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Estudo analítico do conhecimento do professor a respeito dos distúrbios de aprendizagem

Resumos

OBJETIVO: investigar a concepção de professores acerca dos distúrbios de aprendizagem, buscando revelar diferentes aspectos referentes à maneira como a percebem no cotidiano da sala de aula, quais fatores atribuem como causas do problema, como se posicionam frente à questão, além de verificar se houve mudança deste conhecimento após a orientação fonoaudiológica. MÉTODO: participaram desta pesquisa 25 professores que lecionam na Escola Municipal de Ensino Fundamental em São Paulo. Como critério de inclusão adotou-se que os professores deveriam estar atuando em sala de aula no ano letivo de 2010. Não foram incluídos no estudo professores substitutos que não acompanharam o desenvolvimento da turma ao longo do ano. Foi aplicado um questionário para investigar o conhecimento do professor quanto às dificuldades de aprendizagem, e em seguida, foram realizadas palestras de formação a respeito destas dificuldades. Os dados obtidos foram submetidos ao tratamento estatístico, analisados e discutidos com a revisão da literatura. Os métodos estatísticos considerados foram frequência absoluta, frequência relativa e descrito graficamente. RESULTADOS E CONCLUSÃO: os resultados e a conclusão deste estudo evidenciaram que os professores desconhecem os distúrbios de aprendizagem, porém pode-se observar a efetividade de orientação e formação junto a eles.

Aprendizagem; Docentes; Conhecimento


PURPOSE: to investigate the teachers' conception about learning disorders, revealing different aspects related to the way they realize it in everyday classes, which factors attribute as causes of the problem and how to deal with this question; also to verify if there was a change after the Speech Pathology orientation. METHOD: there were 25 teachers in this study, who teaches in the Public Elementary School in Sao Paulo. The inclusion criterion adopted was that the teachers should be teaching in 2010. The substitute teachers that didn't follow the class development throughout the year were not included in the study. A questionnaire was applied to investigate the knowledge that the teacher would have about learning disabilities, and afterwards seminars about these difficulties were giving. The data were submitted to statistical analysis and discussed in literature review. The statistical methods were considered absolute frequency and relative frequency and described graphically. RESULTS AND CONCLUSION: the results and conclusion of this study showed that the teachers do not have knowledge on learning disorders, but we can observe the effectiveness of orientation and training.

Learning; Faculty; Knowledge


Estudo analítico do conhecimento do professor a respeito dos distúrbios de aprendizagem

Raquel Caroline Ferreira LopesI; Patrícia Abreu Pinheiro CrenitteII

IFonoaudióloga pela Universidade de São Paulo; Mestranda em Distúrbios da Comunicação Humana na Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Brasil

IIFonoaudióloga; Docente do Curso de Graduação em Fonoaudiologia pela Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo; Pesquisadora do Laboratório de Pesquisa em Distúrbio de Aprendizagem e Déficit de Atenção da Universidade Estadual de Campinas; Doutora em Neurociências pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Raquel Caroline Ferreira Lopes Rua Joaquim Fidelis 7-96 apto. 44 - Vila Universitária Bauru - SP CEP: 17012-180 E-mail: raquellopes@usp.br

RESUMO

OBJETIVO: investigar a concepção de professores acerca dos distúrbios de aprendizagem, buscando revelar diferentes aspectos referentes à maneira como a percebem no cotidiano da sala de aula, quais fatores atribuem como causas do problema, como se posicionam frente à questão, além de verificar se houve mudança deste conhecimento após a orientação fonoaudiológica.

MÉTODO: participaram desta pesquisa 25 professores que lecionam na Escola Municipal de Ensino Fundamental em São Paulo. Como critério de inclusão adotou-se que os professores deveriam estar atuando em sala de aula no ano letivo de 2010. Não foram incluídos no estudo professores substitutos que não acompanharam o desenvolvimento da turma ao longo do ano. Foi aplicado um questionário para investigar o conhecimento do professor quanto às dificuldades de aprendizagem, e em seguida, foram realizadas palestras de formação a respeito destas dificuldades. Os dados obtidos foram submetidos ao tratamento estatístico, analisados e discutidos com a revisão da literatura. Os métodos estatísticos considerados foram frequência absoluta, frequência relativa e descrito graficamente.

RESULTADOS E CONCLUSÃO: os resultados e a conclusão deste estudo evidenciaram que os professores desconhecem os distúrbios de aprendizagem, porém pode-se observar a efetividade de orientação e formação junto a eles.

Descritores: Aprendizagem; Docentes; Conhecimento

ABSTRACT

PURPOSE: to investigate the teachers' conception about learning disorders, revealing different aspects related to the way they realize it in everyday classes, which factors attribute as causes of the problem and how to deal with this question; also to verify if there was a change after the Speech Pathology orientation.

METHOD: there were 25 teachers in this study, who teaches in the Public Elementary School in Sao Paulo. The inclusion criterion adopted was that the teachers should be teaching in 2010. The substitute teachers that didn't follow the class development throughout the year were not included in the study. A questionnaire was applied to investigate the knowledge that the teacher would have about learning disabilities, and afterwards seminars about these difficulties were giving. The data were submitted to statistical analysis and discussed in literature review. The statistical methods were considered absolute frequency and relative frequency and described graphically.

RESULTS AND CONCLUSION: the results and conclusion of this study showed that the teachers do not have knowledge on learning disorders, but we can observe the effectiveness of orientation and training.

Keywords: Learning; Faculty; Knowledge

INTRODUÇÃO

O Distúrbio de Aprendizagem é reconhecido por profissionais da saúde como um transtorno neurobiológico cognitivo e/ou processamento de linguagem causada pelo funcionamento cerebral atípico1. Manifestam-se por dificuldades significantes na aquisição e uso da escuta, fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades matemáticas.

Frequentemente são descobertos durante a vida escolar da criança, apresentando como dificuldades no processo de aquisição da leitura, escrita e habilidades matemáticas, levando-a a atitudes de indisciplina, pois a falta de compreensão das atividades escolares é frequentemente considerada pela escola como atos voluntários que prevê o fracasso acadêmico.

A escola é o principal meio de acesso da criança a língua escrita e, por esse, motivo é fundamental que os professores e coordenadores pedagógicos conheçam os distúrbios de aprendizagem e adéquem seus métodos de ensino para que possam atender a todas as crianças e não somente aquelas que não possuem nenhuma dificuldade de aprendizagem.

A aprendizagem da escrita pode ocorrer de forma insatisfatória gerando alterações de aprendizagem em algumas crianças2. O processo de aprendizagem da leitura e a escrita envolvem o uso de estratégias fonológicas e ortográficas, sendo que algumas crianças podem ter grandes dificuldades com os aspectos fonológicos enquanto que outras podem ter tais limitações quanto aos aspectos ortográficos3. Segundo Salles4, a sala de aula constitui um contexto natural para avaliar a linguagem escrita das crianças, além de permitir análise contínua e longitudinal de seus progressos, portanto a atuação do especialista juntamente com o professor é de extrema importância para a prática docente. Carvalho5 afirma que a determinação, pelo professor, dos alunos que fracassam na escola pode estar influenciada por fatores externos ao sistema de ensino-aprendizagem.

Neste contexto, a importância de saber o que o professor pensa a respeito das causas, motivos e consequências dos distúrbios de aprendizagem possibilitará a análise da postura em relação a esse problema.

O presente estudo propôs investigar a concepção de professores acerca dos distúrbios de aprendizagem, buscando revelar diferentes aspectos referentes à maneira como o percebem no cotidiano da sala de aula, quais fatores atribuem como causas do problema, como se posicionam frente à questão, além de verificar se houve mudança deste conhecimento após a orientação fonoaudiológica.

MÉTODO

Tratou-se de um estudo transversal desenvolvido em uma amostra de 25 professores, de ambos os sexos, com tempo de atuação variando de 5 a 35 anos. Como critério de inclusão e exclusão os professores deveriam estar atuando em sala de aula na escola onde foi realizada a pesquisa, no ano letivo de 2009/2010. Não foram incluídos no estudo professores substitutos que não acompanharam o desenvolvimento da turma ao longo do ano, ou os professores que se negaram a assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme Resolução 196/96, Conselho Nacional de Saúde 1996.

Após autorização do Comitê de Ética foi feito um levantamento junto à Coordenação Pedagógica da escola a fim de identificar os professores que lecionem nas séries inicias, ciclo I (1º ano à 4º ano) e ciclo II (5º ano à 8º ano).

A pesquisa foi realizada na Escola Pública Municipal da cidade de São Paulo com as devidas autorizações e consentimento dos diretores educacionais e conselho de escola dos estabelecimentos de ensino. Em dia e horário marcado pelo professor, a pesquisadora aplicou os questionários, que foram preenchidos em horário livre, numa sala livre de interferências. Não foi determinado tempo prévio para preenchimento do mesmo, ou seja, o professor preencheu todas as questões num só momento, durante o tempo que julgou necessário.

O questionário foi constituído por 18 questões fechadas que abordam a temática: conhecimentos dos professores sobre o distúrbio da linguagem oral, escrita e conhecimento da atuação do fonoaudiólogo. Ressalta-se que o mesmo (Figura 1), baseou-se no questionário aplicado por Fernandes6, com a adaptação das autoras.


Após a aplicação inicial do questionário, foram selecionadas as dificuldades apresentadas pelos professores e, em outras datas previamente agendadas com a coordenação da escola, foram realizados cursos de formação sobre a temática: Distúrbios de Aprendizagem: o que é linguagem e aprendizagem, fatores que interferem na aprendizagem; O que é linguagem escrita, quais fatores interferem no processo de aprendizagem da linguagem escrita; O que são dificuldades escolares e os distúrbios de aprendizagem: dislexia, disgrafia, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e a atuação do fonoaudiólogo. Os cursos foram realizados com duração de duas horas e trinta minutos propostos para os períodos da manhã, tarde e noite durante uma semana. Tais cursos foram realizados com o material de apoio: apresentação em PowerPoint e pasta com conteúdo ministrado para consulta e anotações dos professores envolvidos. Em seguida, na presença do pesquisador, foi reaplicado o questionário (pós-teste) a fim de tabular e verificar se houve modificação no conhecimento do professor.

Essa pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (Processo nº 119/2009) da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo.

Posteriormente, as questões foram selecionadas e separadas para análise, em questões qualitativas, as quais verificavam as características do ambiente e do sujeito da pesquisa; e as quantitativas, as quais verificavam o conhecimento que o professor tinha sobre os distúrbios de aprendizagem. Para a análise quantitativa foi usado o Teste de McNemar, foram considerados frequência absoluta e frequência relativa, para significância da resposta p<0,05.

RESULTADOS

Procurando traçar um perfil dos entrevistados envolvidos no estudo, a primeira parte do questionário interrogou os professores sobre o ciclo e disciplina que lecionam, sua formação, tempo de serviço e frequência e tipo de leitura, descritos na Tabela 1.

Cerca de 60% dos professores entrevistados buscam atualização pela leitura de livros e revistas especializadas em sua área de atuação, lêem também literatura geral (52%), literatura infantil (48%), jornais e revistas (56%) e histórias em quadrinhos (44%).

Pode ser observado que 60% dos professores, ao longo de sua formação, não receberam nenhuma informação a respeito da atuação do fonoaudiólogo na escola. Sendo que 96% dos professores possuem algum aluno com distúrbio de aprendizagem em suas turmas. Observou-se que antes da intervenção formativa 68% dos professores acreditavam que estas dificuldades escolares eram decorrentes a algum distúrbio orgânico (deficiência) causas intrínsecas - fisiológico, biológico (Figura 2) e esse índice passou a 84%, compreendendo que esta dificuldade pode advir de fatores orgânicos, como uma disfunção do sistema nervoso central e não acompanhado por exemplo de uma deficiência mental, depois da intervenção, não apresentando diferença estatisticamente significante às etapas de aplicação dos questionários (p= 0,683).


Para os professores os problemas que aparecem em sua sala de aula são nomeados como dislexia (28%), distúrbios fonológicos (16%), TDAH (28%) e distúrbio de aprendizagem (32%), sendo que 32% declararam desconhecer os termos mencionados antes da intervenção formativa, contudo depois da intervenção formativa houve sensível alteração dos dados: os professores passaram a classificar e compreender as manifestações encontradas em distúrbios como dislexia (72%), distúrbios fonológicos (76%), TDAH (52%) e distúrbio de aprendizagem (52%), como se pode observar na Figura 3.


Diante das dificuldades em que se deparam, 84% dos professores procuram corrigir com atividades desafiadoras, principalmente depois da intervenção formativa e 64% chamam os pais para conversar a respeito dos problemas.

A utilização dos recursos disponíveis na escola a fim de auxiliar a criança a aprender foi apresentada por 72% dos professores após a intervenção formativa, além de ter aumentado os índices de encaminhamentos para o coordenador pedagógico, para o fonoaudiólogo e a orientação à mãe para que leve a criança a um especialista para um diagnóstico seguro e intervenção eficaz (Figura 4), contudo 92% apontam como relevante que a escola deveria suprir o déficit cultural da criança, promovendo acesso à cultura letrada de forma que garanta seu desenvolvimento.


As dificuldades das crianças em aprender foram justificadas, inicialmente, por 64% dos professores pela falta de infraestrutura física da escola e após a intervenção 84% persistiram em afirmar que os distúrbios de aprendizagem são localizados na escola devido à carência de infraestrutura física e pedagógica. Nesta mesma perspectiva, 84% dos professores apontaram, inicialmente, que não são decorrentes somente do ambiente, mas após a intervenção formativa, apenas 22% apontaram que os distúrbios de aprendizagem não são decorrentes somente do ambiente. No entanto, para 80% dos professores a sobrecarga de trabalho, que dificulta o planejamento e o preparo das aulas, não é a causa para que os alunos apresentem dificuldades escolares.

O conteúdo curricular inadequado às necessidades das crianças foi apresentado, inicialmente, por 24% dos professores não tendo relação aos distúrbios de aprendizagem. E depois da intervenção formativa 84% passaram a afirmar que o conteúdo curricular influencia no processo de aprendizagem dos alunos. Os distúrbios de aprendizagem, para 56% dos professores, não são decorrentes da escola oferecer pouca oportunidade ao desenvolvimento do aluno e depois da intervenção formativa esse índice passou a 84%. Para 92%, após a intervenção formativa, os distúrbios de aprendizagem não estão relacionados ao não cumprimento do conteúdo curricular. E 88% referem que seu baixo salário também não são a causa da indisciplina e baixo rendimento escolar.

Para 36% inicialmente e 64% posteriormente, antes da intervenção formativa distúrbios de aprendizagem ocorrem devido à falta de aptidão e habilidades do aluno; e 92%, após, acreditam que não são decorrentes da indisciplina dos alunos em sala de aula. Ainda, para 72% dos professores antes da intervenção e 80% depois, as dificuldades escolares são decorrentes do meio em que vive o aluno. Para 60% dos professores, antes da intervenção e 68% depois, o nível sociocultural de sua família, assim como 12% apontaram que a falta de acompanhamento desta nos deveres escolares das crianças não interferem às dificuldades escolares.

O desinteresse e a falta de esforço do aluno foram apontados por 64% inicialmente e 52% posteriormente, como fator causal das dificuldades escolares. Cerca de 80% dos professores, em ambas as ocasiões, também acreditam que os alunos possuem baixa autoestima, vinculada aos distúrbios de aprendizagem.

Para 100% dos professores a intervenção especializada é necessária, quando se está à frente de um diagnóstico de distúrbio de aprendizagem, dislexia, disgrafia, distúrbio fonológico e TDAH. Mas que a escola não possui recursos humanos e nem materiais necessários para esses alunos (100%).

Após a intervenção formativa, os professores apresentaram as seguintes afirmações: 72% referiram que uma criança com dislexia apresenta problemas de leitura, previamente apenas 12% apresentaram tal conhecimento; 56% baixo ou médio nível intelectual não é uma das características das crianças disléxicas, antes da intervenção formativa apenas 24% fizeram tal afirmação; 48% após e 8% após a intervenção formativa, revelaram incerteza na afirmação que a criança disléxica pode ser por natureza mais criativa que outras crianças, o que lhe permite compensar a sua dificuldade. Quando questionados sobre a disortografia, que é uma perturbação específica que se caracteriza por erros na escrita, sem que implique erros na leitura, apenas 12% concluíram como verdadeira tal afirmação, após a intervenção formativa esse índice subiu para36%.

Da mesma forma a intervenção formativa modificou as respostas dos professores, pois antes foram 12% que responderam afirmativamente e depois 64% afirmaram que a disgrafia é uma perturbação funcional da escrita que afeta a qualidade da escrita mesmo que não haja erros ortográficos.

Nota-se que 64% dos professores apontaram como não verdadeira a afirmação, que é indiferente a idade de início da intervenção relativamente ao êxito da recuperação de uma criança com dislexia e não houve alterações após a intervenção formativa.

A dificuldade de julgamento da dislexia foi apresentada por 68% dos professores devido às suas diferentes formas de manifestação e antes da intervenção apenas 28% responderam afirmativamente. Quanto ao aparecimento da dislexia estar associado ao nível socioeconômico e cultural da criança 68% dos professores referiram negativamente antes da intervenção e 88% dos professores também referiram negativamente sobre este aspecto após a intervenção. A criança disléxica esforçar-se mais para ler do que as outras crianças foi uma afirmação de 72% dos professores depois da intervenção formativa em detrimento a 32% antes da intervenção. Os profissionais do ensino também afirmavam que a cópia era um exercício adequado para essas crianças, o que modificou após a intervenção formativa (76%).

Para apresentar a evolução das respostas dos professores foram descritas as porcentagens de acertos e erros durante o pré-teste e o pós-teste e os valores de p no teste estatístico (Tabela 2).

DISCUSSÃO

A análise dos resultados apresentados evidenciou que os professores desconhecem os distúrbios de aprendizagem e que possuem dificuldade em classificar as suas causa, ou nomear o problema em que se depara; até mesmo como realizar adequada intervenção para que o aluno supere estas dificuldades. Estudos compararam crianças com e sem dificuldades de leitura e escrita, cujo critério de avaliação é estabelecido apenas pelo professor5, 7-11. Tal percepção é determinante para classificar os alunos em relação ao seu desempenho na leitura e escrita, por isso, a importância do conhecimento dos distúrbios de aprendizagem.

Quando questionados sobre as dificuldades de aprendizagem, os professores apontaram como causa o desinteresse e a falta de esforço do aluno, não tendo relevância significante às aplicações prévia e posterior à intervenção formativa. Outro aspecto apontado foi que a causa do baixo desempenho acadêmico, para a escola, está relacionada ao aluno, especificamente, às suas condições internas de aprendizagem, pois para 88% dos professores as crianças vêm de lares desestruturados, com pais que não acompanham os estudos dos filhos, e 52% acreditam que essas crianças não estão interessadas em aprender e como esses fatores estão intrínsecos ao aluno, para o professor, a sua conduta não interferirá de forma significante para que este aluno supere estas dificuldades, mas 86% afirmam que propõe algumas atividades desafiadoras para essas crianças. Portanto, a principal característica foi apontada como inerente ao aluno, excluindo qualquer interferência da escola aos distúrbios de aprendizagem, refletindo na dificuldade da aderência sobre a intervenção formativa. Revelando que mesmo após a intervenção formativa o professor insiste em referir que a problemática é centrada no aluno, ou seja, apontaram que não há interferência da infraestrutura física e/ou pedagógica relevante aos distúrbios de aprendizagem.

Araujo12 propõe que os problemas e dificuldades de aprendizagem são expressões e alterações manifestadas por muitos alunos no seu desenvolvimento escolar. Quando a criança é limitada, a aprendizagem acaba desencadeando alguns transtornos e comportamentos negativos, tais como o medo, a ansiedade e sentimento de culpa. Sua falta de estímulo e rejeição cria uma atmosfera pouco satisfatória no seu desempenho escolar, evidenciando crianças com distúrbios de aprendizagens que são percebidas nas aulas pelos professores. Contudo, nesse estudo os professores atribuem como causas desses problemas fatores intrínsecos ao aluno ou a sua condição familiar e socioeconômica.

Os resultados apresentados por Osti13, em seu estudo, afirma que os professores atribuem a dificuldade de aprendizagem decorrente a problemas emocionais, como consequências de problemas familiares. Revelando a atribuição da problemática ao ambiente familiar e exclusivo ao aluno, por falta de interesse e vontade em participar das atividades propostas. Semelhante ao estudo atual, 88% dos professores apontaram que os distúrbios de aprendizagem são localizados na escola devido a diversos fatores, principalmente à falta de assistência e acompanhamento da família nos deveres de casa e pesquisas dos alunos e também 52% atribuem ao desinteresse e falta de esforço do aluno.

Para Silva14 ensinar não se resume em conhecer distintas metodologias de ensino e optar por uma ou outra, é preciso compreender o aluno, as características de sua personalidade, as etapas de desenvolvimento na qual se encontra do ponto de vista motor, emocional, cognitivo ou social, e a maneira pela qual ele aprende. Os alunos que não conseguem aprender não o fazem por vontade própria, mas muitas vezes devido a problemas de interação entre o educando e todo o contexto educacional.

Entretanto, a condição familiar e econômica da criança não é determinante para o sucesso ou fracasso escolar, pois há casos de crianças que são bem sucedidas no seu desempenho acadêmico7, apesar de sua condição socioeconômica, contrariando as afirmações dos professores que relacionaram o fracasso às condições sociais e familiares das crianças apontados neste estudo.

Os professores, porém, não conseguem realizar com eficiência uma intervenção significante para garantir a aprendizagem dessas crianças, pois desconhecem os distúrbios de aprendizagem e como realizar mediações adequadas para que as crianças superem essas dificuldades, podendo acarretar de forma insatisfatória alterações no processo de aprendizagem de algumas crianças2. Atualmente, um dado vem chamando à atenção para o sistema educacional das séries iniciais, é o crescente encaminhamento de crianças para atendimento especializado com queixa de distúrbios de aprendizagem15. O agravante do número de encaminhamento é que grande parte dos alunos enviados com essa queixa não apresenta qualquer distúrbio de aprendizagem16 demonstrando as dificuldades do professor em lidar com os problemas dos alunos em sala de aula, sendo impelido a encaminhar crianças que pré-diagnosticam, assim como as dificuldades podem estar diretamente relacionadas à prática pedagógica da escola.

Frequentemente as impressões de um professor quanto às habilidades de um aluno contribuem significativamente para prever quem passará por problemas de leitura e escrita17. Como afirma Lima2 os anos iniciais de escolarização parecem ser cruciais, no que diz respeito a aprender a ler. Portanto, os professores têm um papel fundamental na identificação de um problema e consequentemente realizar adequada intervenção pedagógica para que o aluno supere estas dificuldades.

Os professores, neste estudo durante as atividades de formação, propuseram diversas questões sobre as condutas que deveriam ser tomadas diante dos problemas classificados como distúrbios de aprendizagem, pois tinham inúmeras dúvidas a esse respeito. Tais questionamentos revelaram que, semelhante ao estudo de Fernandes6, o papel do fonoaudiólogo na escola parece ainda não ser completamente conhecido pela comunidade escolar e os distúrbios de aprendizagem também não são conhecidos, pois acreditam que sua atuação é restrita ao diagnóstico e tratamento de alguns distúrbios, e não na prevenção e orientação.

Contudo, se a criança apresenta algum distúrbio ou déficit de desenvolvimento terá mais dificuldade de acompanhar as aulas que normalmente são expositivas, consequentemente apresentará um comportamento inadequado com brincadeiras, desatenção e, em alguns casos, agressividade. Os distúrbios de aprendizagem poderiam ser atenuados caso houvesse maior compreensão e conhecimento do papel do fonoaudiólogo. Foi relatada a falta de conhecimento a respeito, os procedimentos didáticos inadequados e até mesmo ineficientes com 32% dos professores que propõem às crianças realizarem atividades inadequadamente, mas após a intervenção formativa 72% afirmaram que procurarão utilizar todos os recursos disponíveis na escola para ajudar a criança a aprender e superar suas dificuldades, realizando encaminhamentos à direção da escola, junto à coordenação pedagógica, com a orientação junto à mãe para que leve a criança a um especialista para um diagnóstico seguro e intervenção eficaz.

O difícil julgamento da dislexia ocorre devido às suas diferentes formas de manifestação (68%), no entanto, é do conhecimento dos professores que as crianças disléxicas esforçam-se mais para ler do que as outras crianças (72%). Silver18 e Wu19 apresentam que para o diagnóstico do distúrbio de aprendizagem é preciso verificar as características alteradas em habilidades como a identificação ou decodificação da palavra, compreensão de leitura, cálculo, raciocínio matemático, soletração e expressão escrita, e ainda podem ter acometidas áreas acadêmicas que envolvem, de maneira mais ampla, a expressão oral e a compreensão auditiva.

Os problemas de aprendizagem não são restringíveis nem a causas físicas ou psicológicas, nem a análises das conjunturas sociais, segundo Scoz20. É preciso compreendê-los a partir de um enfoque multidimensional, que amalgame fatores orgânicos, cognitivos, afetivos, sociais e pedagógicos, percebidos dentro das articulações sociais. Semelhantemente às respostas deste estudo, as quais 80% dos professores responderam que o meio em que vive o aluno é crucial para seu desempenho escolar e que são decorrentes do nível sociocultural de sua família (68%), contudo 92% reforça que a escola deveria suprir o déficit cultural da criança, promovendo acesso à cultura letrada de forma que garanta seu desenvolvimento.

Durante a intervenção formativa, várias questões foram propostas pelos professores que se mostraram interessados em identificar os distúrbios de aprendizagem, para realizarem encaminhamentos eficientes e acima de tudo intervenções pedagógicas que garantam o aprendizado de todos os alunos. As dificuldades escolares podem advir de problemas de interação entre o aluno e o contexto educacional, não necessariamente a um distúrbio de aprendizagem. Adequar à metodologia do professor, aperfeiçoar o ambiente escolar, efetuar mediações capazes de garantir a aprendizagens dos alunos são condutas que o professor pode realizar, garantindo assim o aprendizado.

Segundo Maranhão21 a parceria do professor no trabalho fonoaudiológico com os pacientes com alterações na escrita é indispensável. No entanto, um ponto observado nas questões propostas foi que o fonoaudiólogo tem um papel a ser desenvolvido na área da educação preventivamente, pois a orientação oferecida aos professores foi determinante não só para otimização dos encaminhamentos, mas aperfeiçoamento do conhecimento e dessa forma melhorar a mediação no processo de ensino aprendizagem.

CONCLUSÃO

Os professores apresentam conhecimento pouco fundamentado a respeito dos distúrbios de aprendizagem, além de não saberem quais condutas devam ser tomados frente a estes problemas. Os resultados evidenciaram que o conhecimento que apresentam, dos distúrbios de aprendizagem, é superficial e distorcido, pois em momento algum, durante a formação acadêmica, houve a realização de cursos sobre o tema.

A orientação fonoaudiológica em palestra de formação propiciou mudanças na concepção dos professores a respeito dos distúrbios de aprendizagens, evidenciando que por meio do conhecimento, mesmo que básico, a respeito dos distúrbios de aprendizagem e da atuação do fonoaudiólogo, o professor pode identificar uma dificuldade, propor atividades diferenciadas e intervir de maneira eficaz.

No entanto, a intervenção formativa foi realizada em tempo reduzido, na qual foram propostas inúmeras questões referentes ao relevante tema, não havendo tempo maior para suprir essa carência de conhecimento. O material de apoio auxiliou a fixação e futuras consultas sobre as características básicas referentes aos distúrbios de aprendizagem. Sugiro dar continuidade com intervenções que promovam a interação dos profissionais do ensino, com o auxílio da tecnologia atual, com programas de tele-educação.

Recebido em: 18/08/2011

Aceito em: 03/01/2012

Conflito de interesses: inexistente

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  • Endereço para correspondência:

    Raquel Caroline Ferreira Lopes
    Rua Joaquim Fidelis 7-96 apto. 44 - Vila Universitária
    Bauru - SP CEP: 17012-180
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Out 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2013

    Histórico

    • Recebido
      18 Ago 2011
    • Aceito
      03 Jan 2012
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