissões à UTI em um grupo específico de pacientes, é importante categorizar os possíveis fatores de risco em três grupos, como mencionado por Gajic et al.(22 Gajic O, Malinchoc M, Comfere TB, Harris MR, Achouiti A, Yilmaz M, et al. The Stability and Workload Index for Transfer score predicts unplanned intensive care unit readmission: initial development and validation. Crit Care Med. 2008;36(3):676-82.) Esses grupos são: (1) características da primeira admissão à UTI; (2) características fisiológicas, anormalidades laboratoriais e gravidade da doença quando da alta da UTI; (3) condição funcional e necessidade de intervenções da enfermagem por ocasião da alta da UTI.

Assim, primeiramente, segundo essa categorização, Rodrigues et al.(11 Rodrigues CM, Pires EM, Feliciano JP, Vieira Jr JM, Taniguchi LU. Admission factors associated with intensive care unit readmission in critically ill oncohematological patients: a retrospective cohort study. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(1):33-9.) deveriam ter também apresentado as características da primeira admissão à UTI de seu grupo de pacientes. Os autores identificaram a duração da permanência no hospital antes da admissão à UTI como um fator independente de predição de readmissão, porém não levaram em consideração a duração da permanência na UTI e nem a duração da VM durante a primeira admissão. Os autores também não fizeram menção ao tipo de VM, isto é, se foi aplicada VM invasiva (VMI) ou não invasiva. Também poderiam ter salientado o desenvolvimento de pneumonia associada ao ventilador durante a primeira estada na UTI. Em pacientes onco-hematológicos, a condição de imunossupressão e infecções associadas à supressão da imunidade também têm grande importância, como infecções por citomegalovírus, pneumonia por Pneumocystis carinii, infecções por Aspergillus ou candidíase invasiva. São quadros de difícil erradicação, e infecções não adequadamente erradicadas podem provocar readmissões neste grupo específico de pacientes.

Em segundo lugar, as características fisiológicas, anormalidades laboratoriais e gravidade da doença por ocasião da alta da UTI não foram avaliadas por Rodrigues et al. como fatores de risco de readmissão.(11 Rodrigues CM, Pires EM, Feliciano JP, Vieira Jr JM, Taniguchi LU. Admission factors associated with intensive care unit readmission in critically ill oncohematological patients: a retrospective cohort study. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(1):33-9.) As condições de alta nestes pacientes são mais importantes para avaliação das readmissões; fatores como condição hemodinâmica na alta, parâmetros laboratoriais e análise de gases arteriais, escores Simplified Acute Physiology Score (SAPS II) ou Acute Physiology and Chronic Health disease Classification System II (APACHE II) por ocasião da alta, condição de disfunção de órgãos por ocasião da alta (condições hepáticas, renais e neurológicas), e condições referentes a infecção e supressão imune na alta.(22 Gajic O, Malinchoc M, Comfere TB, Harris MR, Achouiti A, Yilmaz M, et al. The Stability and Workload Index for Transfer score predicts unplanned intensive care unit readmission: initial development and validation. Crit Care Med. 2008;36(3):676-82.

3 Kareliusson F, De Geer L, Tibblin AO. Risk prediction of ICU readmission in a mixed surgical and medical population. J Intensive Care. 2015;3(1):30.

4 Frost SA, Alexandrou E, Bogdanovski T, Salamonson Y, Davidson PM, Parr MJ, et al. Severity of illness and risk of readmission to intensive care: a meta-analysis. Resuscitation. 2009;80(5):505-10.
-55 Wong EG, Parker AM, Leung DG, Brigham EP, Arbaje AI. Association of severity of illness and intensive care unit readmission: A systematic review. Heart Lung. 2016;45(1):3-9.e2.) O escore Stability and Workload Index for Transfer (SWIFT), como mencionado por Rodrigues et al. em sua discussão, seria mais apropriado para este estudo para avaliar as readmissões.(22 Gajic O, Malinchoc M, Comfere TB, Harris MR, Achouiti A, Yilmaz M, et al. The Stability and Workload Index for Transfer score predicts unplanned intensive care unit readmission: initial development and validation. Crit Care Med. 2008;36(3):676-82.,33 Kareliusson F, De Geer L, Tibblin AO. Risk prediction of ICU readmission in a mixed surgical and medical population. J Intensive Care. 2015;3(1):30.) Sua razão para não utilizar este escore foi a não realização de uma análise de gases arteriais de forma rotineira na alta. Porém, cremos que, na maior parte das UTI, os pacientes, em geral, recebem alta após uma avaliação de seus gases arteriais. Eles poderiam também considerar os resultados da última análise de gases arteriais imediatamente antes da alta. Além do escore SWIFT, seria melhor terem incluído neste estudo escores como Modified Early Warning Score (MEWS), Modified SWIFT com inclusão da função renal e escore SOFA por ocasião da alta com avaliação da disfunção de órgãos.(33 Kareliusson F, De Geer L, Tibblin AO. Risk prediction of ICU readmission in a mixed surgical and medical population. J Intensive Care. 2015;3(1):30.)

Embora Rodrigues et al. tenham mencionado, em sua discussão, que os pacientes onco-hematológicos são mais suscetíveis a complicações pós-UTI que demandam readmissões como o tratamento de questões relacionadas à imunossupressão, desnutrição associada ao câncer, procedimentos invasivos, cirurgias recorrentes e aumento da tendência trombótica, os autores não incluíram esses importantes parâmetros nas análises uni e multivariada.(11 Rodrigues CM, Pires EM, Feliciano JP, Vieira Jr JM, Taniguchi LU. Admission factors associated with intensive care unit readmission in critically ill oncohematological patients: a retrospective cohort study. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(1):33-9.) Cremos que estes parâmetros refletiriam fatores de risco para readmissão de pacientes onco-hematológicos de forma mais efetiva do que os demais parâmetros incluídos neste estudo.

Em terceiro lugar, é importante avaliar a condição funcional e a necessidade de intervenções da enfermagem por ocasião da alta da UTI. A condição fragilizada na alta (restrição ao leito ou paciente capaz de movimentação); o local de encaminhamento após a alta (enfermaria, semi-UTI ou unidade de cuidados paliativos), a condição de alta do paciente (presença de traqueostomia, ventilação domiciliar invasiva ou não invasiva, tipo de ventilador ou concentrador de oxigênio) também deveriam ser avaliados como fatores de risco para readmissão à UTI.

Assim, em vez de apenas as características da primeira admissão, todos os possíveis fatores de risco para readmissão à UTI de pacientes onco-hematológicos devem ser investigados em novos e mais abrangentes estudos.

Müge Aydoğdu

Department of Pulmonary Diseases, Faculty of Medicine, Gazi University - Ancara, Turquia.

Antonio M. Esquinas

Unidade de Terapia Intensiva, Hospital Morales Meseguer - Murcia, Espanha.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Rodrigues CM, Pires EM, Feliciano JP, Vieira Jr JM, Taniguchi LU. Admission factors associated with intensive care unit readmission in critically ill oncohematological patients: a retrospective cohort study. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(1):33-9.
  • 2
    Gajic O, Malinchoc M, Comfere TB, Harris MR, Achouiti A, Yilmaz M, et al. The Stability and Workload Index for Transfer score predicts unplanned intensive care unit readmission: initial development and validation. Crit Care Med. 2008;36(3):676-82.
  • 3
    Kareliusson F, De Geer L, Tibblin AO. Risk prediction of ICU readmission in a mixed surgical and medical population. J Intensive Care. 2015;3(1):30.
  • 4
    Frost SA, Alexandrou E, Bogdanovski T, Salamonson Y, Davidson PM, Parr MJ, et al. Severity of illness and risk of readmission to intensive care: a meta-analysis. Resuscitation. 2009;80(5):505-10.
  • 5
    Wong EG, Parker AM, Leung DG, Brigham EP, Arbaje AI. Association of severity of illness and intensive care unit readmission: A systematic review. Heart Lung. 2016;45(1):3-9.e2.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2016
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