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Atelectasia e alterações pulmonares em recém-nascidos prematuros no período neonatal: laudo radiológico cego e achados clínicos

RESUMO

Objetivo:

Verificar a ocorrência e as características de atelectasias, opacidades, hipotransparências e infiltrados pulmonares evidenciados ao raio X de tórax dos recém-nascidos prematuros, de uma unidade de terapia intensiva neonatal.

Métodos:

Trata-se de estudo observacional transversal. No período de agosto a dezembro de 2017 foram analisadas todas as radiografias de tórax de recém-nascidos. Foram incluídas no estudo as radiografias de tórax de recém-nascidos prematuros com idade gestacional até 36 semanas, no período neonatal que apresentassem alterações evidentes na imagem ou suspeita de alterações, que fossem confirmadas após laudo do médico radiologista. As alterações radiológicas foram associadas com possíveis fatores predisponentes.

Resultados:

No período, foram realizadas 450 radiografias nos recém-nascidos prematuros, sendo que, em 37, foram descritas quatro alterações: 12 (2,66%) descritas como opacidades, 11 (2,44%) como atelectasias, 10 (2,22%) como infiltrados pulmonares e 4 (0,88%) como hipotransparências. Observou-se maior ocorrência das atelectasias no pulmão direito (81,8%). Dentre as radiografias com alterações, 25 (67,6%) recém-nascidos estavam sob o uso da ventilação mecânica invasiva.

Conclusão:

Considerando o laudo radiológico, as alterações observadas têm ocorrências sem diferença estatisticamente significante. A atelectasia não foi a alteração mais encontrada. Os fatores que podem ter predisposto ao aparecimento das alterações foram a prematuridade extrema, o baixo peso, o sexo masculino, o mal posicionamento da cânula endotraqueal e o uso de ventilação mecânica invasiva.

Descritores:
Recém-nascido prematuro; Tórax/diagnóstico por imagem; Atelectasia pulmonar; Diagnóstico por imagem; Nascimento prematuro; Unidades de terapia intensiva neonatal

ABSTRACT

Objective:

To determine the occurrence and characteristics of atelectasis, opacities, hypolucency and pulmonary infiltrates observed on chest X-rays of preterm infants in a neonatal intensive care unit.

Methods:

This was a cross-sectional observational study. From August to December 2017, all chest radiographs of newborn infants were analyzed. The study included the chest radiographs of preterm neonates with gestational ages up to 36 weeks in the neonatal period that showed clear changes or suspected changes, which were confirmed after a radiologist’s report. Radiological changes were associated with possible predisposing factors.

Results:

During the study period, 450 radiographs were performed on preterm neonates, and 37 lung changes were identified and classified into 4 types: 12 (2.66%) changes were described as opacities, 11 (2.44%) were described as atelectasis, 10 (2.22%) were described as pulmonary infiltrate, and 4 (0.88%) were described as hypolucency. A higher occurrence of atelectasis was noted in the right lung (81.8%). Among the abnormal radiographs, 25 (67.6%) newborn infants were receiving invasive mechanical ventilation.

Conclusion:

Considering the radiological report, no significance was found for the observed changes. Atelectasis was not the most frequently observed change. The predisposing factors for these changes were extreme prematurity, low weight, male sex, a poorly positioned endotracheal tube and the use of invasive mechanical ventilation.

Keywords:
Infant, premature; Thorax/diagnostic imaging; Pulmonary atelectasis; Diagnostic imaging; Premature birth; Intensive care units, neonatal

INTRODUÇÃO

A atelectasia é uma alteração que ocorre a partir do colapso de unidades alveolares do pulmão. Uma das principais características é a redução do volume pulmonar, que desequilibra a relação entre ventilação e perfusão, e provoca o shunt pulmonar.(11 Johnston C, Carvalho WB. Atelectasias em pediatria: mecanismos, diagnóstico e tratamento. Rev Assoc Med Bras. 2008;54(5):455-60.)

Os recém-nascidos prematuros apresentam características fisiológicas e anatômicas diferentes em relação ao pulmão de um adulto, que predispõe à formação de atelectasias. Devido à imaturidade pulmonar, o número dos alvéolos é reduzido, com baixa síntese de surfactante e ausência ou subdesenvolvimento de ventilação colateral, propiciando complacência pulmonar diminuída. Em contrapartida, a caixa torácica, pela estrutura cartilaginosa, apresenta complacência aumentada.(11 Johnston C, Carvalho WB. Atelectasias em pediatria: mecanismos, diagnóstico e tratamento. Rev Assoc Med Bras. 2008;54(5):455-60.

2 Peroni DG, Boner AL. Atelectasis: mechanisms, diagnosis and management. Paediatr Respir Rev. 2000;1(3):274-8.
-33 Tauil KA. Comportamento das propriedades mecânicas do sistema respiratório em neonatos, lactentes e crianças saudáveis. Pediatr Mod. 2013;49(2).)

Os principais fatores que cursam com atelectasia no período neonatal em recém-nascidos prematuros são uso da ventilação mecânica, mal posicionamento da cânula endotraqueal (CET), tampões de muco, extubação eletiva ou acidental e doenças como pneumonia bacteriana, displasia broncopulmonar, derrame pleural, síndrome do desconforto respiratório, síndrome de aspiração do mecônio, refluxo gastresofágico e pneumotórax.(44 Alvares BR, Pereira IM, Mezzacappa MA, Stopiglia MS, Pires CS. Pulmonary atelectasis in newborn infants: etiology and radiological aspects. Sci Med (Porto Alegre). 2012;22(1):43-52.)

Classicamente, a atelectasia é visualizada na radiografia de tórax com aumento na densidade e diminuição do volume, associados a diminuição dos espaços intercostais, desvio de estruturas mediastinais, como traqueia e coração, elevação do diafragma homolateral e hiperinsuflação do pulmão contralateral.(55 Sarmento GJ, Peixe AA, Carvalho FA. Fisioterapia respiratória em pediatria e neonatologia. 2a ed. São Paulo: Manole; 2011.) No entanto, problemas técnicos, como hipopenetração do feixe de raio X e centralização inadequada, prejudicam a qualidade do exame, podendo resultar em imagens de aspecto inespecífico, descritos como hipotransparência ou opacidade.(66 Álvares BR, Pereira IC, Araújo Neto AS, Sakuma ET. Achados normais no exame radiológico de tórax do recém-nascido. Radiol Bras. 2006;39(6):435-40.,77 Dominguez MC, Alvares BR. Atelectasia pulmonar em recém-nascidos com doenças clinicamente tratáveis submetidos a ventilação mecânica: aspectos clínicos e radiológicos. Radiol Bras. 2018;51(1):20-5.)

Outra descrição radiológica frequentemente encontrada nos exames dos recém-nascidos prematuros é a hipotransparência, que pode sugerir edema pulmonar, hemorragia, atelectasia ou consolidações. As opacidades podem ocorrer devido a um colapso pulmonar ou derrame pleural, e aos infiltrados pulmonares, pelo acúmulo de líquido no espaço intersticial, por conta de algum processo inflamatório.(66 Álvares BR, Pereira IC, Araújo Neto AS, Sakuma ET. Achados normais no exame radiológico de tórax do recém-nascido. Radiol Bras. 2006;39(6):435-40.,88 Pryor JA, Webber BA, editores. Fisioterapia para problemas respiratórios e cardíacos. 2a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002.) No entanto, para um diagnóstico preciso, essas alterações radiológicas devem estar associadas a outros sinais clássicos da doença.(44 Alvares BR, Pereira IM, Mezzacappa MA, Stopiglia MS, Pires CS. Pulmonary atelectasis in newborn infants: etiology and radiological aspects. Sci Med (Porto Alegre). 2012;22(1):43-52.)

Aspectos radiológicos específicos podem aparecer no exame radiológico de tórax, podendo acometer um lobo, segmento ou todo o pulmão.(99 Oliva Hernández C, Lopez de Vergara RG, Galván Fernández C, Marrero Pérez CL. Atelectasia. Bronquiectasias [Internet]. Madrid: Asociación Española de Pediatría; 2008. [cited 2019 Jun 7]. Available from: http://www.aeped.es/sites/default/files/documentos/1_4.pdf
http://www.aeped.es/sites/default/files/...
) A radiografia de tórax é um dos exames mais utilizados para mostrar sinais clássicos de atelectasia, opacidades, hipotransparências e infiltrados pulmonares. O raio X de tórax é importante ferramenta no suporte diagnóstico e na evolução clínica do paciente internado na unidade de terapia intensiva (UTI).(11 Johnston C, Carvalho WB. Atelectasias em pediatria: mecanismos, diagnóstico e tratamento. Rev Assoc Med Bras. 2008;54(5):455-60.)

Para o fisioterapeuta que atua nessa área, são de suma importância o conhecimento e a associação dos achados radiológicos específicos de cada alteração, pois eles nortearão a conduta mais adequada para o paciente. Em razão disso, este estudo teve como objetivo verificar a ocorrência e as características das atelectasias, das opacidades, das hipotransparências e dos infiltrados pulmonares dos recém-nascidos pré-termo (RNPT), além de verificar sua localização e os possíveis fatores associados.

MÉTODOS

Trata-se de estudo observacional transversal prospectivo, realizado em uma UTI neonatal de hospital público universitário, no período de agosto a dezembro de 2017. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da própria instituição, conforme parecer 2.192.954.

As radiografias de tórax seguiram a rotina de solicitação por indicação médica nos recém-nascidos prematuros internados, que apresentavam suspeita de alterações pulmonares. A coleta dos dados foi realizada diariamente. Foram selecionados os casos que atendessem os critérios de inclusão: radiografias de tórax de recém-nascidos prematuros com idade gestacional (IG) de até 36 semanas + 6 dias de pacientes internados na UTI neonatal no período neonatal. Foram considerados novos casos de alterações quando a resolubilidade da alteração anterior fosse mostrada em pelo menos um exame de imagem normal entre elas. Os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foram assinados pelos pais. Os critérios de exclusão foram radiografias sem enquadramento adequado ou sem alterações radiológicas.

As radiografias de tórax que apresentaram alguma alteração (Figura 1) foram selecionadas e encaminhadas para a avaliação de um médico radiologista, que realizou a análise e o laudo de modo simples cego, sem acesso às informações clínicas do paciente, afim de evitar viés de inspeção, para assegurar apenas a contribuição diagnóstica do exame de imagem avaliado.(1010 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Ciência e Tecnologia. Diretrizes metodológicas: Elaboração de revisão sistemática e metanálise de estudos de acurácia diagnóstica [Internet]. Brasília; Ministério da Saúde; 2014. [citado 2018 Set 28]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_metodologicas_estudos_acuracia_diagnostica.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
) Em seguida, foram coletados os dados do prontuário médico, como sexo, IG, peso, Apgar ao 5º minuto, dias de vida, diagnóstico e uso de algum tipo de suporte ventilatório invasivo, não invasivo ou oxigenoterapia.

Figura 1
Alterações radiológicas. (A) Atelectasia em hemitórax esquerdo e ápice direito. (B) Hipotransparência difusa. (C) Opacidade no terço médio direito. (D) Infiltrado pulmonar difuso.

Os dados foram digitados em planilha do Microsoft Office Excel®, conferidos e exportados para o software de estatística Statistic Statsoft®. Posteriormente, foram analisados por estatística descritiva, com o uso de frequência absoluta e relativa, médias, valores mínimos, máximos e desvio padrão.

RESULTADOS

Entre agosto a dezembro de 2017, foram admitidos 121 recém-nascidos na UTI neonatal. Destes, 82 eram RNPT. Foram realizadas 713 radiografias de tórax na unidade durante este período, 450 eram de RNPT, conforme mostra a figura 2.

Figura 2
Fluxograma das alterações radiológicas nos recém-nascidos pré-termo.

Foram avaliadas 37 radiografias de tórax da UTI neonatal pelo médico radiologista durante o estudo. Destas, 12 (32,4%) alterações foram descritas como opacidades, 11 (29,7%) como atelectasias, 10 (27%) como infiltrados pulmonares e 4 (10,8%) como hipotransparências. A ocorrência das alterações pulmonares considerando os 450 raios X de tórax de RNPT foi de 2,66% de opacidades, 2,44% de atelectasias, 2,22% de infiltrados e 0,88% de hipotransparências em 4 meses.

As características epidemiológicas da amostra e suas variáveis clínicas estão apresentadas na tabela 1. Os diagnósticos clínicos dos recém-nascidos prematuros foram divididos em dois grupos: pulmonares e extrapulmonares. No grupo com doenças pulmonares, foram incluídos pacientes admitidos por síndrome do desconforto respiratório, e síndrome de aspiração do mecônio. No grupo com diagnóstico extrapulmonar, foram incluídos pacientes admitidos em razão de malformações e asfixia neonatal.

Tabela 1
Características epidemiológicas da amostra e suas variáveis clínicas

Nove pacientes tiveram recorrência em diferentes alterações pulmonares observadas, ou mesmo a mesma alteração em diferentes períodos, com pelo menos uma radiografia de tórax normal entre uma imagem e outra. Dois pacientes tiveram apenas uma alteração na radiografia de tórax durante o período neonatal.

O tipo de suporte ventilatório que os RNPT recebiam quando apresentaram a alteração no raio X de tórax está descrito na tabela 2. Dos 25 pacientes em ventilação mecânica invasiva (VMI), 14 (56%) estavam com a cânula endotraqueal (CET) bem posicionada. Dos 11 (44%) nos quais a CET estava mal posicionada, 2 (8%) estavam com a CET seletiva em brônquio fonte direito, 3 (12%) com a CET alta (acima de T1) e 6 (24%) com a CET baixa (próximo à carina). Em todos os exames radiológicos em que a CET estava mal posicionada, havia algum tipo de alteração pulmonar. As CET mal posicionadas foram refixadas adequadamente após o exame radiológico de tórax.

Tabela 2
Alterações radiológicas pulmonares de acordo com o suporte ventilatório

Foram observadas alterações pulmonares em dois pacientes após sofrerem extubação acidental, um com registro de opacidade e outro de atelectasia. Duas atelectasias foram evidenciadas devido ao posicionamento da CET em brônquio fonte direito.

Foram diagnosticadas nove atelectasias no pulmão direito, uma no pulmão esquerdo, e uma atelectasia bilateral - esta com colapso total do pulmão esquerdo e colapso do ápice direito. Dos quatro exames de raio X descritos como hipotransparências, dois estavam localizados do lado direito e duas acometiam ambos os pulmões. Sobre os dez casos descritos como infiltrados pulmonares, oito tiveram acometimento bilateral, um acometeu terço médio direito e um em base esquerda. Sobre os 12 casos descritos como opacidades, 7 foram do lado direito e 5 bilaterais. Quanto ao lado mais acometido pelas outras alterações pulmonares, 19 (51,3%) estavam localizadas em algum lobo do pulmão direito, 2 (5,5%) acometiam algum segmento do pulmão esquerdo, e 16 (43,2%) apresentavam alteração em algum segmento do lado direito e esquerdo (Tabela 3).

Tabela 3
Localização das alterações pulmonares na radiografia de tórax

DISCUSSÃO

Frequentemente, em RNPT, a imaturidade estrutural pulmonar, associada à deficiência de surfactante pulmonar, predispõe o comprometimento da função respiratória com manifestações variáveis, como as alterações pulmonares.(1111 Barbosa AR. Consequências da prematuridade no sistema respiratório [dissertação]. Portugal: Faculdade de Medicina, Universidade de Coimbra; 2015.) No entanto, existem fatores associados que podem contribuir para o desenvolvimento dessas alterações, como o uso da VMI, o mal posicionamento da CET, a fraqueza da musculatura abdominal, a extubação acidental e as complicações pulmonares durante a internação.(44 Alvares BR, Pereira IM, Mezzacappa MA, Stopiglia MS, Pires CS. Pulmonary atelectasis in newborn infants: etiology and radiological aspects. Sci Med (Porto Alegre). 2012;22(1):43-52.,77 Dominguez MC, Alvares BR. Atelectasia pulmonar em recém-nascidos com doenças clinicamente tratáveis submetidos a ventilação mecânica: aspectos clínicos e radiológicos. Radiol Bras. 2018;51(1):20-5.)

Neste estudo, dos 37 recém-nascidos prematuros que apresentaram alguma alteração pulmonar no período neonatal, 22 (59,4%) eram prematuros extremos, com IG menor que 28 semanas, o que corrobora com o estudo de Oliveira et al.,(1212 Oliveira CS, Casagrande GA, Grecco LC, Golin MO. Perfil de recém-nascidos pré-termo internados na unidade de terapia intensiva de hospital de alta complexidade. ABCS Health Sci. 2015;40(1):28-32.) que verificou a associação da IG com doenças respiratórias e constatou que 50% das crianças prematuras extremas evoluíram com complicações do trato respiratório.

A literatura descreve que o baixo peso ao nascimento e a IG são considerados fatores determinantes na evolução do recém-nascido.(1212 Oliveira CS, Casagrande GA, Grecco LC, Golin MO. Perfil de recém-nascidos pré-termo internados na unidade de terapia intensiva de hospital de alta complexidade. ABCS Health Sci. 2015;40(1):28-32.) Esse resultado assemelha ao desta casuística, pois a maioria (75,6%) dos recém-nascidos prematuros apresentava peso inferior a 1.500g.

Outro fator que pode ter contruibuído para o aparecimento das alterações pulmonares foi o uso da VMI, pois 67,6% dos RNPT com alterações pulmonares na radiografia de tórax estavam sob uso de VMI. Estudo que caracterizou o perfil dos recém-nascidos prematuros de UTI neonatal constatou que 93,8% das crianças tiveram patologias respiratórias durante a internação e 90,1% necessitaram de VMI.(1212 Oliveira CS, Casagrande GA, Grecco LC, Golin MO. Perfil de recém-nascidos pré-termo internados na unidade de terapia intensiva de hospital de alta complexidade. ABCS Health Sci. 2015;40(1):28-32.) Esse achado contribui com o presente estudo, pois doenças respiratórias que cursam com a necessidade do uso da VMI tendem a evoluir com o aparecimento de alterações radiológicas no exame de imagem.

Estudos em pediatria demonstram que a complicação mais comum em crianças submetidas à ventilação mecânica é a atelectasia.(77 Dominguez MC, Alvares BR. Atelectasia pulmonar em recém-nascidos com doenças clinicamente tratáveis submetidos a ventilação mecânica: aspectos clínicos e radiológicos. Radiol Bras. 2018;51(1):20-5.,1313 Torres-Castro C, Valle-Leal J, Martínez-Limón AJ, Lastra-Jiménez Z, Delgado-Bojórquez LC. Complicaciones pulmonares asociadas a ventilación mecánica en el paciente neonatal. Bol Med Hosp Infant Mex. 2016;73(5):318-24.,1414 Principi T, Fraser DD, Morrison GC, Farsi SA, Carrelas JF, Maurice EA, et al. Complications of mechanical ventilation in the pediatric population. Pediatr Pulmonol. 2011;46(5):452-7.) No entanto, nesses estudos, a atelectasia foi comparada com outros diagnósticos clínicos ou complicações como a extubação acidental, e não com alterações na imagem no exame radiológico de tórax.

Nas radiografias de tórax incluídas no presente estudo, foram observadas 12 alterações descritas como opacidades, sendo esta a alteração pulmonar mais encontrada. Já as atelectasias foram descritas em 11 imagens radiológicas de tórax. A literatura descreve que, ao diagnosticar uma atelectasia, deve ser observado o aumento da densidade local (opacidade) no exame de imagem, podendo ter ocorrido o colapso das unidades alveolares. No entanto, com a opacidade de um segmento pulmonar, sem outras características associadas, não é possível confirmar uma atelectasia e nem descartar a hipótese de colapso alveolar.(11 Johnston C, Carvalho WB. Atelectasias em pediatria: mecanismos, diagnóstico e tratamento. Rev Assoc Med Bras. 2008;54(5):455-60.)

É importante salientar que a presença de opacidade ou de atelectasia pode corresponder a colapso alveolar e perda de volume alveolar. Apesar de a maioria das radiografias de tórax não ser confirmada como atelectasias, vale ressaltar que, por apresentar sinais de diminuição da aeração, do volume pulmonar e da transparência na imagem de tórax, necessita de tratamentos específicos, como manobras fisioterapêuticas de reexpansão pulmonar, aplicação de pressão positiva intermitente e ventilação não invasiva, afim de evitar medidas invasivas, como fibrobroncoscopia e VMI.(1515 Johnston C, Zanetti NM, Comaru T, Ribeiro SN, Andrade LB, Santos SL. I Recomendação brasileira de fisioterapia respiratória em unidade de terapia intensiva pediátrica e neonatal. Rev Bras Ter Intensiva. 2012;24(2):119-29.)

Em estudo retrospectivo, que avaliou atelectasias em pacientes que estavam sob ventilação mecânica, constatou-se que 90% dos pacientes apresentavam colapso parcial do lado direito e justificou-se que essa localização é a mais comum devido a particularidades anatômicas do recém-nascido.(77 Dominguez MC, Alvares BR. Atelectasia pulmonar em recém-nascidos com doenças clinicamente tratáveis submetidos a ventilação mecânica: aspectos clínicos e radiológicos. Radiol Bras. 2018;51(1):20-5.)

Ocorreram dois casos de cânula seletiva, ocasionando, nesses RNPT, atelectasia de todo o pulmão esquerdo. Casos de intubação seletiva no recém-nascido ocorrem, na maioria das vezes, no brônquio fonte direito, devido à sua posição anatômica ser mais retificada em relação ao brônquio fonte esquerdo, além da dificuldade do posicionamento adequado da CET por conta do tamanho da via aérea.(44 Alvares BR, Pereira IM, Mezzacappa MA, Stopiglia MS, Pires CS. Pulmonary atelectasis in newborn infants: etiology and radiological aspects. Sci Med (Porto Alegre). 2012;22(1):43-52.,77 Dominguez MC, Alvares BR. Atelectasia pulmonar em recém-nascidos com doenças clinicamente tratáveis submetidos a ventilação mecânica: aspectos clínicos e radiológicos. Radiol Bras. 2018;51(1):20-5.)

Alterações pulmonares também podem acontecer após episódios de extubação não programada. Em dois pacientes, as alterações pulmonares observadas no exame radiológico de tórax após a extubação acidental foram a opacidade e a atelectasia, ocasionadas pela perda abrupta da pressão positiva na via aérea, levando ao colapso pulmonar. Em estudo em que foi avaliada a eficácia de um protocolo de fisioterapia em pacientes pós-extubação acidental para prevenir o colapso pulmonar, constatou-se que cerca de 20% dos recém-nascidos apresentaram evidências de algum grau de colapso pós-extubação não programada, caracterizada por aumento da opacidade pulmonar na radiografia em até 24 horas após o evento.(1616 Bagley CE, Gray PH, Tudehope DI, Flenady V, Shearman AD, Lamont A. Routine neonatal postextubation chest physiotherapy: a randomized controlled trial. J Paediatr Child Health. 2005;41(11):592-7.)

A alteração radiológica mais encontrada em pacientes submetidos à ventilação mecânica foi o infiltrado pulmonar. Sarmento et al.(1717 Sarmento GJ, Papa DC, Raimundo RD. Princípios e práticas de ventilação mecânica em pediatria e neonatologia. São Paulo: Manole; 2011. p. 198-211.) descrevem que, em doenças pulmonares como síndrome do desconforto respiratório agudo, aspiração de mecônio, pneumonia e bronquiolite, essa alteração radiológica ocorre devido a um processo inflamatório, com colapso de unidades alveolares e redução do volume pulmonar, além de ocasionar maior risco de infecção associada ao uso da ventilação mecânica.

As limitações deste estudo estiveram relacionadas ao pequeno número da amostra, que ocorreu por conveniência. No entanto, justifica-se pelo curto período da coleta de dados. Outra limitação relacionou-se ao fato de o raio X não ser padrão ouro para se diagnosticar atelectasias pulmonares, por isso os laudos sugerem alguma alteração, mas não confirma um diagnóstico. Recomenda-se a realização de outros estudos, com um maior número de RNPT, com mais examinadores especialistas e não especialistas, para que se possa comparar a visão de quem avalia apenas a imagem e quem avalia a associação da imagem com o paciente.

CONCLUSÃO

Considerando o laudo radiológico, as alterações observadas têm ocorrências sem diferença estatisticamente significante. A atelectasia não foi a alteração mais encontrada nas radiografias de tórax dos recém-nascidos prematuros, mas sim a opacidade - porém esse achado não descarta a hipótese de colapso pulmonar. O lado mais acometido pelas atelectasias foi o direito. Pacientes prematuros extremos, de baixo peso, do sexo masculino, que estão sob ventilação mecânica invasiva e com cânula endotraqueal mal posicionada, têm maior chance de desenvolver alterações pulmonares que podem ser visualizadas na radiografia de tórax. O reconhecimento das características de cada alteração conduz a conduta fisioterapêutica mais adequada para cada recém-nascido, podendo impedir a evolução de complicações pulmonares mais graves.

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Editado por

Editor responsável: Werther Brunow de Carvalho

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Out 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2019

Histórico

  • Recebido
    13 Dez 2018
  • Aceito
    05 Maio 2019
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