Acessibilidade / Reportar erro

Impacto clínico do Model For End Liver Disease (MELD) na presença de invasão microvascular e no desfecho pós-operatório em pacientes submetidos a transplante hepático

RESUMO

Objetivo:

correlacionar dados clínicos e epidemiológicos com a análise patológica dos explantes hepáticos dos pacientes submetidos ao transplante hepático por hetapocarcinoma no HC da UNICAMP e verificar se os scores MELD e MELD-Na apresentam diferenças estatísticas para predizer pior prognóstico pós-transplante.

Métodos:

considerando os transplantes hepáticos ocorridos entre maio/2010 e novembro/2017, após excluir 38, 87 pacientes foram incluídos, analisando-se dados clínicos e laboratoriais desses pacientes para verificar se há independência entre esses e desfecho Invasão Microvascular (IMV). Posteriormente, realizou-se o cálculo do MELD e MELD-Na, a análise descritiva dos dados clínicos e laboratoriais e, por fim, curvas ROC para avaliar a associação entre esses parâmetros laboratoriais e o desfecho óbito nestes pacientes.

Resultados:

a maior parte dos pacientes foi do sexo masculino (78,30%), com idade, em média, de 58,53 anos. A maior parte das hepatopatias foi causada pelo VHC (53,26%). Não foi encontrado preditores para o desfecho IMV entre os parâmetros laboratoriais. As curvas ROC para o desfecho óbito identificaram o score MELD como ponto de corte de maior sensibilidade (90,91%) e especificidade (37,50%) simultâneas com o valor de 10 pontos, ao passo que no MELD-Na o ponto de corte foi 7 pontos, com sensibilidade de 90,91% e especificidade de 33,33%, sendo ambas as escalas significativas.

Conclusões:

não foram encontrados preditores para IMV entre critérios clínicos, laboratoriais e epidemiológicos. O score MELD-Na é mais sensível que o MELD para predizer mortalidade nos pacientes submetidos a transplante hepático.

Palavras-chave:
Neoplasias Hepáticas; Cirrose Hepática; Transplante de Fígado

ABSTRACT

Objective:

to correlate clinical and epidemiological data with the pathological analysis of liver explants from patients undergoing liver transplantation for hetapocarcinoma in the UNICAMP HC and to verify whether the MELD and MELD-Na scores are reliable factors to predict a worse post-transplant prognosis.

Methods:

we studied liver transplants carried out between May 2010 and November 2017. After excluding 38 patients, we included 87, analyzing clinical and laboratory data for correlation with the outcome Microvascular Invasion (MVI). Subsequently, we computed the MELD and MELD-Na scores and performed a descriptive analysis of clinical and laboratory data and, finally, calculated ROC curves to assess the association between these laboratory parameters and mortality in these patients.

Results:

most patients were male (78.30%), with an average age of 58.53 years. Most liver diseases were caused by HCV (53.26%). We found no predictors for MVI among the laboratory parameters. The ROC curves for death identified the MELD score as the cutoff point with the highest combined sensitivity (90.91%) and specificity (37.50%), with a value of 10 points, whereas in the MELD-Na the cutoff point was 7 points, with a sensitivity of 90.91% and a specificity of 33.33%, both scores being significant.

Conclusions:

there were no reliable predictors of MVI between clinical, laboratory, and epidemiological variables. The MELD-Na score is more sensitive than the MELD one for predicting mortality in patients undergoing liver transplantation.

Keywords:
Liver Neoplasms; Hepatic Cirrhosis; Liver transplant

INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que em 2030, em todo o mundo, um milhão de pessoas morrerão por cânceres de origem hepática11 Villanueva A. Hepatocellular Carcinoma. N Engl J Med. 2019;380(15):1450-62. doi: 10.1056/NEJMra1713263.
https://doi.org/10.1056/NEJMra1713263...
. O carcinoma hepatocelular (CHC), o tipo mais prevalente dos tumores hepáticos malignos primários, é um dos maiores problemas de saúde em nível mundial e com incidência crescente22 Njei B, Rotman Y, Ditah I, Lim JK. Emerging trends in hepatocellular carcinoma incidence and mortality. Hepatology. 2015;61(1):191-9. doi: 10.1002/hep.27388.
https://doi.org/10.1002/hep.27388...

3 Severi T, Van Malenstein H, Verslype C, Van Pelt JF. Tumor initiation and progression in hepatocellular carcinoma: Risk factors, classification, and therapeutic targets. Acta Pharmacol Sin. 2010;31(11):1409-20. doi: 10.1038/aps.2010.142.
https://doi.org/10.1038/aps.2010.142...
-44 Kulik L, El-Serag HB. Epidemiology and Management of Hepatocellular Carcinoma. Gastroenterology. 2019;156(2):477-91.e1. doi: 10.1053/j.gastro.2018.08.065.
https://doi.org/10.1053/j.gastro.2018.08...
. Centenas de milhares de novos diagnósticos são realizados a cada ano, sendo essa neoplasia responsável por 85% dos casos em países emergentes, notadamente naqueles endêmicos para o vírus da hepatite B (VHB)11 Villanueva A. Hepatocellular Carcinoma. N Engl J Med. 2019;380(15):1450-62. doi: 10.1056/NEJMra1713263.
https://doi.org/10.1056/NEJMra1713263...
,55 El-Serag HB. Hepatocellular Carcinoma. N Engl J Med. 2011;365(12):1118-27. doi: 10.1056/NEJMra1001683.
https://doi.org/10.1056/NEJMra1001683...
,66 Finn RS, Qin S, Ikeda M, Galle PR, Ducreux M, Kim TY, et al. Atezolizumab plus bevacizumab in unresectable hepatocellular carcinoma. N Engl J Med. 2020;382(20):1894-905. doi: 10.1056/NEJMoa1915745.
https://doi.org/10.1056/NEJMoa1915745...
.

O desenvolvimento de CHC está relacionado a fatores de risco que elevam substancialmente as probabilidades de ocorrência deste câncer, tais como: vírus da hepatite B (VHB), vírus da hepatite C (VHC), doença hepática alcoólica (DHA), doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) e cirrose por qualquer etiologia55 El-Serag HB. Hepatocellular Carcinoma. N Engl J Med. 2011;365(12):1118-27. doi: 10.1056/NEJMra1001683.
https://doi.org/10.1056/NEJMra1001683...
,77 Shiels MS, O'Brien TR. Recent Decline in Hepatocellular Carcinoma Rates in the United States. Gastroenterology. 2020;158(5):1503-1505.e2. 10.1053/j.gastro.2019.12.030.
https://doi.org/10.1053/j.gastro.2019.12...
. Geralmente, essas doenças passam pelo estágio de fibrose hepática antes de culminarem em carcinoma hepatocelular, o que não exclui, entretanto, a possiblidade de evolução direta para CHC88 Tapper EB, Lok ASF. Use of liver imaging and biopsy in clinical practice. N Engl J Med. 2017;377(8):756-68. doi: 10.1056/NEJMra1610570.
https://doi.org/10.1056/NEJMra1610570...
.

A DHGNA apresenta prevalência global estimada em 25% e tem se tornado a causa mais comum de CHC, estando entre a segunda ou terceira indicação de transplante hepático88 Tapper EB, Lok ASF. Use of liver imaging and biopsy in clinical practice. N Engl J Med. 2017;377(8):756-68. doi: 10.1056/NEJMra1610570.
https://doi.org/10.1056/NEJMra1610570...
,99 Chalasani N, Younossi Z, Lavine JE, Diehl AM, Brunt EM, Cusi K, et al. The diagnosis and management of non-alcoholic fatty liver disease: Practice Guideline by the American Association for the Study of Liver Diseases, American College of Gastroenterology, and the American Gastroenterological Association. Hepatology. 2012;55(6):2005-23. doi: 10.1002/hep.25762.
https://doi.org/10.1002/hep.25762...
. Aproximadamente, um quarto dos adultos com DHGNA apresenta esteato-hepatite não alcoólica (EHNA), que usualmente leva à fibrose hepática progressiva, passa pela cirrose e finalmente evolui para o carcinoma hepatocelular1010 Isabela Andronescu C, Roxana Purcarea M, Aurel Babes P. The role of noninvasive tests and liver biopsy in the diagnosis of nonalcoholic fatty liver disease. J Med Life. 2018;11(3):243-6. doi: 10.25122/jml-2018-1002.
https://doi.org/10.25122/jml-2018-1002...

11 Loomba R, Sanyal AJ. The global NAFLD epidemic. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2013;10(11):686-90. doi: 10.1038/nrgastro.2013.171.
https://doi.org/10.1038/nrgastro.2013.17...
-1212 Lazo M, Clark JM. The epidemiology of nonalcoholic fatty liver disease: A global perspective. Semin Liver Dis. 2008;28(4):339-50. doi: 10.1055/s-0028-1091978.
https://doi.org/10.1055/s-0028-1091978...
.

Estudos relatam aumento constante na prevalência e incidência de hepatocarcinoma relacionado à DHGNA. Em futuro próximo, é provável que haja mais casos de CHC relacionado à EHNA quando comparados aos diagnósticos de hepatite C crônica. Isso será possível porque o tratamento para o vírus C é eficaz e pode atingir a erradicação viral em quase todos os pacientes, ao passo que a EHNA é cada vez mais prevalente1313 Davila JA, Morgan RO, Shaib Y, McGlynn KA, El-Serag HB. Diabetes increases the risk of hepatocellular carcinoma in the United States: A population based case control study. Gut. 2005;54(4):533-9. doi: 10.1136/gut.2004.052167.
https://doi.org/10.1136/gut.2004.052167...

14 Pais R, Fartoux L, Goumard C, Scatton O, Wendum D, Rosmorduc O, et al. Temporal trends, clinical patterns and outcomes of NAFLD-related HCC in patients undergoing liver resection over a 20-year period. Aliment Pharmacol Ther. 2017;46(9):856-63. doi: 10.1111/apt.14261.
https://doi.org/10.1111/apt.14261...
-1515 Terrault NA, Zeuzem S, Di Bisceglie AM, Lim JK, Pockros PJ, Frazier LM, et al. Effectiveness of Ledipasvir-Sofosbuvir Combination in Patients With Hepatitis C Virus Infection and Factors Associated With Sustained Virologic Response. Gastroenterology. 2016 Dec;151(6):1131-40.e5. doi: 10.1053/j.gastro.2016.08.004.
https://doi.org/10.1053/j.gastro.2016.08...
.

O tratamento de escolha para a falência hepática avançada é o transplante de fígado humano, sendo essa modalidade terapêutica limitada em razão da demanda por esse órgão ser maior que a oferta. Por esse motivo, existe lista dos potenciais receptores de transplante hepático, sendo a ordem definida por critérios clínicos que avaliam o risco de mortalidade na fila do transplante, como o Model End Liver Disease (MELD), adotado no Brasil em 20061616 Turri JAO, Decimoni TC, Ferreira LA, Diniz MA, Haddad LB de P, Campolina AG. Higher MELD score increases the overall cost on the waiting list for liver transplantation: a micro-costing analysis based study. Arq Gastroenterol. 2017;54(3):238-45. doi: 10.1590/S0004-2803.201700000-35.
https://doi.org/10.1590/S0004-2803.20170...

17 de Freitas ACT, Rampim AT, Nunes CP, Coelho JCU. Impact of meld sodium on liver transplantation waiting list. Arq Bras Cir Dig. 2019;32(3):e1460. doi: 10.1590/0102-672020190001e1460.
https://doi.org/10.1590/0102-67202019000...
-1818 Aranzana EM, Coppini AZ, Ribeiro MA, Massarollo PCB, Szutan LA, Ferreira FG. Model for end-stage liver disease, model for liver transplantation survival and donor risk index as predictive models of survival after liver transplantation in 1,006 patients. Clinics. 2015;70(6):413-8. doi: 10.6061/clinics/2015(06)05.
https://doi.org/10.6061/clinics/2015(06)...
.

Algumas características histológicas do CHC estão diretamente relacionadas com a evolução da doença, como a ocorrência de invasão microvascular (IMV). Vários autores mostraram que a presença de IMV relacionou-se intimamente com a recorrência do CHC, com o pior prognóstico e com a menor sobrevida do paciente, restringindo, assim, as opções de abordagem terapêutica1919 Kaibori M, Ishizaki M, Matsui K, Kwon A-H. Predictors of microvascular invasion before hepatectomy for hepatocellular carcinoma. J Surg Oncol. 2010;102(5):462-8. doi: 10.1002/jso.21631.
https://doi.org/10.1002/jso.21631...
. No entanto, a IMV é de difícil detecção por métodos de imagem e laboratoriais, sendo necessária avaliação histopatológica do explante hepático, o que restringe a utilidade dessa informação no pré-operatório. Assim, o médico assistente poderá ter informações limitadas necessárias para ponderar sobre as terapias disponíveis2020 Sumie S, Kuromatsu R, Okuda K, Ando E, Takata A, Fukushima N, et al. Microvascular Invasion in Patients with Hepatocellular Carcinoma and Its Predictable Clinicopathological Factors. Ann Surg Oncol. 2008;15(5):1375-82. doi: 10.1245/s10434-008-9846-9.
https://doi.org/10.1245/s10434-008-9846-...

21 Zhao WC, Fan LF, Yang N, Zhang HB, Chen BD, Yang GS. Preoperative predictors of microvascular invasion in multinodular hepatocellular carcinoma. Eur J Surg Oncol. 2013;39(8):858-64. doi: 10.1016/j.ejso.2013.04.003.
https://doi.org/10.1016/j.ejso.2013.04.0...
-2222 Choi KK, Kim SH, Choi SB, Lim JH, Choi GH, Choi JS, et al. Portal venous invasion: The single most independent risk factor for immediate postoperative recurrence of hepatocellular carcinoma. J Gastroenterol Hepatol. 2011;26(11):1646-51. doi: 10.1111/j.1440-1746.2011.06780.x.
https://doi.org/10.1111/j.1440-1746.2011...
.

Embora a ocorrência de IMV ainda seja fenômeno pouco elucidado, diversas pesquisas vêm sendo realizadas a fim de compreender a relação com outros dados clínicos e epidemiológicos1919 Kaibori M, Ishizaki M, Matsui K, Kwon A-H. Predictors of microvascular invasion before hepatectomy for hepatocellular carcinoma. J Surg Oncol. 2010;102(5):462-8. doi: 10.1002/jso.21631.
https://doi.org/10.1002/jso.21631...

20 Sumie S, Kuromatsu R, Okuda K, Ando E, Takata A, Fukushima N, et al. Microvascular Invasion in Patients with Hepatocellular Carcinoma and Its Predictable Clinicopathological Factors. Ann Surg Oncol. 2008;15(5):1375-82. doi: 10.1245/s10434-008-9846-9.
https://doi.org/10.1245/s10434-008-9846-...
-2121 Zhao WC, Fan LF, Yang N, Zhang HB, Chen BD, Yang GS. Preoperative predictors of microvascular invasion in multinodular hepatocellular carcinoma. Eur J Surg Oncol. 2013;39(8):858-64. doi: 10.1016/j.ejso.2013.04.003.
https://doi.org/10.1016/j.ejso.2013.04.0...
,2323 Zhang X, Li J, Shen F, Lau WY. Significance of presence of microvascular invasion in specimens obtained after surgical treatment of hepatocellular carcinoma. J Gastroenterol Hepatol. 2018;33(2):347-54. doi: 10.1111/jgh.13843.
https://doi.org/10.1111/jgh.13843...
. A análise por tomografia computadorizada (TC), por exemplo, não conferiu predição à IMV e, até o momento, não existem outros métodos comprovadamente capazes de predizer a ocorrência de IMV de forma geral2424 Lahan-Martins D, Perales SR, Gallani SK, Costa LBE da, Lago EAD, Boin I de FSF, et al. Microvascular invasion in hepatocellular carcinoma: Is it predictable with quantitative computed tomography parameters? Radiol Bras. 2019;52(5):287-92. doi: 10.1590/0100-3984.2018.0123.
https://doi.org/10.1590/0100-3984.2018.0...
. Estudos mostraram que níveis séricos de alguns marcadores, como alfafetoproteína (AFP) e Gama GT, podem predizer a presença de IMV em pacientes com múltiplos nódulos hepáticos2121 Zhao WC, Fan LF, Yang N, Zhang HB, Chen BD, Yang GS. Preoperative predictors of microvascular invasion in multinodular hepatocellular carcinoma. Eur J Surg Oncol. 2013;39(8):858-64. doi: 10.1016/j.ejso.2013.04.003.
https://doi.org/10.1016/j.ejso.2013.04.0...
.

Sendo assim, antever IMV ou determinar fatores clínicos relacionados poderá auxiliar no manejo operatório e no planejamento terapêutico, podendo impactar positivamente no prognóstico da doença e na sobrevida do paciente. Nesse aspecto, o presente estudo se pautará em análise retrospectiva de pacientes submetidos ao transplante hepático, a fim de determinar se a etiologia da hepatopatia foi capaz de predizer a ocorrência de invasão microvascular, além de discutir as características clínico-epidemiológicas de todos os transplantados.

OBJETIVOS

O objetivo deste estudo foi correlacionar dados clínicos e epidemiológico com a análise patológica dos explantes hepáticos de todos os pacientes que foram submetidos ao transplante hepático, no Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), no período de maio/2010 a novembro/2017, em virtude de hepatocarcinoma por cirrose de qualquer etiologia. Em seguida, buscou-se relacionar estatisticamente a causa da hepatopatia e outros dados pré-clínicos com o desfecho de invasão microvascular e óbito. Além disso, verificou-se se os scores MELD e MELD-Na apresentaram diferença na sensibilidade/especificidade para predizer o desfecho óbito nos pacientes pós-transplante.

MÉTODO

Trata-se de estudo retrospectivo que consistiu na análise de prontuários de todos os pacientes que foram submetidos ao transplante hepático, por qualquer etiologia, no período de maio/2010 a novembro/2017, no HC da UNICAMP, em São Paulo - Brasil. Inicialmente, 125 pacientes foram incluídos, sendo excluídos aqueles que não continham informações suficientes para o presente estudo.

Para os exames séricos quantitativos, foram considerados os dados com data mais próxima ao transplante, admitindo-se no máximo três meses antes da operação. Foram excluídos 32 pacientes por não apresentarem as seguintes informações: presença ou ausência de invasão microvascular, data do transplante hepático, data do óbito, histórico de tabagismo e alcoolismo, histórico de diabetes mellitus e hipertensão arterial, peso, altura, presença ou ausência de varizes esofágicas, presença ou ausência de ascite e dosagem dos seguintes biomarcadores: aspartato aminotransferase (AST/TGO), alanina aminotransferase (ALT/TGP), alfafetoproteína, fosfatase alcalina, sódio sérico, creatinina, gamaglutamiltransferase (GGT), plaquetas, bilirrubina total, albumina sérica e relação normatizada internacional (RNI).

Com a posse desses dados, foram calculados os scores MELD e MELD-Na para todos os pacientes do estudo. O cálculo do MELD foi feito pela fórmula: MELD=10*((0.957 * ln [Creatinina]) + (0.378 * ln [Bilirrubina]) + (1.12 ln [RNI])) + 6.43. E o cálculo do MELD-Na pela fórmula: MELD-Na=MELD + 1.32 x (137 - Na) - [0.033 x MELD*(137- Na)]”, considerando-se a correção do valor do sódio sérico para a faixa de 125-137 mEq/L, conforme critérios determinados pela United Network for Organ Sharing (UNOS).

Posteriormente, foi realizada a análise descritiva dos dados clínicos e laboratoriais, sendo que para as variáveis categóricas optou-se pelas medidas de frequência absoluta e relativa. Para as variáveis contínuas, foi conduzida análise da distribuição de probabilidade dos dados, de modo que, para aqueles cuja distribuição foi evidenciada como normal optou-se pelo uso da média e desvio padrão como medidas de tendência central e dispersão, respectivamente. Nas variáveis cuja distribuição foi não normal, preferiu-se o resumo pela mediana, como medida de tendência central, e amplitude interquartil, como medida de dispersão. Para a comparação entre as variáveis laboratoriais contínuas de distribuição normal, foi realizado o teste t de Student, e o teste de Kruskal-Wallis foi utilizado para as variáveis com distribuição não-normal.

Também, foi conduzida uma análise de correlação para identificação da independência entre as variáveis disponíveis pelo Teste de Correlação de Spearman, sendo as variáveis independentes incluídas em modelos de regressão logística na busca da associação, pelo Odds Ratio, para os desfechos “Invasão Microvascular” e “Óbito” por carcinoma hepatocelular. Em um primeiro momento, realizou-se a análise de regressão logística binária, ao passo que que as associações que retornaram P-Valor <0,20 foram incluídas no modelo de regressão logística multivariada. Neste, houve saturação progressiva na adição das variáveis, observando-se os efeitos sobre a precisão e sobre o ajuste das demais variáveis sob a análise definitiva.

Por fim, utilizando-se a escala Model End-Stage Liver Disease (MELD) e a variante que inclui valores séricos de sódio (MELD-Na) foram construídas curvas ROC, avaliando-se a associação entre os parâmetros laboratoriais de gravidade na doença hepática (utilizados para o cálculo do score) e a invasão microvascular/óbito nestes pacientes. Assim, buscou-se estabelecer, na curva, o ponto de corte ideal para o desfecho como aquele que evidencia os maiores valores de Sensibilidade e Especificidade simultaneamente.

Toda a tabulação ocorreu no programa Microsoft Excel© e as análises estatísticas foram realizadas no software Stata versão 16.0 (StataCorp. 2019. Stata Statistical Software: Release 16. College Station, TX: StataCorp LP), com nível de significância de 5%.

O estudo em questão está em consonância com os preceitos éticos exigidos. Sendo, previamente, submetido ao comitê de ética em pesquisa da UNICAMP, obtendo aprovação sob o número de parecer 1.377.774.

RESULTADOS

Na Tabela 1 estão dispostas as características individuais dos pacientes em estudo, podendo-se observar que, dentre os 93 pacientes, 72 (78,30%) foram do sexo masculino, com idade, em média, de 58,53 anos (± 0,80 anos) e 84 (91,3%) raça/cor branca. Quarenta e nove (53,26%) das hepatopatias foi causada pelo vírus da Hepatite C, seguida por Hepatopatia alcoólica (17,39%). Destaca-se que, ainda assim, 65 pacientes (70,70%) tinham histórico de uso de bebidas alcoólicas, 49 (53,26%) eram hipertensos e os tumores foram localizados principalmente no lado direito [80 (66,67%)] do fígado. Os tumores tiveram 3,05cm (±1,98cm) e grau histológico 2 [42 (56,25%)]. Vinte e nove enfermos (31,52%) tinham invasão microvascular à análise histopatológica e 44 (47,83%) morreram, sendo o tempo até o óbito de 27,5 dias (±92,5 dias) e a principal causa foi a septicemia, somando 18 (40,91%) das mortes (Tabela 2).

Tabela 1
Características epidemiológicas e clínicas dos pacientes submetidos a transplante hepático por Carcinoma Hepatocelular.

Tabela 2
Causa do óbito em pacientes submetidos a transplante hepático por Carcinoma Hepatocelular.

Na Tabela 3 estão dispostos os dados laboratoriais dos pacientes, evidenciando-se média dos valores de albumina abaixo dos limites inferiores de referência no grupo de pacientes sem invasão microvascular (Média=3,32 e DP=0,94) e dentro dos limites de referência no grupo com IMV (Média de 3,66 e DP=0,71). A mediana para as plaquetas também esteve abaixo dos limites inferiores de referência, em ambos os grupos. Os valores medianos de alfafetoproteína, TGO e GGT estiveram acima dos limites superiores da normalidade. A mediana para o MELD dos pacientes foi de 12 (AI=7) em pacientes sem IMV e 11 (5,5) em pacientes com IMV, sendo os valores de MELD-Na 11 (AI=11) e 8 (AI=6,5), para os mesmos grupos. Não houve diferenças significativas entre os grupos para nenhum dos parâmetros avaliados.

Tabela 3
Características laboratoriais dos pacientes submetidos a análise histopatológica após transplante hepático por Carcinoma Hepatocelular.

Na Tabela 4, pode-se identificar que não houve diferença entre as causas de hepatopatia com relação ao desfecho invasão microvascular, havendo apenas, inicialmente, associação com o sexo masculino e o tabagismo, porém nenhuma das duas variáveis foi significativa na análise multivariada. Para o desfecho óbito, na análise bivariada não houve associação com nenhuma das causas de hepatopatia especificamente. Foram identificados como fatores de proteção o sexo masculino (p-valor=0,012) e o tabagismo (p-valor=0,035), além da Hipertensão Arterial Sistêmica como fator de risco (p-valor=0,037). Contudo, permaneceu na análise multivariada apenas o sexo masculino (OR=0,2189 e IC=0,0624; 0,7683).

Tabela 4
Fatores pré-clínicos associados à Invasão Microvascular e ao óbito em pacientes submetidos a transplante hepático por Carcinoma Hepatocelular.

A Tabela 5 tem registrada a associação inicial entre o tamanho do maior tumor >5cm, Bilirrubina Total >1,2mg/dL, Plaquetograma <100x109/L, Albumina Sérica <3,5 ou >5,5g/dL, GGT>130U/L e o desfecho invasão microvascular. No entanto, nenhuma variável permaneceu significativa na análise multivariada. Não foram identificadas associações entre as variáveis laboratoriais de exposição e o desfecho óbito.

Tabela 5
Fatores clínico-laboratoriais associados à Invasão Microvascular e ao óbito em pacientes submetidos a transplante hepático por Carcinoma Hepatocelular.

Na Figura 2, as curvas foram construídas para o desfecho óbito, sendo que para o score MELD foi o ponto de corte de maior sensibilidade (90,91%) e especificidade (37,50%) sendo o valor de corte 10 pontos, ao passo que no MELD-Na o ponto de corte foi 7 pontos, com sensibilidade de 90,91% e especificidade de 33,33%. Ambas as escalas foram significativas, com valores de área sob a curva de 0,5727 para a escala MELD e 0,6032 para o MELD-Na. Os óbitos ocorreram em média com 27,5 dias, indo de 1 dia até 53 meses.

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

O desenvolvimento de modelos teóricos-clínicos capazes de predizerem desfechos desfavoráveis auxiliam no planejamento e na condução terapêutica do paciente. Apesar de existirem inúmeros métodos hábeis para a predição de várias enfermidades, muitas vezes há alto nível de dificuldade para determinar essas ferramentas. De sorte que é necessário grande produção científica e distintas abordagens do mesmo assunto por diferentes pesquisadores. O presente estudo buscou correlacionar as informações clínico-laboratoriais dos pacientes submetidos a transplante de fígado por CHC a fim de verificar se existe relação desses dados com IMV ou óbito. Recentemente, outros autores, por meio da abordagem de cálculos utilizando dados obtidos por tomografia multislice, concluíram que não foi possível predizer IMV, como Lahan et al.2424 Lahan-Martins D, Perales SR, Gallani SK, Costa LBE da, Lago EAD, Boin I de FSF, et al. Microvascular invasion in hepatocellular carcinoma: Is it predictable with quantitative computed tomography parameters? Radiol Bras. 2019;52(5):287-92. doi: 10.1590/0100-3984.2018.0123.
https://doi.org/10.1590/0100-3984.2018.0...
que concluíram que a análise tomográfica quantitativa não prediz invasão microvascular.

Neste estudo, observamos que as características epidemiológicas dos pacientes são semelhantes ao perfil nacional. No Brasil, cerca de 70% dos casos de CHC estão relacionados à cirrose secundária à infecção pelos vírus B ou C2525 Carrilho FJ, Kikuchi L, Branco F, Goncalves CS, Mattos AA. Clinical and epidemiological aspects of hepatocellular carcinoma in Brazil. Clinics (Sao Paulo). 2010;65(12):1285-90. doi: 10.1590/s1807-59322010001200010.
https://doi.org/10.1590/s1807-5932201000...
. Além disso, nacionalmente, há predomínio do vírus C sobre o vírus B, sendo, 54% e 16%, respectivamente2525 Carrilho FJ, Kikuchi L, Branco F, Goncalves CS, Mattos AA. Clinical and epidemiological aspects of hepatocellular carcinoma in Brazil. Clinics (Sao Paulo). 2010;65(12):1285-90. doi: 10.1590/s1807-59322010001200010.
https://doi.org/10.1590/s1807-5932201000...
. No presente estudo, no entanto, embora a maioria dos casos de CHC sejam associados ao vírus C, a causa alcoólica está representada como segunda etiologia mais prevalente, chegando ao percentual de 17%, ao passo que o vírus B ficou em 6%, conforme registrado na Tabela 1. É válido ponderar que a amostra utilizada nesse estudo é menor quando comparada ao estudo de Carrilho et al.2525 Carrilho FJ, Kikuchi L, Branco F, Goncalves CS, Mattos AA. Clinical and epidemiological aspects of hepatocellular carcinoma in Brazil. Clinics (Sao Paulo). 2010;65(12):1285-90. doi: 10.1590/s1807-59322010001200010.
https://doi.org/10.1590/s1807-5932201000...
, que definiu o perfil brasileiro para CHC. Essa diferença amostral poderia justificar a divergência entre a segunda etiologia de CHC ter sido causa alcoólica e não pelo vírus B neste estudo.

Atualmente, o estilo de vida e os hábitos alimentares dos pacientes, tem chamado a atenção para as alterações metabólicas. Sabe-se que em futuro próximo, as causas metabólicas de cirrose poderão ser mais prevalentes que as causas virais1313 Davila JA, Morgan RO, Shaib Y, McGlynn KA, El-Serag HB. Diabetes increases the risk of hepatocellular carcinoma in the United States: A population based case control study. Gut. 2005;54(4):533-9. doi: 10.1136/gut.2004.052167.
https://doi.org/10.1136/gut.2004.052167...
, ademais, nosso estudo corroborou que o alcoolismo também é motivo de preocupação para o carcinoma hepatocelular.

O resultado sobre as etiologias de CHC teve relação direta com o estilo de vida e/ou comorbidades dos pacientes estudados. Após a análise dos prontuários, constatamos que 70% desses pacientes referiram uso crônico de bebida alcoólica em algum momento anterior ao transplante, destaca-se aqui que a hepatopatia alcoólica figurou como a segunda causa mais prevalente neste estudo. Além disso, 30% tinham o diagnóstico de diabetes mellitus e 53% eram hipertensos, ficando evidente que a maioria dos pacientes tinha algum tipo de comorbidade metabólica, conforme registrado na Tabela 1. Além disso, quando comparados aos dados nacionais, os pacientes deste estudo apresentaram maior porcentagem de coinfecção pelo vírus B e C, enquanto o país possui o percentual de 2%, nossos pacientes somaram 6%.

A ocorrência de hepatopatia por causa desconhecida (criptogênica), também esteve acima da prevalência brasileira, enquanto a média nacional ficou em 3%, nós encontramos 16%. Possível justificativa poderia ser os casos, ainda, sub-diagnósticados de NASH. Ressalta-se que o estudo que definiu a epidemiologia brasileira data de 20102525 Carrilho FJ, Kikuchi L, Branco F, Goncalves CS, Mattos AA. Clinical and epidemiological aspects of hepatocellular carcinoma in Brazil. Clinics (Sao Paulo). 2010;65(12):1285-90. doi: 10.1590/s1807-59322010001200010.
https://doi.org/10.1590/s1807-5932201000...
, com isso, podemos estar diante de tendência de mudança do perfil epidemiológico brasileiro. Isso porque as terapias anti-virais estão avançando, enquanto os hábitos de vida dos pacientes não estão acompanhando isso3232 GBD 2015 Obesity Collaborators, Afshin A, Forouzanfar MH, et al. Health Effects of Overweight and Obesity in 195 Countries over 25 Years. N Engl J Med. 2017;377(1):13-27. doi:10.1056/NEJMoa1614362.
https://doi.org/10.1056/NEJMoa1614362...
.

A Tabela 1 tem o registro das características clínicas dos transplantados, sendo 78% homens e a média da idade dos pacientes de 58 anos (36-81). Além disso, a Tabela 4 mostra que, entre todas as variáveis pré-clínicas analisadas, o sexo masculino apresentou-se como fator de proteção para o desfecho óbito. Assim, apesar de mais homens serem acometidos pelo CHC (78%), porcentagem menor evoluiu para óbito quando comparado ao sexo feminino. O sexo feminino, no entanto, esteve em menor quantidade em nosso estudo, 21 (22%), o que poderia justificar esse achado. Por outro lado, a porcentagem do sexo masculino (78%) foi exatamente igual (78%) ao estudo de Carrilho2525 Carrilho FJ, Kikuchi L, Branco F, Goncalves CS, Mattos AA. Clinical and epidemiological aspects of hepatocellular carcinoma in Brazil. Clinics (Sao Paulo). 2010;65(12):1285-90. doi: 10.1590/s1807-59322010001200010.
https://doi.org/10.1590/s1807-5932201000...
que analisou 1.363 pacientes, com carcinoma hepatocelular, em 2010. Essa informação revela que não houve tendência de redução do CHC em homens, mantendo-se a taxa constante. De forma semelhante, ainda como visto na Tabela 4, não encontramos nenhuma relação entre os parâmetros analisados e o desfecho invasão microvascular, nem mesmo o sexo masculino apresentou-se significante.

A Tabela 2 relaciona a causa mortis de todos os pacientes que evoluíram para o óbito nos pós-transplante. Foram 14 causas distintas, entre essas, com aproximadamente 41%, a septicemia figurou como o principal motivo de óbito nos pacientes, seguida por choque hipovolêmico, com aproximadamente 16%. Acreditamos que o motivo para esses resultados foi, principalmente, o fato do transplante hepático ser operação de grande porte e a utilização de imunossupressores no pós-operatório. No entanto, avanços significativos na técnica cirúrgica, na terapia imunossurpressora e no manejo anestésico, têm melhorado os desfechos no pós-operatório precoce e tardio2626 Bertacco A, Barbieri S, Guastalla G, Boetto R, Vitale A, Zanus G, et al. Risk Factors for Early Mortality in Liver Transplant Patients. Transplant Proc. 2019;51(1):179-83. doi: 10.1016/j.transproceed.2018.06.025.
https://doi.org/10.1016/j.transproceed.2...
.

Sobre os exames séricos quantitativos, Zhao et al.2121 Zhao WC, Fan LF, Yang N, Zhang HB, Chen BD, Yang GS. Preoperative predictors of microvascular invasion in multinodular hepatocellular carcinoma. Eur J Surg Oncol. 2013;39(8):858-64. doi: 10.1016/j.ejso.2013.04.003.
https://doi.org/10.1016/j.ejso.2013.04.0...
concluíram que a concentração sérica dos biomarcadores AFP >400 mg/L, GGT >130 U/L, diâmetro do tumor >8cm e quantidade de tumores >3, eram preditores de IMV em pacientes diagnosticados com CHC multinodular. No nosso estudo, entretanto, não conseguimos reproduzir esses resultados, pois foram avaliados tumores maiores que 5 centímetros, bilirrubina total >1,2mg/dL, plaquetograma <100x109/L, albumina sérica <3,5 ou >5,5g/dL, TGP >44 U/L ou GGT >130U/L, conforme demonstrado na Tabela 5. Em suma, nenhuma dessas variáveis teve relação significante para o desfecho invasão microvascular. Também foi feita análise generalizada da amostra, considerando-se, no mesmo cálculo, os pacientes com um ou múltiplos nódulos, apesar de 39% desses serem multinodulares, muito semelhante à proporção de 40% da amostra do estudo de Yang et al.2727 Yang T, Zhang J, Lu J-H, Yang G-S, Wu M-C, Yu W-F. Risk factors influencing postoperative outcomes of major hepatic resection of hepatocellular carcinoma for patients with underlying liver diseases. World J Surg. 2011 Sep;35(9):2073-82. doi: 10.1007/s00268-011-1161-0.
https://doi.org/10.1007/s00268-011-1161-...
.

Destaca-se que outros autores1919 Kaibori M, Ishizaki M, Matsui K, Kwon A-H. Predictors of microvascular invasion before hepatectomy for hepatocellular carcinoma. J Surg Oncol. 2010;102(5):462-8. doi: 10.1002/jso.21631.
https://doi.org/10.1002/jso.21631...
já haviam determinado que a invasão microvascular é fator de risco para gravidade e recorrência do CHC, embora nosso estudo não tenha contemplado dados de recorrência do hepatocarcinoma. Além disso, quando o tumor está próximo de cinco centímetros de diâmetro, usualmente o nódulo começa a perder diferenciação, podendo apresentar invasão microvascular. A partir disso, poderia ser admitido que quanto maior o nódulo, pior seria o prognóstico do paciente, com maior probabilidade de recorrência2828 Bruix J, Reig M, Sherman M. Evidence-Based Diagnosis, Staging, and Treatment of Patients With Hepatocellular Carcinoma. Gastroenterology. 2016;150(4):835-53. doi: 10.1053/j.gastro.2015.12.041.
https://doi.org/10.1053/j.gastro.2015.12...
,2929 Hsu HC, Sheu JC, Lin YH, Chen DS, Lee CS, Hwang LY, et al. Prognostic histologic features of resected small hepatocellular carcinoma (HCC) in Taiwan. A comparison with resected large HCC. Cancer. 1985;56(3):672-80. doi: 10.1002/1097-0142(19850801)56:3<672::aid-cncr2820560340>3.0.co;2-v.. No entanto, nosso estudo não foi capaz de comprovar essa informação, pois além de não encontrarmos relação significativa entre a presença de IMV e o desfecho mortalidade, também não conseguimos relacionar o tamanho do nódulo com o desfecho IMV, conforme Tabela 5. Esse fato pode ser justificado pelo eventual sub-diagnóstico de invasão microvascular que existia nas avaliações do anatomopatológico, principalmente em coortes mais antigas.

Inicialmente, na Figura 1, os valores das áreas sob as curvas ROC não mostraram qualquer diferença de sensibilidade entre os scores MELD e MELD-Na para invasão microvascular em pacientes com CHC. Assim, as curvas para ambas as escalas não foram significativas - concluindo que ambos os scores não puderam ser utilizados como preditores de IMV. Até o presente momento, não encontramos nenhum outro estudo com associação semelhante.

Figura 1
Curvas ROC e áreas sob a curva para valores dos scores MELD e MELDNa versus invasão microvascular em pacientes pós-transplante hepático por Carcinoma Hepatocelular.

A curva ROC (Figura 2) mostrou que há maior sensibilidade do MELD-Na sobre o MELD para determinar óbito em pacientes com CHC, considerando-se mesmo ponto de corte para ambos. Outros autores mostraram que o score MELD-Na é mais sensível para determinar gravidade e prioridade na fila do transplante1717 de Freitas ACT, Rampim AT, Nunes CP, Coelho JCU. Impact of meld sodium on liver transplantation waiting list. Arq Bras Cir Dig. 2019;32(3):e1460. doi: 10.1590/0102-672020190001e1460.
https://doi.org/10.1590/0102-67202019000...
,3030 Kim WR, Biggins SW, Kremers WK, Wiesner RH, Kamath PS, Benson JT, et al. Hyponatremia and mortality among patients on the liver-transplant waiting list. N Engl J Med. 2008;359(10):1018-26. doi: 10.1056/NEJMoa0801209.
https://doi.org/10.1056/NEJMoa0801209...
. Em nosso estudo, mais que isso, avaliamos que há íntima relação entre os valores de MELD-Na e o evento óbito nos pós-transplante. A partir dessa análise, podemos inferir que esse score também é útil para avaliar prognóstico nos pós-operatório. Esse é mais sensível que o MELD isolado, apesar de ambos os scores apresentarem significância estatística para este fim sob nossa análise. Ainda, a baixa especificidade dessa curva (37,50%) explica-se pela grande quantidade de óbitos resultantes de causas não hepáticas, como germes multirresistentes e disfunções metabólicas. Nosso estudo, é semelhante à de Aranzana et al.1818 Aranzana EM, Coppini AZ, Ribeiro MA, Massarollo PCB, Szutan LA, Ferreira FG. Model for end-stage liver disease, model for liver transplantation survival and donor risk index as predictive models of survival after liver transplantation in 1,006 patients. Clinics. 2015;70(6):413-8. doi: 10.6061/clinics/2015(06)05.
https://doi.org/10.6061/clinics/2015(06)...
, que utilizaram a curva ROC para valores de MELD versus sobrevida pós-transplante em sete dias, um mês, três meses, seis meses, um ano e dois anos, com 1.006 pacientes. Os autores demonstraram que o escore pode servir como preditor significativo de morte pós-transplante. Similarmente, Xun Luo et al.3131 Luo X, Leanza J, Massie AB, Garonzik-Wang JM, Haugen CE, Gentry SE, et al. MELD as a metric for survival benefit of liver transplantation. Am J Transplant. 2018;18(5):1231-7. doi: 10.1111/ajt.14660.
https://doi.org/10.1111/ajt.14660...
, apontaram sobre a funcionalidade do escore MELD-Na em melhor predizer tanto a mortalidade na fila e sobrevida.

Figura 2
Curvas ROC e áreas sob a curva para valores dos scores MELD e MELDNa versus óbito em pacientes pós-transplante hepático por Carcinoma Hepatocelular.

Destaca-se que apesar de termos analisado um único centro de referência, nosso estudo encontrou dados semelhantes ao perfil nacional e a outros trabalhos maiores2525 Carrilho FJ, Kikuchi L, Branco F, Goncalves CS, Mattos AA. Clinical and epidemiological aspects of hepatocellular carcinoma in Brazil. Clinics (Sao Paulo). 2010;65(12):1285-90. doi: 10.1590/s1807-59322010001200010.
https://doi.org/10.1590/s1807-5932201000...
,2727 Yang T, Zhang J, Lu J-H, Yang G-S, Wu M-C, Yu W-F. Risk factors influencing postoperative outcomes of major hepatic resection of hepatocellular carcinoma for patients with underlying liver diseases. World J Surg. 2011 Sep;35(9):2073-82. doi: 10.1007/s00268-011-1161-0.
https://doi.org/10.1007/s00268-011-1161-...
. Por outro lado, o ônus da análise retrospectiva, gerou fragmentação e perda de informações, como dados do índice de massa corporal (IMC), hábitos de vida e incertezas sobre a quantificação e a temporalidade do etilismo. Assim, identificamos a necessidade de novos métodos e parâmetros biomoleculares com o objetivo de analisar o comportamento tumoral para definição de prognósticos e estratégias no pré, intra e pós-operatório e também no seguimento clínico.

REFERENCES

  • 1
    Villanueva A. Hepatocellular Carcinoma. N Engl J Med. 2019;380(15):1450-62. doi: 10.1056/NEJMra1713263.
    » https://doi.org/10.1056/NEJMra1713263
  • 2
    Njei B, Rotman Y, Ditah I, Lim JK. Emerging trends in hepatocellular carcinoma incidence and mortality. Hepatology. 2015;61(1):191-9. doi: 10.1002/hep.27388.
    » https://doi.org/10.1002/hep.27388
  • 3
    Severi T, Van Malenstein H, Verslype C, Van Pelt JF. Tumor initiation and progression in hepatocellular carcinoma: Risk factors, classification, and therapeutic targets. Acta Pharmacol Sin. 2010;31(11):1409-20. doi: 10.1038/aps.2010.142.
    » https://doi.org/10.1038/aps.2010.142
  • 4
    Kulik L, El-Serag HB. Epidemiology and Management of Hepatocellular Carcinoma. Gastroenterology. 2019;156(2):477-91.e1. doi: 10.1053/j.gastro.2018.08.065.
    » https://doi.org/10.1053/j.gastro.2018.08.065
  • 5
    El-Serag HB. Hepatocellular Carcinoma. N Engl J Med. 2011;365(12):1118-27. doi: 10.1056/NEJMra1001683.
    » https://doi.org/10.1056/NEJMra1001683
  • 6
    Finn RS, Qin S, Ikeda M, Galle PR, Ducreux M, Kim TY, et al. Atezolizumab plus bevacizumab in unresectable hepatocellular carcinoma. N Engl J Med. 2020;382(20):1894-905. doi: 10.1056/NEJMoa1915745.
    » https://doi.org/10.1056/NEJMoa1915745
  • 7
    Shiels MS, O'Brien TR. Recent Decline in Hepatocellular Carcinoma Rates in the United States. Gastroenterology. 2020;158(5):1503-1505.e2. 10.1053/j.gastro.2019.12.030.
    » https://doi.org/10.1053/j.gastro.2019.12.030
  • 8
    Tapper EB, Lok ASF. Use of liver imaging and biopsy in clinical practice. N Engl J Med. 2017;377(8):756-68. doi: 10.1056/NEJMra1610570.
    » https://doi.org/10.1056/NEJMra1610570
  • 9
    Chalasani N, Younossi Z, Lavine JE, Diehl AM, Brunt EM, Cusi K, et al. The diagnosis and management of non-alcoholic fatty liver disease: Practice Guideline by the American Association for the Study of Liver Diseases, American College of Gastroenterology, and the American Gastroenterological Association. Hepatology. 2012;55(6):2005-23. doi: 10.1002/hep.25762.
    » https://doi.org/10.1002/hep.25762
  • 10
    Isabela Andronescu C, Roxana Purcarea M, Aurel Babes P. The role of noninvasive tests and liver biopsy in the diagnosis of nonalcoholic fatty liver disease. J Med Life. 2018;11(3):243-6. doi: 10.25122/jml-2018-1002.
    » https://doi.org/10.25122/jml-2018-1002
  • 11
    Loomba R, Sanyal AJ. The global NAFLD epidemic. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2013;10(11):686-90. doi: 10.1038/nrgastro.2013.171.
    » https://doi.org/10.1038/nrgastro.2013.171
  • 12
    Lazo M, Clark JM. The epidemiology of nonalcoholic fatty liver disease: A global perspective. Semin Liver Dis. 2008;28(4):339-50. doi: 10.1055/s-0028-1091978.
    » https://doi.org/10.1055/s-0028-1091978
  • 13
    Davila JA, Morgan RO, Shaib Y, McGlynn KA, El-Serag HB. Diabetes increases the risk of hepatocellular carcinoma in the United States: A population based case control study. Gut. 2005;54(4):533-9. doi: 10.1136/gut.2004.052167.
    » https://doi.org/10.1136/gut.2004.052167
  • 14
    Pais R, Fartoux L, Goumard C, Scatton O, Wendum D, Rosmorduc O, et al. Temporal trends, clinical patterns and outcomes of NAFLD-related HCC in patients undergoing liver resection over a 20-year period. Aliment Pharmacol Ther. 2017;46(9):856-63. doi: 10.1111/apt.14261.
    » https://doi.org/10.1111/apt.14261
  • 15
    Terrault NA, Zeuzem S, Di Bisceglie AM, Lim JK, Pockros PJ, Frazier LM, et al. Effectiveness of Ledipasvir-Sofosbuvir Combination in Patients With Hepatitis C Virus Infection and Factors Associated With Sustained Virologic Response. Gastroenterology. 2016 Dec;151(6):1131-40.e5. doi: 10.1053/j.gastro.2016.08.004.
    » https://doi.org/10.1053/j.gastro.2016.08.004
  • 16
    Turri JAO, Decimoni TC, Ferreira LA, Diniz MA, Haddad LB de P, Campolina AG. Higher MELD score increases the overall cost on the waiting list for liver transplantation: a micro-costing analysis based study. Arq Gastroenterol. 2017;54(3):238-45. doi: 10.1590/S0004-2803.201700000-35.
    » https://doi.org/10.1590/S0004-2803.201700000-35
  • 17
    de Freitas ACT, Rampim AT, Nunes CP, Coelho JCU. Impact of meld sodium on liver transplantation waiting list. Arq Bras Cir Dig. 2019;32(3):e1460. doi: 10.1590/0102-672020190001e1460.
    » https://doi.org/10.1590/0102-672020190001e1460
  • 18
    Aranzana EM, Coppini AZ, Ribeiro MA, Massarollo PCB, Szutan LA, Ferreira FG. Model for end-stage liver disease, model for liver transplantation survival and donor risk index as predictive models of survival after liver transplantation in 1,006 patients. Clinics. 2015;70(6):413-8. doi: 10.6061/clinics/2015(06)05.
    » https://doi.org/10.6061/clinics/2015(06)05
  • 19
    Kaibori M, Ishizaki M, Matsui K, Kwon A-H. Predictors of microvascular invasion before hepatectomy for hepatocellular carcinoma. J Surg Oncol. 2010;102(5):462-8. doi: 10.1002/jso.21631.
    » https://doi.org/10.1002/jso.21631
  • 20
    Sumie S, Kuromatsu R, Okuda K, Ando E, Takata A, Fukushima N, et al. Microvascular Invasion in Patients with Hepatocellular Carcinoma and Its Predictable Clinicopathological Factors. Ann Surg Oncol. 2008;15(5):1375-82. doi: 10.1245/s10434-008-9846-9.
    » https://doi.org/10.1245/s10434-008-9846-9
  • 21
    Zhao WC, Fan LF, Yang N, Zhang HB, Chen BD, Yang GS. Preoperative predictors of microvascular invasion in multinodular hepatocellular carcinoma. Eur J Surg Oncol. 2013;39(8):858-64. doi: 10.1016/j.ejso.2013.04.003.
    » https://doi.org/10.1016/j.ejso.2013.04.003
  • 22
    Choi KK, Kim SH, Choi SB, Lim JH, Choi GH, Choi JS, et al. Portal venous invasion: The single most independent risk factor for immediate postoperative recurrence of hepatocellular carcinoma. J Gastroenterol Hepatol. 2011;26(11):1646-51. doi: 10.1111/j.1440-1746.2011.06780.x.
    » https://doi.org/10.1111/j.1440-1746.2011.06780.x
  • 23
    Zhang X, Li J, Shen F, Lau WY. Significance of presence of microvascular invasion in specimens obtained after surgical treatment of hepatocellular carcinoma. J Gastroenterol Hepatol. 2018;33(2):347-54. doi: 10.1111/jgh.13843.
    » https://doi.org/10.1111/jgh.13843
  • 24
    Lahan-Martins D, Perales SR, Gallani SK, Costa LBE da, Lago EAD, Boin I de FSF, et al. Microvascular invasion in hepatocellular carcinoma: Is it predictable with quantitative computed tomography parameters? Radiol Bras. 2019;52(5):287-92. doi: 10.1590/0100-3984.2018.0123.
    » https://doi.org/10.1590/0100-3984.2018.0123
  • 25
    Carrilho FJ, Kikuchi L, Branco F, Goncalves CS, Mattos AA. Clinical and epidemiological aspects of hepatocellular carcinoma in Brazil. Clinics (Sao Paulo). 2010;65(12):1285-90. doi: 10.1590/s1807-59322010001200010.
    » https://doi.org/10.1590/s1807-59322010001200010
  • 26
    Bertacco A, Barbieri S, Guastalla G, Boetto R, Vitale A, Zanus G, et al. Risk Factors for Early Mortality in Liver Transplant Patients. Transplant Proc. 2019;51(1):179-83. doi: 10.1016/j.transproceed.2018.06.025.
    » https://doi.org/10.1016/j.transproceed.2018.06.025
  • 27
    Yang T, Zhang J, Lu J-H, Yang G-S, Wu M-C, Yu W-F. Risk factors influencing postoperative outcomes of major hepatic resection of hepatocellular carcinoma for patients with underlying liver diseases. World J Surg. 2011 Sep;35(9):2073-82. doi: 10.1007/s00268-011-1161-0.
    » https://doi.org/10.1007/s00268-011-1161-0
  • 28
    Bruix J, Reig M, Sherman M. Evidence-Based Diagnosis, Staging, and Treatment of Patients With Hepatocellular Carcinoma. Gastroenterology. 2016;150(4):835-53. doi: 10.1053/j.gastro.2015.12.041.
    » https://doi.org/10.1053/j.gastro.2015.12.041
  • 29
    Hsu HC, Sheu JC, Lin YH, Chen DS, Lee CS, Hwang LY, et al. Prognostic histologic features of resected small hepatocellular carcinoma (HCC) in Taiwan. A comparison with resected large HCC. Cancer. 1985;56(3):672-80. doi: 10.1002/1097-0142(19850801)56:3<672::aid-cncr2820560340>3.0.co;2-v.
  • 30
    Kim WR, Biggins SW, Kremers WK, Wiesner RH, Kamath PS, Benson JT, et al. Hyponatremia and mortality among patients on the liver-transplant waiting list. N Engl J Med. 2008;359(10):1018-26. doi: 10.1056/NEJMoa0801209.
    » https://doi.org/10.1056/NEJMoa0801209
  • 31
    Luo X, Leanza J, Massie AB, Garonzik-Wang JM, Haugen CE, Gentry SE, et al. MELD as a metric for survival benefit of liver transplantation. Am J Transplant. 2018;18(5):1231-7. doi: 10.1111/ajt.14660.
    » https://doi.org/10.1111/ajt.14660
  • 32
    GBD 2015 Obesity Collaborators, Afshin A, Forouzanfar MH, et al. Health Effects of Overweight and Obesity in 195 Countries over 25 Years. N Engl J Med. 2017;377(1):13-27. doi:10.1056/NEJMoa1614362.
    » https://doi.org/10.1056/NEJMoa1614362
  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    09 Mar 2021
  • Aceito
    30 Jun 2021
Colégio Brasileiro de Cirurgiões Rua Visconde de Silva, 52 - 3º andar, 22271- 090 Rio de Janeiro - RJ, Tel.: +55 21 2138-0659, Fax: (55 21) 2286-2595 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revista@cbc.org.br