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Trajetórias de mulheres na docência e na pesquisa em Turismo.

The trajectories of women in Tourism teaching and research.

Trayectorias de las mujeres en la docencia y la investigación en Turismo.

Resumo

O objetivo deste artigo é discutir as questões de gênero na academia ao descrever as trajetórias de mulheres que atuam nos Programas de Pós-graduação em Turismo, Hotelaria e Hospitalidade no Brasil. Foram contatadas todas as 71 mulheres, dos 11 Programas de Pós-Graduação, contando com a participação de 31 docentes vinculadas a 10 PPGs, ou 43% do total. Com abordagem qualitativa, adotou-se entrevistas como método de coleta de dados. A partir das transcrições em totalidade e da leitura do corpus textual, foram organizados temas que tratavam da formação, da carreira no ensino superior, e do entrelaçamento entre as vidas profissional e pessoal. Com a análise identificou-se que as trajetórias dessas mulheres na pesquisa e na docência em Turismo não se caracterizavam como representativa nem ilustrativa de uma única mulher docente pesquisadora, mas sim compunham uma versão compartilhada de como as mulheres docentes pesquisadoras atuam no Turismo. Concluímos que as formas como essas mulheres lidam com a docência e a pesquisa influenciaram e influenciam diretamente a pesquisa em Turismo no Brasil. Além disso, observamos que as mulheres da docência e da pesquisa do Turismo brasileiro enfrentam e vivenciam desafios atrelados ao gênero, tais como as mulheres no mercado de trabalho em geral.

Palavras-chave
Gênero; Trabalho; Pós-graduação em Turismo; Trajetória feminina; Pesquisadora

Abstract

This article aims to discuss gender issues in the academy by describing the trajectories of women faculty in Tourism, Hotel Management and Hospitality graduate programs in Brazil. All 71 women from 11 graduate programs were contacted. Thirty-one women from 10 graduate programs participated, representing 43% of the total. Interviews were used as data collection for a qualitative approach. After the interviews full transcript and the textual corpus thorough reading, the analysis was organized in academic training, career in higher education, and the intertwining of personal and professional life. In the analysis, it was identified that the trajectories of these women in research and teaching in Tourism were neither representative nor illustrative of a single female professor-researcher, but rather composed a shared version of how female professor-researchers work in Tourism. The authors concluded that the way those women deal with teaching and researching has a direct influence on how Tourism research takes place in Brazil. Furthermore, it was possible to observe that Brazilian female professors and researchers in the Tourism area face and experience gender-related challenges, in the same way as women in the labor market.

Keywords
Gender; Labor; Tourism graduate programs; Female trajectory; Female researcher

Resumen

Este artículo tiene como objetivo discutir las cuestiones de género en la academia al describir la trayectoria de las mujeres que trabajan en programas de posgrado en Turismo, Hotelería y Hospitalidad en Brasil. Han sido contactadas las 71 mujeres de los 11 Programas de Posgrado. Participaron treinta y una mujeres de 10 programas de posgrado, lo que representa el 43% del total. Con un enfoque cualitativo, las entrevistas han sido adoptadas como método de recolección de datos. A partir de las transcripciones completas y de la lectura del corpus textual, se organizaron temas que trataron sobre la formación, la carrera en la educación superior y el entrelazamiento entre la vida profesional y personal. Identificamos que las trayectorias de estas mujeres en la investigación y la docencia en Turismo no se caracterizaban por ser representativas o ilustrativas de una única docente investigadora, sino que componían una versión compartida de cómo actúan las docentes investigadoras en Turismo. Concluimos que las formas en que estas mujeres se ocupan de la enseñanza y la investigación influyen directamente en cómo funciona la investigación turística en Brasil. Además, observamos que estas mujeres enfrentan y experimentan desafíos de género como las mujeres en todo el mercado laboral.

Palabras clave
Género; Trabajo; Posgrado de Turismo; Trayectoria feminin; Investigadora

1 INTRODUÇÃO

O gênero é constituinte das identidades dos sujeitos e é também uma estrutura social, portanto atravessa as diversas dimensões da vida. A partir disso, nos questionamos de que modo o gênero gera implicações para as mulheres docentes e pesquisadoras de Turismo. Isto porque dados do levantamento de Minasi e Censon (2020)Minasi, S. M., & Censon, D. (2020). Mulheres na academia do turismo no Brasil. [Boletim. Estudos Acadêmicos]. Curitiba, PR: OBSTUR/PR. Recuperado em 18 de março de 2021 de https://obsturpr.ufpr.br/portal/estudos-academicos
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mostram que, embora as mulheres sejam a maioria dos discentes durante a graduação (69,1%) e pós-graduação em Turismo e áreas afins (67,5%), são apenas 46% do corpo docente em programas de pós-graduação. Assim, ao considerarmos o significado do termo gênero e o seu uso como categoria analítica é possível contextualizar e problematizar as trajetórias dessas mulheres na docência e na pesquisa em Turismo.

A elaboração do conceito de gênero enquanto projeto intelectual ocorre no contexto da segunda onda do feminismo, iniciada em fins da década de 1960 (Keller, 2006Keller, E. F. (2006). Qual foi o impacto do feminismo na ciência? Cadernos Pagu, 27, p. 13-34. https://doi.org/10.1590/S0104-83332006000200003
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), ainda que obras como “Sexo e temperamento”, de Margarete Mead (1935), e “O segundo sexo”, de Simone de Beauvoir (1949), já fossem precursoras dessa discussão (Moschkovich, 2018Moschkovich, M. B. F. G. (2018). Feminist Gender Wars: The reception of the concept of gender in Brazil (1980s-1990s) and the global dynamics of production and circulation of knowledge. [Tese de doutorado não-publicada]. Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, SP, Brasil.). Até então, as diferenças entre homens e mulheres eram entendidas como naturais e suas experiências eram tratadas como uma particularidade (no caso de mulheres) e uma referência universal (no caso de homens) (Moschkovich, 2018Moschkovich, M. B. F. G. (2018). Feminist Gender Wars: The reception of the concept of gender in Brazil (1980s-1990s) and the global dynamics of production and circulation of knowledge. [Tese de doutorado não-publicada]. Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, SP, Brasil.). Tanto Beauvoir quanto Mead se opuseram a essa visão, relacionando tais “diferenças sexuais” a construtos históricos e sociais (Moschkovich, 2018Moschkovich, M. B. F. G. (2018). Feminist Gender Wars: The reception of the concept of gender in Brazil (1980s-1990s) and the global dynamics of production and circulation of knowledge. [Tese de doutorado não-publicada]. Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, SP, Brasil.). Assim, anos mais tarde, as feministas propuseram o conceito de gênero para “enfatizar o caráter fundamentalmente social das distinções baseadas no sexo” (Scott, 1995Scott, J. W. (1995). Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação & Realidade., 20(2), 71-99., p. 72), já que o gênero abrangeria as representações criadas em torno das características sexuais, e não estas características em si, que viriam a formar o que é considerado masculino ou feminino ao longo da história e em diferentes sociedades, na tentativa de afastar concepções essencialistas e descontextualizadas sobre a “mulher” ou o “homem” (Louro, 1997Louro, G. L. (1997). Gênero, sexualidade e educação. Vozes.).

O conceito de gênero formulado inicialmente foi, no entanto, criticado por ainda estar vinculado ao determinismo biológico. Ampliando as possibilidades do conceito, o gênero passou a ser utilizado em diversas áreas do conhecimento, especialmente as que analisavam as relações sociais (Furlin, 2014Furlin, N. (2014). A categoria de gênero e o seu estatuto na produção do conhecimento: algumas considerações teóricas. Revista Sociais e Humanas, 27(2), p. 110-127. https://doi.org/10.5902/2317175812751
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). Enquanto metodologia de análise social e tendo o entendimento de que as concepções a respeito do masculino e do feminino são construções sociais, direciona-se o foco para a pluralidade do gênero (Connell & Pearse, 2015Connell, R., Pearse, R. (2015). Gênero: Uma perspectiva global. Tradução da 3a ed. e revisão técnica de Marília Moschkovich. nVersos. ; Louro, 1997Louro, G. L. (1997). Gênero, sexualidade e educação. Vozes.) e destaca-se seu caráter transversal (Furlin, 2014Furlin, N. (2014). A categoria de gênero e o seu estatuto na produção do conhecimento: algumas considerações teóricas. Revista Sociais e Humanas, 27(2), p. 110-127. https://doi.org/10.5902/2317175812751
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). Esse olhar possibilitou questionar em que medida “significados de gênero estão impregnados em nossos sistemas de crenças, instituições e até mesmo em fenômenos livres de gênero, como nossa arquitetura e planejamento urbano.” (Harding, 1986Harding, S. (1986). The science question in feminism. Cornell University Press., p. 17, tradução nossa)1 1 “gender meanings have suffused our belief systems, institutions, and even such apparently gender-free phenomena as our architecture and urban planning.” .

Diversos estudiosos têm se dedicado a compreender as especificidades de gênero para o acesso e a progressão na carreira acadêmica nas diferentes áreas do conhecimento (Pinto, 2019Pinto, É. J. S. (2019). Relações de gênero na carreira acadêmica em Engenharia Civil. [Tese de doutorado não-publicada]. Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, PB, Brasil.; Medeiros & Leitão, 2020Medeiros, G. M. da H., & Leitão, M. do R. de F. A. (2020). As lacunas de gênero na docência das ciências agrárias. In S. A. de S. Monteiro (Org.). Relações de gênero e as subjetividades em contextos culturais 2. Atena Editora. https://doi.org/10.22533/at.ed.51120300919
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; Jesus et al., 2021Jesus, C. V. de., Santos, E. A. dos., Voese, S. B., & Musial, N. T. K. (2021). Mudanças relacionadas a gênero na docência em cursos de Ciências Contábeis. Educação, Cultura e Comunicação, 12(23), p. 313-328. ; Correia & Dolnicar, 2021Correia, A., & Dolnicar, S. (Eds.). (2021) Women’s voices in tourism research – Contributions to knowledge and letters to future generations. The University of Queensland. https://doi.org/10.14264/817f87d
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). Com relação à academia do Turismo, no âmbito internacional, pesquisas recentes também foram dedicadas ao tema (Basurto-Barcia & Ricaurte-Quijano, 2017Basurto-Barcia, J., & Ricaurte-Quijano, C. (2017). Women in tourism: gender (in)equalities in university teaching and research. Anatolia, 28(4), p. 567–581. https://doi.org/10.1080/13032917.2017.1370781
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; Chambers et al., 2017Chambers, D., Munar, A. M., Khoo-Lattimore, C., & Biran, A. (2017). Interrogating gender and the tourism academy through epistemological lens. Anatolia, 28(4), p. 501-513, https://doi.org/10.1080/13032917.2017.1370775
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; Aksatan et al., 2020Aksatan, M., Gunlu, E., Kozak, M. (2020). Women academics in tourism: A cross-gender study in Turkey. International Journal of Tourism Research, 22(6), p. 711-725. https://doi.org/10.1002/jtr.2367
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; Koseoglu et al., 2020Koseoglu, M. A., King, B., & Rahimi, R. (2020). Gender disparities and positioning in collaborative hospitality and tourism research. International Journal of Contemporary Hospitality Management, 32(2), p. 535-559. https://doi.org/10.1108/IJCHM-09-2018-0747
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), com destaque para o relatório “The gender gap in the Tourism Academy: Statistics and indicators of gender equality”, publicado em 2015 por um grupo de acadêmicas do Turismo (Munar et al., 2015Munar, A. M., Biran, A., Budeano, A., Caton, K., Chambers, D., Dredge, D., Gyimothy, S., Jamal, T., Larson, M., Nilsson Lindström, K., Nygaard, L., & Ram, Y. (2015). The Gender Gap in the Tourism Academy: Statistics and Indicators of Gender Equality. Tourism Education Futures Initiative (TEFI), Report I.) que atuam em países nórdicos. Tal relatório representou, segundo Chambers et al. (2017)Chambers, D., Munar, A. M., Khoo-Lattimore, C., & Biran, A. (2017). Interrogating gender and the tourism academy through epistemological lens. Anatolia, 28(4), p. 501-513, https://doi.org/10.1080/13032917.2017.1370775
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, a primeira tentativa de analisar quantitativamente a desigualdade de gênero na academia do Turismo internacional ao trazer dados sobre a representatividade de homens e mulheres em posições de poder da academia do Turismo no ano de 2013. O relatório chama atenção para o fato de que as mulheres representavam menos de 30% dos corpos editoriais de 189 periódicos analisados. Além disso, as mulheres foram 24% de um total de 158 palestrantes em 33 conferências analisadas, realizadas pelo International Center for Research and Study on Tourism [CIRET] e pela Association for Tourism and Leisure Education [ATLAS]. Dados que corroboram o contexto apontado por Swain (2016Swain, M. B. (2016). Embodying cosmopolitan paradigms in tourism research. In A. M. Munar & T. Jamal. Tourism research paradigms: Critical and emergent knowledges. Tourism Social Sciences Series, 22, Emerald. https://doi.org/10.1108/S1571-504320150000022012
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, p. 89, tradução nossa2 2 “From early days of tourism studies, there has been a noticeable lack of women researchers” ) de que “desde o início dos estudos do Turismo, existe uma notória falta de pesquisadoras mulheres”.

No Brasil, a academia do Turismo parece ter iniciado recentemente uma reflexão sobre como vem sendo atravessada por questões de gênero. No âmbito nacional, em Bibliometria3 3 A Bibliometria é um campo teórico tradicional da Ciência da Informação com leis e princípios empíricos estatísticos que emprega diferentes critérios (autores, palavras-chave, periódicos, entre outros), no desenvolvimento de pesquisas científicas que visam conhecer e aprofundar determinada temática. Uma das vertentes observadas em pesquisas contemporâneas é o uso da Bibliometria como técnica de pesquisa, realidade reconhecida especialmente nas investigações desenvolvidas nos campos das ciências humanas, sociais e sociais aplicadas (Araújo, 2006). nas bases de dados Spell e Publicações de Turismo, Pagnussat, Medaglia e Silveira (2020)Pagnussat, E. C., Medaglia, J., Silveira, C. E. (2020). Gênero e Turismo: um panorama dos estudos de mulheres e homens no mercado de trabalho. In Anais XV Fórum Internacional de Turismo do Iguassu. Foz do Iguaçu/PR, Brasil. https://bityli.com/7426U
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detectaram apenas 22 trabalhos de gênero no contexto do mercado de trabalho em turismo, sendo o primeiro de 2006 e o ápice quantitativo em 2015, com 4 publicações, indicando esse reconhecimento recente do tema no Brasil. Em 2019, destaca-se a criação4 4 A demanda para a criação do GT de gênero no Seminário da ANPTUR partiu de duas mestrandas em Turismo que escreveram uma carta assinada por outros colegas e professores e entregue à diretoria da ANPTUR no Seminário de 2018. do Grupo de Trabalho [GT] no XVI Seminário da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Turismo [ANPTUR] dedicado às pesquisas sobre gênero e turismo. Em 2020, no XVII Seminário da ANPTUR, o GT contou com nove trabalhos que traziam enfoque à mulher, abordando questões relacionadas à academia, às viagens, ao mercado de trabalho, dentre outras. Também se destaca, na mesma edição do evento, o debate intitulado “Mulheres na Pesquisa em Turismo: impactos, desafios e perspectivas”.

No âmbito internacional, as pesquisas no turismo que envolvem a perspectiva de gênero, sem se restringir ao âmbito acadêmico, tornaram-se mais regulares a partir dos anos 1990, destacando-se a publicação, em 1995, do Special Issue: Gender in Tourism na Annals of Tourism Research. Mais recentemente, em 2019, tem-se também o Special Issue: Gender and Mobility in Tourism, publicado na Tourism Review. Entretanto, ainda que o esforço venha sendo feito, a publicação dessas pesquisas equivale a menos de 6% das publicações dos periódicos mais importantes da área entre 2005 e 2014 (Reis, 2020Reis, C. U. F. dos (2020). O trabalho de cozinheiras, cozinheiros e chefs em cozinhas profissionais: Reflexões a partir da perspectiva de gênero. [Dissertação de mestrado não-publicada]. Programa de Pós-Graduação em Turismo, Setor de Ciências Humanas, Universidade Federal do Paraná. Curitiba, PR, Brasil.).

Já a feminização do magistério é pauta importante. Esta concepção surge no século XIX, com a associação de construções sociais ligadas ao feminino (Louro, 1997Louro, G. L. (1997). Gênero, sexualidade e educação. Vozes.). De espaço marcadamente masculino e religioso (Louro, 1997Louro, G. L. (1997). Gênero, sexualidade e educação. Vozes.), o magistério se transformou em um dos primeiros campos de trabalho para as mulheres. Ainda assim, a presença feminina no magistério vem ocorrendo de forma mais intensa nos primeiros níveis da educação, não atingindo o Ensino Superior. Dados de 2009 (Vianna, 2013Vianna, C. P. (2013). A feminização do magistério na educação básica e os desafios para a prática e a identidade coletiva docente. In S. C. Yannoulas (Org.). Trabalhadoras: Análise da feminização das profissões e ocupações (pp. 159-180). Abaré. Recuperado em 17 de março de 2021 http://www.producao.usp.br/handle/BDPI/44242.
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) mostram que as mulheres são maioria na Educação Infantil (97,9%), no Ensino Fundamental (82,2%) e no Ensino Médio (64,1%), e a minoria no Ensino Superior (44,8%). Dez anos mais tarde (2019), esse cenário permaneceu sem modificações, com 46,6% de mulheres atuando no Ensino Superior (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira [INEP], 2021Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. (2021). Resumo técnico do Censo da Educação Superior 2019 [recurso eletrônico]. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Recuperado em 05 de maio de 2021 de https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/estatisticas_e_indicadores/resumo_tecnico_censo_da_educacao_superior_2019.pdf
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).

Com efeito, é a partir desse cenário, e considerando que “homens e mulheres não participam do mundo do trabalho nas mesmas condições, ainda que membros de uma mesma classe ou categoria ocupacional” (Sardenberg, 2004Sardenberg, C. M. B. (2004). O trabalho feminino no Brasil: desigualdades de gênero e contrastes regionais. In C. M. B. Sardenberg (Org.). A face feminina do complexo metal-mecânico: mulheres metalúrgicas no norte e nordeste. Salvador: NEIM/UFBA:REDOR:CNM/CUT, 01, 27-50. Recuperado em 30 de abril de 2021 de https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/6872, p. 28), que pretendemos discutir as questões de gênero na academia do Turismo. O olhar para as trajetórias de mulheres enquanto profissionais da docência e da pesquisa em programas de pós-graduação em Turismo, Hotelaria e Hospitalidade, a partir das lentes do gênero, implica visibilizar as questões que afetam as mulheres, diferentemente da maneira como afetam os homens. Com base nestes questionamentos e levantamentos iniciais, esta pesquisa tem como objetivo discutir as questões de gênero na academia ao descrever a trajetória de mulheres que atuam nos Programas de Pós-graduação em Turismo, Hotelaria e Hospitalidade no Brasil. Considerando a natureza qualitativa da pesquisa, este trabalho apresenta uma estrutura que segue diretamente para a metodologia, trazendo os resultados entrelaçados à revisão teórica. É finalizado com a conclusão e as referências utilizadas.

2 METODOLOGIA

A escolha metodológica para o desenvolvimento deste estudo foi a abordagem qualitativa e, em específico, a adoção da entrevista como método de pesquisa de campo, a fim de compreender as trajetórias dessas mulheres enquanto docentes pesquisadoras, protagonizando seus lugares de fala. Assumimos que essas falas nos possibilitaram reconstruir as trajetórias e interpretá-las a partir da perspectiva de gênero, considerando que tal perspectiva admite que as diferentes instituições e práticas sociais constituem e são constituídas pelos gêneros, oportunizando assim visibilidade às diferentes posições ocupadas por homens e mulheres, no caso desta pesquisa, no universo da docência (Louro, 1997Louro, G. L. (1997). Gênero, sexualidade e educação. Vozes.; Furlin, 2014Furlin, N. (2014). A categoria de gênero e o seu estatuto na produção do conhecimento: algumas considerações teóricas. Revista Sociais e Humanas, 27(2), p. 110-127. https://doi.org/10.5902/2317175812751
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).

As mulheres foram selecionadas a partir dos 11 Programas de Pós-Graduação [PPGs] reconhecidos pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior [CAPES], vinculados às seguintes instituições: Universidade Anhembi Morumbi (com Mestrado e Doutorado Acadêmico/Mestrado Profissional); Universidade de Caxias do Sul, Universidade de São Paulo, Universidade do Vale do Itajaí e Universidade Federal do Rio Grande do Norte (com Mestrado e Doutorado Acadêmico); Universidade Estadual do Ceará e Instituto Federal de Sergipe (com Mestrado Profissional); e Universidade Federal do Paraná, Universidade Federal de Pernambuco, Universidade Federal Fluminense e Universidade Federal de Ouro Preto (com Mestrado Acadêmico). De acordo com os sites oficiais dos programas, analisados em março de 2021, o corpo docente atuante na Pós-graduação em Turismo, Hotelaria e Hospitalidade totaliza 151 docentes. Destes, 71 são mulheres docentes pesquisadoras, ou seja, 47% do corpo docente. Dessa listagem a pesquisa contou com a participação de 31 docentes vinculadas a 10 PPGs, ou 43% do total de mulheres. Houve oito recusas de participação, a exclusão de duas docentes (coautoras deste estudo) e 30 não respostas aos e-mails. Identificamos após as entrevistas que alguns PPGs estavam com a lista desatualizada de docentes nos sites ou que estavam em processo de credenciamento/descredenciamento de docentes, o que pode estar relacionado à não resposta aos e-mails encaminhados. Assim, os resultados deste estudo refletem as trajetórias das 31 participantes.

As docentes pesquisadoras foram convidadas a participar a partir do envio do convite via endereços de e-mail disponíveis nos sites dos PPGs. Após o aceite, foi realizado o agendamento da entrevista, já com o encaminhamento do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

O roteiro da entrevista foi composto por cinco blocos: I - Perfil da entrevistada (pergunta norteadora: Quem é você? - autodescrição); II - Formação (Você pode comentar sobre sua formação?); III - Trajetória acadêmica e atuação hoje (Fale sobre a sua trajetória acadêmica até hoje); IV - A vida da mulher profissional e A vida pessoal da mulher; e V - Encerramento. As entrevistas foram realizadas entre 24 de março e 10 de abril de 2021, via plataforma virtual Zoom, com a gravação audiovisual autorizada e duração que variou entre 30 minutos e uma hora e 50 minutos. As entrevistas foram transcritas em sua totalidade, compondo o corpus deste estudo.

O corpus foi lido e relido pelas pesquisadoras e os trechos que identificavam a trajetória da entrevistada foram marcados com realce. Esses trechos foram então compilados para outro arquivo e agrupados por temas que tratavam da formação, da carreira no ensino superior, e do entrelaçamento entre a vida profissional e a vida pessoal. A partir da trajetória relatada, foi possível relacionar os trechos acerca dos caminhos trilhados pelas entrevistadas, suas estratégias, seus constrangimentos e seus agenciamentos. A análise do corpus foi feita a partir desse processo de acesso recorrente às transcrições e à literatura, adotando uma abordagem recursiva (Veal, 2011Veal, A. J. (2011). Metodologia da pesquisa em lazer e turismo. Aleph.), para dar sentido ao material e compreender seus significados. Desse modo, não temos uma revisão de literatura em separado, mas sua utilização na introdução para estruturar o problema em estudo, na análise dos temas explicitando argumentos teóricos basilares para a discussão dos resultados, e na conclusão para identificar e contrastar padrões ou categorias (Creswell, 2010Creswell, J. W. (2010). Projeto de pesquisa: Métodos qualitativo, quantitativo e misto. Artmed.). Uma possível limitação relacionada à análise das entrevistas é a falsa inferência (Gaskell, 2013Gaskell, G. (2013). Entrevistas individuais e de grupos. In M. W. Bauer, G. Gaskell. (Eds.). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: Um manual prático (pp. 64-89). Vozes.), que foi minimizada, neste estudo, pela análise conjunta dos dados quer individual ou coletivamente pelas autoras (em sete reuniões entre abril e maio).

Sendo a comunidade acadêmica de Turismo no Brasil pequena, o anonimato das participantes foi garantido pela supressão de seu nome e substituição por símbolos (números arábicos e romanos, e letras). Como a fala das entrevistadas está presente mais de uma vez no texto e, para preservar o sigilo, cada uma recebeu um número arábico aleatório (de E1 a E31), um número romano aleatório (de EI a EXXXI) e uma letra aleatória (de Ea a Eae); assim cada entrevistada pode ser representada por até três símbolos de forma a evitar a sua identificação. Outras informações em sua fala que pudessem identificá-la (por exemplo, Instituição de Ensino Superior [IES] e, Unidade da Federação) também foram suprimidas.

As participantes deste estudo são mulheres docentes e pesquisadoras vinculadas a PPGs em Turismo, Hotelaria e Hospitalidade na condição de professora permanente ou colaboradora. A entrada nos PPGs aconteceu em média sete anos após o seu ingresso na IES, e cinco iniciaram sua trajetória na instituição concomitante com a entrada na pós-graduação. Para 12 docentes a carreira na pós-graduação iniciou junto com a criação do PPG. O ingresso na docência ocorreu para 21 participantes entre 1990 e 2006, período que coincide com a expansão do ensino superior em Turismo no Brasil (Silveira et al., 2012Silveira, C. E., Medaglia, J., & Gândara, J. M. G. (2012). Quatro décadas de Ensino Superior de Turismo no Brasil: dificuldades na formação e consolidação do mercado de trabalho e a ascensão de uma área de estudo como efeito colateral. Revista Turismo Visão e Ação – Eletrônica, 14(1). https://doi.org/10.14210/rtva.v14n1.p006-018
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; Silveira et al., 2020Silveira, C. E., Medaglia, J., & Nakatani, M. S. M. (2020). Labour market for tourism graduates: comparisons between 2012 and 2018 data. Brazilian Journal of Tourism Research, 14(2). https://doi.org/10.7784/rbtur.v14i2.1779
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; Moscardi et al., 2020Moscardi, E. H., Rangel, B. S., Nakatani, M. S. M., & Silveira, C. E. (2020). A formação superior em Turismo no Brasil: trajetória e satisfação dos egressos. In S. J. G. Anjos, N. P. Angeli, & F. A. Anjos. (Org.). Turismo, competências profissionais e mercado de trabalho (pp. 88-93). UNIVALI.). Das 31 entrevistadas, 17 têm formação em turismo, quer seja graduação ou pós-graduação. A média de idade das participantes é de 50 anos (mediana é 48 anos), 27 são ou foram casadas/união estável e 22 têm filhos.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO: OS RELATOS, AS TEMÁTICAS E REFLEXÕES POSSÍVEIS

A trajetória das mulheres está imersa em um meio social compreensível a partir da perspectiva de gênero. Ainda que houvesse uma variedade de pontos de vista sobre o assunto, alguns relatos encontraram intersecção em questões que pareceram emergentes na construção de uma trajetória compartilhada. Suas falas trouxeram à luz o protagonismo feminino na construção de sua história profissional, entrelaçada à dimensão pessoal.

Muitos dos relatos trouxeram a construção e a contextualização familiar para a apresentação de suas trajetórias. Exemplo disso são as menções a respeito do meio vivido, como relata a entrevistada E12, ao contar que “numa cidade do interior, era difícil ser mulher. … eu percebi muito cedo que não tinha lugar pra mim naquela cidade, que a cidade era muito tradicional, muito retrógrada. Eu queria estudar!”. Com isso, é possível fazer uma relação com as expectativas em torno da vida pessoal e profissional dessas mulheres, pautadas por ideais regulatórios embasados em estruturas histórica e socialmente construídas a partir de um universo masculino (Foucault, 2005Foucault, M. (2005). Histoire de la sexualité I: la volonté de savoir. Gallimard.; Das, 2007Das, V. (2007). Life and words: Violence and the descent into the ordinary. University of California Press. https://doi.org/10.1525/9780520939530
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). O conselho do pai da entrevistada E9, “primeiro estuda e cuide da sua vida, organize sua carreira, seu trabalho, … busque a sua trajetória, busque a sua sobrevivência”, chama atenção para elementos que embasam as expectativas e os planejamentos na vida dessas mulheres. Foram também essas falas que nos indicaram caminhos para organizar a análise dos relatos obtidos em três temáticas principais: a formação, a carreira no ensino superior, e a vida profissional e a vida pessoal, de forma a destacar questões que afetam de modo diferente mulheres e homens.

3.1 A formação

O acesso ao ensino superior no contexto de ascensão social foi questão de destaque na trajetória de muitas dessas mulheres. Almeida Filho (2007)Almeida Filho, N. (2007). Universidade Nova: Textos críticos e esperançosos. Editora Universidade de Brasília; EDUFBA. discute, do ponto de vista histórico, o papel do ensino superior na constituição social do país. Essa discussão entra em consonância com os estudos acerca do modelo histórico da família brasileira. A base histórica da família patriarcal brasileira se caracterizava pelo enfoque na educação e formação do filho homem mais velho, responsável pela herança e administração familiar na ausência do pai, os demais filhos eram encaminhados aos estudos para formação em áreas de prestígio (medicina, direito etc.), enquanto às filhas dava-se o enfoque de uma formação voltada ao cuidado da família e do lar (Almeida, 1987Almeida, A. (1987). Notas sobre a família no Brasil. In A. M. Almeida (Org.). Pensando a família no Brasil (pp. 53-66). Espaço e Tempo/UFRRJ.). O ressurgimento do movimento feminista na década de 1960 (Keller, 2006Keller, E. F. (2006). Qual foi o impacto do feminismo na ciência? Cadernos Pagu, 27, p. 13-34. https://doi.org/10.1590/S0104-83332006000200003
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) e os questionamento de padrões sociais que buscavam limitar a vida das mulheres, especialmente na esfera pública, provocaram uma série de mudanças. Dentre elas, a maior inserção da mulher no mercado de trabalho, o número crescente de núcleos familiares compostos apenas por mulheres e seus filhos e, em sintonia com isso, a possibilidade de vislumbre de outros caminhos para além do doméstico tradicional e de profissões tradicionais, marcam uma nova guinada no acesso ao ensino superior pela mulher brasileira (Samara, 1989Samara, E. M. (1989). As mulheres, o poder e a família. São Paulo, Século XIX. São Paulo: Marco Zero; Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo.). Ainda que esse acesso tenha sido ampliado, e hoje as mulheres tenham ultrapassado os homens entre os discentes universitários no Brasil (INEP, 2021Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. (2021). Resumo técnico do Censo da Educação Superior 2019 [recurso eletrônico]. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Recuperado em 05 de maio de 2021 de https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/estatisticas_e_indicadores/resumo_tecnico_censo_da_educacao_superior_2019.pdf
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) e em outros países, esse processo não é simples nem livre de questionamentos e problemáticas.

Silveira e colaboradores (2012, p. 8)Silveira, C. E., Medaglia, J., & Gândara, J. M. G. (2012). Quatro décadas de Ensino Superior de Turismo no Brasil: dificuldades na formação e consolidação do mercado de trabalho e a ascensão de uma área de estudo como efeito colateral. Revista Turismo Visão e Ação – Eletrônica, 14(1). https://doi.org/10.14210/rtva.v14n1.p006-018
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afirmam que “o ensino superior possui melhor aceitação e sempre foi sinônimo de ascensão social”. Para as entrevistadas E15 e E23 o ingresso no ensino superior caracterizava-se como uma grande oportunidade, posto que “o mundo era muito grande e eu queria explorar esse mundo. E ao mesmo tempo podia ser pequeno dependendo das opções que você fizesse” (E15). Nesse contexto, a média de idade das entrevistadas (50 anos) pode ajudar a compreender os relatos iniciais a respeito do entorno social, que combinam a trajetória com o desenvolvimento da educação no Brasil. Afirmações como “mestrado na época era uma coisa absurda” (E27) e “eu tinha especialização e naquele momento a especialização era muito importante, mestrado era muito raro” (E24), ou também os anseios pessoais a respeito dos estudos e da atualização profissional, como “eu queria estudar, achei que eu tava precisando me reciclar, porque eu já tinha ficado um tempão trabalhando só, sem estudar” (Et), estruturam os relatos sobre sua formação em anseios, questionamentos, esforços e, finalmente, conquistas.

Também não foram raros os relatos que descrevem o início da vida acadêmica frequentando dois cursos superiores em simultâneo, ou então dois cursos superiores em sequência (E2, E3, E9, E13, E18, E21, E26, E27, E31). Ainda que as entrevistadas indiquem esses processos com relativa naturalidade, a carga de trabalho depositada em si mesmas pode ser observada quando questionadas acerca do percurso de sua formação. Relatos como: “eu fazia umas cinco disciplinas na graduação e nove no técnico, isso quando eu comecei a fazer os dois. Depois eu fiquei na graduação e no mestrado, aí eu cursava sei lá, umas três disciplinas no mestrado e cinco da graduação” (E3), ou ainda, “estudava em uma faculdade de manhã, fazia um estágio a tarde e fazia faculdade de Turismo a noite, ... só que eu tive que abandonar a pública, porque não conciliava.” (E13).

Ainda sobre as formações universitárias, há relatos em que o questionamento da família acerca do curso escolhido é destacado, como: “tinha um estranhamento na família …, minha avó perguntava, você vai fazer o que? o que faz quem estuda Turismo?” (E30). Há também, nesse contexto, relação direta com as expectativas familiares: “todo mundo esperava que eu fizesse medicina ou que eu fizesse odontologia. Essas coisas tradicionais. Então quando eu inventei que eu … [queria seguir outra carreira] enfrentei essa coisa da família, mas fui embora e fiz.” (Eac).

As escolhas femininas acerca de suas carreiras e áreas de atuação são temáticas recorrentes nos estudos da psicologia social e comportamental (Trusz, 2020Trusz, S. (2020). Why do females choose to study humanities or social sciences, while males prefer technology or science? Some intrapersonal and interpersonal predictors. Social Psychology of Education, 23, p. 615–639. https://doi.org/10.1007/s11218-020-09551-5
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; Alon & DiPrete, 2017Alon, S., & DiPrete, T. A. (2017). Gender differences in the formation of a field of study choice set. Sociological Science, 2, p. 50-81. http://dx.doi.org/10.15195/v2.a5
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), bem como, a presença feminina na área acadêmica do Turismo também vem sendo discutida (Munar et al., 2015Munar, A. M., Biran, A., Budeano, A., Caton, K., Chambers, D., Dredge, D., Gyimothy, S., Jamal, T., Larson, M., Nilsson Lindström, K., Nygaard, L., & Ram, Y. (2015). The Gender Gap in the Tourism Academy: Statistics and Indicators of Gender Equality. Tourism Education Futures Initiative (TEFI), Report I.; Basurto-Barcia & Ricaurte-Quijano, 2017Basurto-Barcia, J., & Ricaurte-Quijano, C. (2017). Women in tourism: gender (in)equalities in university teaching and research. Anatolia, 28(4), p. 567–581. https://doi.org/10.1080/13032917.2017.1370781
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; Chambers et al. 2017Chambers, D., Munar, A. M., Khoo-Lattimore, C., & Biran, A. (2017). Interrogating gender and the tourism academy through epistemological lens. Anatolia, 28(4), p. 501-513, https://doi.org/10.1080/13032917.2017.1370775
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; Minasi & Censon, 2020Minasi, S. M., & Censon, D. (2020). Mulheres na academia do turismo no Brasil. [Boletim. Estudos Acadêmicos]. Curitiba, PR: OBSTUR/PR. Recuperado em 18 de março de 2021 de https://obsturpr.ufpr.br/portal/estudos-academicos
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). Ainda assim, as expectativas em torno dessas escolhas estão permeadas por construções sociais não somente relacionadas ao gênero, mas também aos ideais de crescimento e desenvolvimento pessoal, compartilhados socialmente (Shapiro & Williams, 2012Shapiro, J. R., & Williams, A. M. (2012). The role of stereotype threats in undermining girls' and women's performance and interest in STEM fields. Sex Roles: A Journal of Research, 66(3-4), 175–183. https://doi.org/10.1007/s11199-011-0051-0
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; De Kleijn et al., 2020De Kleijn, M., Jayabalasingham, B., Falk-Krzesinski, H. J., Collins, T., Kuiper-Hoyng, L., Cingolani, I., Zhang, J., Roberge, G., Deakin, G., Goodall, A., Whittington, K. B., Berghmans, S. Huggett, & S. Tobin, S. (2020). The Researcher Journey Through a Gender Lens: An examination of research participation, career progression and perceptions across the globe. Elsevier. Recuperado em 05 de maio de 2021 de www.elsevier.com/gender-report
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). Nesse último ponto de vista, do desenvolvimento pessoal, a entrevistada E23 afirma: “Então assim, naquela época ou concurso público ou academia, porque a iniciativa privada, era pra quem tinha contato, conhecia alguém …”, indicando ainda construções sociais ligadas ao emprego no setor privado. Dessa forma, para muitas de nossas entrevistadas o prosseguimento na carreira acadêmica se constituiu em relações de expectativas familiares, autocobranças e ideais de crescimento e desenvolvimento pessoal. Essa afirmação pauta-se na compreensão de que a ampliação do acesso ao ensino superior, bem como as escolhas acerca do prosseguimento da carreira acadêmica, não são questões isoladas. Fazem parte de um esforço histórico de lutas por igualdade de gênero, pela entrada em espaços tradicionalmente compreendidos como masculinos, e por tentativas de se redefinir os papéis desempenhados pelas mulheres na sociedade (Therborn, 2004Therborn, G. (2004). Between sex and power: Family in the world, 1900-2000. Routledge. https://doi.org/10.4324/9780203643297
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).

3.2 Carreira no ensino superior

As autocobranças para a continuidade nos estudos, somadas aos contextos históricos e sociais e a carga de trabalho nos remetem, novamente, às expectativas em torno da mulher. Pontuamos, anteriormente, que as concepções criadas a respeito do masculino e do feminino são construções sociais (Furlin, 2014Furlin, N. (2014). A categoria de gênero e o seu estatuto na produção do conhecimento: algumas considerações teóricas. Revista Sociais e Humanas, 27(2), p. 110-127. https://doi.org/10.5902/2317175812751
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). Tais construções encontram terreno fértil para a reprodução de formas de agir, pensar e sentir que impõem a busca pela ascensão como ideal (Butler, 1993Butler, J. (1993). Bodies that matter: On the discursive limits of "sex". New York: Routledge.) e as expectativas acerca de comportamentos ideais e regulatórios como naturais (Weber, 1979Weber, M. (1979). A objetividade do conhecimento nas ciências sociais. In G. Cohn (Org.) Weber, Coleção Grandes cientistas sociais. Ática.; Das, 2007Das, V. (2007). Life and words: Violence and the descent into the ordinary. University of California Press. https://doi.org/10.1525/9780520939530
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).

A mulher docente e pesquisadora, atenta à sua carreira e aos seus objetivos profissionais, se reconhece como vitoriosa, valorizando a entrada em universidades públicas e privadas de renome, a participação na criação de programas de pós-graduação e de associações como a ANPTUR, e na editoração de periódicos científicos. Isso não apaga, no entanto, a percepção gendrificada de que esse processo, por vezes, engloba dificuldades atreladas ao fato de serem mulheres — o que não é exclusivo da carreira docente, e sim, algo que perpassa o mercado de trabalho como um todo (Perrot, 2019Perrot, M. (2019). Epílogo. Escrever a história do trabalho das mulheres. In M. Maruani (Org.). Trabalho, logo existo. Perspectivas feministas (pp. 319-326). FGV Editora.). O campo acadêmico é, como outras áreas profissionais, um campo de relações de poder, hierarquias e desigualdades e, como parte de uma estrutura social mais ampla, as regras e critérios de objetividade deste campo estão circunscritas àquilo que socialmente se constrói como legítimo, tradicional e esperado (Grossi & Rea, 2020Grossi, M. P., & Rea, C. A. (2020). Teoria feminista e produção de conhecimento situado: Ciências humanas, biológicas, exatas e engenharias. In M. P. Grossi & C. A. Rea. (Orgs.). Devires.).

Isso se torna visível quando observamos que, conforme análise de Barreto (2014)Barreto, A. (2014). A mulher no ensino superior. Distribuição e representatividade. Cadernos do GEA., (6). FLACSO, GEA; UERJ, LPP., no período entre 2006 e 2012, as mulheres foram maioria no acesso e conclusão do ensino superior — dado reiterado pelo Censo da Educação Superior (INEP, 2021Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. (2021). Resumo técnico do Censo da Educação Superior 2019 [recurso eletrônico]. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Recuperado em 05 de maio de 2021 de https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/estatisticas_e_indicadores/resumo_tecnico_censo_da_educacao_superior_2019.pdf
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). A autora destaca, porém, que quando se considera a docência nesse mesmo período, a presença das mulheres correspondeu, em média, a 45,28%, enquanto a dos homens a 54,72%. A prevalência masculina ocorre, também, nas instituições públicas de ensino, algo que “é ainda mais notável levando-se em consideração que o processo seletivo nessas instituições é realizado prioritariamente através de concurso público, o que sugeriria uma maior igualdade de oportunidades.” (Barreto, 2014Barreto, A. (2014). A mulher no ensino superior. Distribuição e representatividade. Cadernos do GEA., (6). FLACSO, GEA; UERJ, LPP., p. 21). A contratação por meio de concurso público certamente tem vantagens no que diz respeito às questões de gênero, impedindo, por exemplo, variação de salário em um mesmo cargo a depender de quem o ocupa, se mulher ou homem. Isso, no entanto, “não impede que a subjetividade interfira na avaliação de candidatos, nem significa que ela seja necessariamente igualitária, mas indica que existe um princípio de impessoalidade fundamental na organização da carreira.” (Moschkovich, 2013Moschkovich, M. B. F. G. (2013). Teto de vidro ou paredes de fogo? Um estudo sobre gênero na carreira acadêmica e o caso da UNICAMP. [Dissertação de mestrado não-publicada]. Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, SP, Brasil., p. 6). A entrevistada E31 reflete acerca disso, apontando que “a mulher sempre tem que provar mais, ela sempre tem que demonstrar maior competência, ter maior currículo”. Também relata que um companheiro a chamou de “deusa do Lattes”, indo ao encontro da crítica, muitas vezes dirigida às mulheres, que priorizam o aspecto profissional da vida, pontuando que “essas questões não aparecem pros homens”.

Nesse sentido, chamamos atenção para uma discussão pautada a partir da configuração tradicional da divisão sexual do trabalho, segundo a qual cabe aos homens o trabalho na esfera pública e o sustento da casa, enquanto as mulheres devem se ocupar do trabalho doméstico e de cuidado (Hirata, 2015Hirata, H. (2015). Mudanças e permanências nas desigualdades de gênero: divisão sexual do trabalho numa perspectiva comparativa. Friedrich-Ebert-Stiftung, 7, 4-9. Recuperado em 30 de abril de 2021 de http://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/12133.pdf
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). É com base no ideal de família tradicional, construído a partir do século XIX, que se questiona a mulher trabalhadora assalariada, colocando como incompatível a realização do trabalho doméstico pela mulher com o trabalho na esfera pública. Compreende-se nesse mesmo eixo o relato da entrevistada E21, cujo ex-marido lhe dizia: “Tu só trabalha!”. Isso também gera uma visão do trabalho da mulher como secundário, complementar ao do homem (Scott, 1991Scott, J. W. (1991). A mulher trabalhadora, In G. Duby, M. Perrot. (Orgs.). História das Mulheres no Ocidente: O Século XIX (Vol. 4, pp. 443–475). Edições Afrontamento.), bem como do papel do dinheiro da mulher como menos relevante do que o do homem (Zelizer, 1989Zelizer, V. (1989). The Social Meaning of Money: "Special Monies". American Journal of Sociology, 95(2), p. 342-377. https://doi.org/10.1086/229272
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). Para além disso, reproduz-se um discurso de dispensabilidade, já que o exercício da atividade profissional pelas mulheres é considerado um desvio das tarefas femininas fundamentais (Louro, 1997Louro, G. L. (1997). Gênero, sexualidade e educação. Vozes.), uma vez que estas se restringiam ao casamento e à maternidade. Como consequência, o trabalho das mulheres no ensino primário e secundário suscitou o discurso da feminização do magistério, ao criar uma identificação das professoras com o papel de “mãe espiritual”, dotando o trabalho da mulher de um sentido para além do trabalho, mas também pautado pelo que tradicionalmente se compreende como o papel social da mulher.

Dando seguimento à carreira, a entrada na docência foi, em todos os relatos, um evento de comemoração. A entrevistada E16 comenta que, em um concurso com mais de uma centena de candidatos inscritos, fora aprovada em primeiro lugar. Para além do evento específico, relata que “não foi uma preparação, eu não estudei para o concurso, eu estudei a minha vida inteira pra chegar na universidade. Não foi pro concurso, foi uma história de vida mesmo” (E16). Também a entrevistada E29, ao relatar o preparo para um concurso público, conta que “eu tinha um plano de estudos, eu montei os textos, eu tinha tudo muito bem estruturado né, então assim, estudei muito para passar”. Ela destaca que para além da objetividade necessária na organização de seus estudos, também foi necessário lidar com cargas emocionais pessoais, diversas pressões externas, a percepção da competitividade estrutural ao seu entorno e, assim, a percepção da solidão do processo. Esses relatos conversam com os questionamentos acerca da autocobrança feminina nos estudos e no trabalho, naturalizada a partir de relatos de sucesso e dados que demonstram que as mulheres atingem melhores notas e índices nos estudos (Quadlin, 2018Quadlin, N. (2018). The Mark of a Woman's Record: Gender and Academic Performance in Hiring. American Sociological Review, 83(2), 331–360. https://doi.org/10.1177/0003122418762291
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).

Finalmente, quando a aprovação em concursos parecia indicar o fim de uma etapa de autocobranças, trazemos a reflexão da entrevistada EVIII sobre uma nova etapa. Para ela, assim como para tantas outras (EXI, E12, EXXVI, Ea), a necessidade de validação de sua competência ainda se caracterizava como obrigação e autocobrança, expressada por uma frase: “você vai ter que provar se você é boa mesmo ou se não é”. Com isso buscamos atentar à reprodução de imposições de provações socialmente naturalizadas e que não está circunscrita somente às relações de trabalho, também permeando e sendo permeada pelas vidas pessoais dessas mulheres.

3.3 Vida profissional e vida pessoal

Assim como o trabalho está “no centro das relações de gênero” também “as lógicas de gênero são indispensáveis para a compreensão do funcionamento das atividades ligadas ao trabalho” (Maruani, 2019Maruani, M. (2019). Introdução. O adeus ao trabalho, e aí? In M. Maruani (Org.). Trabalho, logo existo. Perspectivas feministas (pp. 11-15). FGV Editora., p. 13). Análises que se ocupam desse tema devem considerar a continuidade entre trabalho produtivo/assalariado e reprodutivo/doméstico (Kergoat, 2019Kergoat, D. (2019). O trabalho, um conceito central para os estudos de gênero? In M. Maruani (Org.). Trabalho, logo existo (pp. 287-294). Perspectivas feministas. FGV Editora.), residindo aí a importância do conceito de divisão sexual do trabalho e da discussão vida profissional e vida pessoal da mulher. Como viemos destacando, ainda que o acesso das mulheres à educação nos últimos 20 anos tenha sido ampliado, como demonstram dados da Organização Internacional do Trabalho ([OIT], 2018Organización Internacional del Trabajo - OIT. (2018). Perspectivas Sociales y del Empleo en el Mundo: Avance global sobre las tendencias del empleo femenino. Oficina Internacional del Trabajo – Ginebra: OIT. Recuperado em 09 de setembro de 2021 de https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/---publ/documents/publication/wcms_619603.pdf.
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), a diferença de participação das mulheres no mercado de trabalho em relação aos homens diminuiu apenas 2% no mesmo período. O Relatório de Gênero do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ([IBGE], 2021Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2021). Estatísticas de Gênero: Indicadores sociais das mulheres no Brasil. 2a Ed. Estudos e Pesquisas. Informação Demográfica e Socioeconômica, 38. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Recuperado em 07 de setembro de 2021 de https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101784_informativo.pdf.
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) também aponta para o nível maior de escolarização das mulheres em todas as faixas etárias à exceção da acima de 65 anos, contudo a participação da mulher no mercado de trabalho é de 19,2 pontos percentuais menor que a dos homens. O relatório justifica esta discrepância também através do conceito de divisão sexual do trabalho: o fato de as mulheres serem as maiores responsáveis pelo trabalho doméstico limita a participação delas no mercado de trabalho e também as direciona para postos de trabalho menor remunerados, o que ilustra o princípio da separação (Hirata & Kergoat, 2007Hirata, H., & Kergoat, D. (2007). Novas configurações da divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa, 37(132). https://doi.org/10.3895/rts.v6n11.2557
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).

As falas acerca da conciliação do trabalho como docente e do trabalho doméstico e de cuidado demonstraram a plasticidade do referido conceito — a coexistência de diferentes modelos (Hirata & Kergoat, 2007Hirata, H., & Kergoat, D. (2007). Novas configurações da divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa, 37(132). https://doi.org/10.3895/rts.v6n11.2557
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). O modelo de conciliação é o que ocorre quando a mulher concilia o trabalho doméstico e familiar com o trabalho profissional, enquanto o homem assume apenas o profissional (Hirata, 2015Hirata, H. (2015). Mudanças e permanências nas desigualdades de gênero: divisão sexual do trabalho numa perspectiva comparativa. Friedrich-Ebert-Stiftung, 7, 4-9. Recuperado em 30 de abril de 2021 de http://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/12133.pdf
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), tal qual ocorre com a entrevistada E22, que afirma “eu na minha casa, aqui, eu faço literalmente tudo”, e exemplifica que mesmo atividades burocráticas, como a sua declaração de imposto de renda e a do marido, são responsabilidades dela. Vale notar que se trata de uma entrevistada com mais de 50 anos.

Por outro lado, no relato de entrevistadas mais jovens, observa-se um modelo de parceria, ou seja, quando homens e mulheres dividem o trabalho doméstico e de cuidado (Hirata, 2015Hirata, H. (2015). Mudanças e permanências nas desigualdades de gênero: divisão sexual do trabalho numa perspectiva comparativa. Friedrich-Ebert-Stiftung, 7, 4-9. Recuperado em 30 de abril de 2021 de http://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/12133.pdf
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). Uma das entrevistadas mais jovens relata que no âmbito doméstico “O pai tem a mesma atribuição que eu. Quando [o filho] era pequeno tinha que trocar a fralda, tinha que dar mamadeira, fazia tudo, então assim, as relações de igualdade, somos pai e mãe, né” (Eb). A entrevistada E3 também apresenta essa variação nas formas de conciliar trabalho doméstico e profissional, ao exemplificar que sua mãe a envolvia nas atividades domésticas, mas deixava de lado os filhos homens. Como consequência dessa divisão injusta, ela relata ter aversão a esse tipo de atividade até hoje, de modo que o realiza a contragosto, dentro do modelo de parceria com o marido. Ela afirma que, ainda que exista um acordo conjugal a respeito das atividades domésticas, que repense sobre essa questão e que isso seja discutido conjuntamente, preferiria “mil vezes pagar alguém”.

Esse “pagar alguém” relaciona-se ao chamado modelo de delegação, que foi o que se fez presente com maior frequência no cotidiano das entrevistadas. Neste modelo fica a cargo de uma outra mulher (empregada, babá, cuidadora, faxineira e familiares) o cuidado com a casa e a família (Hirata & Kergoat, 2007Hirata, H., & Kergoat, D. (2007). Novas configurações da divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa, 37(132). https://doi.org/10.3895/rts.v6n11.2557
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; Hirata, 2015Hirata, H. (2015). Mudanças e permanências nas desigualdades de gênero: divisão sexual do trabalho numa perspectiva comparativa. Friedrich-Ebert-Stiftung, 7, 4-9. Recuperado em 30 de abril de 2021 de http://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/12133.pdf
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). Isso parece ter sido fundamental para a dedicação dessas mulheres à carreira profissional, tal como reconhece a entrevistada E1: “Eu sempre contei e espero continuar contando com uma pessoa que me ajuda nas coisas em casa … o que me dá muito mais liberdade, né, do que se eu tivesse aqui também de dar conta dos afazeres [domésticos] né, que são infindáveis”. Também a entrevistada E25 comenta sua rede de apoio para os cuidados com a filha: “a escola é pertinho. Então eu levo ou a minha funcionária né, minha rede aqui, minha mãe, meu companheiro, a gente se ajuda”.

A dificuldade da vida das mulheres que não contam com a possibilidade de delegar no dia a dia, tampouco de dividir com o marido/companheiro, é intensificada quando se tem filhos em idade infantil, e foi expressa pela entrevistada Ex, que tem dois filhos crianças e conta com ajuda de uma faxineira apenas uma vez por semana. Ela relata que o seu trabalho é constantemente interrompido devido à necessidade de administrar as brincadeiras e apaziguar desentendimentos entre as crianças, de modo que “quando eles vão pra escola é quando eu respiro fundo, tenho ali meu momento de tranquilidade, que é o período da tarde”.

Não raro, o fato de o trabalho doméstico e de cuidado com os filhos recair quase sempre sobre a mulher, e a influência de uma concepção de feminilidade que atrela a maternidade ao feminino, faz com que, uma vez rompida essa esfera, isso ocorra em meio à culpa. Isso foi demonstrado em diversas pesquisas (Neto et al., 2010Neto, A. M. C., Tanure, B., & Andrade, J. (2010). Executivas: carreira, maternidade., amores e preconceitos. RAE eletrônica, 9(1), 2-23. https://doi.org/10.1590/S1676-56482010000100004
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; Loureiro et al., 2012Loureiro, C. M. P., Costa, I. S. A., & Freitas, J. A. S. B. (2012). Trajetórias profissionais de mulheres executivas: qual o preço do sucesso? Revista de Ciências da Administração, 14(33), p. 130-144. https://doi.org/10.5007/2175-8077.2012v14n33p130
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) e se relaciona à romantização da maternidade, algo que não ocorre em relação à paternidade (César et al., 2019César, R.C.B., Loures, A.F., & Andrade, B.B.S. (2019). A romantização da maternidade e a culpabilização da mulher. Revista Mosaico, 10(2), p. 68-75. https://doi.org/10.21727/rm.v10i2Sup.1956
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). Para além disso, esse processo de negociação acarreta, novamente, em autocobranças (Almeida, 2007Almeida, L. S. (2007). Mãe, cuidadora e trabalhadora: Múltiplas identidades de mães que trabalham. Revista do Departamento de Psicologia – UFF, 19(2), p. 411-422. https://doi.org/10.1590/S0104-80232007000200011
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), como pode ser observado quando as entrevistadas (E2, E4, E17, EIII) afirmam que na conciliação do trabalho como docente com o trabalho de cuidado com os/as filhos/as, o sentimento de culpa sempre se faz presente: “Filho, eu fui uma boa mãe pra ti?. Pergunta de mãe com sentimento de culpa, óbvio!” (E4) ou “quando eu fui fazer o doutorado eu deixei minha filha. Ela tinha três anos, eu deixei ela em [cidade], com toda assistência, com a avó, com pai, tudo, e eu fui pra [cidade]. … Mas não foi simples essa decisão e eu acho que tem traumas em função disso.” (E17), e “E engraçado que eu acho que na minha vida profissional eu sempre consegui delegar, eu sempre consegui distribuir tarefas…, mas aqui tem uma culpa, tem aquelas coisas de mulher e de mãe.” (E2). Adicionalmente, a entrevistada EIII, ao refletir sobre suas conquistas profissionais e a criação de duas filhas, afirma que esse foi um processo “eivado de culpas”, das quais ela se livrou “há muito pouco tempo”, ressaltando que apesar de ter tido ajuda paga, os pais das filhas não se envolveram na criação delas: “eu fiz uma carreira, mas eu também paguei um preço por ter feito essa carreira.”.

Assim, esses relatos são permeados por especificidades que remetem à concepção tradicional do feminino na vida doméstica e na influência dessa vida doméstica em seus estudos e atuação profissional (Sardenberg, 2004Sardenberg, C. M. B. (2004). O trabalho feminino no Brasil: desigualdades de gênero e contrastes regionais. In C. M. B. Sardenberg (Org.). A face feminina do complexo metal-mecânico: mulheres metalúrgicas no norte e nordeste. Salvador: NEIM/UFBA:REDOR:CNM/CUT, 01, 27-50. Recuperado em 30 de abril de 2021 de https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/6872), como a maternidade, sinalizada pela entrevistada I, “eu era uma mestranda um pouco velha, …, eu tinha um bebê pra cuidar… então era muito difícil assim”. Ou ainda a entrevistada EXXVII, que ao pedir seis meses de prorrogação de prazo para conclusão do doutorado devido ao nascimento do filho, ouviu, à época, do coordenador do seu programa de pós-graduação: “‘Eu não sei o que você tá pedindo essa prorrogação, porque eu tive minhas três filhas ao longo do doutorado e não precisei’. Aí eu disse: ‘E o senhor pariu e amamentou?’ Ele disse ‘Ah, mas eu fui um pai muito presente!’ Aquilo me marcou, sabe … foi tudo certinho e aos 36 anos, exato, eu era Doutora e Mãe, né.”. Este relato parece evidenciar ambas as percepções: as dificuldades e o sentimento de culpa que perpassam a vida das mulheres enquanto cuidadoras e o sentimento de vitória que representa para essas mulheres realizarem, ao mesmo tempo, projetos profissionais e pessoais.

4 TRAJETÓRIAS ENTRELAÇADAS

Ainda que tenhamos traçado, até aqui, os relatos e reflexões de maneira linear, não é linearmente que essas trajetórias se constituíram. Houve relatos de aprovações em concursos públicos enquanto ainda cursavam a pós-graduação ou em vias de cursar (E1, E6, E7, E8, E11, E13, E14, E15, E16, E17, E24, E25, E26, E30, E31). Também relatos acerca da vivência da maternidade tanto durante os estudos, como nos anos iniciais da docência (E4, E8, E9, E12, E13, E15, E17, E18, E20, E22, E23, E30, E31). Assim, as questões da vida pessoal/familiar entrelaçam-se com as da vida profissional e dão forma às trajetórias das mulheres docentes e pesquisadoras.

Para que esse entrelaçamento seja possível, estratégias de negociação permeiam a vida das mulheres. Para Kolb e McGinn (2008)Kolb, D., & McGinn, K. L. (2008). Beyond Gender and Negotiation to Gendered Negotiations. Harvard Business School NOM, Working Paper No. 09-064. http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.1291948
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é necessário pensar na temática para além do binômio gênero e negociação, mas sim como negociações de gênero. Nessa seara, direciona-se as atenções para discutir “vantagens e desvantagens, exploração e controle, ação e emoção, sentido e identidade, que são padronizados através de e embasados em termos de uma distinção entre homem e mulher, masculino e feminino” (Acker, 1990Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: A theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), p.139-158. https://doi.org/10.1177/089124390004002002
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, p. 146, tradução nossa5 5 “Advantage and disadvantage, exploitation and control, action and emotion, meaning and identity are patterned through and in terms of a distinction between male and female, masculine and feminine” ). Nesse sentido, as mulheres, no decorrer de suas trajetórias profissionais e de suas vidas pessoais e familiares, constantemente veem-se em face de negociações a respeito das oportunidades em suas carreiras, suas legitimações de autoridade, o valor/importância de seus trabalhos, suas redes de suporte, e seus comprometimentos ao ideal profissional tradicional esperado (Fletcher, 1999Fletcher, J. K. (1999). Disappearing acts. MIT Press. https://doi.org/10.7551/mitpress/2440.001.0001
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; Correll et al., 2007Correll, S. J., Benard, S., & Paik, I. (2007). Getting a job: Is there a motherhood penalty? American Journal of Sociology, 112(5), p. 1297-1338. https://doi.org/10.1086/511799
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; Kolb & McGinn, 2008Kolb, D., & McGinn, K. L. (2008). Beyond Gender and Negotiation to Gendered Negotiations. Harvard Business School NOM, Working Paper No. 09-064. http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.1291948
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). Para além disso, ao mesmo tempo em que as mulheres costumam secundarizar seus interesses nas negociações enquanto exacerbam o cuidado e os interesses alheios; quando seus comportamentos desviam desse imaginário social compartilhado de cuidado e atenção aos outros, seus sentimentos pessoais expressam-se em meio ao autoquestionamento e culpa, bem como ao julgamento familiar (Amanatullah & Morris, 2010Amanatullah, E. T., & Morris, M. W. (2010). Negotiating gender roles: Gender differences in assertive negotiating are mediated by women’s fear of backlash and attenuated when negotiating on behalf of others. Journal of Personality and Social Psychology, 98(2), p. 256–267. https://doi.org/10.1037/a0017094
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; Dobrijević, 2014Dobrijević, G. (2014). The effect of gender on negotiation behaviour. Singidunum Journal of Applied Sciences, 14(1), 43-52. https://doi.org/10.5937/sjas11-5298
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).

As estratégias de negociação de cada um desses aspectos da vida são latentes nos relatos quando as entrevistadas sinalizam que eram necessárias “as paradas estratégicas para estudar e parir” (Ei), assim como escolhas acerca da carreira, como a entrevistada E20 que relata que “eu fiquei dez anos [atuando também no setor público] e saí de lá porque fiquei grávida. Eu sou uma mãe dedicada, não dava para conciliar a carreira no setor público e a carreira na docência”. Essas negociações, presentes em diversos relatos, fossem acerca do período de formação, do início de carreira ou até mesmo no desdobrar da profissão, demonstram que não há como separar em polos as vidas pessoais e profissionais das mulheres. Denotam, também, a tentativa de equilíbrio diante das condições impostas socialmente para encontrar um meio termo, em forma de estratégia psíquica (Araujo et al., 2015Araujo, B. F. von B. de., Tureta, C. A., & Araujo, D. A. von B. de. (2015). How do working mothers negotiate the work-home interface? Journal of Managerial Psychology, 30(5), p. 565–581. https://doi.org/10.1108/JMP-11-2013-0375
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; Huopalainen & Satama, 2018Huopalainen, A. S., & Satama, S. T. (2018). Mothers and researchers in the making: Negotiating "new" motherhood within the "new" academia. Human Relations, 72(1), p. 98-121. https://doi.org/10.1177/0018726718764571
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), como afirma a entrevistada E14 a respeito do equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional: “se você me perguntar qual é a minha prioridade, minha prioridade é cuidar dos meus filhos, manter minha sanidade e manter meu emprego, [risos], essa é a ordem”. Assim, esses relatos retomam a reflexão a respeito das concepções de gênero socialmente construídas.

A sobrecarga atribuída à mulher e à mãe, o consequente sentimento de culpa e os questionamentos do entorno social estão presentes nos relatos das participantes sobre a construção de suas trajetórias, ainda que sejam mencionados, em diversos momentos, juntamente com suas conquistas. Por conquistas não consideramos apenas méritos acadêmicos e profissionais, mas também conquistas pessoais. Também não consideramos como méritos circunscritos separadamente, mas uma combinação entrelaçada e simultânea, uma vez que “não tem como comparar. Você compara um emprego com o outro, você não compara um relacionamento com um emprego” (EVII).

A carga emocional depositada nesses processos remete, novamente, às expectativas criadas em torno do sucesso — ou insucesso — das trajetórias. A entrevistada EIV relata que, ainda que estivesse sendo cobrada para ingressar na pós-graduação, foi orientada a se acostumar “porque o mestrado não é fácil, geralmente as pessoas são reprovadas de cara”. A aprovação, assim, na primeira tentativa, é expressa como “sonho, foi uma coisa que eu não esperava” (EIV). Assim também a entrevistada IX que, ao fazer a inscrição para a seleção do doutorado, “a primeira expectativa não era eu passar logo de primeira, a gente sabe que doutorado não é uma coisa fácil”.

Com efeito, somos levadas a refletir acerca dos estereótipos criados em torno da mulher acadêmica, docente, pesquisadora, bem como ao comportamento esperado e percebido frente às situações entendidas como provações de suas trajetórias (El-Alayli et al., 2018El-Alayli, A., Hansen-Brown, A. A., & Ceynar, M. (2018). Dancing Backwards in High Heels: Female Professors Experience More Work Demands and Special Favor Requests, Particularly from Academically Entitled Students. Sex Roles, 79, p. 136-150. https://doi.org/10.1007/s11199-017-0872-6
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). Dessa maneira toma forma a marcante fala da entrevistada E6, quando questionada sobre suas bancas de concurso público, afirmando que “cada provação é uma vitória, cada caminho uma vitória! … todas foram altamente marcantes, com lágrimas nos olhos, com ansiedade na alma, com nervosismo, com expectativa, sem saber se vai, sem saber se volta. Todas as aprovações foram surpreendentes, foram festejadas!”. Os relatos de lágrimas nos olhos, ansiedades na alma e nervosismos, nos levam também a refletir acerca das nuances que coletivamente estruturam as trajetórias femininas e compõem, nem sempre tão positivamente, as emoções de suas vitórias. Finalmente, e assim como viemos descrevendo com as entrevistas, é possível afirmar que os processos que individualmente são descritos como vitoriosos encontram consonância na construção de uma versão compartilhada de trajetória de mulheres na pesquisa e docência em Turismo, portanto não representativa nem ilustrativa da trajetória de uma única mulher.

5 CONCLUSÃO

Este estudo é fruto de uma ampla pesquisa, ainda em andamento, que neste trabalho especificamente apresentou uma compreensão das trajetórias acadêmicas das mulheres docentes e pesquisadoras no Turismo e, portanto, não invalida outras discussões sobre o tema. Optou-se, aqui, por dar visibilidade às trajetórias de vida dessas mulheres e por discutir aspectos de suas carreiras em que o gênero foi determinante, notadamente os que se relacionam à conciliação do trabalho doméstico e de cuidado com a carreira de docente/pesquisadora. É importante notar que não houve identificação de relatos que apresentassem especificidades da academia do Turismo, mas sim, um amplo reconhecimento de que as mulheres da docência e da pesquisa do Turismo brasileiro enfrentam e vivenciam questões comuns às mulheres no mercado de trabalho como um todo (Le Feuvre, 2019Le Feuvre, N. (2019). Conclusão. Reconfigurações das questões da igualdade nas sociedades contemporâneas. In M. Maruani (Org.). Trabalho, logo existo. Perspectivas feministas (pp. 307-318). FGV Editora.).

Essas trajetórias certamente influenciam as estruturas da pesquisa acadêmica em Turismo, nos principais espaços da produção de conhecimento em Turismo no país, os Programas de Pós-Graduação. Isto porque as mulheres participaram da formação desses PPGs desde seu início nos anos 2000, além de comporem desde sua criação, em maior ou menor medida, as diretorias da ANPTUR, assumindo posições de liderança no cenário acadêmico nacional. As formas como essas mulheres atuam como docentes e pesquisadoras também influenciaram e influenciam diretamente a pesquisa em Turismo no Brasil, pois entendemos que o conhecimento acadêmico é construído pelas sinergias da pesquisadora e do seu objeto/sujeito de pesquisa (Swain, 2016Swain, M. B. (2016). Embodying cosmopolitan paradigms in tourism research. In A. M. Munar & T. Jamal. Tourism research paradigms: Critical and emergent knowledges. Tourism Social Sciences Series, 22, Emerald. https://doi.org/10.1108/S1571-504320150000022012
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) e, portanto, é um conhecimento situado (Haraway, 1988Haraway, D. (1988). Situated knowledges: The science question in feminism and the privilege of partial perspective. Feminist Studies, 14(3), p. 575-599. https://doi.org/10.2307/3178066
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). Do mesmo modo, o gênero parece impactar a atuação da mulher enquanto docente e enquanto pesquisadora. Em específico a atuação na pós-graduação que demanda e valoriza publicações, participação em congressos, representação institucional e internacionalização de carreira, o que representa uma carga de trabalho extra à concorrida agenda pessoal e profissional das mulheres.

Assim, tanto o perfil profissional quanto o pessoal das mulheres impactam. No primeiro caso, a experiência consolidada em sala de aula antes de ingressar na pós-graduação (sete anos em média) e a participação na fundação dos PPGs nos quais atuam (cinco). No segundo, a média de 50 anos, ter ou ter tido relacionamentos estáveis (27) e serem mães (22), também apontam para o arcabouço pessoal que irá influenciar na condução de sua carreira como docente e pesquisadora, quer fazendo escolhas, quer enfrentando as adversidades atreladas ao gênero feminino na sociedade contemporânea.

A partir da voz das docentes pesquisadoras reconhecemos que sua formação, carreira acadêmica e vida profissional e pessoal foram influenciadas pelo gênero. Isso porque, apesar de, oficialmente, a carreira docente não fazer distinção em relação a sexo, as concepções tradicionais de gênero trazem questões que podem, em alguma medida, colocar obstáculos ou limites que tendem a afetar as mulheres de forma mais acentuada que os homens. Nesse sentido, ao invés de considerar apenas o cotidiano estritamente acadêmico, interrogar as entrevistadas sobre o trabalho doméstico e de cuidado e utilizar o conceito de divisão sexual do trabalho permitiu considerar “o conjunto do trabalho socialmente realizado” (Kergoat, 2019Kergoat, D. (2019). O trabalho, um conceito central para os estudos de gênero? In M. Maruani (Org.). Trabalho, logo existo (pp. 287-294). Perspectivas feministas. FGV Editora., p. 289) e dar visibilidade a questões de gênero que perpassam as trajetórias profissionais das entrevistadas. É com essa chave de leitura que compreendemos os percalços, os obstáculos, os constrangimentos e o sentimento de culpa em suas trajetórias individuais, ainda que tenham sido relatados como parte da vida da mulher e, quando (e não se, pois sempre são relatados como) superados, se transformam em motivo de vitória. Essa consideração, quando tomada como coletiva, pode representar a naturalização das construções sociais de gênero (Furlin, 2014Furlin, N. (2014). A categoria de gênero e o seu estatuto na produção do conhecimento: algumas considerações teóricas. Revista Sociais e Humanas, 27(2), p. 110-127. https://doi.org/10.5902/2317175812751
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) no ambiente acadêmico, contribuindo para reiterar a hierarquia acadêmica (Grossi & Rea, 2020Grossi, M. P., & Rea, C. A. (2020). Teoria feminista e produção de conhecimento situado: Ciências humanas, biológicas, exatas e engenharias. In M. P. Grossi & C. A. Rea. (Orgs.). Devires.), para reproduzir estereótipos da diferença de gênero (Louro, 1997Louro, G. L. (1997). Gênero, sexualidade e educação. Vozes.), e para legitimar diferentes condições de trabalho para homens e para mulheres (Sardenberg, 2004Sardenberg, C. M. B. (2004). O trabalho feminino no Brasil: desigualdades de gênero e contrastes regionais. In C. M. B. Sardenberg (Org.). A face feminina do complexo metal-mecânico: mulheres metalúrgicas no norte e nordeste. Salvador: NEIM/UFBA:REDOR:CNM/CUT, 01, 27-50. Recuperado em 30 de abril de 2021 de https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/6872).

Finalmente, é importante destacar que por se tratar de uma ampla pesquisa ainda em andamento, as mais de 31 horas de entrevistas realizadas e transcritas apontam ainda outras questões, tais como o assédio moral e sexual nas universidades, a influência dos relacionamentos familiares (conjugais e sobre ter ou não filhos) para as decisões de carreira, que não puderam ser exploradas neste artigo. Além disso, considerando que a diversidade de experiências entre as mulheres é ainda maior quando se considera o fator raça, destacamos como limitação desta pesquisa a não problematização desse assunto e indicamos a necessidade de pesquisas futuras que considerem o efeito do fator raça na carreira acadêmica do Turismo. Como dificuldade relatamos a recusa na participação, a não resposta e algumas reiterações de convite para participação no estudo indicando que a discussão deste tema parece, paradoxalmente, não ser de interesse de todas as docentes. Assim, também toma forma a emergência no aprofundamento do debate e na ampliação das análises, visando a continuidade da contribuição com os estudos sobre a relação das mulheres com o mercado de trabalho, dando maior visibilidade às questões de gênero na academia do Turismo.

  • Como citar: Censon, D.; Reis C. U. F.; Medaglia, J.; Nakatani, M. S. M. (2022). Trajetórias de mulheres na docência e na pesquisa em Turismo. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, São Paulo, 16, e-2468.http://dx.doi.org/10.7784/rbtur.v16.2468
  • 1
    “gender meanings have suffused our belief systems, institutions, and even such apparently gender-free phenomena as our architecture and urban planning.”
  • 2
    “From early days of tourism studies, there has been a noticeable lack of women researchers”
  • 3
    A Bibliometria é um campo teórico tradicional da Ciência da Informação com leis e princípios empíricos estatísticos que emprega diferentes critérios (autores, palavras-chave, periódicos, entre outros), no desenvolvimento de pesquisas científicas que visam conhecer e aprofundar determinada temática. Uma das vertentes observadas em pesquisas contemporâneas é o uso da Bibliometria como técnica de pesquisa, realidade reconhecida especialmente nas investigações desenvolvidas nos campos das ciências humanas, sociais e sociais aplicadas (Araújo, 2006Araújo, C. A. (2006). Bibliometria: evolução histórica e questões atuais. Em Questão, 12(1), p. 11-32. https://brapci.inf.br/index.php/res/v/10124
    https://brapci.inf.br/index.php/res/v/10...
    ).
  • 4
    A demanda para a criação do GT de gênero no Seminário da ANPTUR partiu de duas mestrandas em Turismo que escreveram uma carta assinada por outros colegas e professores e entregue à diretoria da ANPTUR no Seminário de 2018.
  • 5
    “Advantage and disadvantage, exploitation and control, action and emotion, meaning and identity are patterned through and in terms of a distinction between male and female, masculine and feminine”

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Editado por

Editor:

Leandro B. Brusadin.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    05 Jul 2021
  • Aceito
    04 Out 2021
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