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Perfil clínico-epidemiológico da apendicite aguda: análise retrospectiva de 638 casos

RESUMO

Objetivo:

avaliar a epidemiologia e os resultados do tratamento cirúrgico de doentes portadores de graus III e IV, mais avançados, da Síndrome de Mirizzi (SM) de acordo com a classificação de Csendes.

Métodos:

estudo retrospectivo, de corte transversal através da revisão de prontuários de 13 pacientes portadores de graus III e IV da SM operados de dezembro de 2001 a setembro de 2013, entre 3691 colecistectomias realizadas neste período.

Resultados:

a incidência da SM foi 0,6% (23 casos) e os graus III e IV perfizeram 0,35% deste número. Houve um predomínio de tipo IV (12 casos). O diagnóstico pré-operatório foi possível em 53,8% dos casos. A conduta preferencial foi derivação biliodigestiva (10 casos) e foi optado por drenagem com tubo "T" e sutura da via biliar em três ocasiões especiais. Três pacientes apresentaram fístula biliar resolvida com conduta expectante e um caso de coleperitônio necessitou reoperação. No seguimento ambulatorial dos pacientes que realizaram a anastomose biliodigestiva (oito), 50% estão assintomáticos, 25% apresentaram estenose da anastomose e 25% perderam seguimento. O tempo médio de acompanhamento foi 41,8 meses.

Conclusão:

de incidência baixa e de diagnóstico pré-operatório em apenas metade dos casos, a SM em graus avançados tem na anastomose biliodigestiva sua melhor conduta, porém não isenta de morbimortalidade.

Descritores:
Síndrome de Mirizzi; Icterícia Obstrutiva; Epidemiologia; Terapêutica; Procedimentos Cirúrgicos Operatórios.

ABSTRACT

Objective:

to describe the clinical and epidemiological profile of acute appendicitis (AA) of the patients treated at a referral center in the Juiz de Fora macro-region, Minas Gerais State, Brazil.

Methods:

we conducted a retrospective, observational study in the Dr. Mozart Geraldo TeixeiraEmergency Hospital. We selected 638 patients diagnosed with AA, and analyzed the variables gender, age, evolutionary phase, length of hospital stay, pathological diagnosis, use of antibiotics, use of drains, complications and mortality.

Results:

AA was more prevalent in young adults (19-44 years) and males (65.20%). The mean hospital stay was seven days and phase II was the most prevalent. We found the histopathological diagnosis of primary tumor of the appendix in six patients (0.94%), adenocarcinoma being the most common histologic type (66.7%). Regarding the use of antibiotics, 196 patients underwent antibiotic prophylaxis and 306 received antibiotic therapy. Eighty-one patients used some kind of drain, for an average of 4.8 days. Seventeen patients died (2.67%), predominantly males (70.59%), with mean age of 38.47 years.

Conclusion:

AA has a higher prevalence in males and young adults. The length of stay is directly associated with the evolutionary phase. The most common complication is infection of the surgical site. Mortality in our service is still high when compared with developed centers.

Keywords:
Appendicitis. General Surgery. Abdomen; Acute.

INTRODUÇÃO

A apendicite aguda (AA) é a principal causa de abdome agudo cirúrgico em todo o mundo, com uma prevalência de aproximadamente 7% na população 1-4. Tem um pico de incidência entre 10-14 anos no sexo feminino e entre 15-19 anos no sexo masculino22. Papandria D, Goldstein SD, Rhee D, Salazar JH, Arlikar J, Gorgy A, et al. Risk of perforation increases with delay in recognition and surgery for acute appendicitis. J Surg Res. 2013;184(2):723-9.. A apendicectomia é o tratamento de escolha, pois, além de permitir o diagnóstico definitivo, também reduz significativamente o risco de complicações, tais como perfuração, sepse e óbito. O fator causal mais importante de AA parece ser o desenvolvimento de obstrução luminal, cuja etiologia tem associação com a faixa etária - a hiperplasia linfoide é o fator mais comum encontrado em pacientes menores de 20 anos, enquanto a obstrução por fecalito é mais comum em idosos 44. Shogilev DJ, Duus N, Odom SR, Shapiro NI. Diagnosing appendicitis: evidence-based review of the diagnostic approach in 2014. West J Emerg Med. 2014;15(7):859-71..

A classificação de doenças de acordo com estágio de evolução é importante para avaliar a gravidade e o prognóstico, além de permitir a elaboração de protocolos de orientação terapêutica e de pesquisa55. Gomes CA, Nunes TA. Classificação laparoscópica da apendicite aguda. Correlação entre graus da doença e as variávies perioperatórias. Rev Col Bras Cir. 2006;33(5):289-93.. O tratamento cirúrgico consiste na remoção do apêndice utilizando técnica aberta, cirurgia descrita por McBurney em 1894, ou através da apendicectomia laparoscópica, descrita por Semm em 1983 66. Jaschinski T, Mosch C, Eikermann M, Neugebauer EA. Laparoscopic versus open appendectomy in patients with suspected appendicitis: a systematic review of meta-analyses of randomised controlled trials. BMC Gastroenterol. 2015;15:48..

Frente à alta prevalência da AA e das possibilidades de complicações deste quadro clínico, o objetivo deste estudo foi descrever o perfil clínico-epidemiológico da AA de pacientes atendidos em um centro de referência da macrorregião de Juiz de Fora, MG.

MÉTODOS

Este foi um estudo observacional retrospectivo, realizado no Hospital de Pronto Socorro Dr. Mozart Geraldo Teixeira na cidade de Juiz de Fora, Minas Gerais. Após aprovação pelo comitê de ética em pesquisa institucional (protocolo 1.424.169), foram analisados prontuários médicos de todos os pacientes internados por abdome agudo (n = 1048) no período de janeiro de 2009 a janeiro de 2014. Destes foram selecionados apenas os pacientes com diagnóstico de AA (n = 638). Casos com dados clínicos insuficientes foram excluídos do estudo.

As variáveis analisadas obtidas por meio do prontuário do paciente foram sexo, idade, fase evolutiva, tempo de internação, diagnóstico anatomopatológico, uso de antibióticos, uso de dreno, complicações e a mortalidade por causas. A fase evolutiva foi classificada de 0 a IV, sendo que a fase 0 corresponde ao apêndice normal, I apêndice com hiperemia e edema, II apêndice com exsudato fibrinoso, III apêndice com necrose e abcesso e IV apendicite perfurada. As fases foram estratificadas em apendicite complicada (III e IV) e não-complicada (I e II).

Inicialmente foi testada a normalidade (Kolmogorov-Smirnov) e a homocedasticidade da distribuição (teste de Hartley) validando a utilização da estatística paramétrica. Utilizamos o teste-t de Student para comparar os o tempo médio de internação por sexo, o tempo médio de internação entre os pacientes que utilizaram e não utilizaram dreno e entre os pacientes submetidos à antibioticoprofilaxia. Utilizamos uma ANOVA simples para verificar o tempo de internação relacionado com a fase evolutiva da doença. O teste de Qui-quadrado foi adotado para comparar a fase evolutiva da doença por sexo e a mortalidade por sexo. Consideramos como nível de significância p<0,05, sendo empregado o software estatístico SPSS versão 20.0 (SPSS, Chicago, EUA) para análise dos dados.

RESULTADOS

Dos 1048 pacientes diagnosticados com abdome agudo, 638 (60,88%) eram por AA, representando a principal causa de abdome agudo no serviço referido. A média de idade foi de 32 anos e houve prevalência no sexo masculino (65,20%). A doença foi mais prevalente no adulto jovem (19-44 anos), representando 60,03% dos casos (Tabela 1), sendo menos comum em idosos (2,97%). O tempo médio de internação foi de 7,03 dias, sendo 6,77 dias para homens e 7,56 dias para mulheres, não sendo observada diferença significativa entre os sexos (p=0,554).

Tabela 1
Prevalência da apendicite aguda de acordo com a faixa etária

Dos pacientes apendicectomizados, 98,75% tinham AA. Dos pacientes submetidos à apendicectomia incidental, 75% eram do sexo feminino e o cisto ovariano foi a causa predominante nessas pacientes. No sexo masculino as causas foram Hérnia de Amyand e adenocarcinoma de apêndice.

Das fases evolutivas, a mais frequente foi a fase II com 34,30% (Tabela 2). Dos pacientes diagnosticados na fase IV, a maioria era homens (65,8%). O tempo de hospitalização foi maior na fase IV, com uma média de 12,37 dias (Figura 1), havendo diferença significativa entre a fase I e a fase IV (p=0,001).

Tabela 2
Classificação e prevalência da apendicite de acordo com a fase evolutiva

Figura 1
Tempo de Internação, em dias, de acordo com a fase evolutiva da Apendicite Aguda.

De todos os resultados anatomopatológicos, seis (0,94%) tiveram o diagnóstico de tumor primário do apêndice, dentre os quais o adenocarcinoma foi o mais frequente (66,7%). Os outros tipos histológicos encontrados foram carcinoma epidermóide e tumor estromal gastrointestinal (GIST). Além disso, determinou-se, pelo exame anatomopatológico, um caso de infestação parasitária como etiologia da AA.

Da casuística exposta, 81 pacientes fizeram uso de dreno, cujo tempo de uso foi em média 4,8 dias e o tempo médio de internação foi de 10,37 dias. Observou-se maior tempo de hospitalização neste grupo, comparado aos que não o utilizaram, não havendo diferença significativa (p=0,43).

Quanto ao uso de antibióticos, 196 pacientes foram submetidos apenas à antiobioticoprofilaxia, e a associação da amoxicilina com clavulanato foi a mais utilizada (64,29%). Estes pacientes tiveram menor tempo de internação quando comparados àqueles que não realizaram a profilaxia, havendo diferença significativa entre os grupos. Antibioticoterapia foi realizada em 306 pacientes (47,97%), dos quais 214 possuíam AA complicada (69,94%). A terapia mais utilizada foi a associação do metronidazol com outro agente antimicrobiano (40,13%), sendo que os mais utilizados foram o ciprofloxacino (32,03%) e a gentamicina (27,35%).

Da totalidade da amostra, 38 pacientes (5,96%) evoluíram com complicações no pós-operatório, sendo a infecção de ferida operatória (52,63%) e a deiscência de ferida (26,31%) as mais frequentes. Também houve complicações por abscesso intra-abdominal, sepse e fístula.

Considerando a mortalidade, 17 pacientes morreram (2,67%), havendo predominância do sexo masculino (70,59%). A média de idade foi 38,47 anos, 70,58% possuíam AA complicada, e 47,06% dos pacientes foram diagnosticados na fase IV, havendo correlação direta entre a fase evolutiva e o óbito. Quanto às causas, 53% deveram-se ao choque séptico e 47% a causas desconhecidas ou indeterminadas.

DISCUSSÃO

No presente estudo, a AA foi mais prevalente no sexo masculino, estando de acordo com outros estudos realizados77. Sulu B, Günerhan Y, Palanci Y, Isler B, Caglayan K. Epidemiological and demographic features of appendicitis and influences of several environmental factors. Ulus Travma Acil Cerrahi Derg. 2010;16(1):38-42.

8. Al-Omran M, Mamdani M, McLeod RS. Epidemiologic features of acute appendicitis in Ontario, Canada. Can J Surg. 2003;46(4):263-8.
-99. Ximenes AMG, Mello FST, Lima-Júnior ZB, Ferreira CF, Cavalcanti ADF, Dias-Filho AV. Tempo de internação após apendicectomia aberta por três técnicas cirúrgicas diferentes. ABCD, arq bras cir dig. 2014;27(3):188-90.. Todavia, a faixa etária mais prevalente foi entre 19-44 anos, contrastando com dados epidemiológicos que mostraram que a doença é mais prevalente em jovens entre 10-19 anos77. Sulu B, Günerhan Y, Palanci Y, Isler B, Caglayan K. Epidemiological and demographic features of appendicitis and influences of several environmental factors. Ulus Travma Acil Cerrahi Derg. 2010;16(1):38-42.,88. Al-Omran M, Mamdani M, McLeod RS. Epidemiologic features of acute appendicitis in Ontario, Canada. Can J Surg. 2003;46(4):263-8..

Neste estudo, apenas 1,25% dos pacientes foram submetidos à apendicectomia incidental, com maior prevalência em mulheres, sendo o cisto ovariano a etiologia predominante1010. Pages-Bouic E, Millet I, Curros-Doyon F, Faget C, Fontaine M, Taourel P. Acute pelvic pain in females in septic and aseptic contexts. Diagn Interv Imaging. 2015;96(10):985-95.. Assim, em mulheres com abdome agudo, o ultrassom é importante para o diagnóstico diferencial com doenças do sistema genital feminino99. Ximenes AMG, Mello FST, Lima-Júnior ZB, Ferreira CF, Cavalcanti ADF, Dias-Filho AV. Tempo de internação após apendicectomia aberta por três técnicas cirúrgicas diferentes. ABCD, arq bras cir dig. 2014;27(3):188-90.,1010. Pages-Bouic E, Millet I, Curros-Doyon F, Faget C, Fontaine M, Taourel P. Acute pelvic pain in females in septic and aseptic contexts. Diagn Interv Imaging. 2015;96(10):985-95.. Além disso, as infecções do trato genital superior podem levar a ''periapendicites reativas'', cuja principal causa é a doença inflamatória pélvica (DIP), devido à topografia do apêndice1010. Pages-Bouic E, Millet I, Curros-Doyon F, Faget C, Fontaine M, Taourel P. Acute pelvic pain in females in septic and aseptic contexts. Diagn Interv Imaging. 2015;96(10):985-95..

A avaliação histopatológica é uma prática recomendada, pois permite identificar malignidade em até 1% dos pacientes, mais frequentemente na forma de tumor neuroendócrino, adenocarcinoma ou cistoadenoma mucinoso1111. Bhangu A, SØreide K, Di Saverio S, Assarsson JH, Drake FT. Acute appendicitis: modern understanding of pathogenesis, diagnosis, and management. Lancet. 2015;386(10000):1278-87.. Em nosso estudo não houve nenhum caso de tumor neuroendócrino, apesar deste ser considerado a neoplasia primária mais comum, representando aproximadamente 32-57% dos tumores do apêndice1212. Gu Y, Wang N, Xu H. Carcinoid tumor of the appendix: a case report. Oncol Lett. 2015;9(5):2401-3.. O adenocarcinoma foi o tumor mais prevalente em nosso trabalho, sendo que esta neoplasia é considerada rara, representando menos de 0,5% de todos os tumores gastrointestinais e entre 4-6% dos tumores do apêndice. Nestes casos, a hemicolectomia deve ser realizada1313. Park IJ, Yu CS, Kim HC, Kim JC. Clinical features and prognostic factors in primay adenocarcinoma of the appendix. Korean J Gastroenterol. 2004;43(1):29-34.,1414. Guraya SY, Almaramhy HH. Clinicopathological features and the outcome of surgical management for adenocarcinoma of the appendix. World J Gastrointest Surg. 2011;3(1):7-12..

Um estudo realizado na África do Sul avaliou os resultados anatomopatológicos de 371 pacientes submetidos à apendicectomia e revelou parasitose como diagnóstico incidental em 8,5% dos casos1515. Chamisa I. A clinicopathological review of 324 appendices removed for acute appendicitis in Durban, South Africa: a retrospective analysis. Ann R Coll Surg Engl. 2009;91(8):688-92.. Em nosso estudo, apenas um paciente apresentou AA por infestação parasitária.

A AA não complicada, quando tratada com apendicectomia, comparado ao tratamento apenas com antibióticos, possui uma menor taxa de complicações1616. Kirby A, Hobson RP, Burke D, Cleveland V, Ford G, West RM. Appendicectomy for suspected uncomplicated appendicitis is associated with fewer complications than conservative antibiotic management: a meta-analysis of post-intervention complications. J Infect. 2015;70(2):105-10.. Uma revisão sistemática ao analisar uma série de meta-análises concluiu que o tratamento da AA apenas com antibióticos não deve ser rotineiramente recomendado. A realização da apendicectomia permanece como o padrão-ouro para o tratamento da AA 1717. Rocha LL, Rossi FM, Pessoa CM, Campos FN, Pires CE, Steinman M. Antibiotics alone versus appendectomy to treat uncomplicated acute appendicitis in adults: what do meta-analyses say? World J Emerg Surg. 2015;10:51..

Embora a profilaxia com antibióticos seja comum em procedimentos cirúrgicos o uso inadequado destes fármacos ocorre em 25-50% das cirurgias eletivas gerais1818. Dellinger EP, Gross PA, Barrett TL, Krause PJ, Martone WJ, McGowan JE Jr, et al. Quality standard for antimicrobial prophylaxis in surgical procedures. Infectious Diseases Society of America. Clin Infect Dis. 1994;18(3):422-7.

19. Gyssens IC, Geerligs IE, Nannini-Bergman MG, Knape JT, Hekster YA, van der Meer JW. Optimizing the timing of antimicrobial prophylaxis in surgery: an intervention study. J Antimicrob Chemother. 1996;38(2):301-8.
-2020. Dahms RA, Johnson EM, Statz CL, Lee JT, Dunn DL, Beilman GJ. Third-generation cephalosporins and vancomycin as risk factors for postoperative vancomycin-resistant enterococcus infection. Arch Surg. 1998;133(12):1343-6.. Recomenda-se a utilização de antibióticos, profiláticos ou terapêuticos, em todos os pacientes que serão submetidos à apendicectomia, e estes devem ser iniciados antes do ato operatório2121. Kasatpibal N, NØrgaard M, SØrensen HT, SchØnheyder HC, Jamulitrat S, Chongsuvivatwong V. Risk of surgical site infection and efficacy of antibiotic prophylaxis: a cohort study of appendectomy patients in Thailand. BMC Infect Dis. 2006;6:111-9.. Quando profiláticos devem ser administrados na indução anestésica. As drogas escolhidas devem ser ativas contra germes Gram negativos e anaeróbios, e entre estes últimos, especificamente, Bacteroides fragilis. Meta-análise de estudos randomizados comparando antibióticos profiláticos pré-operatórios com placebo mostrou uma redução significativa de infecção da ferida com o uso de qualquer agente antimicrobiano2222. Andersen BR, Kallehave FL, Andersen HK. Antibiotics versus placebo for prevention of postoperative infection after appendicectomy. Cochrane Database Syst Rev. 2005;(3):CD001439.. Em nosso estudo, a associação da amoxicilina com clavulanato foi a profilaxia mais utilizada (64,29%), sendo que pacientes submetidos apenas à antibioticoprofilaxia tiveram menor tempo de internação quando comparados àqueles que não a realizaram. Portanto, é prudente o uso de antibióticos no pré-operatório, porém, a continuação da terapêutica vai depender dos achados operatórios de abscesso ou perfuração livre2323. Nutels DBA, Andrade ACG, Rocha AC. Perfil das complicações após apendicectomia em um hospital de emergência. ABCD, arq bras cir dig. 2007;20(3):146-9..

Em um estudo retrospectivo que avaliou 107 pacientes apendicectomizados num hospital de referência, as fases evolutivas mais prevalentes foram as fases II (27%) e IV (27%) 2424. Fischer CA, Pinho MSL, Ferreira S, Milani CAC, van Santen CR, Marquardt RA. Apendicite aguda: existe relação entre o grau evolutivo, idade e o tempo de internação? Rev Col Bras Cir. 2005;32(3):136-8.. Em nosso estudo a fase II foi a mais prevalente, representando 34,30% dos casos.

Ao contrário da AA não complicada, a forma perfurada é associada a maior chance de complicações pós-operatórias, como abscessos intra-abdominais2525. Fraser JD, Aguayo P, Leys CM, Keckler SJ, Newland JG, Sharp SW, et al. A complete course of intravenous antibiotics vs a combination of intravenous and oral antibiotics for perforated appendicitis in children: a prospective, randomized trial. J Pediatr Surg. 2010;45(6):1198-202.,2626. St Peter SD, Sharp SW, Holcomb GW, 3rd, Ostlie DJ. An evidence-based definition for perforated appendicitis derived from a prospective randomized trial. J Pediatr Surg. 2008;43(12):2242-5.. Nestes casos drenos são amplamente utilizados por cirurgiões para evitar a formação de abscessos intra-abdominais. Um estudo avaliou 199 pacientes com AA complicada, dos quais 79 usaram o dreno e 120 não utilizaram: 15% dos pacientes tratados sem drenagem peritoneal desenvolveram abcesso intra-abdominal após apendicectomia2727. Beek MA, Jansen TS, Raats JW, Twiss EL, Gobardhan PD, van Rhede van der Kloot EJ. The utility of peritoneal drains in patients with perforated appendicitis. Springerplus. 2015;4:371..

As complicações pós-operatórias mais comuns da apendicectomia estão relacionadas com o grau de inflamação apendicular. É importante levar em consideração o tempo decorrido do início do quadro e o momento da operação2323. Nutels DBA, Andrade ACG, Rocha AC. Perfil das complicações após apendicectomia em um hospital de emergência. ABCD, arq bras cir dig. 2007;20(3):146-9.. As complicações pós-operatórias permanecem em torno de 10%, sendo a infecção do sítio cirúrgico responsável por um terço delas55. Gomes CA, Nunes TA. Classificação laparoscópica da apendicite aguda. Correlação entre graus da doença e as variávies perioperatórias. Rev Col Bras Cir. 2006;33(5):289-93.,2828. Johnson AB, Peetz ME. Laparoscopic appendectomy is an acceptable alternative for the treatment of perforated appendicitis. Surg Endosc. 1998;12(7):940-3.. A infecção do sítio operatório ocorreu em 3,45% dos pacientes e foi a principal complicação pós-operatória. Ela é citada entre 0 a 15% para o procedimento laparotômico 55. Gomes CA, Nunes TA. Classificação laparoscópica da apendicite aguda. Correlação entre graus da doença e as variávies perioperatórias. Rev Col Bras Cir. 2006;33(5):289-93.,2929. Majewski W. Diagnostic laparoscopy for the acute abdomen and trauma. Surg Endosc. 2000;14(10):930-7..

O tempo de internação também aumenta com a gravidade da apendicite3030. Tsai CC, Lee SY, Huang FC. Laparoscopic versus open appendectomy in the management of all stages of acute appendicitis in children: a retrospective study. Pediatr Neonatol. 2012;53(5):289-94., o que foi observado em nosso estudo. A mortalidade em centros mais desenvolvidos é baixa (0.09% a 0,24%). De acordo com a literatura, em países de renda média e baixa, a mortalidade varia entre 1-4%, sendo um marcador útil da qualidade de assistência de saúde. Em nosso serviço a mortalidade foi de 2,67%, o que demonstra a estreita relação entre o nível socioeconômico do país e a qualidade do serviço de saúde1111. Bhangu A, SØreide K, Di Saverio S, Assarsson JH, Drake FT. Acute appendicitis: modern understanding of pathogenesis, diagnosis, and management. Lancet. 2015;386(10000):1278-87..

Concluindo, a AA apresentou maior prevalência no sexo masculino e no adulto jovem (19-44 anos). O tempo de internação esteve diretamente associado à fase evolutiva e aumentou com a gravidade da apendicite. A complicação mais comum foi a infecção de sítio cirúrgico, corroborando os dados da literatura. A mortalidade ainda foi alta o que mostra a necessidade da melhoria da qualidade da assistência de saúde pública no Brasil.

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  • Fonte de financiamento: nenhum.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    13 Mar 2016
  • Aceito
    21 Jun 2016
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