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Turismo em territórios indígenas: desenvolvimento e impacto sociocultural na Comunidade Indígena Nova Esperança “Pisasú Sarusawa” (Rio Cuieiras - Amazonas)

Tourism in indigenous territories: development and sociocultural impacts in Nova Esperança Indigenous Community “Pisasú Sarusawa” (Rio Cuieiras - Amazonas)

Turismo en territorios indígenas: desarrollo y impacto sociocultural en la Comunidad Indígena Nova Esperança “Pisasú Sarusawa” (Rio Cuieiras - Amazonas)

Resumo

O turismo indígena no Brasil ocorre em diferentes territórios, e não somente nas que são denominadas oficialmente pelo Estado Brasileiro como Terras Indígenas. Especificamente, na área rural de Manaus, Estado do Amazonas, dentro da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Puranga Conquista, a Comunidade Indígena Nova Esperança tem como prática o Turismo de Base Comunitária (TBC). Partindo do pressuposto de que os impactos socioculturais estão sob a luz do desenvolvimento do turismo, o objetivo desta pesquisa foi analisar como o modelo de turismo se relaciona com os impactos socioculturais no contexto da Comunidade Indígena Nova Esperança. A pesquisa tem abordagem qualitativa e foi desenvolvida com levantamento bibliográfico, documental e pesquisa de campo. Em campo, foram realizadas 21 entrevistas semiestruturadas, aplicados questionários socioeconômicos e observação participativa com inserção por dois meses consecutivos na comunidade. A análise qualitativa ocorreu por meio da triangulação dos dados. Os resultados apontam que o modelo de turismo em Nova Esperança avançou de uma prática de apenas receber o turista e esperar que ele comprasse o artesanato local, para um modelo de gestão interna que possibilitou a apropriação pelos indígenas do fluxo de turistas, do artesanato, da hospedagem e das demais operações técnicas e financeiras. Sete impactos socioculturais principais foram identificados: benefícios econômicos; orgulho; relação com agentes intermediários; estilo de vida coletivo; comercialização da cultura; tradições e costumes; e, crenças. Foram identificados também impactos indiretos relacionados ao turismo.

Palavras-chave
Modelo de Desenvolvimento do Turismo; Turismo de Base Comunitária;; Impactos Socioculturais; Povos Indígenas; Povo baré

Abstract

Indigenous tourism in Brazil takes place in different territories, and not only in those that are officially named by the Brazilian State as Indigenous Lands. Specifically, in the rural area of Manaus, Amazonas State, within the Puranga Conquista Sustainable Development Reserve, the Nova Esperança Indigenous Community has as practice Community Base Tourism (CBT). Based on the assumption that sociocultural impacts are under the light of tourism development, the objective of this research was to analyze how the tourism model relates to sociocultural impacts in the context of the Nova Esperança Indigenous Community. The research has a qualitative approach and was developed with bibliographic, documentary and field research. In the field, 21 semi-structured interviews were conducted, socioeconomic questionnaires and participatory observation were applied with insertion for two consecutive months in the community. The qualitative analysis occurred through the triangulation of the data. The results indicate that the tourism model in Nova Esperança advanced from a practice of only receiving the tourist and waiting for him to buy the local handicrafts, to a model of internal management that allowed the appropriation by the indigenous people of the flow of tourists, handicrafts, lodging and other technical and financial operations. Seven main sociocultural impacts were identified: economic benefits; pride; relationship with intermediary agents; collective lifestyle; cultural commercialization; traditions and customs; and beliefs. Indirect impacts related to tourism have also been identified.

Keywords
Tourism Development Model; Community-based Tourism; Sociocultural Impacts; Indigenous Peoples; Baré People

Resumen

El turismo indígena en Brasil tiene lugar en diferentes territorios, y no sólo en aquellos que son nombrados oficialmente por el Estado brasileño como Tierras Indígenas. Específicamente, en la zona rural de Manaus, estado del Amazonas, dentro de la Reserva de Desarrollo Sostenible Puranga Conquista, la Comunidad Indígena Nova Esperança tiene como práctica el Turismo Comunitario (TBC). Partiendo del supuesto de que los impactos socioculturales están bajo la luz del desarrollo turístico, el objetivo de esta investigación fue analizar cómo el modelo turístico se relaciona con los impactos socioculturales en el contexto de la Comunidad Indígena Nova Esperança. La investigación tiene un enfoque cualitativo y fue desarrollada con investigación bibliográfica, documental y de campo. En campo se realizaron 21 entrevistas semiestructuradas, se aplicaron cuestionarios socioeconómicos y observación participativa con inserción durante dos meses consecutivos en la comunidad. El análisis cualitativo se produjo a través de la triangulación de los datos. Los resultados indican que el modelo turístico en Nova Esperança avanzó de una práctica de solo recibir al turista y esperar a que comprara las artesanías locales, a un modelo de gestión interna que permitió la apropiación por parte de los indígenas del flujo de turistas, artesanías, alojamiento y otras operaciones técnicas y financieras. Se identificaron siete impactos socioculturales principales: beneficios económicos; orgullo; relación con agentes intermediarios; estilo de vida colectivo; comercialización del cultivo; tradiciones y costumbres; y, creencias. También se han identificado impactos indirectos relacionados con el turismo.

Palabras clave
Modelo de Desarrollo Turístico; Turismo Comunitario; Impactos socioculturales; Pueblos indígenas; Pueblo baré

1 INTRODUÇÃO

A literatura da Antropologia do Turismo voltada ao estudo de comunidades indígenas tende a dar enfoque aos seus impactos sociais e culturais, apontando a atividade como a grande vilã da mudança cultural quando do encontro entre visitantes e visitados, sem considerar, entretanto, questões precedentes à atividade turística, tais como: os históricos de luta dos movimentos indígenas pelo direito a terra e território, educação, saúde, outros tipos de trabalhos, acesso dos indígenas a outras culturas e, até, a própria estrutura estabelecida para que o turismo ocorra no território indígena. Em geral, não considera também a possibilidade de que determinadas mudanças poderiam ser fruto da escolha dos indígenas em função de questões políticas, sociais ou econômicas (Pereiro & Fernandes, 2018Pereiro, X., & Fernandes, F. (2018). Antropologia e Turismo : teorias , métodos e praxis. (June 2018).).

Outra lacuna na literatura é o conceito de turismo em territórios indígenas, muitas vezes associado a segmentações turísticas, limitando suas outras abordagens e a possibilidade de uma revisão mais ampla sobre o tema. Há, ainda, que se considerar também uma diferença significativa entre etnoturismo e o turismo indígena retratado na literatura internacional, onde o etnoturismo reproduz as explorações do mercado e o turismo indígena trata de iniciativas nas quais os empreendimentos, a gestão e a articulação são feitas pelos indígenas.

No caso da Comunidade Indígena Nova Esperança (AM), o turismo chegou de forma vertical por meio de agentes externos já consolidados no mercado local. O modelo de turismo constituído era o convencional, baseado na exploração: 1) de um estereotipo de índio; e, 2) no trabalho não remunerado da comunidade. Porém, conforme foi se dando a sua atuação, os indígenas foram se apropriando da atividade e caminhando para outra forma de turismo: o Turismo de Base Comunitária (TBC).

Localizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Puranga Conquista, especificamente, no rio Cuieiras, a Comunidade Indígena Nova Esperança é formada predominantemente pela etnia baré. A comunidade é constituída por cerca de 30 famílias a partir do processo migratório do Alto para o Baixo Rio Negro (Amazonas), entre as décadas de 1980/1990. O turismo inicia na comunidade em meados dos anos 2000, se intensifica por meio do turismo de massa em 2005, e, em 2010, ocorre a iniciativa de TBC junto ao fortalecimento do artesanato.

Essa movimentação em direção ao TBC em Nova Esperança teve início em 2010 e envolveu a comunidade, universidades, poder público e organizações do terceiro setor, todos atores fundamentais para o seu suporte e estruturação.

Assim, considerando o contexto de Nova Esperança, tem-se como pressuposto que a estrutura de desenvolvimento que rege cada tipo de turismo se relaciona e influencia diretamente os impactos socioculturais, pois, cada qual possui um tipo de gestão do turismo, de papel da comunidade local e dos agentes intermediários, de oferta de serviços e de empreendimentos.

Diante disso, tem-se como problema de pesquisa: Como o modelo do turismo se relaciona com os impactos socioculturais que se apresentam no contexto empírico da Comunidade Indígena Nova Esperança (AM)? Quais são as dinâmicas de turismo na comunidade? Como são articuladas? São apropriadas pelos indígenas?

Tem-se então como objetivo geral analisar como o modelo de turismo se relaciona com os impactos socioculturais no contexto da Comunidade Indígena Nova Esperança. Enquanto objetivos específicos: a) Caracterizar a comunidade em seus aspectos históricos, geográficos, sociais e culturais; b) Identificar as dinâmicas de turismo na comunidade; c) Identificar como é articulado e apropriado o turismo; d) Analisar quais impactos socioculturais ocorrem a partir da atual estrutura de turismo.

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001, por meio da bolsa demanda social com duração de vinte e quatro meses.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Turismo em Territórios Indígenas

A discussão sobre o turismo em territórios indígenas no Brasil vem acontecendo desde 1999, como apresenta Corbari (2015)Corbari, S. D. (2015). O Turismo Envolvendo Comunidades Indígenas Em Teses e Dissertações: Retrato das Relações e dos Impactos Socioculturais. Universidade Federal do Paraná. em sua análise sobre o turismo em comunidades indígenas em dissertações e teses de 1999 a 2012. A partir da análise dos conceitos e caracterizações nos trabalhos identificados, essa autora propõe uma divisão dos tipos de turismo.

A autora parte do turismo cultural, que seria o tema maior, derivando para o turismo étnico. Este daria gênese ao turismo étnico indígena. A partir deste ponto, o turismo em áreas indígenas se divide em duas modalidades, o turismo convencional, sob controle externo, e o turismo sustentável, via turismo de base comunitária (Corbari, 2015Corbari, S. D. (2015). O Turismo Envolvendo Comunidades Indígenas Em Teses e Dissertações: Retrato das Relações e dos Impactos Socioculturais. Universidade Federal do Paraná.). Nesta interpretação, o conceito de turismo indígena tem relação “com o fator territorial” (Corbari, 2015Corbari, S. D. (2015). O Turismo Envolvendo Comunidades Indígenas Em Teses e Dissertações: Retrato das Relações e dos Impactos Socioculturais. Universidade Federal do Paraná., p. 78). Porém, nota-se que este ainda ficou muito relacionado à segmentação ao trazer o conceito em contraponto aos segmentos de turismo científico, de aventura e o étnico indígena.

Entendendo a importância da proposta de Corbari (2015)Corbari, S. D. (2015). O Turismo Envolvendo Comunidades Indígenas Em Teses e Dissertações: Retrato das Relações e dos Impactos Socioculturais. Universidade Federal do Paraná., dá-se a continuidade a esta, partindo do esclarecimento de alguns conceitos que são de suma importância para o que se conceituará aqui como turismo em territórios indígenas. Assim, buscou-se:

  1. alinhamento conceitual com autores da Geografia Humana, atentando a diferença entre os conceitos de “área” e “território” que são amplamente discutidos nessa disciplina;

  2. atentar à discussão feita também pela Antropologia sobre a luta dos movimentos indígenas, pelo direito a terra e ao território, e como isso se reflete no turismo; e,

  3. abranger os diferentes territórios indígenas e seus desdobramentos no turismo dentro de um termo comum que vai além da perspectiva de segmentação turística.

A área é utilizada para expressar um instrumento de análise que é construído e diferenciado pelo observador no processo de investigação, ou seja, é uma construção externa que parte de quem a observa e a categoriza (Câmara et al., 2003Câmara, G., Monteiro, A. M. V., & Medeiros, J. S. de. (2003). Representações Computacionais do Espaço: Fundamentos Epistemológicos da Ciência da Geoinformação. Geografia, 28(1), 83–96. http://www.periodicos.rc.biblioteca.unesp.br/index.php/ageteo/article/view/1090
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).

O território não depende de um observador externo para existir; é um espaço construído, produzido por atores sociais; em outras palavras, é o resultado das relações de poder a partir de práticas espaciais (Raffestin, 1993Raffestin, C. (1993). Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática.).

O território se constitui, portanto, por meio da manifestação de relações sociais num determinado fragmento do espaço. Ele também está vinculado à cultura, uma vez que “a ocupação do território é vista como algo gerador de raízes e identidade: um grupo não pode mais ser compreendido sem o seu território, no sentido de que a identidade sociocultural das pessoas estaria inarredavelmente ligada aos atributos do espaço concreto” (Lopes de Souza, 2000Lopes de Souza, M. (2000). O Território: Sobre espaço e poder, autonomia e desenvolvimento. In I. E. de Castro, P. C. Costa Gomes, & R. L. Corrêa (Eds.), Geografia: conceitos e temas (2nd ed., pp. 77–116). Bertrand Brasil., p. 84).

A partir da diferença entre os conceitos de território e área, é necessário apontar a diferença entre terra indígena e território indígena, já que o termo proposto na pesquisa busca abranger os diferentes territórios indígenas.

A terra indígena é um processo político-jurídico conduzido pelo Estado sobre os territórios em uso e ocupação de comunidades indígenas. Refere-se a uma parte do território nacional que foi reconhecida a partir de requisitos técnicos e legais para sua demarcação seguindo os termos da Constituição Federal de 1988 (Art. 231 e 232), do Estatuto do Índio (Lei 6.001/73) e do Decreto nº1.775, de 8 de janeiro de 1996, que dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas e dá outras providências. Esta possui quatro tipos: i) terras indígenas tradicionalmente ocupadas – referentes ao que consta no art. 231; ii) reservas indígenas – terras doadas por terceiros ou pela União; iii) terras dominiais – terras adquiridas pelas comunidades indígenas por alguma forma de aquisição consoante a legislação civil; e, iv) interditadas – destinadas aos povos isolados (Fundação Nacional do Índio [FUNAI], n.d.Fundação Nacional do Índio (n.d.). Modalidades de Terras Indígenas. http://www.funai.gov.br/index.php/indios-no-brasil/terras-indigenas
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).

O território indígena, entretanto, não depende desse tipo de processo político-jurídico para que exista. Ele necessita apenas que um determinado fragmento do espaço seja ocupado e utilizado por determinado povo indígena na construção de suas relações sociais e de poder. Isso quer dizer que quando utilizamos na pesquisa o conceito de territórios indígenas estamos nos referindo aos diferentes territórios indígenas localizados nos diferentes territórios políticos-jurídicos, sejam eles em terra indígena, em unidades de conservação, nas cidades e outros. Isso implica também em normativas criadas pelo estado para o uso do território: há diferenças explícitas entre as comunidades em terras indígenas e as que não estão. Isto porque estas são regidas pelas Constituição Federal de 1988, Convenção no. 169 da Organização Internacional do Trabalho, além do ordenamento territorial promovido pela Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI).

Balza Alcarón (2001, p. 80)Balza Alcarón, R. (2001). Tierra, territorio y territorialidad indígena: un estudio antropológico sobre la evolución en las formas de ocupación del espacio del pueblo indígena chiquitano de la ex-reducción jesuíta de San José. APCOB/SNV/IWGI., em seu estudo antropológico sobre a evolução e formas de ocupação do povo indígena chiquitano (Bolívia/Brasil), definiu como território indígena: “todo o espaço que atualmente é imprescindível para que um povo indígena tenha acesso a recursos naturais que possibilitam sua reprodução material e espiritual, segundo suas características próprias de organização produtiva e social”. Essa definição corrobora o apresentado por Gallois (2004)Gallois, D. T. (2004). Terras ocupadas? Territórios? Territorialidades? Terra, 37–41., segundo o qual o território indígena é a relação da sociedade indígena com sua base territorial, isto é, têm-se espaços para a reprodução de sua vivência material como também espaços que mantêm preservados recursos para seu bem-estar.

Um termo comumente utilizado para se referir aos territórios indígenas é comunidade/aldeia indígena. Tal termo se une ao sentido tautológico e menos pontiagudo (como tribo, por exemplo) para nomear esses territórios, onde, por parte da Antropologia, a comunidade indígena representa as “redes de relações que se podem chamar de indígenas” [itálico nosso] (Viveiros de Castro, 2006Viveiros de Castro, E. (2006). “No Brasil, todo mundo é índio, exceto quem não é.” Isa-Sp, 1–20. https://pib.socioambiental.org/files/file/PIB_institucional/No_Brasil_todo_mundo_é_índio.pdf.
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, p. 14), sendo elas relações de parentesco ou de vizinhança.

Assim, toda terra indígena é um território indígena, mas nem todo território indígena é uma terra indígena (no sentido político-jurídico). Ambos os conceitos utilizam o termo “comunidade/aldeia” para nomear determinado território ou vários dentro de um território maior.

Outro fator a ser considerado nessa reflexão de “turismo em territórios indígenas” é que, dentre as diferentes abordagens do tema, surge a questão: o etnoturismo/turismo étnico e o turismo indígena, não seriam a mesma coisa?

Pereiro (2016)Pereiro, X. (2016). A review of Indigenous tourism in Latin America: reflections on an anthropological study of Guna tourism (Panama). Journal of Sustainable Tourism. https://doi.org/10.1080/09669582.2016.1189924
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apresenta que o turismo étnico se refere à experiência do turista com diferentes comunidades étnicas e suas raízes. O turismo cultural seria um grande nicho de segmentação do turismo que identifica as experiências dos turistas no turismo étnico. Já o turismo indígena está voltado ao modo de vida dos povos indígenas, a partir de um modelo sustentável e responsável, vinculando-o também às pautas dos movimentos indígenas.

Carr, Ruhanen e Whitford (2016)Carr, A., Ruhanen, L., & Whitford, M. (2016). Indigenous peoples and tourism: the challenges and opportunities for sustainable tourism. Journal of Sustainable Tourism. https://doi.org/10.1080/09669582.2016.1206112
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corroboram tal perspectiva reforçando que as comunidades étnicas são formadas por imigrantes que não passaram pelo mesmo processo dos indígenas. Ou seja, o turismo indígena não caberia nesta definição de “étnico”, uma vez que os sujeitos da atividade, ou seja, a população indígena, é autóctone ou nativa da região, que passou (e passa) pela luta a suas terras e o uso conforme cosmologia do grupo indígena.

Já para Butler e Hinch (2007)Butler, R., & Hinch, T. (2007). Tourism and indigenous peoples: issues and implications (1st ed.). Elsevier. https://doi.org/10.4324/9780080553962
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o turismo indígena é aquele em que necessariamente toda a estrutura do turismo é dominada pelos indígenas, a exemplo da propriedade de empreendimentos, da prestação de serviços e de um modelo próprio de gestão do turismo, ao qual poderíamos assemelhar ao TBC em comunidades indígenas no Brasil.

O domínio dos povos indígenas sobre os empreendimentos seria uma característica do controle cultural frente ao turismo. Entretanto, ao levantar produções sobre etnoturismo não há tal pressuposto. Pelo contrário.

Estudos de caso latino-americanos com enfoque no etnoturismo, trazem uma abordagem crítica sobre como indígenas têm performado e reproduzido o papel de "índio cultural". Ao ser convertido em “objeto exótico” ou “human zoo” (Arnaut, 2011Arnaut, K. (2011). The human zoo after Abu Ghraib: performance and subalternity in the “cam era”, 2000–2003.) para o consumo do turista em troca de algum retorno financeiro, dentre um contexto onde as comunidades estavam em situação de pobreza, estes encontraram nesta identidade indígena, construída para o etnoturismo, um espaço de inclusão no mercado. Diante disso, a proposta de valorização da cultura seria apenas a mercantilização do patrimônio cultural, não alterando as relações de controle ou de tomadas de decisões, reproduzindo a ação de exploração econômica e cultural, assim como empresas privadas de turismo, que não têm compromisso com responsabilidade social (Ortiz de Zevallos, 2008Ortiz de Zevallos, A. C. (2008). La construcción de la cultura para el consumo en el caso de Nuevo Perú. Anthropologica, XXVI(26), 113–142.; Repetto & Burgos, 2014Repetto, F. F., & Burgos, I. E. (2014). Esencialización y espectacularización de lo maya. Turismo voluntario y étnico en una comunidad yucateca. Península, 9(1), 9–31. https://doi.org/10.1016/S1870-5766(14)70118-7
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; Torres Fernández, 2010Torres Fernández, P. (2010). La transformación de lo étnico en producto turístico en la provincia de Chaco, Argentina. Runa, 31(1), 89–107. http://www.scielo.org.ar/scielo.php?pid=S1851-96282010000100005&script=sci_arttext&tlng=en
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).

Diante destas discussões, entende-se por turismo em territórios indígenas todo o tipo de atividade turística que ocorre nos diferentes territórios (terra indígena, comunidades/aldeia em unidade de conservação ou em área urbana/rural), onde há o envolvimento dos agentes intermediários: lideranças/grupos de trabalhos indígenas, organizações governamentais, não-governamentais e empresas de turismo, na estruturação do turismo no território. Os papéis estabelecidos e desempenhados por cada ator da atividade são fundamentais no processo de compreensão do modelo de turismo nesses territórios.

Os agentes intermediários se referem aos atores que intermediam a articulação do turismo no território, sejam eles da esfera pública, privada ou local. É a partir dos acordos e estruturações feitas por tais atores que se chega à relação entre turistas e visitados. Esta é uma forma de ter claro que não basta analisar o impacto sociocultural do encontro de ambos, se há uma estrutura que os precede e que vai ditar a forma como o encontro ocorrerá.

O fluxograma a seguir (Figura 1) situa a organização proposta sobre turismo em territórios indígenas a partir das diferentes características que o compõe.

Figura 1
Fluxograma situando o turismo em territórios indígenas

A proposta de situar o turismo em territórios indígenas por meio do fluxograma acima é apresentar uma visualização mais clara das diversas categorias que compõem este turismo, saindo da visão de conceituação clássica de segmentação, e ampliando para as outras possibilidades ao se partir da compreensão de que: há diferentes tipos de territórios (que vão implicar em questões normativas e de organização legal do território), há segmentos, há tipos de desenvolvimentos, há diferentes atuações dos indígenas frente ao tipo de desenvolvimento e há mais atores do que apenas turistas e visitados para uma análise de impacto sociocultural.

2.2 Impactos socioculturais à luz do desenvolvimento do turismo

Os aspectos socioculturais influenciados pelo turismo em uma determinada comunidade aparecem na literatura como impactos socioculturais. Esta pesquisa, no caso, ateve-se às produções de autores da Antropologia do Turismo (Grünewald, 1999Grünewald, R. de A. (1999). Os ‘Índios do Descobrimento’: Tradição e Turismo., 2003Grünewald, R. de A. (2003). Turismo e etnicidade. Horizontes Antropológicos, 9(20), 141–159. https://doi.org/10.1590/S0104-71832003000200008
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; Santana, 2008Santana, A. (2008). Antropología y Turismo: Nuevas hordas, viejas culturas? Editora Ariel.; Graburn, 2009Graburn, N. (2009). Antropologia ou antropologias do turismo? In Turismo e antropologia: novas abordagens (pp. 13–52). Papirus.; Marín Guardado, 2015Marín Guardado, G. (2015). Turismo: espacios y culturas en trasnformación. Desacatos, (47), 06–15. http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1607-050X2015000100001&lng=es&nrm=iso&tlng=es
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; Neves, 2017Neves, S. C. (2017). A Domesticação do Turismo: estratégias Pataxó na relação com agentes e agências de turismo em Coroa Vermelha. PASOS Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 13(3), 567–580. https://doi.org/10.25145/j.pasos.2015.13.040
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, 2019Neves, S. C. (2019). Aspectos culturais do turismo. In B. M. Augusto Gomes & M. Bahl (Eds.), Turismo e Sociedade: aspectos teóricos (pp. 35–52). All Print Editora.; Pereiro & Fernandes, 2018Pereiro, X., & Fernandes, F. (2018). Antropologia e Turismo : teorias , métodos e praxis. (June 2018).).

Os primeiros estudos antropológicos em turismo versavam, em sua maioria, sobre mudança sociocultural, principalmente, pelo viés da teoria da aculturação (Pereiro & Fernandes, 2018Pereiro, X., & Fernandes, F. (2018). Antropologia e Turismo : teorias , métodos e praxis. (June 2018).). Isso porque o tema da mudança cultural ganhou notoriedade a partir da Segunda Guerra Mundial, ao se perceber que as mudanças de valores, crenças e ideais acontecem quando são agregados novos elementos, por meio de intervenções ou inovações culturais, do empréstimo de elementos culturais ou por falhas na transmissão do conhecimento de uma geração para outra (Santana, 2008Santana, A. (2008). Antropología y Turismo: Nuevas hordas, viejas culturas? Editora Ariel.). Especificamente sobre o turismo, Graburn (2009, p. 18)Graburn, N. (2009). Antropologia ou antropologias do turismo? In Turismo e antropologia: novas abordagens (pp. 13–52). Papirus. aponta que “experts dos próprios países colonizadores [aconselharam as nações mais pobres] a desenvolver o turismo para obter divisas e gerar empregos”.

Os estudos sobre impactos do turismo abordavam uma visão mais simplista, restringindo-os a interação entre visitante e visitados, onde “a presença dos turistas era o vetor da mudança, cujo modo de vida tradicional era irreparavelmente alterado” (Graburn, 2009Graburn, N. (2009). Antropologia ou antropologias do turismo? In Turismo e antropologia: novas abordagens (pp. 13–52). Papirus., p. 19). Os indígenas eram retratados como ‘esponjas’ que apenas absorviam tais impactos e, logo, ocorreriam as mudanças advindas desse contato, sem considerar fatores como: poder de decisão desses povos, agentes intermediários, tipo de estrutura de desenvolvimento do turismo, outros impactos não relacionados ao turismo e um viés mais moderado quanto aos impactos negativos e positivos da atividade.

As principais limitações dessa abordagem eram: a visão romântica das comunidades como harmônicas, perspectiva limitada quanto à agência dos indígenas, sua capacidade de gestão e de resistência, partindo da compreensão de cultura como algo “essencialista, homogeneizadora e petrificadora”, e certa inabilidade em distinguir quais os impactos do turismo e quais as de outros processos (Marín Guardado, 2015Marín Guardado, G. (2015). Turismo: espacios y culturas en trasnformación. Desacatos, (47), 06–15. http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1607-050X2015000100001&lng=es&nrm=iso&tlng=es
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, p. 10).

A partir dos anos 2000, a teoria da “aculturação” e a análise funcionalista começaram a ser deixados de lado, adotando-se, então, “(...) modelos teóricos mais híbridos e mestiços, aos fluxos, às fronteiras e transversalidades, às reelaborações, recriações e reinvenções culturais” (Pereiro & Fernandes, 2018Pereiro, X., & Fernandes, F. (2018). Antropologia e Turismo : teorias , métodos e praxis. (June 2018)., p. 212), assumindo o poder das comunidades como agentes ativos nos processos de mudança, resistência e negociação.

Junto a essa evolução dos estudos e da literatura, os impactos socioculturais foram e são amplamente discutidos dentro de categorias como autenticidade ou tradição. Assim, segue uma síntese, em linhas gerais (Figura 2), das principais categorias de discussão que circundam o tema e sua relação com o turismo (Cooper et al., 2001Cooper, C., Fletcher, J., Wanhill, S., Gilbert, D., & Shepherd, R. (2001). Turismo: príncipios e práticas (2nd ed.). Bookman.; Deery et al., 2012Deery, M., Jago, L., & Fredline, L. (2012). Rethinking social impacts of tourism research: A new research agenda. Tourism Management. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2011.01.026
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; Graburn, 2009Graburn, N. (2009). Antropologia ou antropologias do turismo? In Turismo e antropologia: novas abordagens (pp. 13–52). Papirus.; Grünewald, 1999Grünewald, R. de A. (1999). Os ‘Índios do Descobrimento’: Tradição e Turismo., 2003; Neves, 2017Neves, S. C. (2017). A Domesticação do Turismo: estratégias Pataxó na relação com agentes e agências de turismo em Coroa Vermelha. PASOS Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 13(3), 567–580. https://doi.org/10.25145/j.pasos.2015.13.040
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, 2019; Repetto & Burgos, 2014Repetto, F. F., & Burgos, I. E. (2014). Esencialización y espectacularización de lo maya. Turismo voluntario y étnico en una comunidad yucateca. Península, 9(1), 9–31. https://doi.org/10.1016/S1870-5766(14)70118-7
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).

Figura 2
Principais categorias de discussão sobre impacto sociocultural

É importante destacar que esta pesquisa está baseada no pressuposto de que, para compreender a natureza dos impactos socioculturais, é necessária uma descrição e análise do processo de desenvolvimento turístico no local, pois, a velocidade e o tipo de desenvolvimento turístico afetam diretamente a intensidade e a direção das mudanças socioculturais (Cooper et al., 2001Cooper, C., Fletcher, J., Wanhill, S., Gilbert, D., & Shepherd, R. (2001). Turismo: príncipios e práticas (2nd ed.). Bookman.), levantando a seguinte questão: de qual tipo de desenvolvimento do turismo estamos falando?

Se até 1990 a única perspectiva de desenvolvimento pairava sob o modelo de turismo convencional (ou de desenvolvimento mainstream), é a partir dessa década que os modelos de desenvolvimento alternativo (Esteva, 2010Esteva, G. (2010). Development. In W. Sachs (Ed.), Development Dictionary : a Guide To Knowledge As Power (2nd ed., pp. 1–23). Zed Books.), em particular o desenvolvimento sustentável, ganharam notoriedade e espaço, de produções científicas a políticas públicas. Entretanto, é necessária parcimônia na utilização do conceito devido a sua vasta utilização como panaceia, seguida da dificuldade em se alcançar todas as dimensões da sustentabilidade em um destino.

Além do desenvolvimento sustentável, é necessário dar ênfase também ao etnodesenvolvimento, visto que ele surge no contexto latino-americano como resultado das pressões internacionais sobre direitos humanos e meio ambiente, para se estabelecer uma nova política indigenista frente ao que se determinava como desenvolvimento (Lima de Souza & Barroso-Hoffmann, 2002Lima de Souza, A. C., & Barroso-Hoffmann, M. (2002). Questões para uma política indi­genista: etnodesenvolvimento e políticas públicas. Uma apresentação. In A. C. Lima de Souza & M. Barroso-Hoffmann (Eds.), Etnodesenvolvimento e políticas públicas: bases para uma nova política indigenista. (pp. 7–28). Contra Capa.), a fim de romper com políticas etnocidas e etnocráticas (Bonfil Batalla, 1995Bonfil Batalla, G. (1995). Etnodesarrollo: sus premisas jurídicas, políticas y de organización. Obras Escogidas de Guillermo Bonfil Batalla, 2 (1995), 464–480. http://recursos.udgvirtual.udg.mx/biblioteca/bitstream/20050101/1269/2/el_etnodesarrollo.pdf
http://recursos.udgvirtual.udg.mx/biblio...
; Stavenhagen, 1985Stavenhagen, R. (1985). Etnodesenvolvimento: Uma Dimensão Ignorada no Pensamento Desenvolvimentista. Anuário Antropológico, 84, 11–44. http://www.dan.unb.br/images/pdf/anuario_antropologico/Separatas1984/anuario84_rodolfostavenhagen.pdf
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). Neste aspecto, o papel dos movimentos indígenas foi fundamental para uma nova concepção de desenvolvimento.

Contudo, nota-se a ausência da discussão do etnodesenvolvimento no turismo em detrimento da discussão do desenvolvimento sustentável; ou, quando há, tende-se a vê-los como sinônimos; e não são, já que o etnodesenvolvimento se baseia num contexto onde as sociedades indígenas desenvolvem autonomia para controlarem seus territórios, sua organização social, sua cultura, suas relações de negócio etc. (Bonfil Batalla, 1995Bonfil Batalla, G. (1995). Etnodesarrollo: sus premisas jurídicas, políticas y de organización. Obras Escogidas de Guillermo Bonfil Batalla, 2 (1995), 464–480. http://recursos.udgvirtual.udg.mx/biblioteca/bitstream/20050101/1269/2/el_etnodesarrollo.pdf
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; Stavenhagen, 1985Stavenhagen, R. (1985). Etnodesenvolvimento: Uma Dimensão Ignorada no Pensamento Desenvolvimentista. Anuário Antropológico, 84, 11–44. http://www.dan.unb.br/images/pdf/anuario_antropologico/Separatas1984/anuario84_rodolfostavenhagen.pdf
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).

Os estudos sobre impactos estão cada vez mais “alinhados à busca de soluções, sob a rubrica da “sustentabilidade”” (Graburn, 2009Graburn, N. (2009). Antropologia ou antropologias do turismo? In Turismo e antropologia: novas abordagens (pp. 13–52). Papirus., p. 37), onde, dentre as questões pesquisadas, inclui-se uma atenção ao TBC.

De modo geral, o TBC é um modelo de gestão de desenvolvimento do turismo que visa uma base endógena, desde a iniciativa até o desenvolvimento local. Este modelo está amparado na premissa de desenvolvimento alternativo, propondo a integração entre os atores e os benefícios econômicos. Trata-se de uma atividade de baixo impacto negativo, tanto sob o aspecto social quanto ambiental, uma vez que possui uma menor escala de visitantes em comparação aos destinos do turismo de massa, promovendo a interculturalidade, a participação e o protagonismo das comunidades locais no planejamento, na implementação e na avaliação de projetos turísticos, trazendo as comunidades locais para o controle do turismo em aspectos de propriedade, gestão e benefícios (Alfonso & López, 2010Alfonso, M. J. P., & López, D. G. (2010). Impactos socioculturales en el turismo comunitario : una visión desde los pueblos implicados. Aguaclara.; Irving, 2009Irving, M. D. A. (2009). Reinventando a reflexão sobre turismo de base comunitária: inovar é possível? In I. Bartholo, Roberto; Sansolo, Davis Gruber; Bursztyn (Ed.), Turismo de Base Comunitária: diversidade de olhares e experiências brasileiras (1st ed., pp. 142–161). Letra e Imagem.; Maldonado, 2009Maldonado, C. (2009). O Turismo Rural Comunitário na América Latina: gênesis, características e políticas. In I. Bartholo, Roberto; Sansolo, Davis Gruber; Bursztyn (Ed.), Turismo de Base Comunitária: diversidade de olhares e experiências brasileiras (1st ed., pp. 25–44). Letra e Imagem. https://periodicos.unifesp.br/index.php/ecoturismo/article/download/6569/4194/32773
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; Mayaka et al., 2019Mayaka, M., Croy, W. G., & Wolfram Cox, J. (2019). A dimensional approach to community-based tourism: Recognising and differentiating form and context. Annals of Tourism Research, 74(November 2018), 177–190. https://doi.org/10.1016/j.annals.2018.12.002
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; Saayman et al., 2014Saayman, M., Jugmohan, S., & Giampiccoli, A. (2014). Developing community-based tourism in South Africa: addressing the missing link. African Journal for Physical Health Education, Recreation(20), 1139–1161.).

O TBC tem sido o principal modelo de gestão e de desenvolvimento de turismo, recomendado aos diferentes territórios indígenas no Brasil (FUNAI, 2015Fundação Nacional do Índio (2015). Instrução Normativa No03/2015.; Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade [ICMBio], 2018Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (2018). Turismo de Base Comunitária em Unidades de Conservação Federais: Princípios e diretrizes. http://www.icmbio.gov.br/portal/ultimas-noticias/20-geral/9609-pratica-incentiva-o-turismo-de-base-comunitaria-em-ucs
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). Fato que não causa estranheza, visto que seu próprio surgimento ocorreu na América Latina, em 1980, como Turismo Rural Comunitário (TRC) como aponta Maldonado (2009)Maldonado, C. (2009). O Turismo Rural Comunitário na América Latina: gênesis, características e políticas. In I. Bartholo, Roberto; Sansolo, Davis Gruber; Bursztyn (Ed.), Turismo de Base Comunitária: diversidade de olhares e experiências brasileiras (1st ed., pp. 25–44). Letra e Imagem. https://periodicos.unifesp.br/index.php/ecoturismo/article/download/6569/4194/32773
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. Ele foi mobilizado por comunidades indígenas e campestres devido às “pressões mundiais do mercado turístico” sobre seus patrimônios culturais e naturais, como consequência do crescimento de um segmento cultural e natural do turismo nesses territórios (Maldonado, 2009Maldonado, C. (2009). O Turismo Rural Comunitário na América Latina: gênesis, características e políticas. In I. Bartholo, Roberto; Sansolo, Davis Gruber; Bursztyn (Ed.), Turismo de Base Comunitária: diversidade de olhares e experiências brasileiras (1st ed., pp. 25–44). Letra e Imagem. https://periodicos.unifesp.br/index.php/ecoturismo/article/download/6569/4194/32773
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, p. 26). As áreas campestres da América Latina foram inseridas no movimento global de combate à pobreza, sendo o turismo uma das principais atividades econômicas estimuladas nesses locais por países do Norte global (Graburn, 2009Graburn, N. (2009). Antropologia ou antropologias do turismo? In Turismo e antropologia: novas abordagens (pp. 13–52). Papirus.; Maldonado, 2009Maldonado, C. (2009). O Turismo Rural Comunitário na América Latina: gênesis, características e políticas. In I. Bartholo, Roberto; Sansolo, Davis Gruber; Bursztyn (Ed.), Turismo de Base Comunitária: diversidade de olhares e experiências brasileiras (1st ed., pp. 25–44). Letra e Imagem. https://periodicos.unifesp.br/index.php/ecoturismo/article/download/6569/4194/32773
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; Santana, 2008Santana, A. (2008). Antropología y Turismo: Nuevas hordas, viejas culturas? Editora Ariel.).

No Brasil, desde 2015, para a regulamentação do turismo em Terras Indígenas (TIs) é necessária a criação de um plano de visitação a ser apresentado à FUNAI, baseado no TBC, com enfoque nos segmentos de ecoturismo, etnoturismo e/ou turismo de pesca (FUNAI, 2015Fundação Nacional do Índio (2015). Instrução Normativa No03/2015.). No caso das Unidades de Conservação (UCs) é recomendado que o turismo siga os princípios do TBC visando compatibilizar as diretrizes das UCs ao desenvolvimento local nas comunidades tradicionais e indígenas (ICMBio, 2018Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (2018). Turismo de Base Comunitária em Unidades de Conservação Federais: Princípios e diretrizes. http://www.icmbio.gov.br/portal/ultimas-noticias/20-geral/9609-pratica-incentiva-o-turismo-de-base-comunitaria-em-ucs
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).

Essas políticas, organizadas aos moldes do TBC, levam à reflexão: quais os impactos socioculturais se relacionam ao TBC em territórios indígenas? Uma resposta para isso é vincular a análise dos impactos socioculturais à análise do TBC.

Fabrino (2018, p. 313)Fabrino, N. H. (2018). Turismo de Base Comunitária: proposição de um instrumento de análise. In E. P. do Nascimento & H. A. Costa (Eds.), Turismo e Sustentabilidade: verso e reverso (1st ed., pp. 309–328). Garamond. propõe um instrumento de análise das iniciativas de TBC após uma compilação de “princípios, premissas, objetivos e componentes do TBC encontrados na literatura”, podendo ser aplicado em diferentes localidades, a partir de um quadro formado por sete categorias gerais compostas por critérios de análise e de verificação/subcritérios.

Para a análise dos impactos socioculturais, compilou-se (Quadro 1) as categorias apresentadas por Deery et al. (2012)Deery, M., Jago, L., & Fredline, L. (2012). Rethinking social impacts of tourism research: A new research agenda. Tourism Management. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2011.01.026
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e Cooper et al. (2001Cooper, C., Fletcher, J., Wanhill, S., Gilbert, D., & Shepherd, R. (2001). Turismo: príncipios e práticas (2nd ed.). Bookman., 2007)Cooper, C., Fletcher, J., Wanhill, S., Gilbert, D., & Shepherd, R. (2007). Turismo: príncipios e práticas (3rd ed.). Bookman., com 14 e 32 categorias, respectivamente. Estas, materializam o que está sendo estabelecido como impacto sociocultural e se são aplicáveis ou não ao presente estudo.

Quadro 1
Compilação de categorias do TBC e de impacto sociocultural Compilação de categorias do TBC e de impacto sociocultural

Para Cooper et al. (2001, 2007), alguns fatores de desenvolvimento econômico são entendidos como impactos socioculturais indiretos, entre os quais, as novas formas de comunicação, o transporte e a infraestrutura. Butler e Hinch (2007)Butler, R., & Hinch, T. (2007). Tourism and indigenous peoples: issues and implications (1st ed.). Elsevier. https://doi.org/10.4324/9780080553962
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apontam que o ‘turismo indígena’ é impactado por ambientes externos a eles, como o político, social, econômico e físico (natural/meio ambiente). Assim, é necessário identificar e diferenciar os impactos não relacionados ao turismo e que em um contexto geral de influências socioculturais, repercutem também nos rumos dos impactos específicos ao turismo.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa, de abordagem qualitativa, envolveu a coleta de dados por meio de fontes primárias e secundárias. A revisão da literatura foi realizada em duas fases: a primeira refere-se à busca por publicações que se encaixariam na abordagem da pesquisa ou de pesquisas já realizadas na Comunidade na plataforma do Google Acadêmico; a segunda, por meio de artigos disponíveis nas plataformas Science Direct, Scielo e Portal de Teses e Dissertações da CAPES.

A pesquisa de campo foi realizada no período de 25 de julho de 2018 a 02 de setembro de 2018. O processo da pesquisa foi dividido em dois locais: na comunidade e em Manaus. O território, as questões de deslocamento e algumas pessoas da comunidade já eram conhecidos, o que facilitou a inserção da pesquisadora na comunidade e um pré-levantamento de informações.

Figura 3
Cartograma de localização da Comunidade Indígena Nova Esperança (AM)

Diferentes técnicas de coleta de dados foram utilizadas na pesquisa de campo. No início, havia quatro indivíduos-chave que poderiam direcionar a outros. Para a ampliação dos entrevistados, a técnica bola de neve (snowball) foi utilizada, onde os entrevistados indicaram outras que possuem o perfil ou características de acordo com o objetivo da pesquisa (Vinuto, 2014Vinuto, J. (2014). A amostragem em Bola De Neve na Pesquisa Qualitativa: um debate em aberto. Temáticas, 0(44), 203–220. https://doi.org/10.20396/tematicas.v22i44.10977
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). A partir disso, outros potenciais indivíduos foram entrevistados. A técnica foi encerrada segundo os critérios estabelecidos de saturação. Dessa forma, chegou-se ao panorama do Quadro 1.

Quadro 2
Grupo de atores entrevistados e locais das entrevistas

Os critérios de saturação dos entrevistados ocorreram por meio da repetição de informações sobre a história da comunidade, história do turismo na comunidade, percepções sobre o turismo e os turistas na comunidade, como o turismo influenciou os rumos da pessoa entrevistada em aspectos de trabalho, ocupação do tempo e nas demais atividades cotidianas. Foram utilizados dois roteiros semiestruturados: um para as entrevistas com os indígenas (Apêndice II) e um para Instituições (Apêndice III).

Outro fator que influenciou as entrevistas e a observação participante foi a distribuição territorial das moradias por núcleos, pois do ponto de vista do envolvimento das famílias com o turismo e artesanato, foram identificados três núcleos, representados como 1, 2 e 3 no mapa abaixo (Figura 5) que mostra, especificamente, a área total da comunidade.

Figura 4
Disposição dos núcleos identificados em Nova Esperança

No primeiro núcleo estão algumas das famílias envolvidas com o turismo por meio da produção do artesanato; a maioria possui outras ocupações. No segundo, está a maioria das famílias envolvidas diretamente com o turismo. No terceiro, as famílias que não estão envolvidas com o turismo. Chegou a essa representação por núcleo, a partir das respostas obtidas com o questionário socioeconômico e observação no cotidiano.

Questionários fechados foram aplicados para o levantamento do perfil socioeconômico das famílias de Nova Esperança (Apêndice I) para a identificação das famílias envolvidas com turismo e/ou artesanato (ou outras atividades), além de outras informações como o número de pessoas que se autodeclaram como indígenas baré (possuindo o RANI - Registro Administrativo de Nascimento de Indígena - ou não). Nesse caso, por exemplo, das 116 pessoas da comunidade, 109 se identificaram como baré (dessas, apenas 81 possuem o RANI) e 17 como não-indígenas (mas que são de outras comunidades ribeirinhas ali da região).

Esse é um dado relevante, pois para que o turismo possa de contribuir com o fortalecimento do orgulho, da identidade e da cultural local (três indicativos de impacto sociocultural), é necessário que as pessoas da comunidade se entendem como tal, ainda mais no caso dos baré. Estes passaram por um longo processo de tentativas de apagamento da etnia baré desde as políticas coloniais, a exemplo das políticas pombalinas do séc. XVIII, até meados de 1990, e, assim, foram se dissociando em ser baré para ser caboclo amazônico (Figueiredo, 2016Figueiredo, P. M. (2016). Os Baré do Alto Rio Negro: breviário histórico. In M. Herrero & U. Fernandes (Eds.), Baré: povo do rio. Edições Sesc São Paulo.; França Baré, 2016França Baré, B. (2016). Origem do Povo Baré. In M. Herrero & U. Fernandes (Eds.), Baré: povo do rio. Edições Sesc São Paulo.; Garcia, 2017Garcia, E. F. (2017). O projeto pombalino de imposição da língua portuguesa aos índios e a sua aplicação na América meridional. Tempo, 12(23), 23–38. https://doi.org/10.1590/s1413-77042007000200003
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; Herrero & Fernandes, 2016Herrero, M., & Fernandes, U. (2016). Baré: povo do rio (2nd ed.). Edições Sesc São Paulo.). O processo de reconhecimento como baré no Alto Rio Negro começou apenas em 1990 como aponta França Baré (2016)França Baré, B. (2016). Origem do Povo Baré. In M. Herrero & U. Fernandes (Eds.), Baré: povo do rio. Edições Sesc São Paulo.. Esse fenômeno de reconstrução e/ou reaparecimento de identidades indígenas, resgate de memórias, da língua, que até então estavam submersas na identidade cabocla ou outras, ficou conhecida como etnogênese (Bartolomé, 2006Bartolomé, M. A. (2006). As etnogêneses: velhos atores e novos papéis no cenário cultural e político. Mana, 12(1), 39–68. https://doi.org/10.1590/s0104-93132006000100002
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; Mauro, 2013Mauro, V. F. (2013). Etnogênese E Reelaboração Da Cultura Entre Os Krahô-Kanela E Outros Povos Indígenas. Espaço Ameríndio, 7(1), 37. https://doi.org/10.22456/1982-6524.33293
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).

Quanto aos turistas, ao invés da realização de entrevistas, foram observados o processo e a articulação da comunidade com a sua chegada, bem como a forma como acontece a visita e o pós-visita. Isso porque não foi considerada a possibilidade de um fluxo de turistas de agências convencionais na comunidade, e, sim, os vindos apenas pelo roteiro de TBC, o que não ocorreu.

A construção da análise dos dados foi baseada na triangulação dos dados (Alves & Silva, 1992Alves, Z. M. M. B. M. M. B., & Silva, M. H. G. F. D. da. (1992). Análise qualitativa de dados de entrevista: uma proposta . Paidéia (Ribeirão Preto) , 61–69. https://doi.org/10.1590/S0103-863X1992000200007
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; Minayo, 2012Minayo, M. C. de S. (2012). Análise qualitativa: Teoria, passos e fidedignidade. Ciencia e Saude Coletiva, 17(3), 621–626. https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000300007
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; Pereiro & Fernandes, 2018Pereiro, X., & Fernandes, F. (2018). Antropologia e Turismo : teorias , métodos e praxis. (June 2018).), obtidos por meio das entrevistas semiestruturadas transcritas na íntegra, da observação participante e da análise documental do Plano de Gestão, do antigo perímetro Parque Estadual, que situa todo o território, além de legislações que tratam sobre o tema.

A pesquisa foi autorizada verbalmente pelas lideranças da Comunidade e por documentação pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amazonas (Autorização No 134/2017 – DEMUC/SEMA). O “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido” e o “Termo de Autorização de uso de imagem e voz” foram utilizados, onde a pesquisa e o posterior uso dos dados foram esclarecidos aos participantes, obedecendo ao que está previsto na Resolução do CNS nº 466/12.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Comunidade Indígena Nova Esperança está assentada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Puranga Conquista junto a outras quatro comunidades indígenas apenas no Rio Cuieiras, sem contar as demais na RDS. Isso traz a discussão de que o turismo não está restrito às Terras Indígenas. Porém, as políticas de desenvolvimento do turismo envolvendo povos indígenas, por parte da FUNAI, estão voltadas apenas às Terras Indígenas, ficando, então, os demais territórios na lacuna da Instrução Normativa No 03/2015 da FUNAI que trata sobre a regulamentação do turismo em terras indígenas (FUNAI, 2015Fundação Nacional do Índio (2015). Instrução Normativa No03/2015.).

Assim, a regulamentação do turismo em territórios indígenas dentro de RDS depende das normativas vigentes para essa categoria de UC, e não necessariamente a instituída pela FUNAI. Ou seja, a instrução normativa criada pela FUNAI tem como base um tipo de território, e não os diferentes povos indígenas em si, ficando essa lacuna de atuação e acompanhamento da FUNAI sobre os demais casos. Isso pode ser entendido também como um modelo que poderia ser adotado pelas RDSs, levando em conta suas particularidades normativas e de regulação do território que diferem de Terra Indígena.

É importante se atentar então ao território em que estão as comunidades indígenas e suas normativas, visto que a trajetória de políticas públicas e a própria atuação de órgãos federais e estaduais ocorrerá de forma distinta, e isso vai influenciar diretamente o contexto socioespacial de comunidades e, consequentemente, os desdobramentos do turismo.

Apenas em 2018, o TBC em Unidades de Conservação Federal ganhou um documento com diretrizes. Esse documento é voltado principalmente aos gestores das UCs e seus princípios e diretrizes unem a conservação ambiental, a salvaguardas das culturas e histórias das comunidades locais e do protagonismo comunitário, interligando-se aos princípios estabelecidos no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (ICMBio, 2018Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (2018). Turismo de Base Comunitária em Unidades de Conservação Federais: Princípios e diretrizes. http://www.icmbio.gov.br/portal/ultimas-noticias/20-geral/9609-pratica-incentiva-o-turismo-de-base-comunitaria-em-ucs
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).

Esse documento apresenta o TBC como “um modelo de gestão da visitação protagonizado pela comunidade, gerando benefícios coletivos, promovendo a vivência intercultural, a qualidade de vida, a valorização da história e da cultura dessas populações, bem como a utilização sustentável para fins recreativos e educativos, dos recursos da Unidade de Conservação” (ICMBio, 2018Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (2018). Turismo de Base Comunitária em Unidades de Conservação Federais: Princípios e diretrizes. http://www.icmbio.gov.br/portal/ultimas-noticias/20-geral/9609-pratica-incentiva-o-turismo-de-base-comunitaria-em-ucs
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, p. 10).

No caso da RDS Puranga Conquista, não há, até o presente momento, um Plano de Gestão e Manejo, e o TBC nem sempre foi e, para algumas comunidades indígenas, ainda não é a realidade.

No caso da atividade turística em Nova Esperança, conforme já apresentado anteriormente, ela iniciou-se em 2000 com o recebimento de pequenas embarcações para a venda de artesanato. Em 2003, houve uma intensificação deste tipo de turismo, mas foi em 2005 que ele se consolidou aos moldes do turismo convencional - mencionado pelos entrevistados como turismo de massa - com a inserção de um navio cruzeiro no roteiro de visitas. Tal modelo de visitação, pautado por premissas exógenas, teve dois principais impactos na comunidade:

  1. O artesanato e o turismo foram tidos como oportunidade de fonte de renda, em alternativa ao extrativismo de madeira da região, que até então era a única opção, mudando gradualmente para esta nova atividade econômica; e,

  2. Inicialmente, havia poucas pessoas que faziam artesanato. Com o aumento do número de turistas e a venda mais frequente dos artesanatos, mais pessoas foram incorporando a atividade. Hoje são 20 artesãos que trabalham com insumos da floresta para confecção de diferentes peças.

Todas as quartas-feiras recebiam de 150 a 200 turistas, para uma população com cerca de 60 pessoas, que deveriam ser recepcionados a partir da caracterização de ‘índio cultural’ utilizando indumentárias (geralmente utilizadas para datas festivas e comemorativas) e o território precisava estar sempre limpo e organizado. Eles representavam a dança do Dabucuri1 1 A cerimônia do Dabucuri é comum em comunidade indígenas do Alto Rio Negro e envolve cantos, danças, bebidas e alimentos como frutas, peixes e produtos artesanais. É feito com o intuito de reforçar alianças entre familiares ou com outras famílias. De acordo com Figueiredo (2009) o dabucuri Baré foi sendo incorporado em comemorações de santos. com o grupo de crianças e adultos, apresentavam a culinária indígena e colocavam à venda os artesanatos. Toda a produção para receber os turistas não era paga, com o discurso de que os turistas comprariam os artesanatos, porém, nem sempre compravam.

Essas diretrizes foram levadas pela empresa do navio cruzeiro e acordadas com as lideranças da comunidade, que inicialmente entenderam como algo benéfico. Conforme foi passando o tempo, a comunidade começou a perceber que era muito trabalho para pouca/nenhuma remuneração direta, que nem sempre os grupos compravam os artesanatos ou compravam só de alguns artesãos, ficando outros sem remuneração. Esse modelo de turismo convencional foi causando indignação na comunidade e, o que inicialmente foi visto como benéfico, terminou com o sentimento de exploração. Com o fim do contrato de cinco anos, eles se recusaram a continuar recebendo a empresa. Os impactos socioculturais nesse período podem ser associados a: número maior de turistas em relação à população local, efeito demonstração/exibição e geração de renda apenas para algumas das famílias diretamente vinculadas ao turismo e artesanato e comercialização da arte/cultura vinculado ao modelo vertical e exógeno do turismo.

Esse modelo de turismo levado pelo navio cruzeiro representa bem o chamado desenvolvimento mainstream ou, no caso, o turismo mainstream, onde a exploração de comunidade indígena tem como resultado o lucro para esse agente externo. Se antes eles eram explorados pelos ‘senhores da madeira’ na região, agora eram explorados pelos ‘senhores do turismo’. A exploração em cima do trabalho cultural dos baré desvela uma situação agravante: a exploração do imaginário e estereótipo indígena vinha acompanhada da exploração da força de seu trabalho, que antecedia a visitação em si, já que se dava pela organização e modelo de turismo acordada com a empresa.

Tal situação leva à reflexão de que talvez o problema não seja a exposição da cultura em si, já que eles também estão escolhendo isso, ou seja, exercendo fronteiras étnicas e a alteridade (Neves, 2017Neves, S. C. (2017). A Domesticação do Turismo: estratégias Pataxó na relação com agentes e agências de turismo em Coroa Vermelha. PASOS Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 13(3), 567–580. https://doi.org/10.25145/j.pasos.2015.13.040
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). A questão mais ampla, que sai do campo da cultura para o do desenvolvimento, é que esse modelo de turismo era baseado num sistema de exploração que os via e os mantinha apenas como objetos, subalternizando quem ‘presta o serviço’ e eliminando quaisquer responsabilidades para/com aqueles indígenas. Seria uma espécie de visão de ‘favor’ em levar os turistas para a comunidade, quando, na verdade, um necessita do outro no sistema de oferta e demanda. Esse tipo de situação é apresentado por Proença e Panosso Netto (2020)Proença, A. R. G. B., & Panosso Netto, A. (2020). The Process of Tourism Transition and the Tourism Social Contract in Indigenous Area: The case of the Nova Esperança Indigenous Community (Rio Cuieras, Brasil). In W. Leal Filho, V. K. King, & I. B. de Lima (Eds.), Indigenous Amazonia, Regional Development and Territorial Dynamics: Contentious Issues. Springer. https://doi.org/10.1007/978-3-030-29153-2
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como “contrato social do turismo”. Tal situação se assemelha aos casos retratados em estudos latino-americanos sobre o etnoturismo (Ortiz de Zevallos, 2008Ortiz de Zevallos, A. C. (2008). La construcción de la cultura para el consumo en el caso de Nuevo Perú. Anthropologica, XXVI(26), 113–142.; Repetto & Burgos, 2014Repetto, F. F., & Burgos, I. E. (2014). Esencialización y espectacularización de lo maya. Turismo voluntario y étnico en una comunidad yucateca. Península, 9(1), 9–31. https://doi.org/10.1016/S1870-5766(14)70118-7
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; Torres Fernández, 2010Torres Fernández, P. (2010). La transformación de lo étnico en producto turístico en la provincia de Chaco, Argentina. Runa, 31(1), 89–107. http://www.scielo.org.ar/scielo.php?pid=S1851-96282010000100005&script=sci_arttext&tlng=en
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).

O discurso de valorização parece ser mais numa tentativa de amenizar práticas turísticas baseadas em um racismo contemporâneo, pois se constrói uma narrativa turística vinculada ao período colonial, à imagem do bom selvagem hospitaleiro, subserviente, que encontrará o turista exatamente como foi ilustrado nos livros de história do ensino básico, reforçando a história do colonizador e negando todo o processo de luta, de resistências, de reinvenções e contemporaneidades dos indígenas. Cabecinhas (2008, p. 173)Cabecinhas, R. (2008). Racismo e Xenofobia: a actualidade de uma velha questão. Comunicación e Cidadanía, 2, 148–162. corrobora a percepção acima ao discutir sobre os novos racismos e a instrumentalização de estereótipos:

As dimensões de conteúdo estruturantes dos estereótipos são a instrumentalidade e a competência para o grupo dominante e a expressividade e o exotismo para os grupos minoritários. Outro aspecto a salientar diz respeito aos papéis que são atribuídos a cada um dos grupos: ao grupo dominante são associados traços que remetem para um papel activo na sociedade (trabalhadores, empreendedores, etc.) enquanto que aos grupos minoritários são associados traços que remetem para um papel decorativo ou lúdico (cheios de ritmo, musicais, etc.). Assim, as representações raciais durante o período colonial continuam a estruturar o pensamento sobre nós e os outros, embora recorrendo a uma linguagem mais subtil.

Nota-se que fora da “arena turística”, é dificultado aos indígenas o acesso a vários espaços por afirmarem não ser “coisa de índio” ou que “estão deixando de ser índio”, mas reivindicam sua presença quando se trata de lucrar com sua imagem, força de trabalho e promover lazer para pessoas não-indígenas. E aí fica a questão: valorização do indígena sob a perspectiva de quem?

Com o término do contrato com a empresa turística, em 2010 teve início a atuação do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) na região, com oficinas de sensibilização sobre o turismo em Unidades de Conservação e TBC (Garrido Melo, 2014Garrido Melo, J. (2014). A experiência da comunidade indígena Nova Esperança (Manaus-Amazonas). In C. B. M. Costa Novo & J. G. da Cruz (Eds.), Turismo comunitário: reflexões no contexto Amazônico. EDUA.); e, em 2011, com a consagração de um planejamento turístico participativo, abordando aspectos de organização comunitária, artesanato, alimentos e bebidas, recepção de visitantes, farinhada, oficina de artesanato para o visitante e canoagem.

Em 2012, com o planejamento já finalizado, procedeu-se à sua integração no Roteiro TUCORIN (Turismo Comunitário no Rio Negro), porém, este não se consolidou, especialmente pelo fato de, em Nova Esperança, o fluxo de turistas ser de baixo a nulo. Apesar disso, todo esse processo de envolvimento no TBC trouxe para a comunidade outra compreensão sobre o turismo, sendo a atividade apropriada e articulada pelos próprios indígenas.

Assim, a análise a seguir foi feita a partir do proposto por Fabrino (2018)Fabrino, N. H. (2018). Turismo de Base Comunitária: proposição de um instrumento de análise. In E. P. do Nascimento & H. A. Costa (Eds.), Turismo e Sustentabilidade: verso e reverso (1st ed., pp. 309–328). Garamond., onde a autora indica sete elementos-chave para avaliar o TBC: Dominialidade, Organização Comunitária, Democratização de Oportunidades e Repartição de Benefícios, Integração Econômica, Interculturalidade, Gestão Ambiental e Comercialização e Promoção do TBC. De forma resumida:

  1. A comunidade está envolvida no processo de gestão do turismo;

  2. É a proprietária de empreendimentos turísticos (como o restaurante comunitário e a suíte em casa de uma família voltada a receber até 4 turistas);

  3. Estão organizados coletivamente, com divisão de papéis, onde criaram um grupo de trabalho para o TBC e um para o artesanato;

  4. No TBC estão envolvidas 13 pessoas e no artesanato 20 pessoas;

  5. As lideranças da comunidade fazem parte do Fórum de Turismo de Base Comunitária do Baixo Rio Negro, do Conselho Deliberativo da RDS, da Associação-Mãe e do Fórum Permanente de Defesa das Comunidades Ribeirinhas de Manaus;

  6. Além da venda do artesanato diretamente para os turistas, sua comercialização se dá também em lojas em Manaus, com foco no artesanato Amazônico, e ainda via comércio online, no site das Lojas Americanas buscando por “Jirau da Amazônia”;

  7. As experiências turísticas e a promoção de Nova Esperança por parceiros estão voltadas, principalmente, às práticas, lugares e objetos que compõem seu cotidiano amazônico, retratando-os como comunidade indígena contemporânea. A promoção não foca em adereços ou pintura indígenas como atrativo, e, sim, no dia a dia da comunidade;

  8. A comercialização do roteiro é feita por agência de turismo parceira que, além de intermediar o contato entre turista e comunidade, auxilia na formatação de roteiro, tarifário etc., gerando impacto positivo para a comunidade;

  9. Parcerias com agências convencionais foram estabelecidas a partir dos princípios do modelo de gestão do TBC e de seu roteiro.

Vale ressaltar que a iniciativa por parte dos órgãos (IPÊ, DEMUC e UEA) foi de suma importância para o estabelecimento do TBC em Nova Esperança. A sua apropriação fica evidente na fala e nos papéis desempenhados pelos envolvidos com o segmento. Atualmente, a comunidade possui contrato com três agências (uma do Rio de Janeiro, uma de Manaus e uma francesa com sede em Manaus), além de duas possíveis parceiras que já demonstraram interesse em parcerias.

Partindo, então, do princípio de que Nova Esperança passou por diferentes modelos de desenvolvimento do turismo, é possível afirmar que este possui três fases, conforme apresentado na Figura 6.

Tabela 1
Três fases de desenvolvimento do turismo em Nova Esperança

Quando comparadas as atividades ofertadas (Quadro 2) para receber turistas de agências convencionais, nota-se que o roteiro criado no atual modelo de gestão de TBC é adaptado para atender as diferentes demandas, mantendo assim as decisões internas para a visitação.

Tabela 2
Comparativo das atividades para agências/operadoras de experiências de TBC e agências de turismo convencional

A experiência de tais acordos e parcerias que vêm ocorrendo em Nova Esperança demonstra que: (1) o TBC é fundamental, enquanto modelo de gestão, para o fortalecimento interno dos aspectos de dominialidade, organização comunitária e interculturalidade; (2) tal fortalecimento e compreensão de si (comunidade) e da atividade, influencia diretamente na determinação de como será o turismo, quais os papeis de cada agente do turismo, seja interno ou externo; (3) é possível ter agência convencional como parceira, sem ser explorado o estereótipo de “índio”; (4) a cultura indígena é valorizada pelo TBC ao entendê-la, tanto nas manifestações culturais quanto nas vivências com a base territorial; e, (5) o turismo como ferramenta política ao visibilizar as comunidades indígenas e possibilitar que o não indígena conheça o que é ser indígena contemporâneo nesse pedaço de Amazônia, na Manaus rural.

Com base no exposto, identifica-se o atual contexto do turismo em Nova Esperança dentro de alguns impactos do turismo, a partir das categorias propostos por Cooper et al. (2001Cooper, C., Fletcher, J., Wanhill, S., Gilbert, D., & Shepherd, R. (2001). Turismo: príncipios e práticas (2nd ed.). Bookman., 2007)Cooper, C., Fletcher, J., Wanhill, S., Gilbert, D., & Shepherd, R. (2007). Turismo: príncipios e práticas (3rd ed.). Bookman. e Deery et al. (2012)Deery, M., Jago, L., & Fredline, L. (2012). Rethinking social impacts of tourism research: A new research agenda. Tourism Management. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2011.01.026
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. São eles: benefícios econômicos; modo de vida coletivo, que os permite uma forte organização social e articulação interna e externa; comercialização da cultura, a partir de acordos simétricos entre eles e os intermediários e a venda de artesanato; orgulho em receber pessoas dos mais diversos lugares que querem conhecer seu modo de vida e sua produção e que criam laços de conversa ou momentos de lazer; seus costumes, tradições e crenças como atividades e diretrizes para o TBC, apresentando-se ao turista que queira conhecê-los e experienciar sua cultura e seu território.

A associação entre o modelo de turismo e os impactos socioculturais é essencial para entendermos que:

  1. não haverá o mesmo tipo de impacto sociocultural em um modelo convencional e em um modelo gestão de TBC só por ser comunidade indígena, por exemplo: há diferenças na raiz do modelo desde como é pensado, como os agentes entendem o turismo, quem tem o poder, quais os papeis de atuação, quem lucra, qual a relação com o território e as dinâmicas sociais. Isso fica explícito com o caso de Nova Esperança que sai de sentimento de exploração e de “prestador de serviço” ao sentimento de orgulho e gestão interna e com parceiros do turismo na comunidade;

  2. analisar o impacto em conjunto com o modelo, traz uma visão maior e mais complexa do contexto, por exemplo: o turismo está gerando renda. Porém ao analisar mais essa renda, nota-se que vai para poucas famílias e o valor pago não dá conta de remunerar toda a mão de obra envolvida. Assim, apesar de num primeiro momento o entender como impacto positivo, será que os demais desencadeamentos desse “benefício” o validam como positivo?

Os sete impactos socioculturais foram ressaltados por trazerem o que se consideram as principais discussões quando se trata de turismo e impactos socioculturais: a questão econômica, a relação com o não-indígena e a cultura (enquanto autenticidade, tradição e apropriação). O quadro 3 apresenta a relação entre elementos do TBC e dos impactos socioculturais.

Tabela 3
Relação entre elementos do TBC e impactos socioculturais

Outros fatores que influenciam a vida da/em comunidade e, consequentemente, os impactos socioculturais do turismo são: os estudos, com indígenas que estão nas universidades e da escola indígena com o ensino do nheengatu; os projetos de desenvolvimento social como o bolsa-floresta, bolsa-família e bolsa-defeso, a energia por painel solar, incentivos à produção e refinamento da produção do artesanato; o acesso a Manaus e a outras comunidades; a partilha de costume com o entorno como o futebol, o casamento, as músicas, a estrutura das casas e o costume global com o acesso à internet e redes sociais. O forte laço familiar na comunidade é um aspecto fundamental ao lidarem com o turismo e o artesanato, bem como, com a resolução de conflitos, acordo comuns e divisão dos trabalhos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar dos impactos negativos do primeiro modelo de turismo convencional, sublinhado como exploratório e que reforça a imagem colonial de “índios” da Amazônia, essa dinâmica levou à comunidade a produção de artesanato para fins de venda a turistas. A partir daí, a atividade ganhou mais adeptos e, conforme foi sendo apropriada pela comunidade como pertencente à sua realidade, foi ganhando significado de fortalecimento entre as famílias, em termos econômicos e de vínculos, e, enquanto comunidade, tornou-se ainda mais importante por retomar e recriar traços da cultura baré.

A apropriação do artesanato e a reinvenção da cultura pelo turismo trouxe também, como resultado, a criação de produtos que retratam os animais do dia a dia dessa parte do noroeste amazônico, a criação de acessórios femininos e de objetos como a zarabatana.

Assim, o turismo convencional, que deu o pontapé à atividade, aparece agora como TBC, reforçando a cultura presente no cotidiano baré, com novos parceiros, voltados ao desenvolvimento social e ambiental. Esses parceiros levam a perspectiva do turismo e do artesanato como negócio, fomentados como empreendedorismo ribeirinho, além de buscarem fortalecer o turismo sustentável e responsável na região.

Ressalte-se ainda que, num contexto mais amplo de Unidade de Conservação, seria necessário incluir políticas voltadas aos povos indígenas, bem como um alinhamento com o etnodesenvolvimento, que incluiria aqui atuação da FUNAI. Isso possibilitaria que essas comunidades também tenham políticas de turismo voltadas às comunidades indígenas como as que estão em Terras Indígenas.

Para novos estudos que deem continuidade a este, recomenda-se: 1) produção científica de indicadores de impactos socioculturais em comunidades indígenas; 2) estudos com uma abordagem mais antropológica em determinar como a apropriação aqui apresentada é articulada dentro da cosmologia baré, necessitando de mais tempo em campo; 3) estudos mais focados no artesanato com essa roupagem de negócio e empreendedorismo social ribeirinho; 4) estudo mais amplo com todas as comunidades indígenas da RDS sobre os impactos do turismo e possibilidades de iniciativas de TBC; e 5) estudo sobre a viabilidade de um projeto de etnodesenvolvimento para a RDS.

Como contribuição à academia, a pesquisa propõe o conceito de “Turismo em Territórios Indígenas”, identificando suas categorias e possíveis abordagens. Além disso, corrobora à perspectiva de entender o impacto sociocultural à luz do desenvolvimento do turismo.

Diante da realidade atual da comunidade, pode-se afirmar que o apoio dos parceiros foi/é essencial para continuidade de suas atividades e a organização interna, por meio de grupos de trabalho para o turismo e artesanato, e a organização externa, com as articulações políticas, são essenciais para alcançar cada vez mais um turismo responsável, livre de estereótipos e imposições exploratórias do mercado.

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento “001".

  • Como citar: Proença, A. R. G. B.; Panosso Netto, A. (2022). Turismo em territórios indígenas: desenvolvimento e impacto sociocultural na Comunidade Indígena Nova Esperança “Pisasú Sarusawa” (Rio Cuieiras - Amazonas). Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, São Paulo, 16, e-2408. http://doi.org/10.7784/rbtur.v16.2408
  • 1
    A cerimônia do Dabucuri é comum em comunidade indígenas do Alto Rio Negro e envolve cantos, danças, bebidas e alimentos como frutas, peixes e produtos artesanais. É feito com o intuito de reforçar alianças entre familiares ou com outras famílias. De acordo com Figueiredo (2009)Figueiredo, P. M. (2016). Os Baré do Alto Rio Negro: breviário histórico. In M. Herrero & U. Fernandes (Eds.), Baré: povo do rio. Edições Sesc São Paulo. o dabucuri Baré foi sendo incorporado em comemorações de santos.

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Apêndice 1 – Questionário Socioeconômico

CASA N°____

  1. Quantas pessoas moram na casa?

  2. Qual a idade de cada?

  3. Qual o sexo de cada?

  4. Desde que ano moram na comunidade?

  5. São de qual família?

  6. Qual o nível educacional de cada?

  7. Qual(is) os tipos de trabalho(s) de cada?

  8. Qual a renda da família? (indicar o número a frente do tanto de salários-mínimos da família, referente a 2018).

    1 0 a 1 salário-mínimo R$ 0 a 954 2 1 a 2 salários-mínimos R$ 955 a 1.908 3 2 a 3 salários-mínimos R$ 1.909 a 2.862 4 3 a 4 salários-mínimos R$ 2.863 a 3.816 5 4 a 5 salários-mínimos R$ 3.817 a 4.770 6 5 a 6 salários-mínimos R$ 4.771 a 5.724 7 6 a 7 salários-mínimos R$ 5.725 a 6.678 8 7 a 8 salários-mínimos R$ 6.679 a 7.632 9 8 a 9 salários-mínimos R$ 7.633 a 8.586 10 9 a 10 salários-mínimos R$ 8.587 a 9540 11 Mais de 10 salários-mínimos Mais de R$ 9.541

  9. Fazem parte de algum programa ou benefício social do governo (exemplo bolsa família)? Se sim, quais?

  10. Se identificam com alguma etnia indígena?

  11. Possuem RANI? Se sim, quantos tem?

Apêndice 2 – Roteiro de Entrevista Indígenas

Apêndice 3 – Roteiro de Entrevista Instituições

Editado por

Editor:

Leandro B. Brusadin.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    01 Abr 2021
  • Aceito
    04 Out 2021
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