Accessibility / Report Error

Avaliação do risco nutricional em pacientes oncológicos graves: revisão sistemática

RESUMO

Objetivo:

Revisar sistematicamente os principais métodos para avaliação do risco nutricional utilizados em pacientes oncológicos graves e apresentar aqueles que melhor avaliam os riscos e preveem desfechos clínicos relevantes neste grupo de pacientes, além de discutir as vantagens e as desvantagens destes métodos, segundo a literatura atual.

Métodos:

O estudo consistiu de uma revisão sistemática com base na análise de artigos obtidos nas bases de dados PubMed, LILACS e SciELO, realizando as buscas com os termos em inglês: “nutritional risk assessment”, “critically ill” e “cancer”.

Resultados:

Apenas 6 (17,7%) dos 34 artigos inicialmente obtidos cumpriam os critérios para inclusão e foram selecionados para revisão. Os principais desfechos destes estudos foram que o gasto de energia em repouso se associou com subnutrição e superalimentação. O escore elevado da Avaliação Subjetiva Global - Produzida pelo Paciente associou- se de forma significante com baixa ingestão de alimentos, perda de peso e desnutrição. Em termos de marcadores bioquímicos, níveis mais elevados de creatinina, albumina e ureia se associaram de forma significante com mortalidade mais baixa. Os piores índices de sobrevivência foram encontrados para pacientes com condições de desempenho piores, conforme avaliação usando o Eastern Cooperative Oncologic Group performance status, escore prognóstico de Glasgow elevado, baixa albumina/hipoalbuminemia, elevado escore da Avaliação Subjetiva Global - Produzida Pelo Paciente e para níveis elevados de fosfatase alcalina. Valores de avaliação do Índice de Risco Nutricional Geriátrico inferiores a 87 se associaram de forma significante com mortalidade. O escore pelo índice prognóstico inflamatório nutricional se associou com condição nutricional anormal em pacientes oncológicos graves. Dentre os estudos revisados que avaliaram apenas peso e índice de massa corporal, não se encontrou qualquer desfecho clínico significante.

Conclusão:

Nenhum dos métodos revisados ajudou a definir o risco entre esses pacientes. Portanto, sugere-se a avaliação por meio da quantificação da perda de peso e dos níveis séricos, preferivelmente em combinação com outros métodos utilizando escores como o Eastern Cooperative Oncologic Group performance status, o escore prognóstico de Glasgow e a Avaliação Subjetiva Global - Produzida Pelo Paciente, já que seu uso é simples, factível e útil em tais casos.

Descritores
Neoplasias/complicações; Estado terminal; Avaliação nutricional; Estado nutricional; Suporte nutricional; Assistência ao paciente; Cuidados intensivos

ABSTRACT

Objective:

To systematically review the main methods for nutritional risk assessment used in critically ill cancer patients and present the methods that better assess risks and predict relevant clinical outcomes in this group of patients, as well as to discuss the pros and cons of these methods according to the current literature.

Methods:

The study consisted of a systematic review based on analysis of manuscripts retrieved from the PubMed, LILACS and SciELO databases by searching for the key words “nutritional risk assessment”, “critically ill” and “cancer”.

Results:

Only 6 (17.7%) of 34 initially retrieved papers met the inclusion criteria and were selected for the review. The main outcomes of these studies were that resting energy expenditure was associated with undernourishment and overfeeding. The high Patient-Generated Subjective Global Assessment score was significantly associated with low food intake, weight loss and malnutrition. In terms of biochemical markers, higher levels of creatinine, albumin and urea were significantly associated with lower mortality. The worst survival was found for patients with worse Eastern Cooperative Oncologic Group - performance status, high Glasgow Prognostic Score, low albumin, high Patient-Generated Subjective Global Assessment score and high alkaline phosphatase levels. Geriatric Nutritional Risk Index values < 87 were significantly associated with mortality. A high Prognostic Inflammatory and Nutritional Index score was associated with abnormal nutritional status in critically ill cancer patients. Among the reviewed studies that examined weight and body mass index alone, no significant clinical outcome was found.

Conclusion:

None of the methods reviewed helped to define risk among these patients. Therefore, assessment by a combination of weight loss and serum measurements, preferably in combination with other methods using scores such as Eastern Cooperative Oncologic Group - performance status, Glasgow Prognostic Score and Patient-Generated Subjective Global Assessment, is suggested given that their use is simple, feasible and useful in such cases.

Keywords:
Neoplasms/complications; Critically illness; Nutritional assessment; Nutritional status; Patient care; Intensive care

INTRODUÇÃO

O câncer se estabeleceu como um problema de saúde pública em todo o mundo e, atualmente, é a segunda principal causa de óbito por doença nos países desenvolvidos.(1Ferlay J, Soerjomataram I, Ervik M, Dikshit R, Eser S, Mathers C, et al. GLOBOCAN 2012 v1.0: estimated cancer incidence and mortality worldwide in 2012. IARC Cancer Base No 11. Lyon, France: International Agency for Research on Cancer; 2013.)Estima-se um crescimento das taxas globais de 50% entre os anos de 2000 e 2020, o que deve resultar em uma incidência de 10 a 15 milhões de pacientes com câncer.(2World Health Organization. Expert Consultation on diet, nutrition and the prevention of chronic diseases. Genève: WHO; Joint WHO/FAO Expert Consultation on Diet, Nutrition and the Prevention of Chronic Diseases (2002: Geneva, Switzerland) Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: report of a joint WHO/FAO expert consultation, Geneva, 28 January -- 1 February 2002. (WHO technical report series; 916))

Tem se observado que pacientes com doenças malignas têm sido cada vez mais admitidos à unidade de terapia intensiva (UTI), em razão de complicações do próprio câncer ou por efeitos colaterais dos tratamentos utilizados.(3Azoulay E, Afessa B. The intensive care support of patients with malignancy: do everything that can be done. Intensive Care Med. 2006;32(1):3-5.) Assim, uma significante parte desses pacientes oncológicos são verdadeiramente críticos, levando a um significante aumento das complicações e óbitos após o tratamento.(4Wong PW, Enriquez A, Barrera R. Nutritional support in critically ill patients with cancer. Crit Care Clin. 2001;17(3):743-67.)

Respostas metabólicas graves, principalmente caracterizadas por hipermetabolismo e hipercatabolismo proteico, estão presentes em pacientes graves, tornando-os mais suscetíveis à desnutrição.(4Wong PW, Enriquez A, Barrera R. Nutritional support in critically ill patients with cancer. Crit Care Clin. 2001;17(3):743-67.) A desnutrição está ligada a prognóstico pior e deve ser detectada e prevenida o mais precocemente possível, para tratar e prevenir o prejuízo clínico por meio de intervenções nutricionais apropriadas e intensivas,(5Barbosa-Silva MC. Subjective and objective nutritional assessment methods: what do they really assess? Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2008;11(3):248-54.,6Poziomyck AK, Weston AC, Lameu EB, Cassol OS, Coelho LJ, Moreira LF. Preoperative nutritional assessment and prognosis in patients with foregut tumors. Nutr Cancer. 2012;64(8):1174-81.) que podem reduzir ou, até mesmo, praticamente eliminar o risco de morbidade e mortalidade.(7ASPEN Board of Directors and the Clinical Guidelines Task Force. Guidelines for the use of parenteral and enteral nutrition in adult and pediatric patients. JPEN J Parenter Enter Nutr. 2002;26(1 Suppl):1SA-138SA. Erratum in JPEN J Parenter Enteral Nutr 2002;26(2):144.)

Um dos maiores problemas com os métodos atualmente disponíveis para avaliar a condição nutricional é a inadequação quase absoluta de qualquer método ou ferramenta se usado isoladamente, demonstrando, de forma clara, a ausência de um padrão-ouro. Assim, diferentes métodos foram combinados, em uma tentativa de aumentar a especificidade e a sensibilidade da avaliação do risco nutricional.(8Ryu SW, Kim IH. Comparison of different nutritional assessment in detecting malnutrition among gastric cancer patients. World J Gastroenterol. 2010;16(26):3310-7.,9Pablo AM, Izaga MA, Alday LA. Assessment of nutritional status on hospital admission: nutritional scores. Eur J Clin Nutr. 2003;57(7):824-31.) Se avaliações nutricionais de rotina em geral ou especificamente em pacientes com câncer já possuem muitas dificuldades e não permitem estabelecer um padrão-ouro, deve ser estimada a avaliação do risco nutricional dos pacientes com câncer que complicam seriamente, tornando-se graves - como um resultado direto de câncer per se ou como resultado dos efeitos colaterais da terapia neoadjuvante ou adjuvante. Os resultados permitirão melhor prevenção, controle dos riscos e redução da mortalidade.(5Barbosa-Silva MC. Subjective and objective nutritional assessment methods: what do they really assess? Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2008;11(3):248-54.

Poziomyck AK, Weston AC, Lameu EB, Cassol OS, Coelho LJ, Moreira LF. Preoperative nutritional assessment and prognosis in patients with foregut tumors. Nutr Cancer. 2012;64(8):1174-81.

ASPEN Board of Directors and the Clinical Guidelines Task Force. Guidelines for the use of parenteral and enteral nutrition in adult and pediatric patients. JPEN J Parenter Enter Nutr. 2002;26(1 Suppl):1SA-138SA. Erratum in JPEN J Parenter Enteral Nutr 2002;26(2):144.

Ryu SW, Kim IH. Comparison of different nutritional assessment in detecting malnutrition among gastric cancer patients. World J Gastroenterol. 2010;16(26):3310-7.
-9Pablo AM, Izaga MA, Alday LA. Assessment of nutritional status on hospital admission: nutritional scores. Eur J Clin Nutr. 2003;57(7):824-31.)

O objetivo do presente estudo foi revisar de forma sistemática os principais métodos para avaliação do risco nutricional utilizados em pacientes oncológicos graves, determinando aqueles que melhor avaliam os riscos e preveem desfechos clínicos relevantes nesse grupo de pacientes, além de discutir as vantagens e as desvantagens desses métodos, segundo a literatura atual.

MÉTODOS

O presente estudo consistiu em análise de referências obtidas nas seguintes bases de dados: PubMed (National Library of Medicine and National Institutes of Health), LILACS, indexador abrangente da base de dados científicos da América Latina e Caribe e SciELO (Scientific Electronic Library Online), uma base de dados cooperativa digital de acesso livre a periódicos originalmente do Brasil. Para identificar todas as publicações relevantes, realizamos buscas sistemáticas nas bases de dados quanto aos últimos 20 anos, até 10 de dezembro de 2014. A estratégia de busca foi definida por unitermos relacionados à avaliação do risco nutricional e estado nutricional (avaliação do risco nutricional ou estado nutricional, avaliação nutricional) em combinação com termos relativos à UTI e pacientes críticos oncológicos (doença crítica, paciente com câncer, câncer crítico).

A seleção dos estudos e a extração dos dados (por exemplo, autor, ano de publicação, amostra do estudo, objetivo, avaliação nutricional e principais resultados) foram realizados simultaneamente por dois revisores. As diferenças foram resolvidas por meio de procedimento de consenso. Em casos de discordância, a decisão foi tomada por um terceiro revisor.

Os manuscritos foram avaliados quanto às duas principais questões da pesquisa: (1) a validade de uma ferramenta de triagem nutricional em comparação com um método de referência (validade de critérios e construção); e (2) a capacidade da ferramenta de prever o desfecho clínico (validade preditiva).(1010 van Bokhorst-de van der Schueren MA, Guaitoli PR, Jansma EP, de Vet HC. Nutrition screening tools: does one size fit all? A systematic review of screening tools for the hospital setting. Clin Nutr. 2014;33(1):39-58.)

Foram inicialmente obtidos 34 artigos da PubMed, enquanto as bases de dados LILACS e SciELO não forneceram qualquer artigo. Desses 34 artigos, 2 eram duplicatas e foram excluídos da análise. Dos restantes 32 artigos, identificamos os que cumpriam os critérios para inclusão. Os critérios de inclusão foram definidos previamente e são os seguintes: estudos em adultos ou em idosos; artigos redigidos em inglês ou português; estudos realizados em uma população hospitalar de pacientes oncológicos graves (submetidos ou não a tratamento cirúrgico); estudos que descrevessem a validade preditiva de uma ferramenta para um ou mais desfechos (condição nutricional, tempo de permanência, perda de peso, desnutrição, superalimentação, mortalidade, sobrevivência e outras complicações); e manuscritos publicados nos últimos 20 anos. Não foi encontrado qualquer artigo em português. Os critérios de exclusão de artigos compreenderam: artigos de revisão não disponíveis na versão completa, comunicações breves e artigos não concernentes a avaliação nutricional em pacientes oncológicos graves; artigos que não tratassem da avaliação da condição nutricional em pacientes oncológicos graves; artigos que não tratassem de câncer; artigos indisponíveis quando solicitado aos autores; que não se referisse aos critérios definidos para inclusão.

Dos 32 artigos identificados na busca, 9 (28%) foram excluídos por não tratarem de avaliação da condição nutricional em pacientes oncológicos graves, 4 (12%) não tratavam de câncer, 5 (15%) não cumpriam os critérios de inclusão, 2 (6%) não estavam disponíveis após solicitação aos autores, e 2 (6%) eram comunicações breves; os 4 artigos restantes (12%) eram artigos de revisão.

RESULTADOS

O fluxograma que descreve a pesquisa dos artigos é apresentado na figura 1. Inicialmente, foram selecionados 34 estudos e, ao final, apenas 6 artigos (17,7%) foram selecionados para compor esta revisão. Os artigos estão descritos no quadro 1.

Figura 1
Desenho esquemático da metodologia aplicada.

UTI - unidade de terapia intensiva.


Quadro 1
Artigos indexados (PubMed, LILACS e SciELO) relacionados à avaliação nutricional em pacientes oncológicos graves

Dos 6 estudos selecionados, 3 eram estudos transversais (1 retrospectivo e 2 prospectivos) e 3 observacionais (1 retrospectivo e 2 prospectivo). Em razão das diferenças entre os estudos incluídos nesta revisão, os autores definiram o grau de recomendação e nível de evidência para os artigos em conformidade com as orientações do National Health and Medical Research Council para níveis adicionais de evidência de graus de recomendação para desenvolvedores de diretrizes (Figura 2). Os principais desfechos observados nesta revisão foram subnutrição, superalimentação, estado nutricional, mortalidade, sobrevivência, perda de peso, peso e desnutrição.

Figura 2
Níveis adicionais do National Health and Medical Research Council para níveis de evidências e graus de recomendação para desenvolvedores de diretrizes.

Dentre todos os estudos selecionados, 1 examinou a correlação entre o gasto energético em repouso (GER) estimado e o medido, para obter uma melhor estimativa das necessidades energéticas; 1 avaliou a prevalência de desnutrição na população geral utilizando a ferramenta Avaliação Subjetiva Global - Produzida pelo Paciente (ASG-PPP); 1 examinou o papel dos marcadores bioquímicos para prever mortalidade; 1 correlacionou os desfechos mortalidade e sobrevivência com perda de peso e diferentes métodos de avaliação nutricional, como ASG-PPP, ECOG- performance status (ECOG-PS), escore prognóstico de Glasgow (EPG), marcadores bioquímicos e antropometria; 1 validou o desempenho da ferramenta Índice de Risco Nutricional Geriátrico (IRNG), além de analisar marcadores bioquímicos como preditores de mortalidade em curto prazo; e o último aplicou a ferramenta índice prognóstico inflamatório nutricional (IPIN) para avaliar a condição nutricional da população do estudo.

Para uma melhor análise e descrição dos resultados, os artigos selecionados para esta revisão foram separados segundo os métodos propostos para avaliação (Quadro 2).

Quadro 2
Métodos de avaliação nutricional como preditores de risco nutricional em pacientes oncológicos graves

Avaliação nutricional baseada em métodos de calorimetria indireta e estimada

Pirat et al.(1111 Pirat A, Tucker AM, Taylor KA, Jinnah R, Finch CG, Canada TD, et al. Comparison of measured versus predicted energy requirements in critically ill cancer patients. Respir Care. 2009;54(4):487-94.)realizaram um estudo transversal retrospectivo. Dos 34 pacientes oncológicos graves incluídos, 26 (76%) eram pós-operatórios. No estudo, os autores avaliaram a correlação entre GER medido pela calorimetria indireta com o GER estimado pela aplicação da fórmula clínica (com base na Sociedade Americana de Nutrição Parenteral e Enteral de 2002 e 2004) e GER estimado pela aplicação da equação de Harris-Benedict. O GER estimado pela equação de Harris-Benedict, sem incluir fatores de estresse ou atividade, foi semelhante ao GER medido e exibiu uma correlação significativa (r = 0,587; p < 0,001), ao contrário do GER clinicamente estimado e do GER medido (r = 0,24; p = 0,17).

Como desfechos principais, tanto a equação de Harris-Benedict quanto os métodos clinicamente estimados se associaram com elevada prevalência de desnutrição (29 e 15%, respectivamente) e superalimentação (29% com a equação de Harris-Benedict e 71% com o método clinicamente estimado). São necessários mais estudos para permitir avaliação dos riscos que a superalimentação ou subalimentação podem criar nesse grupo de pacientes.

Avaliação nutricional com base em métodos subjetivos

A avaliação nutricional utilizando o ASG-PPP foi realizada por Khoshnevis et al. em um estudo prospectivo transversal com 416 pacientes oncológicos graves submetidos a cirurgia (18,0%), radioterapia (31,8%), quimioterapia (32,8%), ou a uma combinação dos três tratamentos (8,5%), ou que estavam em seus últimos estágios de tratamento e acompanhamento (9,0%). Os autores analisaram a prevalência e os níveis de desnutrição nesses pacientes. Pacientes bem nutridos (A) constituíam até 47% dos casos; pacientes com risco nutricional (B), 29%; e 24% dos pacientes estavam gravemente desnutridos (C). Considerando-se as diferenças entre os tratamentos oncológicos, foi identificada desnutrição (graus B ou C) em pacientes submetidos à cirurgia (21,5%), à radioterapia (32%), à quimioterapia (30,6%), a uma combinação destes (10%) ou pacientes em fase final de tratamento ou acompanhamento (5,9%). Sintomas nutricionais, como depressão (39%), anorexia (38%), xerostomia (32%), náusea (25%) e dor (23%), estiveram significantemente relacionados com redução da ingestão de alimentos (r = 0,652; p < 0,001) e perda de peso (r = 0,577; p < 0,001). Dentre os 416 pacientes, 41% não tinham apresentado perda de peso nos últimos 6 meses e 44% tiveram perda de peso superior a 5% em 1 mês, ou superior a 10% em 6 meses. Foi encontrada uma forte correlação entre a perda de peso e as avaliações pelo ASG-PPP (r = 0,684), sintomas clínicos (r = 0,754) e nutricionais (r = 0,801).(1212 Khoshnevis N, Ahmadizar F, Alizadeh M, Akbari ME. Nutritional assessment of cancer patients in Tehran, Iran. Asian Pac J Cancer Prev. 2012;13(4):1621-6.)

Avaliação nutricional com base em parâmetros laboratoriais

Foram avaliados albumina sérica, creatinina e ureia em um estudo retrospectivo observacional conduzido por Salahudeen et al.(1313 Salahudeen AK, Kumar V, Madan N, Xiao L, Lahoti A, Samuels J, et al. Sustained low efficiency dialysis in the continuous mode (C-SLED): dialysis efficacy, clinical outcomes, and survival predictors in critically ill cancer patients. Clin J Am Soc Nephrol. 2009;4(8):1338-46.) para avaliar preditores de desfechos de sobrevivência em pacientes oncológicos (n = 199) tratados com diálise de baixa eficiência realizada continuamente (C-SLED, sigla do inglês sustained low efficiency dialysis in the continuous mode). Passaram por cirurgia 22 pacientes, 20 estavam em tratamento radioterápico e 86, em quimioterapia. Como principais desfechos, o estudo identificou que pacientes com níveis mais elevados de ureia (≥ 8mg/dL) demonstravam um risco significantemente menor de óbito, em comparação aos pacientes com níveis mais baixos de ureia (< 8mg/dL; risco relativo - RR = 0,57; intervalo de confiança de 95% - IC95% = 0,34 - 0,94; p < 0,03). Em contraste, pacientes com níveis mais elevados de creatinina (RR = 0,8; IC95% = 0,66 - 0,98) e albumina sérica (RR = 0,68; IC95% = 0,51 - 0,92) demonstraram um menor risco de óbito (p = 0,03 e p = 0.01). O índice de massa corporal (IMC) não se correlacionou com a sobrevivência do paciente (p = 0,18).

Avaliação nutricional com base em combinação de parâmetros

Read et al.(1414 Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.)realizaram um estudo de seguimento de 51 pacientes submetidos a cuidados paliativos com câncer colorretal avançado estágio IV para correlacionar marcadores de avaliação nutricional com sobrevida. Os marcadores incluíram ASG-PPP, Eastern Cooperative Oncologic Group - performance status (ECOG-PS), EPG, proteína C-reativa (PCR), albumina, peso e IMC. Dentre os 51 pacientes neste estudo, 15 (29%) tinham recebido recentemente o diagnóstico de câncer colorretal estágio IV, 36 (71%) apresentavam doença progressiva após terem recebido previamente um a três regimes de tratamento quimioterápico, 37 pacientes (73%) tinham cirurgia prévia, e 4 pacientes (8%) tinham recebido radioterapia prévia.

O ECOG-PS é um método subjetivo primariamente delineado para avaliar o grau de comprometimento clínico provocado pelo tumor.(1515 Oken MM, Creech RH, Tormey DC, Horton J, Davis TE, McFadden ET, et al. Toxicity and response criteria of the Eastern Cooperative Oncology Group. Am J Clin Oncol. 1982;5(6):649-55.) No estudo,(1414 Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.) 92% dos pacientes tinham ECOG-PS-2 (alguma limitação das atividades diárias). Como desfecho principal, observou-se um nível pior de sobrevivência à medida que piorava o índice ECOG-PS, conforme previsto (p < 0,001). Quanto ao ASG-PPP, 56% dos pacientes (n = 28) foram classificados nas categorias B ou C. Quando o escore no ASG-PPP era ≥ 9 (n = 19), 38% dos pacientes estavam em risco nutricional alto. Observou-se baixa sobrevivência nos pacientes que tinham um escore do ASG-PPP ≥ 9 (p < 0,001), ASG-PPP B ou ASG-PPP C (p = 0,020). Perda de peso ≥ 10% após 6 meses foi observada em 9 (18%) pacientes no estudo.

Com relação a exames bioquímicos, 33 (69%) pacientes tiveram elevação da PCR (> 10mg/L), 7 (14%) pacientes apresentavam diminuição da albumina (< 35g/L), e 29 (57%) elevação da fosfatase alcalina (FAL) (> 130U/L). Na avaliação do EPG, um escore prognóstico, que classifica a resposta inflamatória com base em uma combinação dos resultados referentes a PCR e albumina, 7 (15%) pacientes tinham classificação EPG 2 (hipoalbuminemia e aumento da PCR), 26 (54%) eram EPG 1 (elevação da PCR ou hipoalbuminemia) e 15 (31%) eram EPG 0 (sem alterações). Como principal desfecho, observou-se baixa sobrevivência em pacientes com hipoalbuminemia (< 35g/L; p = 0,017), alta FAL (p = 0,018) e EPG 1 ou EPG 2 (p = 0,036).

Quando PCR foi avaliada como uma variável contínua, em vez de por categoria (normal versus alto), uma correlação negativa significativa com a sobrevida foi encontrada (p = 0,029). A análise multivariada, utilizando o modelo de riscos proporcionais de Cox, mostrou que tipo de tratamento (RR = 1,48; IC95% = 1,11 - 1,79; p = 0,005), ECOG-PS (RR = 2,37; IC95% = 1,11 - 5,09; p = 0,026), EPG (RR = 2,27; IC95% = 1,09-4,73; p = 0,028) e FAL (RR = 0,44; IC95% = 0,18 - 1,07; p = 0,069) poderiam predizer significativamente a sobrevida. No entanto, o estado nutricional de pacientes não foi preditor significativo na análise multivariada.

Em conclusão, os autores sugeriram que ECOG-PS, EPG, FAL e tipo de tratamento são considerados importantes preditores de sobrevivência em câncer colorretal avançado.

Ferramentas de triagem de risco baseadas em avaliação nutricional

Lee et al.(1616 Lee JS, Choi HS, Ko YG, Yun DH. Performance of the Geriatric Nutritional Risk Index in predicting 28-day hospital mortality in older adult patients with sepsis. Clin Nutr. 2013;32(5):843-8.)realizaram um estudo observacional de pacientes sépticos com 65 anos de idade ou mais (n = 401) para validar o desempenho do IRNG, uma ferramenta de triagem para risco nutricional na predição de mortalidade hospitalar em curto prazo (até 28 dias). Dentre os 401 pacientes estudados, 70 (17,5%) tinham câncer metastático, enquanto 32 (8%) não tinham. A triagem realizada por meio da ferramenta IRNG e marcadores bioquímicos (albumina, PCR e creatinina) foi aplicada a todos os pacientes. Segundo o IRNG, a mortalidade hospitalar foi de 4,6% no grupo de pacientes com risco muito baixo (IRNG > 98); 10% no grupo com risco baixo (IRNG 92 - 98); 8,5% no grupo com risco moderado (IRNG 87 a < 92); 22% no grupo com risco alto (IRNG 82 a < 87); e 36% no grupo com risco muito alto (IRNG < 82). Os desfechos principais foram que índices no IRNG < 87, entre 87 e 82 (p = 0,015) e < 82 (p = 0,002) associaram-se de forma independente com aumento do risco de óbito comparativamente ao IRNG > 98. Níveis mais baixos de albumina sérica se associaram com mortalidade hospitalar (OR = 4,095; IC95% = 2,22 - 7,56) após análise univariada e não apresentaram significância após análise multivariada (OR = 1,831; IC95% = 0,78 - 4,28). Metástase de câncer (p < 0,001) e níveis de creatinina sérica (p = 0,011) foram os únicos fatores independentes associados com aumento do risco de óbito, após análise multivariada.

Avaliação nutricional com base em escores

Nelson e Walsh realizaram o primeiro estudo piloto transversal em cuidados paliativos de pacientes oncológicos graves (n = 50) utilizando o IPIN, que usa o produto de duas proteínas de fase aguda (alfa-1 glicoproteína ácida e PCR) dividido por duas proteínas viscerais (albumina e pré-albumina), e compararam seus valores de IPIN com os de uma população saudável (< 1). O escore médio (DP) na amostra foi de 102 (142), com IC95% de 62 - 142. Nenhum paciente sob cuidados paliativos estava em uso de tratamento antitumoral ativo. O IPIN foi significantemente mais alto em pacientes com câncer avançado, anorexia e perda de peso, e pode ser um método útil para avaliação em pacientes oncológicos graves.(1717 Nelson KA, Walsh D. The cancer anorexia-cachexia syndrome: a survey of the Prognostic Inflammatory and Nutritional Index (PINI) in advanced disease. J Pain Symptom Manage. 2002;24(4):424-8.)

Os principais resultados com uso das ferramentas acima referenciadas mostram que alguns métodos de avaliação nutricional se comprovaram melhores para prever os desfechos clínicos em pacientes oncológicos graves. Estimativas combinadas de perda de peso, mensurações séricas de PCR, albumina, ureia, creatinina e FAL, preferivelmente combinadas com outros métodos que utilizam escores como ECOG-PS, EPG e ASG-PPP se associaram com desfechos clínicos relevantes, como desnutrição, sobrevivência e mortalidade. É interessante que tanto risco nutricional quanto estado nutricional possam ser avaliados por meio de diferentes métodos, para melhor estimar a prevalência, prognóstico e até mesmo a resposta a intervenções nutricionais,(5Barbosa-Silva MC. Subjective and objective nutritional assessment methods: what do they really assess? Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2008;11(3):248-54.) o que poderia reduzir consideravelmente os riscos de morbidade e mortalidade.(1818 Andrade FN, Lameu EB, Luiz RR. Musculatura adutora do polegar: um novo índice prognóstico em cirurgia cardíaca valvar. Rev SOCERJ. 2005;18(5):384-91.)

DISCUSSÃO

Foram descritas mais de 70 ferramentas para avaliação nutricional, analisando diferentes populações. Até o momento, nenhuma ferramenta suficientemente sensível e específica pode ser considerada como um padrão-ouro para avaliação nutricional.(1010 van Bokhorst-de van der Schueren MA, Guaitoli PR, Jansma EP, de Vet HC. Nutrition screening tools: does one size fit all? A systematic review of screening tools for the hospital setting. Clin Nutr. 2014;33(1):39-58.) Retenção hídrica, massa tumoral, efeitos colaterais da quimioterapia como hiperemese, anorexia, fadiga e depressão, toxicidade sobre fígado, rins ou outros órgãos, e efeitos de terapias de suporte, que levam a náuseas e alteração da motilidade intestinal, estão entre as condições que comprometem a qualidade da avaliação.(1919 Hirschfeld S. Working group session report: cancer. J Nutr. 1999;129(1S Suppl):306S-307S. Review.)

Os métodos para estimar as necessidades energéticas de pacientes graves sem câncer são em geral imprecisos e frequentemente não factíveis para aplicação na UTI. Assim, até aqui nenhum desses métodos foi amplamente aceito. Em pacientes oncológicos graves, Pirat et al. demonstraram que a desnutrição e a superalimentação são comuns quando se usam esses métodos,(1111 Pirat A, Tucker AM, Taylor KA, Jinnah R, Finch CG, Canada TD, et al. Comparison of measured versus predicted energy requirements in critically ill cancer patients. Respir Care. 2009;54(4):487-94.) podendo levar a desfechos imprevistos.(2020 Walker RN, Heuberger RA. Predictive equations for energy needs for the critically ill. Respir Care. 2009;54(4):509-21.)

O sistema ASG-PPP aplicado a pacientes oncológicos, primeiramente por Read et al.(1414 Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.) e, subsequentemente, por Khoshnevis et al.,(1212 Khoshnevis N, Ahmadizar F, Alizadeh M, Akbari ME. Nutritional assessment of cancer patients in Tehran, Iran. Asian Pac J Cancer Prev. 2012;13(4):1621-6.) lida de forma específica com aspectos nutricionais de pacientes oncológicos e detecta pequenas variações na condição nutricional.(2121 Lameu EB, Gerude MF, Corrêa RC, Lima KA. Adductor pollicis muscle: a new anthropometric parameter. Rev Hosp Clin Fac Med Sao Paulo. 2004;59(2):57-62.) Read et al. encontraram elevada prevalência de desnutrição, risco nutricional e baixa sobrevivência quando aplicaram o ASG-PPP.(1414 Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.) Semelhantemente, Khoshnevis et al. encontraram que 50% dos pacientes estudados tinham diminuição da ingestão alimentar, que resultava em perda de peso e, consequentemente, em desnutrição, com quase metade dos pacientes (46%) com necessidade de cuidados intensivos. Sintomas nutricionais, perda de peso e redução da gordura e tecido muscular foram considerados fatores causadores de desnutrição nesses pacientes.(1212 Khoshnevis N, Ahmadizar F, Alizadeh M, Akbari ME. Nutritional assessment of cancer patients in Tehran, Iran. Asian Pac J Cancer Prev. 2012;13(4):1621-6.)

Parâmetros antropométricos, como IMC, perda de peso, circunferências musculares e espessura de dobras cutâneas, quando aplicados isoladamente, não refletem a real condição nutricional.(6Poziomyck AK, Weston AC, Lameu EB, Cassol OS, Coelho LJ, Moreira LF. Preoperative nutritional assessment and prognosis in patients with foregut tumors. Nutr Cancer. 2012;64(8):1174-81.)Dentre os estudos revisados que avaliaram peso e IMC isoladamente, não foi identificado qualquer desfecho.(1111 Pirat A, Tucker AM, Taylor KA, Jinnah R, Finch CG, Canada TD, et al. Comparison of measured versus predicted energy requirements in critically ill cancer patients. Respir Care. 2009;54(4):487-94.,1313 Salahudeen AK, Kumar V, Madan N, Xiao L, Lahoti A, Samuels J, et al. Sustained low efficiency dialysis in the continuous mode (C-SLED): dialysis efficacy, clinical outcomes, and survival predictors in critically ill cancer patients. Clin J Am Soc Nephrol. 2009;4(8):1338-46.,1414 Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.,1616 Lee JS, Choi HS, Ko YG, Yun DH. Performance of the Geriatric Nutritional Risk Index in predicting 28-day hospital mortality in older adult patients with sepsis. Clin Nutr. 2013;32(5):843-8.) Perda de peso combinada com outros parâmetros associou-se fortemente com ASG-PPP e sintomas nutricionais.(1212 Khoshnevis N, Ahmadizar F, Alizadeh M, Akbari ME. Nutritional assessment of cancer patients in Tehran, Iran. Asian Pac J Cancer Prev. 2012;13(4):1621-6.) Assim, sugerimos que avaliações nutricionais realizadas com parâmetros antropométricos, principalmente perda de peso, devem ser realizadas em combinação com a avaliação de outros parâmetros propostos para obtenção de melhores resultados.

Nos anos recentes, marcadores bioquímicos têm ganhado considerável valorização científica e clínica, sendo extremamente úteis durante o processo patológico em combinação com avaliação nutricional. Essas avaliações podem ser utilizadas para triar e avaliar o risco, determinar o grau de dano nutricional e o tipo de suporte a ser aplicado, e para monitorar a eficácia do suporte nutricional.(2222 Biomarkers Definitions Working Group. Biomarkers and surrogate endpoints: preferred definitions and conceptual framework. Clin Pharmacol Ther. 2001;69(3):89-95.,2323 Kumar M, Sarin SK. Biomarkers of diseases in medicine. Curr Trends Sci. 2009;70:403-17.) Embora esses marcadores tenham sido considerados por Salahudeen et al.(1313 Salahudeen AK, Kumar V, Madan N, Xiao L, Lahoti A, Samuels J, et al. Sustained low efficiency dialysis in the continuous mode (C-SLED): dialysis efficacy, clinical outcomes, and survival predictors in critically ill cancer patients. Clin J Am Soc Nephrol. 2009;4(8):1338-46.) e Read et al.(1414 Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.) úteis e capazes de prever mortalidade em pacientes oncológicos graves, seus resultados podem ser afetados por fatores relacionados à doença e não são indicadores confiáveis de desnutrição.(4Wong PW, Enriquez A, Barrera R. Nutritional support in critically ill patients with cancer. Crit Care Clin. 2001;17(3):743-67.,2424 Jeejeebhoy KN. Nutritional assessment. Nutrition. 2000;16(7-8):585-90. Review.,2525 Montejo González JC, Culebras-Fernández JM, García de Lorenzo y Mateos A. [Recommendations for the nutritional assessment of critically ill patients]. Rev Med Chil. 2006;134(8):1049-56. Spanish.)

A ferramenta de avaliação ECOG-PS é um escore subjetivo delineado para avaliar o grau de comprometimento clínico que o tumor impõe ao paciente.(1515 Oken MM, Creech RH, Tormey DC, Horton J, Davis TE, McFadden ET, et al. Toxicity and response criteria of the Eastern Cooperative Oncology Group. Am J Clin Oncol. 1982;5(6):649-55.) Recentemente, Forrest et al. desenvolveram um novo escore prognóstico conhecido como escore prognóstico de Glasgow (EPG). O EPG é um escore cumulativo, que se baseia em alterações da PCR sérica e na diminuição da albumina,(2626 Forrest LM, McMillan DC, McArdle CS, Angerson WJ, Dunlop DJ. Evaluation of cumulative prognostic scores based on the systemic inflammatory response in patients with inoperable non-small-cell lung cancer. Br J Cancer. 2003;89(6):1028-30.) sendo utilizado para determinar o grau de inflamação, mas é também uma ferramenta potencialmente útil para avaliação nutricional, uma vez que se considera que os pacientes oncológicos se encontram em um estado constante de inflamação crônica, um dos fatores primários que levam à caquexia. Esse escore pode também identificar pacientes que podem desenvolver complicações durante o tratamento e é relacionado à sobrevivência.(2727 da Silva JB, Maurício SF, Bering T, Correia MI. The relationship between nutritional status and the Glasgow prognostic score in patients with cancer of the esophagus and stomach. Nutr Cancer. 2013;65(1):25-33.) De maneira semelhante, Read et al.(1414 Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.) relataram que o EPG e o ECOG-PS foram preditores significantes da sobrevivência em pacientes graves com câncer colorretal avançado, e os aspectos do EPG foram similares aos valores prognósticos do ECOG-PS.(2626 Forrest LM, McMillan DC, McArdle CS, Angerson WJ, Dunlop DJ. Evaluation of cumulative prognostic scores based on the systemic inflammatory response in patients with inoperable non-small-cell lung cancer. Br J Cancer. 2003;89(6):1028-30.)

O IRNG é uma ferramenta de triagem simples e objetiva para avaliação do risco nutricional em pacientes idosos internados, tendo sido inicialmente aplicado em pacientes oncológicos graves por Lee et al.(1616 Lee JS, Choi HS, Ko YG, Yun DH. Performance of the Geriatric Nutritional Risk Index in predicting 28-day hospital mortality in older adult patients with sepsis. Clin Nutr. 2013;32(5):843-8.) Essa ferramenta necessita de uma única avaliação rotineira de albumina, peso e altura do joelho quando da admissão; não é considerada uma ferramenta que demande gasto exagerado de tempo; e requer pouco envolvimento do paciente. O IRNG também é um indicador prognóstico mais confiável de morbidade e mortalidade hospitalar do que a albumina ou o IMC isoladamente. No entanto, o uso deste escore tem diversas limitações, já que só pode ser utilizado no idoso, e é difícil estabelecer um peso normal nessa população.(1616 Lee JS, Choi HS, Ko YG, Yun DH. Performance of the Geriatric Nutritional Risk Index in predicting 28-day hospital mortality in older adult patients with sepsis. Clin Nutr. 2013;32(5):843-8.,2828 Bouillanne O, Morineau G, Dupont C, Coulombel I, Vincent JP, Nicolis I, et al. Geriatric Nutritional Risk Index: a new index for evaluating at-risk elderly medical patients. Am J Clin Nutr. 2005;82(4):777-83.)

O IPIN foi delineado para avaliar tanto a condição nutricional quanto o prognóstico em pacientes graves porque pode ser utilizado para traçar a maioria das condições patológicas.(1717 Nelson KA, Walsh D. The cancer anorexia-cachexia syndrome: a survey of the Prognostic Inflammatory and Nutritional Index (PINI) in advanced disease. J Pain Symptom Manage. 2002;24(4):424-8.,2929 Ingenbleek Y, Carpentier YA. A prognostic and inflammatory nutritional index scoring critically ill patients. Int J Vitam Nutr Res. 1985;55(1):91-101.) Nelson e Walsh concluíram que não há métodos atuais que possam determinar, de forma precisa, a desnutrição no câncer, e que a ferramenta IPIN poderia ser útil. Entretanto, seu estudo pioneiro só forneceu informações preliminares,(1717 Nelson KA, Walsh D. The cancer anorexia-cachexia syndrome: a survey of the Prognostic Inflammatory and Nutritional Index (PINI) in advanced disease. J Pain Symptom Manage. 2002;24(4):424-8.) sendo necessários mais estudos que apliquem o IPIN em pacientes oncológicos graves para poder comparar os dados e desfechos no futuro, e, possivelmente, estabelecer uma recomendação quanto ao uso desta ferramenta.

Wong et al. apresentaram, em 2001, uma revisão sistemática que incluía pacientes oncológicos graves. Embora o foco de sua revisão fosse o suporte nutricional em pacientes críticos oncológicos, os autores discutiram brevemente a importância da avaliação nutricional nesse grupo de pacientes. Segundo o ponto de vista dos autores, todos os métodos propostos têm uma série de limitações para seu uso na avaliação de risco e determinação da condição nutricional. Portanto, no momento ainda não se pode oferecer qualquer recomendação padronizada.(4Wong PW, Enriquez A, Barrera R. Nutritional support in critically ill patients with cancer. Crit Care Clin. 2001;17(3):743-67.)

Recentemente, foi apresentada uma revisão sistemática para avaliar a construção dos estudos ou validação de critérios, e a validade preditiva de ferramentas de triagem nutricional para a população hospitalar em geral. Uma as limitações se relacionava à heterogeneidade da população. Assim, o passo seguinte para pesquisas futuras seria aplicar diferentes ferramentas à mesma população de pacientes, permitindo realizar comparações entre as ferramentas e o agrupamento dos resultados. Os autores relataram que as 32 ferramentas avaliadas mostraram resultados incoerentes com relação à validade construtiva. Em conclusão, o grupo aconselhou que não se desenvolvesse qualquer outra ferramenta de avaliação e nunca depender apenas de uma única ferramenta para triar a condição nutricional de todos os pacientes. Na ausência de um padrão-ouro reconhecido para avaliação da desnutrição, o grupo de estudo considerou a avaliação de medidas antropométricas e avaliação global subjetiva como métodos “válidos” de referência. Assim, ferramentas de triagem e valores laboratoriais foram considerados comparações menos válidas.(1010 van Bokhorst-de van der Schueren MA, Guaitoli PR, Jansma EP, de Vet HC. Nutrition screening tools: does one size fit all? A systematic review of screening tools for the hospital setting. Clin Nutr. 2014;33(1):39-58.)

Concordamos que a avaliação do risco nutricional em pacientes oncológicos graves deve ser realizada pela combinação de diferentes métodos, considerando todas as limitações e com o objetivo de estabelecer um diagnóstico nutricional o mais completo e confiável possível. No entanto, na prática clínica, é necessário conhecer as ferramentas atualmente aplicadas para o tratamento de pacientes oncológicos graves e discutir as vantagens e desvantagens dessas ferramentas de avaliação, para desenvolver uma nova ferramenta que permita avaliar o risco nutricional e a condição nutricional desse grupo de pacientes.

Esta revisão sistemática teve algumas limitações. Apenas 6 estudos avaliaram o risco nutricional em pacientes oncológicos que portavam complicações. É importante que, do total de 6 artigos incluídos nesta revisão sistemática, 3 eram pioneiros na maior parte dos métodos de avaliação nutricional nesse grupo de pacientes,(1414 Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.,1616 Lee JS, Choi HS, Ko YG, Yun DH. Performance of the Geriatric Nutritional Risk Index in predicting 28-day hospital mortality in older adult patients with sepsis. Clin Nutr. 2013;32(5):843-8.,1717 Nelson KA, Walsh D. The cancer anorexia-cachexia syndrome: a survey of the Prognostic Inflammatory and Nutritional Index (PINI) in advanced disease. J Pain Symptom Manage. 2002;24(4):424-8.)demonstrando de forma clara que não existe um número suficiente de estudos comparativos. Além disso, os pacientes oncológicos não são divididos em categorias segundo o tratamento que recebem, a fim de permitir uma melhor avaliação do risco nutricional. Contudo, os instrumentos utilizados na prática clínica não consideram os riscos e as complicações dos tratamentos oncológicos, como efeitos colaterais de quimioterapia e de radioterapia, e as implicações da resposta inflamatória após uma cirurgia.(8Ryu SW, Kim IH. Comparison of different nutritional assessment in detecting malnutrition among gastric cancer patients. World J Gastroenterol. 2010;16(26):3310-7.)

CONCLUSÃO

Como não pode ainda ser oferecida qualquer recomendação clara com relação à avaliação do risco nutricional em pacientes oncológicos graves, em razão da falta de evidências de estudos comparativos, sugere-se que as avaliações sejam realizadas pela combinação de diferentes métodos, levando em conta as limitações de cada um deles. Considerando-se os principais desfechos utilizando as diferentes ferramentas, os métodos de avaliação nutricional devem se basear em estimativas combinadas da perda de peso, mensurações dos níveis séricos de proteína C-reativa, albumina, ureia, creatinina e fosfatase alcalina, preferivelmente junto de outros métodos que utilizem escores como Eastern Cooperative Oncology Group performance status, escore prognóstico de Glasgow e Avaliação Subjetiva Global - Produzida Pelo Paciente.

  • Editor responsável: Flávia Ribeiro Machado

REFERÊNCIAS

  • 1
    Ferlay J, Soerjomataram I, Ervik M, Dikshit R, Eser S, Mathers C, et al. GLOBOCAN 2012 v1.0: estimated cancer incidence and mortality worldwide in 2012. IARC Cancer Base No 11. Lyon, France: International Agency for Research on Cancer; 2013.
  • 2
    World Health Organization. Expert Consultation on diet, nutrition and the prevention of chronic diseases. Genève: WHO; Joint WHO/FAO Expert Consultation on Diet, Nutrition and the Prevention of Chronic Diseases (2002: Geneva, Switzerland) Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: report of a joint WHO/FAO expert consultation, Geneva, 28 January -- 1 February 2002. (WHO technical report series; 916)
  • 3
    Azoulay E, Afessa B. The intensive care support of patients with malignancy: do everything that can be done. Intensive Care Med. 2006;32(1):3-5.
  • 4
    Wong PW, Enriquez A, Barrera R. Nutritional support in critically ill patients with cancer. Crit Care Clin. 2001;17(3):743-67.
  • 5
    Barbosa-Silva MC. Subjective and objective nutritional assessment methods: what do they really assess? Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2008;11(3):248-54.
  • 6
    Poziomyck AK, Weston AC, Lameu EB, Cassol OS, Coelho LJ, Moreira LF. Preoperative nutritional assessment and prognosis in patients with foregut tumors. Nutr Cancer. 2012;64(8):1174-81.
  • 7
    ASPEN Board of Directors and the Clinical Guidelines Task Force. Guidelines for the use of parenteral and enteral nutrition in adult and pediatric patients. JPEN J Parenter Enter Nutr. 2002;26(1 Suppl):1SA-138SA. Erratum in JPEN J Parenter Enteral Nutr 2002;26(2):144.
  • 8
    Ryu SW, Kim IH. Comparison of different nutritional assessment in detecting malnutrition among gastric cancer patients. World J Gastroenterol. 2010;16(26):3310-7.
  • 9
    Pablo AM, Izaga MA, Alday LA. Assessment of nutritional status on hospital admission: nutritional scores. Eur J Clin Nutr. 2003;57(7):824-31.
  • 10
    van Bokhorst-de van der Schueren MA, Guaitoli PR, Jansma EP, de Vet HC. Nutrition screening tools: does one size fit all? A systematic review of screening tools for the hospital setting. Clin Nutr. 2014;33(1):39-58.
  • 11
    Pirat A, Tucker AM, Taylor KA, Jinnah R, Finch CG, Canada TD, et al. Comparison of measured versus predicted energy requirements in critically ill cancer patients. Respir Care. 2009;54(4):487-94.
  • 12
    Khoshnevis N, Ahmadizar F, Alizadeh M, Akbari ME. Nutritional assessment of cancer patients in Tehran, Iran. Asian Pac J Cancer Prev. 2012;13(4):1621-6.
  • 13
    Salahudeen AK, Kumar V, Madan N, Xiao L, Lahoti A, Samuels J, et al. Sustained low efficiency dialysis in the continuous mode (C-SLED): dialysis efficacy, clinical outcomes, and survival predictors in critically ill cancer patients. Clin J Am Soc Nephrol. 2009;4(8):1338-46.
  • 14
    Read JA, Choy ST, Beale PJ, Clarke SJ. Evaluation of nutritional and inflammatory status of advanced colorectal cancer patients and its correlation with survival. Nutr Cancer. 2006;55(1):78-85.
  • 15
    Oken MM, Creech RH, Tormey DC, Horton J, Davis TE, McFadden ET, et al. Toxicity and response criteria of the Eastern Cooperative Oncology Group. Am J Clin Oncol. 1982;5(6):649-55.
  • 16
    Lee JS, Choi HS, Ko YG, Yun DH. Performance of the Geriatric Nutritional Risk Index in predicting 28-day hospital mortality in older adult patients with sepsis. Clin Nutr. 2013;32(5):843-8.
  • 17
    Nelson KA, Walsh D. The cancer anorexia-cachexia syndrome: a survey of the Prognostic Inflammatory and Nutritional Index (PINI) in advanced disease. J Pain Symptom Manage. 2002;24(4):424-8.
  • 18
    Andrade FN, Lameu EB, Luiz RR. Musculatura adutora do polegar: um novo índice prognóstico em cirurgia cardíaca valvar. Rev SOCERJ. 2005;18(5):384-91.
  • 19
    Hirschfeld S. Working group session report: cancer. J Nutr. 1999;129(1S Suppl):306S-307S. Review.
  • 20
    Walker RN, Heuberger RA. Predictive equations for energy needs for the critically ill. Respir Care. 2009;54(4):509-21.
  • 21
    Lameu EB, Gerude MF, Corrêa RC, Lima KA. Adductor pollicis muscle: a new anthropometric parameter. Rev Hosp Clin Fac Med Sao Paulo. 2004;59(2):57-62.
  • 22
    Biomarkers Definitions Working Group. Biomarkers and surrogate endpoints: preferred definitions and conceptual framework. Clin Pharmacol Ther. 2001;69(3):89-95.
  • 23
    Kumar M, Sarin SK. Biomarkers of diseases in medicine. Curr Trends Sci. 2009;70:403-17.
  • 24
    Jeejeebhoy KN. Nutritional assessment. Nutrition. 2000;16(7-8):585-90. Review.
  • 25
    Montejo González JC, Culebras-Fernández JM, García de Lorenzo y Mateos A. [Recommendations for the nutritional assessment of critically ill patients]. Rev Med Chil. 2006;134(8):1049-56. Spanish.
  • 26
    Forrest LM, McMillan DC, McArdle CS, Angerson WJ, Dunlop DJ. Evaluation of cumulative prognostic scores based on the systemic inflammatory response in patients with inoperable non-small-cell lung cancer. Br J Cancer. 2003;89(6):1028-30.
  • 27
    da Silva JB, Maurício SF, Bering T, Correia MI. The relationship between nutritional status and the Glasgow prognostic score in patients with cancer of the esophagus and stomach. Nutr Cancer. 2013;65(1):25-33.
  • 28
    Bouillanne O, Morineau G, Dupont C, Coulombel I, Vincent JP, Nicolis I, et al. Geriatric Nutritional Risk Index: a new index for evaluating at-risk elderly medical patients. Am J Clin Nutr. 2005;82(4):777-83.
  • 29
    Ingenbleek Y, Carpentier YA. A prognostic and inflammatory nutritional index scoring critically ill patients. Int J Vitam Nutr Res. 1985;55(1):91-101.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Ago 2015
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2015

Histórico

  • Recebido
    24 Fev 2015
  • Aceito
    08 Jun 2015
Associação de Medicina Intensiva Brasileira - AMIB Rua Arminda, 93 - Vila Olímpia, CEP 04545-100 - São Paulo - SP - Brasil, Tel.: (11) 5089-2642 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbti.artigos@amib.com.br