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Impacto do curativo de espuma não aderente com Ibuprofeno na vida dos pacientes com úlcera venosa

RESUMO

Objetivo:

avaliar a dor em pacientes portadores de úlcera venosa de membros inferiores que utilizaram curativo de espuma não aderente com Ibuprofeno (CEI).

Métodos:

estudo prospectivo de pacientes portadores de úlceras venosas de membros inferiores tratados no período de abril de 2013 a agosto de 2014. Foram utilizados os questionários Escala Numérica e Questionário de Dor de McGille, as avaliações eram feitas no momento da inclusão do paciente no estudo e a cada oito dias, totalizando cinco consultas. Os pacientes foram divididos em dois grupos: 40 no Grupo Estudo (GE), que foram tratados com CEI, e 40 no Grupo Controle (GC), tratados com curativo primário, conforme o tipo de tecido e exsudato.

Resultados:

na primeira consulta os pacientes de ambos os grupos relataram dor intensa. No quinto dia os pacientes do GE relataram ausência de dor e a maioria do GC relatou dor moderada. Com relação ao Questionário de Dor de McGill, a maioria dos pacientes de ambos os grupos, no início da coleta de dados, relataram sensações relacionadas aos descritores sensorial, afetivo, avaliativo e miscelânea, sendo que entre os pacientes do GE houve discreta melhora após a segunda consulta. Após a terceira consulta já não referiram os descritores citados. Os pacientes do GC manifestaram todas as sensações desses descritores até quinta a consulta.

Conclusão:

o curativo de espuma não aderente com Ibuprofeno é eficaz na redução da dor de pacientes portadores de úlceras venosas.

Descritores:
Úlcera Varicosa; Extremidade Inferior; Medição da Dor.Ibuprofeno; Qualidade de vida; Assistência Centrada no Paciente.

ABSTRACT

Objective :

to evaluate pain in patients with lower limb venous ulcer who used non-adherent Ibuprofen foam dressing (IFD).

Methods :

we conducted a prospective study of patients with lower limb venous ulcers treated from April 2013 to August 2014. We used the Numerical Scale and McGill Pain Questionnaire, performing the assessments at the moment of inclusion of the patient in the study and every eight days thereafter, totaling five consultations. We divided the patients into two groups: 40 in the Study Group (SG), who were treated with IFD, and 40 in the Control Group (CG), treated with primary dressing, according to tissue type and exudate.

Results :

at the first consultation, patients from both groups reported intense pain. On the fifth day, SG patients reported no pain and the majority of CG reported moderate pain. Regarding the McGill Pain Questionnaire, most patients of both groups reported sensations related to sensory, affective, evaluative and miscellaneous descriptors at the beginning of data collection; after the second assessment, there was slight improvement among the patients in the SG. After the third consultation, they no longer reported the mentioned descriptors. CG patients displayed all the sensations of these descriptors until the fifth visit.

Conclusion :

non-adherent Ibuprofen foam dressing is effective in reducing the pain of patients with venous ulcers.

Keywords:
Varicose Ulcer; Lower Extremity; Pain Measurement; Ibuprofen; Quality of life; Patient-Centered Care.

INTRODUÇÃO

As úlceras venosas são consequência de insuficiência venosa crônica, decorrente de hipertensão venosa ocasionada por incompetência valvular das veias superficiais e profundas, da obstrução venosa ou da combinação destes fatores11 Abbade LP, Lastória S, Rollo HA. Venous ulcer: cli-nical characteristics and risk factors. Int J Dermatol. 2011;50(4):405-11.,22 Kanjoor JR. Venous ulcer: current concepts. Indian J Plast Surg. 2011;44(1):109-11.. Acometem com maior frequência os membros inferiores e comprometem cerca de 5% da população adulta nos países ocidentais, com prevalência de 0,3%. Sua ocorrência aumenta com a idade, sendo superior a 4% em indivíduos com mais de 65 anos11 Abbade LP, Lastória S, Rollo HA. Venous ulcer: cli-nical characteristics and risk factors. Int J Dermatol. 2011;50(4):405-11.,33 Bergan JJ, Schmid-Schönbein GW, Smith PD, Nicolaides AN, Boisseau MR, Eklof B. Chronic venous disease. N Engl J Med. 2006;355(5):488-98.. Podem apresentar exsudato e odor com necessidade de troca de curativos várias vezes por dia, com impacto no estilo de vida. É comum que o paciente apresente frustração e desesperança relacionadas ao tratamento, pois algumas destas lesões podem levar meses para cicatrizar44 Salomé GM, Almeida AS, Ferreira LM. Association of sociodemographic factors with hope for cure, religiosity, and spirituality in patients with venous ulcers. Adv Skin Wound Care. 2015;28(2):76-82.

5 Salomé GM, Alves SG, Costa VF, Pereira VR, Ferreira LM. Feelings of powerlessness and hope for cure in patients with chronic lower-limb ulcers. J Wound Care. 2013;22(6):300, 302-4.

6 Corrêa NF, Brito MJ, CarvalhoResende MM, Duarte MF, Santos FS, Salomé GM, et al. Impact of surgical wound dehiscence on health-related quality of life and mental health. J Wound Care. 2016;25(10):561-70.
-77 Salomé GM, Almeida SA, Ferreira LM. Evaluation of pain in patients with venous ulcers after skin graf-ting. J Tissue Viability. 2014;23(3):115-20.. Acarretam dor, edema, perda de mobilidade e afastamento das atividades profissionais, gerando, frequentemente, aposentadoria por invalidez. Como consequência da dor, que agrava ou gera dificuldade de locomoção, e da restrição das atividades da vida diária e do lazer, a úlcera venosa pode levar a alterações da qualidade de vida e da autoestima, e determinar quadros de ansiedade e depressão, que podem contribuir para o retardo do processo de cicatrização da úlcera88 Salomé GM, de Almeida SA, de Jesus Pereira MT, Massahud MR Jr, de Oliveira CN, de Brito MJ, et al. The impact of venous leg ulcers on body image and self-esteem. Adv Skin Wound Care.2016; 29(7): 316-321.

9 Salomé GM, Blanes L, Ferreira LM. The impact of skin grafting on the quality of life and self-esteem of patients with venous leg ulcers. World J Surg. 2014;38(1):233-40.

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11 Pedroso RA, Celich KLS. Dor: quinto sinal vital, um desafio para o cuidar em enfermagem. Texto contexto-enferm. 2006;15(2):270-6.

12 Price P. Health-related quality of live and the patient perspective. J Wound Care. 1998;7(7):365-6.

13 González-Consuegra RV, Verdú J. Quality of life in people with venous leg ulcers: an integrative review. J Adv Nurs. 2011;67(5):926-44.

14 Nelson EA, Bell-Syer SE, Cullum NA. Compression for preventing recurrence of venous ulcers. Int J Low Extrem Wounds. 2012;11(3):235-6.
-1515 Douglas V. Living with a chronic leg ulcer: an insight into patients' experiences and feelings. J Wound Care. 2001;10(9):355-60..

O curativo de espuma com Ibuprofeno (CEI) é um curativo não aderente, formado por espuma ligada a um filme semipermeável de poliuretano que permite que o Ibuprofeno seja liberado na ferida pela presença de fluidos ou exsudato. Trata-se de tecnologia inovadora, que promove melhor controle do exsudato, assegura um mínimo de risco de vazamento ou maceração da pele, traz alívio da dor durante o tempo de uso do curativo e durante suas trocas e promove um meio úmido1616 Arapoglou V, Katsenis K, Syrigos KN, Dinakakos EP, Zalopoulos N, Tsoutsos D, et al. Analgesic efficacy of anibuprofen-releasing foam dressing compared with local best practice for pain fulexuding wounds. J Wound Care. 2011;20(7):319-20, 322-5.

17 Palao iDomenech R, Romanelli M, Tsiftsis DD, Slonková V, Jortikka A, Johannensen N, et al. Effect of an ibuprofen-releasing foam dressing on wound pain: a real-life. J Wound Care. 2008;17(8):342-8.
-1818 Jørgensen B, Friis GJ, Gottrup F. Pain and quality of life for patients with venous leg ulcers: proof of concept of the efficacy of Biatain-Ibu, a new pain reducing wound dressing. Wound Repair Regen. 2006;14 (3):233-9..

Este estudo teve como objetivo avaliar o impacto do curativo de espuma não aderente com Ibuprofeno no controle da dor de pacientes portadores de úlceras venosas.

MÉTODOS

Estudo controlado, randomizado, analítico e prospectivo realizado no Ambulatório São João da Faculdade de Ciências da Saúde Dr. José Antônio Garcia Coutinho, após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o número 534.263.

Foram estudados 80 pacientes, divididos em dois grupos com 40 pacientes cada: Grupo Estudo (GE), tratados com CEI, e Grupo Controle (GC), tratados com curativo primário, conforme o tipo de tecido e exsudato. Os critérios de inclusão foram: idade igual e/ou superior a 18 anos, índice tornozelo/braço entre 1,0 e 1,4, pacientes que estavam fazendo uso de medicação para dor e que não estavam sendo tratados com terapia compressiva. Os critérios de exclusão foram: pacientes cujas feridas apresentavam sinais clínicos de infecção, alergia ao Ibuprofeno ou presença de erisipela adjacente à lesão. Foram excluídos do trabalho os pacientes faltosos ao atendimento no ambulatório, aqueles que durante o estudo estivessem tomando medicação para dor e pacientes que, durante estudo, a ferida apresentasse sinais clínicos de infecção ou alergia.

O trabalho foi realizado no período de abril de 2013 a agosto de 2014, sendo a primeira coleta de dados realizada no momento da inclusão do paciente no estudo, e depois a cada oito dias, totalizando cinco consultas. Nestas consultas, a ferida era avaliada e trocado o curativo primário, mas os pacientes foram orientados a trocar o curativo secundário sempre que ocorresse a saturação.

Os pacientes foram randomizados por processo de envelopes selados e opacos e foram guardados na central de randomização. Um indivíduo independente gerou uma sequência de números randômicos, colocando-os um a um nos envelopes selados. Os pacientes foram sorteados de forma consecutiva, por meio da retirada do envelope e da alocação em um dos grupos.

Os participantes responderam a questionário sobre dados sociodemográficos e clínicos. Para quantificar a intensidade de dor foi utilizada a Escala Numérica de dor, graduada de 0 a 10, em que 0 significa ausência de dor e 10 a pior dor já sentida. A intensidade de dor foi classificada em ausência de dor (0), dor leve (1-3), moderada (4-6) e intensa (7-10)1919 Peón AU, Diccini S. Dor pós-operatório em craniotomia. Rev Latino-am Enfermagem. 2005;13(4):489-95.,2020 Pimenta CAM, Teixeira MJ. Questionário de dor de McGill: proposta da adaptação para a língua portuguesa. Rev Esc Enferm USP. 1996;30(3): 473-83..

A qualidade da dor foi avaliada com a aplicação do Questionário de Dor de McGill. Esse questionário é constituído por palavras conhecidas como descritores, pois descrevem a sensação de dor que o paciente pode estar sentindo. Os descritores são organizados em quatro grandes grupos e em 20 subgrupos. Cada conjunto de subgrupos avalia um grupo. Os descritores abrangem as áreas: sensorial (subgrupo de 1 a 10), afetivo (subgrupo de 11 a 15), avaliativo (subgrupo 16) e miscelânea (subgrupo de 17 a 20)1919 Peón AU, Diccini S. Dor pós-operatório em craniotomia. Rev Latino-am Enfermagem. 2005;13(4):489-95.,2020 Pimenta CAM, Teixeira MJ. Questionário de dor de McGill: proposta da adaptação para a língua portuguesa. Rev Esc Enferm USP. 1996;30(3): 473-83.. O grupo sensorial-discriminativo (subgrupos de 1 a 10) refere-se às propriedades mecânicas, térmicas, de vividez e espaciais da dor; o grupo afetivo-motivacional (subgrupos de 11 a 15) descreve a dimensão afetiva nos aspectos de tensão, medo e respostas neurovegetativas; os descritores do componente cognitivo-avaliativo (subgrupo 16) permitem ao doente expressar a avaliação global da experiência dolorosa. Os subgrupos de 17 a 20 compreendem itens de miscelânea. Cada subgrupo é composto por dois a seis descritores qualitativamente similares, mas com nuances que os tornam diferentes em termos de magnitude. Assim, para cada descritor corresponde um número que indica sua intensidade.

A partir do questionário de McGill, pode se chegar às seguintes medidas: número de descritores escolhidos e índice de dor. O número de descritores escolhidos corresponde às palavras que o doente escolheu para explicar a dor. O maior valor possível é 20, pois o doente só pode escolher, no máximo, uma palavra por subgrupo. O índice de dor é obtido com o somatório dos valores de intensidade dos descritores escolhidos. Estes índices podem ser obtidos no total e para cada um dos quatro componentes do questionário: padrão sensitivo, afetivo, avaliativo e subgrupo de miscelânea.

A análise estatística foi realizada no SPSS 11.5. Para análise estatística foram utilizados os seguintes testes: teste de Mann-Whitney e teste do Qui-quadrado. Para todos os testes estatísticos foram considerados os níveis de significância de 5% (p≤0,05).

RESULTADOS

As variáveis sociodemográficas dos participantes podem ser vistas na tabela 1. Verifica-se que a maioria dos participantes de ambos os grupos eram da cor branca, sexo feminino, idade acima 60 anos, aposentados e fumantes. Com relação à escolaridade, 18 participantes (45%) do GE eram analfabetos e 29 pacientes (72,50%) do GC tinham apenas o ensino fundamental.

Tabela 1
Relação das variáveis sócio-demográficas dos participantes do estudo.

No que se refere à lesão, na tabela 2 pode se observar que a maioria dos pacientes de ambos os grupos conviviam com a úlcera por seis a dez anos e as lesões apresentavam exsudato e odor.

Tabela 2
Relação das variáveis relacionadas à lesão.

A tabela 3 mostra que a maioria dos pacientes de ambos os grupos tinham diabetes mellitus, hipertensão arterial e não eram cardiopatas.

Tabela 3
Relação das variáveis relacionadas à doença.

Na tabela 4 podemos observar que na primeira avaliação os pacientes de ambos os grupos relataram dor intensa; na segunda, a maioria dos pacientes do GE relatou dor moderada. Já no GC, 20 (50%) relataram dor moderada e 19 (47,50%) dor intensa. Na terceira avaliação, a maioria dos pacientes do GE relatou dor leve e os pacientes do GC relataram dor moderada. Na quarta avaliação, a maioria dos pacientes relatou ausência de dor. No GC, a maioria relatou dor moderada. Na quinta consulta, a maioria dos pacientes relatou ausência de dor. No GC, a maioria relatou dor moderada.

Tabela 4
Resultados obtidos do Escore total da Escala numérica de dor.

A tabela 5 possibilita observar que a maioria dos pacientes de ambos os grupos relatou os descritores sensorial, afetivo, avaliativo e miscelânea. O GC manteve o relato destes descritores até a quinta avaliação, com discreta melhora, porém, o GE apresentou melhora significativa durante a primeira e até a quinta consulta.

Tabela 5
Resultados obtidos no escore total dos descritores do Questionário de Dor de McGill.

DISCUSSÃO

A doença venosa crônica é, no Brasil, a 14a causa de afastamento temporário do trabalho. Esses dados representam um sério problema de saúde pública, que atinge diversas faixas etárias, diferentes etnias, ambos os sexos, com reflexo nos gastos públicos e interferência na qualidade de vida dos pacientes e de seus familiares. Constatou-se que a maioria dos pacientes era fumante e com baixo grau de escolaridade, dados que se assemelham aos de outras pesquisas55 Salomé GM, Alves SG, Costa VF, Pereira VR, Ferreira LM. Feelings of powerlessness and hope for cure in patients with chronic lower-limb ulcers. J Wound Care. 2013;22(6):300, 302-4.

6 Corrêa NF, Brito MJ, CarvalhoResende MM, Duarte MF, Santos FS, Salomé GM, et al. Impact of surgical wound dehiscence on health-related quality of life and mental health. J Wound Care. 2016;25(10):561-70.
-77 Salomé GM, Almeida SA, Ferreira LM. Evaluation of pain in patients with venous ulcers after skin graf-ting. J Tissue Viability. 2014;23(3):115-20.,1717 Palao iDomenech R, Romanelli M, Tsiftsis DD, Slonková V, Jortikka A, Johannensen N, et al. Effect of an ibuprofen-releasing foam dressing on wound pain: a real-life. J Wound Care. 2008;17(8):342-8.,2121 Kalra M, Gloviczki P. Surgical treatment of venous ulcers: role of subfascial endoscopic perforator vein ligation. Surg Clin North Am. 2003;83(3):671-705.,2222 Macêdo EAB, Oliveira AKA, Melo GSM, Nóbrega WG, Costa IKF, Dantas DV, et al. Characterization socio-demographic of patients with venous ulcers treated at a university hospital. J Nurs UFPE online. 2010;4 (spe):1863-67.. Entre os participantes do estudo verificou-se predomínio de mulheres. Infere-se que a ocorrência de úlcera venosa no sexo feminino esteja associada a fatores hormonais, à gravidez, ao puerpério e à maior incidência de veias varicosas, o que pode favorecer o surgimento da insuficiência venosa crônica. Este predomínio deve-se também, em parte, à longevidade feminina, uma vez que, até a idade dos 40 anos, o número de casos se distribui com certa igualdade entre os sexos2323 Azoubel R, Torres GV, Silva LWS, Gomes FV, Reis LA. Efeitos da terapia física descongestiva na cicatrização de úlceras venosas. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2010 Dec [cited 2012 Aug 26];44(4):1085-92. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v44n4/33.pdf
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24 Bongiovanni CM, Hughes MD, Bomengen RW. Accelerated wound healing: multidisciplinary advances in the care of venous leg ulcers. Angiology. 2006;57(2):139-44.
-2525 Macedo EAB, Nogueira MIS, Torres SMSGSO, Torres GV. Efetividade da terapia compressiva na cicatrização de úlcera venosa: uma revisão da literatura. Rev Fiep Bulletin. 2009;79 (especial):344-6..

Com relação ao tabagismo, sabe-se que o fumo prejudica a oxigenação dos tecidos, diminui a resistência do organismo, deixando-o mais suscetível à infecções e retarda a cicatrização. Além disso, o tabagismo altera a síntese de colágeno, dificultando a cicatrização de feridas. A nicotina produz vasoconstrição, que aumenta o risco de isquemia e de desenvolvimento de úlceras, e as úlceras, quando já existentes, apresentam dificuldade na cicatrização. Nesses casos, o processo celular é interrompido e funções anormais decorrem de fatores sistêmicos, locais ou ambos no processo da cicatrização2626 Uchimoto S, Tsumura K, Hayashi T, Suematsu C, Endo G, Fujii S, et al. Impact of cigarette smo-king on the incidence of Type 2 diabetes mellitus in middle-aged Japanese men: the Osaka Health Survey. Diabet Med.1999;16(11):951-5..

A dor em feridas decorre da lesão tecidual e a percepção da dor depende de inúmeros fatores relacionados ao paciente, ao tipo de ferida, à quantidade e à intensidade de estímulos externos1919 Peón AU, Diccini S. Dor pós-operatório em craniotomia. Rev Latino-am Enfermagem. 2005;13(4):489-95.,2020 Pimenta CAM, Teixeira MJ. Questionário de dor de McGill: proposta da adaptação para a língua portuguesa. Rev Esc Enferm USP. 1996;30(3): 473-83.. A pele é ricamente inervada, o que lhe confere a capacidade de captar vários tipos de estímulos, e a presença de infecção e necrose agrava o processo doloroso das feridas. A dor crônica pode ser considerada como a perpetuação da dor aguda, não tem função biológica de alerta e gera sofrimento. Em geral, não ocorrem respostas neurovegetativas como as encontradas na dor aguda, sendo essas decorrentes da adaptação dos sistemas neuronais2727 Silva JA, Ribeiro-Filho NP. Avaliação e mensuração de dor: pesquisa, teoria e prática. Ribeirão Preto: FUNPEC; 2006..

Dor é uma das principais causas do sofrimento de qualquer pessoa doente. Estudos nacionais e internacionais relatam que aproximadamente 80% da procura das pessoas pelos serviços de saúde são motivadas por dor. A dor crônica acomete 30 a 40% dos brasileiros e constitui a principal causa de absenteísmo, licenças médicas, aposentadorias por doença, indenizações trabalhistas e baixa produtividade no trabalho2828 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS no 19, de 03 de janeiro de 2002. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, o Programa Nacional de Assistência à Dor e Cuidados Paliativos [Internet]. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil. 2002 jan 04 [acesso 2009 ago 17]. Disponível em: http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIAS/Port2002
http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIA...
,2929 Elliott TE, Renier CM, Palcher JA. Chronic pain, depression, and quality of life: correlations and predictive value of the SF-36. Pain Med. 2003;4(4):331-9.. A dor é um sintoma muito frequente em pacientes com úlcera venosa e sua prevalência varia entre 80 e 96% nesse grupo de pessoas. Pode ser persistente e/ou ser exacerbada durante as trocas de curativo. A dor pode também influenciar negativamente a cicatrização, pois o estímulo doloroso está associado à liberação de mediadores inflamatórios, que potencialmente reduzem a reparação tecidual e a regeneração1616 Arapoglou V, Katsenis K, Syrigos KN, Dinakakos EP, Zalopoulos N, Tsoutsos D, et al. Analgesic efficacy of anibuprofen-releasing foam dressing compared with local best practice for pain fulexuding wounds. J Wound Care. 2011;20(7):319-20, 322-5.,3030 Oliveira PFT, Tatagiba BSF, Martins MA, Tipple AFV, Pereira LV. Avaliação da dor durante a troca de curativo de úlceras de perna. Texto Contexto Enferm. 2012;21(4):862-9.

31 Woo KY, Sibbald RG. The improvement of wound-associated pain and healing trajectory with a comprehensive foot and leg ulcer care model. J Wound Ostomy Continence Nurs. 2009;36(2):184-91.
-3232 Cruz HM, Pimenta CA, Dellarozza MS, Braga PE, Lebrão ML, Duarte YA. Quedas em idosos com dor crônica: prevalência e fatores associados. Rev Dor. 2011;12(2):108-14..

No presente estudo, todos os pacientes, dos dois grupos, referiram dor intensa no início da coleta de dados, porém os participantes do GE, que foram tratados com o curativo de espuma não aderente com Ibuprofeno, apresentaram melhora significativa da dor na segunda semana de tratamento. Com relação ao GC, após a quarta consulta, os pacientes relataram dor moderada, enquanto os pacientes do GE relataram ausência de dor.

Estudo em que se utilizou curativo de espuma não aderente com Ibuprofeno, os autores concluíram que esse curativo foi eficaz no alívio da dor1616 Arapoglou V, Katsenis K, Syrigos KN, Dinakakos EP, Zalopoulos N, Tsoutsos D, et al. Analgesic efficacy of anibuprofen-releasing foam dressing compared with local best practice for pain fulexuding wounds. J Wound Care. 2011;20(7):319-20, 322-5.. Também em nosso estudo, os pacientes tratados com CEI apresentaram melhora significativa após primeira semana de tratamento.

Em estudo em que os autores descreveram as características da dor nos pacientes com úlceras crônicas do pé, a amostra foi composta por 90 pacientes, e utilizada a escala numérica e Questionário de Dor de McGill. A intensidade média da dor relatada era 7,56 e os descritores sensíveis foram usados mais frequentemente para descrever a dor. Os autores concluíram ser necessário que os profissionais, ao avaliarem os pacientes com estas feridas, utilizem um instrumento para avaliar a dor e elaborem um plano assistencial para que possam ter melhora da dor e da qualidade de vida3333 Gonçalves ML, de Gouveia Santos VL, de Mattos Pimenta CA, Suzuki E, Komegae KM. Pain in chronic leg ulcers. J Wound Ostomy Continence Nurs. 2004;31(5):275-83.,3434 Dutra RA, Salomé GM, Leal LM, Alves MG, Moura JP, Silva AT, et al. Cost comparison of pressure ulcer preventive dressings: hydrocolloid dressing versus transparent polyurethane film. J Wound Care. 2016; 25(11):635-40..

O Questionário de Dor de McGill avalia aspectos sensoriais, afetivos e avaliativos da dor, descrevendo a experiência dolorosa que os pacientes apresentam. A dimensão sensitivo-discriminativa avalia os aspectos têmporo-espaciais, mecânicos e térmicos da dor; a dimensão afetivo-motivacional envolve aspectos de tensão, medo, autopunição e respostas neurovegetativas; e a dimensão cognitivo-avaliativa avalia a situação global do indivíduo e representa um julgamento baseado nas características sensoriais e afetivas, na experiência prévia e no significado da situação1919 Peón AU, Diccini S. Dor pós-operatório em craniotomia. Rev Latino-am Enfermagem. 2005;13(4):489-95.,2020 Pimenta CAM, Teixeira MJ. Questionário de dor de McGill: proposta da adaptação para a língua portuguesa. Rev Esc Enferm USP. 1996;30(3): 473-83.,3535 Vilela LHR, Salomé GM, Pereira RC, Ferreira LM. Pain assessment in patients with venous leg ulcer treated by compression therapy with unnas boot. J Tissue Sci Eng. 2016;7:2..

Em outro estudo com 24 pacientes com dor, os autores investigaram o efeito do curativo de espuma não aderente com Ibuprofeno. A dor persistente na ferida apresentou diminuição de uma média de 6,3±2,2 - 3,0±1,7 após 12 horas e permaneceu baixa em seguida. A dor na troca de curativo também diminuiu e manteve-se baixa. Assim como nós, os autores concluíram que o curativo de espuma não aderente com Ibuprofeno reduziu a dor de pacientes portadores de úlcera venosa crônica3636 Jørgensen B, Gottrup F, Karlsmark T, Bech-Thomsen N, Sibbald RG. Combined use of an ibuprofen-releasing foam dressing and silver dressing on infected leg ulcers. J Wound Care. 2008;17(5):210-4..

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  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2017

Histórico

  • Recebido
    02 Out 2016
  • Aceito
    15 Dez 2016
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